Acórdão nº 1167/10.5TBPTL.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 06 de Setembro de 2011

Magistrado ResponsávelGABRIEL CATARINO
Data da Resolução06 de Setembro de 2011
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Recorrente: AA Recorrido: BB I. – RELATÓRIO.

Em dissidência com o decidido no despacho saneador/sentença que julgou procedente a excepção de caducidade do direito de acção para investigação da paternidade formulado pela demandante contra o pretenso pai, BB, recorre, per saltum, a demandante, AA, do havendo a considerar para a decisão a proferir, os sequentes: I.1. - Antecedentes Processuais. Elenca-se a súmula dos factos alegados nos articulados produzidos.

Na petição, donde faz emergir o pedido reconhecimento como filha do Réu, BB, e que fosse averbado ao seu registo de nascimento o apelido "M....., aduz a demandante, em síntese apertada, a sequente factologia: “a. A Autora nasceu em ........., na freguesia da Correlhã, no dia 14 de Maio de 1949. (vi de fls....), tendo sido na Conservatória do Registo Civil de........... como filha de CC, sem qualquer menção da paternidade (vide fls...) b. Que a sua mãe manteve relações sexuais de cópula com o Réu, nomeadamente nos primeiros 120 dias dos 300 que precederam o seu nascimento, nada obstando à perfilhação.

  1. Que a sua mãe e o Réu, em meados da década de 40 começaram a estreitar laços de amizade, que posteriormente evoluíram para outro tipo de relação, e que tal namoro, apesar de não assumido plenamente, era do conhecimento de toda a freguesia, situação que até era muito comentada na época; de tal modo que, quando na freguesia se descobriu a gravidez da mãe da Autora, aqui Recorrente, toda a gente teve a convicção que a filha seria do Réu, por ter sido o único homem com quem viram a mãe da Autora. Que essa Relação durou anos, sempre com promessas adiadas, tendo mesmo continuado depois do nascimento da Autora.

  2. Alegando ainda a Autora que, quando pequena a mãe lhe teria indicado que aquele era o seu pai mas que este nunca permitiu uma tentativa de aproximação, o que a impediu de ter acesso ao mesmo, nomeadamente ao seu nome completo ou morada, até porque a Autora foi viver para o Porto ainda muito jovem, tendo perdido contacto com os familiares mais próximos e com vizinhos que lhe pudessem dar mais informações.

  3. E que, o facto de só agora ter intentado a respectiva acção de investigação de paternidade se prende com a circunstância de só posteriormente ao falecimento da mãe e do seu marido (este em 24 de Setembro de 2009, vide fls....) a Autora ter voltado para a sua terra Natal e ter feito uma investigação mais cuidada acerca das suas raízes, o que lhe permitiu obter dados mais concretos sobre o Réu.” Na contestação que apresentou, o demandado defende-se, por excepção, apelando para a nova redacção do artigo 1817.º, n.º 1 do Código Civil, na redacção que lhe foi conferida pela Lei n.º 14/2009, de 1 de Abril, que preceitua que “a acção de investigação de paternidade só pode ser proposta durante a menoridade do investigante ou nos dez anos posteriores à sua maioridade ou emancipação”. Tendo a Autora 61 anos de idade há muito que está ultrapassado o prazo de dez anos previsto no indicado preceito, cuja vigência se tem desde 2 de Abril de 2009.

    Para além da excepção de caducidade induz a figura de abuso de direito por reputar estarem a ser excedidos os limites da boa fé, dos bons costumes, do fim social e económico do direito que pretende exercitar. Na verdade a mãe da Autora faleceu há mais de 12 anos, sendo que é a própria Autora que afirma saber que o seu pai biológico é o demandado. Apesar de ter conhecimento dessa realidade pessoal nunca a fez saber ao demandado nem curou de saber da sua situação pessoal. Tendo neste momento a idade de 90 anos, o demandado esteve doente há quatro anos e a Autora não procurou inteirar-se da sua situação de saúde. Sendo relevante o direito à identidade, também o é o direito de personalidade e do de reserva à intimidade da vida privada, constituindo-se como abuso de direito a pretensão de exercitar o direito de ver investigada a paternidade relativamente ao demandado com a consequente devassa da suas relações pessoais, familiares e patrimoniais.

    Por impugnação contramina os factos constitutivos do direito da Autora, nomeadamente que alguma vez tivesse tido relações com a mãe da Autora, mais velha do que ele cinco anos. A ser verdade o que a Autora refere, à data em que deverão ser situadas as relações sexuais geradoras da concepção a sua mãe teria 33 anos e será pouco crível, como a autora refere, que se deixasse embair nas “falas” do demandado. Do mesmo passo não é verdade que o demandado tenha mantido um namoro com a mãe da autora nem esta consegue localizar o momento exacto em que essas relações terão ocorrido, tendo-se limitado a fazer apelo ao período legal estabelecido – os primeiros 120 dias do 300 que precederam o nascimento da autora.

    Em sede de réplica a autora refuta a argumentação aduzida para a veia exceptiva suscitada, esgrimindo com o acórdão do Tribunal Constitucional n.º 23/2006, de 10-01-2006, publicado no DR, I Série, de 08-02-2006, bem como jurisprudência deste supremo Tribunal em que estriba a posição adversa por que propugna.

    No atinente ao abuso de direito, a autora repristina jurisprudência que já tinha impelido para contraminar a excepção de caducidade e outra em que se escora para abonar a posição de lidimidade do direito a que se arroga. Em sucinto e parcimonioso despacho, o Tribunal de Ponte de Lima julgou procedente a excepção de caducidade, tendo absolvido o Réu do pedido. È deste despacho que vem interposto o presente recurso de revista, per saltum, em que a autora pretende que venha a ser revogado o despacho saneador/sentença em que se julgou o direito á acção de investigação caduco. I.2. – Quadro Conclusivo.

    Para o pedido que requesta, a recorrente formula o quadro conclusivo que a seguir se deixa transcrito. “1 - No douto Despacho Saneador Sentença recorrido entendeu-se julgar procedente a excepção peremptória de caducidade do direito de intentar a acção de investigação de paternidade, invocado pelo Réu e, em consequência decidiu-se absolver o Réu do pedido.

    1. A Recorrente não se conforma com a aplicação do direito aos factos, já que, salvo melhor opinião, entendemos que não se verifica no presente caso os pressupostos da caducidade.

    2. E, por tal motivo se recorre somente de direito.

    3. Assim, pretendia a Recorrente/Autora: a) - Que a acção de reconhecimento de paternidade fosse julgada provada e procedente; b) - Ser reconhecida como filha do Réu para todos os efeitos legais; c) - Que fosse averbado ao seu registo de nascimento o apelido "M........" 5. Para tanto, a Autora, aqui Recorrente intentou Acção de Investigação de Paternidade contra o Réu, tendo, em suma, alegado que: a. A Autora nasceu em .........., na freguesia da Correlhã, no dia 14 de Maio de 1949. (vi de fls....), tendo sido na Conservatória do Registo Civil de Ponte de Lima como filha de CC, sem qualquer menção da paternidade (vide fls...) b. Que a sua mãe manteve relações sexuais de cópula com o Réu, nomeadamente nos primeiros 120 dias dos 300 que precederam o seu nascimento, nada obstando à perfilhação.

  4. Que a sua mãe e o Réu, em meados da década de 40 começaram a estreitar laços de amizade, que posteriormente evoluíram para outro tipo de relação, e que tal namoro, apesar de não assumido plenamente, era do conhecimento de toda a freguesia, situação que até era muito comentada na época; de tal modo que, quando na freguesia se descobriu a gravidez da mãe da Autora, aqui Recorrente, toda a gente teve a convicção que a filha seria do Réu, por ter sido o único homem com quem viram a mãe da Autora. Que essa Relação durou anos, sempre com promessas adiadas, tendo mesmo continuado depois do nascimento da Autora.

  5. Alegando ainda a Autora que, quando pequena a mãe lhe teria indicado que aquele era o seu pai mas que este nunca permitiu uma tentativa de aproximação, o que a impediu de ter acesso ao mesmo, nomeadamente ao seu nome completo ou morada, até porque a Autora foi viver para o Porto ainda muito jovem, tendo perdido contacto com os familiares mais próximos e com vizinhos que lhe pudessem dar mais informações.

  6. E que, o facto de só agora ter intentado a respectiva acção de investigação de paternidade se prende com a circunstância de só posteriormente ao falecimento da mãe e do seu marido (este em 24 de Setembro de 2009, vide fls....) a Autora ter voltado para a sua terra Natal e ter feito uma investigação mais cuidada acerca das suas raízes, o que lhe permitiu obter dados mais concretos sobre o Réu.

    1. Porém, o Tribunal "a quo" entendeu que, "o prazo para a A. intentar a presente acção está ultrapassado por força da Lei 14/2009 de 1 de Abril que procedeu à alteração do art.1817.º do Código Civil ". (itálico nosso).

    2. Tendo julgado procedente a excepção peremptória de caducidade invocada pela Ré.

    3. Tendo o tribunal "a quo" fundamentado que "Atento o disposto no artigo 1. o da referida Lei, o artigo 1817.º n.º 1do Código ... e que como o "artigo 2.º da referida Lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação, ou seja, no dia 2 de Abril de 2009.", "Está assente que o artigo 1817.º n.º 1 do CC com a nova redacção - aplica-se à presente acção por força do art. 1873.º do mesmo Código." (itálico nosso).

    4. Entendendo assim o Tribunal "a quo" que "... tendo a A. 61 anos de idade, há muito que está ultrapassado o prazo de 10 anos previsto no art. 1817.º n.º 1 do CC com a redacção dada pela nova Lei 14/2009 de 1 de Abril, a qual se aplica ao presente processo. " (itálico nosso).

    5. Acrescentando ainda o Tribunal" a quo" que "... é verdade que o n.º 1 do artigo 1817.º CC na sua redacção anterior à referida Lei 14/2009 de 1 de Abril, foi declarado inconstitucional com força obrigatória geral. Daí não se pode concluir que a referida inconstitucionalidade abrange a actual redacção da referida disposição legal. ". Para concluir que " Por tudo isto entendemos que o n.º 1 do art. 1817.º do C. Civil na sua actual redacção não é inconstitucional. " (itálico nosso) 11. A Recorrente não pode concordar com tal entendimento! 12...

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