Acórdão nº 07B2737 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 27 de Setembro de 2007

Magistrado ResponsávelSALVADOR DA COSTA
Data da Resolução27 de Setembro de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I AA e BB intentaram, no dia 20 de Setembro de 1999, contra o Gabinete Português da Carta Verde, a Companhia de Seguros CCMotor Polices LLoyd ‘s e DD Motor Europe Ltd, acção declarativa de condenação, com processo ordinário, pedindo a condenação do primeiro a pagar-lhes 120 000 000$ e juros de mora desde a citação, ou para o caso de ser considerado parte ilegítima para responder directamente pelo pagamento, a condenação da segunda, ou se esta fosse considerada parte ilegítima pelo mesmo motivo, a condenação da terceira, com fundamento na morte do pai deles, EE, na colisão dos veículos com as matrículas nºs XT-00-00 e P0000MLP-A, o primeiro conduzido por EE e o último por FF, ocorrida no dia 18 de Novembro de 1996, na Estrada Nacional nº 247, e na culpa exclusiva do último e em contrato de seguro celebrado com a referida seguradora estrangeira.

Os réus, em contestação, invocaram a sua ilegitimidade e a dos autores e impugnaram os factos articulados pelos últimos, a que se seguiu a réplica e a tréplica.

Foi concedido aos autores o apoio judiciário na modalidade de dispensa de pagamento de taxa de justiça e demais encargos com o processo, e, no despacho de compensação, foi julgada improcedente a mencionada excepção, salvo a relativa a DD Ldª, que foi absolvida da instância.

Realizado o julgamento, foi proferida sentença no dia 12 de Outubro de 1999, por via da qual o réu Gabinete Português da Carta Verde foi condenado a pagar a AA € 75 000 e a BB € 50 000, acrescidos de juros de mora à taxa legal desde a citação.

Apelaram os autores e o réu Gabinete Português da Carta Verde, este subordinadamente, e a Relação, por acórdão proferido no dia 1 de Março de 2007, reduziu a indemnização do dano morte para € 50 000 e, quanto aos juros de mora, decidiu que os relativos à indemnização por danos patrimoniais eram devidos desde a citação e os concernentes à compensação pelos danos não patrimoniais era devidos desde a sentença.

Interpuseram os apelantes autores recurso de revista, o Gabinete Português da Carta Verde a título subordinado, formulando os primeiros, em síntese, as seguintes conclusões de alegação: - o acórdão é nulo por não ter conhecido da questão colocada na resposta ao recurso de apelação interpostos pelo Gabinete Português da Carta Verde relativa à impossibilidade do recurso por virtude de a seguradora não ter manifestado discordância relativamente à sentença proferida no tribunal da primeira instância; - o acórdão violou os artigos 496º, nº 3 e 494º do Código Civil, porque ao fixar os montantes indemnizatórios concedeu primazia ao direito à vida em si mesmo considerado; - os referidos artigos não se concentram apenas na relevância do direito à vida quanto à fixação do direito à indemnização, reportando-se também ao grau de culpabilidade do agente, à situação económica deste e às demais circunstâncias do caso, o que não foi observado; - DD Motor Europe Ltd, de elevado estatuto económico, promoveu em Portugal o teste de uma viatura na via pública por um piloto profissional, sem procurar pista mais adequada, podendo ter evitado a morte que ocorreu; - a indemnização dos danos assenta não só na vertente compensatória como também na sancionatória, e os valores fixados não se revelam suficientes para sancionar e consciencializar a DD Motor Europe Ltd da gravidade do seu comportamento, porque a via pública não é o palco natural para testes automobilísticos; - o caso é diferente dos que habitualmente ocorrem em Portugal, porque o prémio pago pela DD Motor Europe Ltd é calculado para responsabilidade ilimitada, o Gabinete Português da Carta Verde apenas adianta a indemnização e é automaticamente reembolsado após a regularização do sinistro pela seguradora estrangeira; - os artigos 496º, nº 3, e 494º do Código Civil são materialmente inconstitucionais quando interpretados e aplicados no sentido de que o montante indemnizatório pela perda do direito à vida, decorrente de acidente automobilístico, deve ser fixado tendo necessariamente de se ter em conta os valores jurisprudenciais portugueses, mesmo diante de uma situação particularmente inédita e diversa, nunca antes apreciada; - a interpretação e a aplicação feita no acórdão violam o artigo 13º da Constituição porque o princípio da igualdade só é observado quando as situações concretas, muito diversas, são tratadas na sua singular especificidade, sem a limitação de um padrão previamente estabelecido; - como não há lei que imponha previamente um limite mínimo e máximo de indemnização, não podem ser estabelecidos por via da jurisprudência, pois tal significa violação dos artigos , 202º e 203º da Constituição; - sujeitos ao Código Civil, não podem os tribunais adentrar o campo legislativo, ainda que por via jurisprudencial, estabelecendo prévios parâmetros mínimos e máximos, por tal implicar a violação da legalidade democrática e do princípio da separação de poderes, inerente ao Estado de Direito Democrático; - deve ser revogado o acórdão recorrido, desaplicando-se os montantes indemnizatórios que foram considerados; - a indemnização pelo dano morte deve ser fixada em € 500 000, ou em valor próximo e sempre superior a € 50 000 Respondeu o Gabinete Português da Carta Verde, na posição de recorrido, em síntese de conclusão de alegação: - a não pronúncia da Relação sobre a questão suscitada pelos recorridos não releva, atento o disposto no artigo 469º do Código de Processo Civil; - não se justifica o agravamento das indemnizações com intuito sancionatório porque o lesante foi o condutor do veículo ao operar uma manobra de ultrapassagem mal calculada; - ele não é parte na acção, a sua situação económica é desconhecida, DD Motor Europe Ltd foi absolvida da instância e não teve interferência no acidente, sendo o recorrente um mero garante; - é equitativa, designadamente atendendo às circunstâncias do caso e aos padrões actuais da jurisprudência a indemnização de € 50 000 fixada pela Relação pela perda do direito à vida; O Gabinete Português da Carta Verde, por seu turno, no recurso que interpôs, formulou as seguintes conclusões de alegação: - a fixação do valor indemnizatório pelos danos não patrimoniais de um filho pela morte do pai é feita por recurso à equidade; - a equidade neste género de casos aconselha que se recorra aos critérios e valores geralmente adoptados pela jurisprudência e em especial a dos tribunais superiores; - as circunstâncias de facto assentes não justificam a fixação de valor indemnizatório superior ao padrão médio da jurisprudência das Relações e do Supremo Tribunal de Justiça; - considerando os valores fixados pelos mencionados tribunais em 2005 e 2006, é de conceder apenas o montante de € 10 000.

Respondeu a recorrida AA, em síntese de conclusão de alegação: - o recorrente desconsidera a referência que o nº 3 do artigo 496º faz ao artigo 494º, ambos do Código Civil; - o teste da viatura na via pública...

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