Acórdão nº 07B2372 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 27 de Setembro de 2007

Magistrado ResponsávelOLIVEIRA ROCHA
Data da Resolução27 de Setembro de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça 1.

AA- Indústria de Confecções, SA., propôs acção declarativa contra BB e esposa CC, pedindo que, em face do arresto e penhora que incidiram e incidem sobre 15.000 acções nominativas de que o réu BB é titular no capital social da autora, seja reconhecido a esta o direito de adquirir tais acções pelo valor de 5,34 euros cada e, por via disso, os réus condenados a reconhecer esse direito de aquisição e, em consequência, ordenar-se a transmissão das referidas acções através de declaração de transmissão escrita nos títulos.

Alega, para tanto, que o réu BB é titular de 15.000 acções nominativas no valor de 5 euros cada. Por via do arresto dessas acções, decretado nos autos de arresto no 427/01, deliberou adquirir tais acções, o que comunicou ao executado, com a informação de que o seu valor global seria pago em 4 prestações trimestrais, iguais e sucessivas.

Em 20 de Junho de 2002, o réu comunicou que vendera as acções a DD, Lda, acções que foram também penhoradas nas execuções 179/02, 138/02 e 180/02.

Os réus contestaram, alegando que a decisão de arresto não tinha transitado em julgado. Foi na audiência de julgamento da oposição ao arresto que, como incidente, requereu a prestação de caução, o que veio a ser feito através de garantia bancária. Por via disso, foi ordenado o levantamento do arresto. A deliberação tem em vista obstar a que exerça o seu direito de venda das acções pelo preço de 224.459,05 euros, venda que já concretizou, porque, tendo notificado a autora, ela não exerceu a preferência. Assim, é a compradora DD, Lda, a legítima titular das acções.

A autora, na réplica, mantém que, tendo sido decretado o arresto das acções, assiste-lhe direito à sua aquisição. A venda das acções à DD, Lda, corresponde a um plano congeminado pelo réu BB, sendo certo que eles não fizeram entre si qualquer negócio que tivesse por objecto as acções. Tratou-se de um mero artificio para obrigar a autora a adquirir as acções por um preço especulativo. Para além disso, não prestou o seu consentimento à venda das acções.

Requer a intervenção provocada da DD, Lda, para intervir como ré e, com os demais réus, ser condenada no pedido por si formulado.

Admitido o incidente de intervenção principal provocada da chamada, esta contesta, dizendo que, em meados de 2001, acordou com os réus BB e esposa comprar-lhes as 15.000 acções por 3.000$00 cada. Não tendo havido a manifestação de intenção de exercer preferência por parte da sociedade ou de qualquer accionista, adquiriu as acções. Invoca o abuso de direito da autora no exercício da aquisição das acções pelo valor nominal em prejuízo do réu. Alega que, nos processos executivos mencionados pela autora foram deduzidos embargos de terceiro, que foram julgados improcedentes, por as acções não estarem penhoradas.

Deduziu reconvenção, que foi admitida, pedindo que a autora seja condenada a reconhecer que é legítima possuidora das 15.000 acções nominativas.

Teve lugar a audiência de julgamento, após o que foi proferida sentença, que julgou improcedente a acção e procedente a reconvenção.

Inconformada, a autora recorreu para o Tribunal da Relação de Coimbra, tendo feito acompanhar as alegações de um parecer jurídico, mas aquele Tribunal, por acórdão de 30 de Janeiro de 2007, manteve a decisão.

Ainda irresignada, pede revista.

Concluiu a alegação do recurso pela seguinte forma: Em caso de arresto ou penhora de acções da autora, esta tem o direito de as adquirir, nos termos do art. 4°, n° 7, dos estatutos; Efectivamente, através daquela cláusula estatutária, cada um dos sócios da AA vinculou-se, perante a sociedade, à declaração de venda das acções, se estas fossem arrestadas ou penhoradas, tendo a AA a faculdade de aceitar ou não aquela proposta negocial irrevogável; Uma cláusula como a do art. 4°, n° 7, dos estatutos da AA, acautela interesses legítimos e atendíveis dos sócios, bem como da própria sociedade, e não se destina a evitar ou controlar a entrada de estranhos na sociedade; Nos termos do contrato de opção incluído no contrato de sociedade da AA, o direito potestativo da sociedade à aquisição das acções pode ser exercido logo que as acções se encontrem arrestadas ou penhoradas, não dependendo o exercício deste direito da efectiva venda judicial; Só assim se compreende a 2ª parte do mesmo dispositivo ligada pela conjunção "e" o advérbio "ainda"; Tendo a AA exercido, em Dezembro de 2001, o seu direito de opção de compra das acções arrestadas, concluiu-se, nessa data, o contrato de compra e venda das acções arrestadas: a proposta (irrevogável) de venda fora efectuada no próprio contrato de sociedade por cada um dos sócios, entre os quais se contava BB; a aceitação deu-se com o exercício, pela AA, do seu direito potestativo de aquisição, em 6 de Dezembro de 2001; Atenta a existência de um arresto, o negócio de compra e venda das acções, celebrado entre a AA e BB, era, naquela data, inoponível ao credor arrestante (art. 622° Código Civil); A venda das acções à AA, em Dezembro de 2001, tomou nula a venda posterior das mesmas acções, efectuada pelo réu BB à DD, LDA., por esta segunda venda ser a non domino (art. 892° Código Civil); Mesmo que se entendesse que o negócio de compra e venda, celebrado, em Dezembro de 2001, entre a AA e o réu BB, não teria produzido efeitos reais, pelo facto de o vendedor não ter aposto nos títulos a declaração de transmissão (art. 102° CVM), nem por isso a solução do caso dos autos deixaria de ser favorável à autora; Com efeito, mesmo que se entendesse que a AA ainda não seria proprietária das acções - por BB não ter aposto nos títulos a declaração de transmissão -, aquela sociedade é credora do accionista: ao vender à sociedade as suas acções, BB assumiu, entre outros, o dever de declarar nos títulos a transmissão que efectuou; Ainda que se admitisse esta hipótese - em que a AA seria apenas titular de um direito de crédito contra BB - nem por isso deveria deixar de ser dado provimento à acção intentada, pois o direito daquela sociedade sempre deverá prevalecer sobre o eventual direito da reconvinte DD, Ldª; A AA adquiriu validamente as acções, sendo nula a venda posterior à sociedade DD, Ldª; Aliás, no último parágrafo da carta de 6.12.01, a AA refere que existe matéria de facto suficiente para não autorizar a venda das acções; O acórdão violou as normas do art. 7º, nº4, da AA, o art. 195º, nº3, do CVM, o art. 490º, nº3, do CSC e o art. 892º do C.Civil.

Nas contra-alegações, a reconvinte pronuncia-se pela manutenção da decisão impugnada.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

  1. Estão provados os seguintes factos: A autora é uma sociedade anónima, matriculada na C.R.Comercial de Arganil, sob o n° 193, e com o capital social...

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