Acórdão nº 645/05.2TBVCD.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 06 de Julho de 2011

Magistrado ResponsávelGRANJA DA FONSECA
Data da Resolução06 de Julho de 2011
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1.

AA intentou acção declarativa de condenação, com processo ordinário, contra Companhia de Seguros BB, S.A., peticionando a condenação da ré a pagar-lhe a quantia de 68.890 euros, acrescida dos juros a contar da citação, bem como a quantia que vier a ser apurada em liquidação de sentença relativamente aos danos descritos nos itens 59º a 61º da petição inicial.

Alegou, em síntese, que, no dia 24/02/2002, na EN 13, em Vilar, Vila do Conde, ocorreu um acidente de viação em que foram intervenientes os veículos ligeiros de passageiros, matrículas ...NJ, propriedade de CC e conduzido por DD, seguindo nele como passageira a autora AA e ...FC, propriedade de EE e conduzido por FF, tendo cabido a culpa na produção do acidente, em exclusivo, ao condutor do FC. Em resultado do acidente, a autora sofreu danos, que descrimina, de natureza patrimonial e não patrimonial.

A Ré Companhia BB de Seguros, S.A. que entretanto alterou a sua denominação social inicialmente para BB SEGUROS, S.A. e actualmente para BB SEGUROS, S.A., contestou, impugnando a versão do acidente apresentada pela autora e defendeu que o mesmo aconteceu por culpa exclusiva do condutor do veículo NJ, que se despistou em consequência da velocidade superior a 120 km/hora de que ia animado e da imperícia e falta de destreza do mesmo condutor. Impugnou ainda os danos sofridos pela autora e o respectivo montante.

Concluiu pela improcedência da presente acção e sua absolvição do pedido.

Foram apensados aos presentes autos (645/05.2TBVCD) os processos n.

os 645/05.2TBVCD-A (anterior 649/05.5TBVCD) e 645/05.2TBVCD-B (anterior 646/05.2 TBVCD).

Nos autos 645/05.2TBVCD-B (anterior 646/05.2TBVCD) a autora GG intentou acção declarativa de condenação, com processo ordinário, contra a ré Companhia de Seguros BB, S.A., peticionando a condenação da ré a pagar-lhe a quantia de 68.890 euros, acrescida dos juros a contar da citação, bem como a quantia que vier a ser apurada em liquidação de sentença relativamente aos danos descritos nos itens 77º a 80º da petição inicial.

Alegou, em síntese, que, no dia 24/02/2002, na EN 13, em Vilar, Vila do Conde, pela 01h, ocorreu um acidente de viação em que foram intervenientes os veículos ligeiros de passageiros, matrículas ...NJ, propriedade de CC e conduzido por DD, onde seguia como passageira a autora GG, e ...FC, propriedade de EE e conduzido por FF, tendo a culpa na produção do acidente cabido, em exclusivo, ao condutor do FC. Em resultado do acidente, a autora sofreu danos de natureza patrimonial e não patrimonial, que descrimina.

A ré contestou nos mesmos termos em que o fez no processo principal.

Concluiu pela improcedência da acção.

Nos autos 645/05.2TBVCD-A (anterior 649/05.5TBVCD) o autor CC intentou acção declarativa de condenação, com processo sumário, contra a ré Companhia de Seguros BB, S.A., na qual termina peticionando a condenação da Ré a pagar-lhe a quantia de 13.150 euros, acrescida de juros a contar da citação até integral pagamento.

Alegou, em síntese, que, no dia 24/02/2002, na EN 13, em Vilar, Vila do Conde, pela 01h, ocorreu um acidente de viação em que foram intervenientes os veículos ligeiros de passageiros, matrículas ...NJ, de sua propriedade e conduzido por DD e ...FC, propriedade de EE e conduzido por FF, tendo a culpa na produção do acidente cabido, em exclusivo, ao condutor do FC. Em resultado do acidente, o veículo NJ, propriedade do autor, ficou completamente destruído, tendo este sofrido danos em virtude da perda do mesmo veículo.

A ré contestou, alegando os mesmos factos que invocara no processo principal e acrescentado que, no caso de procedência do pedido do autor, a indemnização a pagar ao mesmo seria a constante do documento nº 2 (9.477,16 euros) junto com a contestação.

Concluiu pela improcedência da acção.

O autor respondeu e alterou o pedido, pedindo que a ré seja condenada a pagar-lhe a quantia de 9.477,16 euros, e juros no montante de 1.980,20 euros vencidos até 17/02/2005, e vincendos desde esta data até efectivo pagamento sobre a referida quantia de 9.477,16 euros.

Na fase de saneamento/condensação foi proferido um único despacho saneador abrangendo os factos alegados nas peças processuais dos três processos.

Organizou-se a matéria de facto assente e a base instrutória em moldes que não suscitaram reclamações.

Foi proferida sentença que julgou as acções improcedentes e, em consequência, absolveu a ré BB SEGUROS, S.A. dos pedidos formulados pelos autores AA, GG e CC.

Inconformados, apelaram os autores para o Tribunal da Relação do Porto que, por Acórdão de 20/12/2010, confirmou a sentença recorrida.

De novo inconformados, os autores recorreram para este Supremo Tribunal de Justiça e, alegando, formularam as seguintes conclusões: 1ª - Tendo em atenção o disposto no artigo 712º n.º 1 alínea a), dúvidas não se colocam de que a questão aqui posta é a de saber se a decisão da Relação cumpriu ou não o dever de sindicância da prova fixado neste preceito.

  1. - De facto é o próprio artigo 712º, n.º 2 que refere que “a Relação reaprecia as provas em que assentou a parte impugnada da decisão, tendo em atenção o conteúdo das alegações de recorrente e recorrido, sem prejuízo de oficiosamente atender a quaisquer outros elementos probatórios que hajam servido de fundamento à decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados”.

  2. - É evidente que, na situação em apreço, o Tribunal da Relação pronunciou-se sobre o recurso então interposto mas fê-lo condicionado e condicionando, olvidando que dispõe ainda da possibilidade de ordenar a renovação dos meios de prova na situação prevista no n.º 3 do artigo 712°, podendo, até, determinar a comparência pessoal dos depoentes.

  3. - Tal poder - dever demonstra um tal grau de discricionariedade que é bem ilustrativo do carácter ex novo com que a prova deverá ser enfrentada em segunda instância.

  4. - Aliás, tal visão foi acolhida por diversíssima jurisprudência[1]: “(...) a Relação terá de basear-se sempre numa nova e diferente convicção formada pelos seus juízes”.

  5. - No Acórdão de que se recorre uma tal visão não foi acolhida, mas antes considera-se desde logo pré-determinado porque e passamos a citá-lo: “Ora, os recursos de reponderação, no ensinamento do Prof. Miguel Teixeira de Sousa «satisfazem-se com o controlo da decisão impugnada e em averiguar se, dentro dos condicionalismos da instância recorrida, essa decisão foi adequada, pelo que esses recursos controlam apenas — pode dizer-se — a Justiça relativa dessa decisão».

  6. - Mais refere que a 2ª instância não procede a qualquer novo julgamento, mas se basta com o tal controlo da decisão, enjeitando qualquer nova convicção que passasse pelo crivo de uma reapreciação da prova.

  7. - Daí que afirme “a alteração da matéria de facto, só pode ser feita em função de elementos constantes dos autos (incluindo, obviamente, agravação) e quando seja razoável concluir que aquela enferma de erro” e que “deve ter-se presente que ao tribunal de 2.ª instância não pode ser exigido que procure uma nova convicção sobre depoimentos de pessoas cuja presença física lhe está ausente, mas indagar se a convicção formada pelo tribunal recorrido tem suporte razoável naquilo que a gravação demonstra”.

  8. - Aliás, o aresto vai mais longe e cita um douto Acórdão que refere; “vigorando entre nós o sistema da livre apreciação da prova a convicção do Tribunal não é, em princípio sindicável, salvo se se demonstrar que, na sua formação, se violaram regras de racionalidade e de lógica”, acabando por chegar à conclusão de que “a reapreciação da prova pela Relação não se destina a julgar de novo a matéria de facto, mas antes a sindicar os concretos pontos dessa matéria que em função de concretos meios de prova se revelem grosseiramente apreciados em termos probatórios”, mais concluindo que “é, pois, á luz de tais condicionalismos que é efectuada a reapreciação da prova produzida e fundamentadora da decisão em causa”.

  9. - Concatenando todo o exposto é manifesto que a decisão recorrida pugna por uma interpretação diríamos, après la letre, do estatuído no artigo 712° do CPC.

  10. - Ao contrário do acolhido pelo douto acórdão da Relação, AMÂNCIO FERREIRA[2] refere que na “Relação, a reapreciação da prova pela Relação coincide em amplitude com a da 1ª instância”.

  11. - Ou seja, quando exista gravação dos depoimentos prestados em audiência, a Relação vai, na sua veste de tribunal de apelação, reponderar a prova produzida, tal como o expressou este Supremo Tribunal no seu Acórdão de 19/10/2004 e por Acórdão de 13/03/2009, Processo n.º 08B3684 refere que a amplitude de um novo julgamento em matéria de facto, como bem acentua AMÂNCIO FERREIRA, (...) corresponde à liberdade de julgamento a que alude o n.º 1 do artigo 655° o que vale também na reapreciação a fazer pela Relação. Isso mesmo se extrai igualmente do Acórdão deste Supremo Tribunal, de 07/06/2005, que, a dado passo, pondera: “(...) Nessa medida, poderemos mesmo dizer que o tribunal de recurso actua como tribunal de substituição relativamente ao tribunal recorrido (...)”.

  12. - Mais afirmando que, em boa verdade, só assim, isto é, só com a reapreciação das provas — o que postula, além do mais, a indispensável análise do seu...

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