Acórdão nº 07S1801 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 12 de Setembro de 2007

Magistrado ResponsávelPINTO HESPANHOL
Data da Resolução12 de Setembro de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1.

Em 4 de Novembro de 2003, no Tribunal do Trabalho de Lisboa, AA instaurou a presente acção declarativa, com processo comum, emergente de contrato individual de trabalho contra Empresa-A, e Empresa-B, pedindo que, declarado ilícito o seu despedimento, fossem as rés condenadas: (i) a reintegrá-la nos seus quadros ou pagar-lhe indemnização; (ii) a pagar-lhe a quantia de € 500,00, já vencida, e todos os vencimentos desde a data do despedimento até à data da sentença; (iii) subsidiariamente, a pagar-lhe as quantias devidas pela cessação do contrato a termo celebrado; (iv) tudo acrescido de juros de mora à taxa legal.

Alegou que, em 7 de Novembro de 2002, celebrou um contrato de trabalho temporário com a primeira ré para desempenhar as funções de escriturária de 3.ª, obrigando-se a prestar essa actividade à segunda ré, sendo indicado como motivo do recurso ao trabalho temporário a substituição da trabalhadora BB, em licença de maternidade, tendo exercido essas funções sob as ordens, direcção e fiscalização da segunda ré até ao dia 30 de Dezembro de 2002, data em que um representante das rés (sic) lhe telefonou, «dizendo para não ir trabalhar no dia 31, acrescentando que o contrato terminava em virtude da trabalhadora que a A. havia substituído regressar à empresa», pelo que «foi, assim, inequivocamente despedida nesta data, sem qualquer processo disciplinar ou sequer pré-aviso».

A autora defende que o motivo invocado no contrato de trabalho temporário não corresponde à verdade, pois a trabalhadora que iria alegadamente substituir não regressou ao serviço na data em que foi despedida, nem posteriormente, sendo que as funções para que a autora foi contratada correspondem a um posto permanente da segunda ré e não têm natureza transitória.

Tendo sido falseado o motivo de recurso ao trabalho temporário, a indicação de tal motivo não é atendível, nos termos dos artigos 9.º, n.º 1, alínea a), e 11.º, n.º 4, do Decreto-Lei n.º 358/89, de 17 de Outubro, e artigo 41.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 64-A/89, de 27 de Fevereiro, pelo que, devendo considerar-se o contrato de trabalho celebrado como sem termo, o despedimento de que foi alvo é ilícito por não ter sido precedido de processo disciplinar.

Subsidiariamente, caso se considere válido o contrato celebrado, sempre a primeira ré teria de pagar-lhe «o período de aviso prévio, bem como compensação e proporcionais pela cessação do contrato de trabalho, o que não fez».

Frustrada a conciliação na audiência de partes, ambas as rés contestaram.

A primeira ré aduziu que a empresa utilizadora é a única responsável pela existência da razão apontada para o recurso ao trabalho temporário e, além disso, que comunicou à autora a caducidade do contrato de trabalho a termo incerto, por carta e via telefónica, cumprindo o pré-aviso a que estava obrigada, tendo-lhe pago todos os créditos laborais a que tinha direito.

A segunda ré alegou que «comunicou à 1.ª R. que se deixavam de verificar os pressupostos do contrato de utilização de trabalho temporário, pelo que este deveria cessar em 30 de Dezembro de 2002», e que, para fazer face às necessidades pontuais de aumento de trabalho no seu departamento de peças e logística recorreu, em 1 de Outubro de 2002, a um contrato de utilização de trabalho temporário, mas como a trabalhadora colocada pela empresa de trabalho temporário entrou, durante esse mês, em licença de maternidade, vinculada pela manutenção daquele contrato e porque se mantinham as causas que o motivaram, recorreu a outro contrato de utilização de trabalho temporário para durar até ao regresso daquela trabalhadora.

Porém, em meados de Dezembro de 2002, apercebeu-se da diminuição da actividade que justificou a celebração do primeiro contrato de utilização de trabalho temporário, pelo que, tendo cessado o motivo respectivo, pôs termo a ambos os contratos de utilização de trabalho temporário, em 30 de Dezembro de 2002, aliás, pondo «termo ao primeiro destes contratos, tinha necessária e logicamente de pôr termo ao segundo, dado o encadeamento que entre os dois havia», donde, é infundada a versão da contratação da autora para um posto de trabalho permanente.

Realizado julgamento, foi exarada sentença que julgou o pedido principal improcedente e procedente o pedido subsidiário, condenando a primeira ré a pagar à autora a quantia de € 232,32, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a data do seu vencimento, 30 de Dezembro de 2002, até integral pagamento, tendo absolvido a segunda ré de todos os pedidos.

  1. Inconformada, a autora interpôs recurso de apelação, defendendo: (i) os factos assentes sob os n.os 11, 19 e 21 contêm matéria de direito e conclusiva; (ii) o contrato de trabalho temporário relativo à trabalhadora substituída é nulo porque não faz menção concreta aos factos e circunstâncias que integravam o respectivo motivo justificativo; (iii) o contrato de trabalho temporário da recorrente só poderia cessar validamente com o regresso da trabalhadora BB; (iv) o motivo justificativo do contrato de trabalho da recorrente foi falseado; (v) a segunda ré ao pretender valer-se do contrato de utilização que celebrou com a «Empresa-C» agiu, pelo menos, com abuso de direito; (vi) a recorrente foi despedida ilicitamente.

    A Relação não conheceu da alegada nulidade do contrato de trabalho temporário da trabalhadora BB, que considerou tratar-se de uma questão nova, pois, «na sentença recorrida, não se decidiu a validade ou invalidade do contrato celebrado pela BB, nem tinha que decidir-se, já que tal questão não foi colocado pela A. na petição inicial, não sendo aí alegada a factualidade referente a essa matéria, a qual é estranha ao objecto desta causa», e quanto às demais questões negou provimento ao recurso, confirmando a decisão recorrida.

    É contra esta decisão da Relação que a autora se insurge, mediante recurso de revista, em que formula as seguintes conclusões: «1. A recorrente foi contratada pela 1.ª R., mediante a celebração de um contrato de trabalho temporário, sendo a 2.ª R. a empresa utilizadora; 2. O motivo justificativo indicado para a celebração do contrato da A. foi: [s]ubstituição de trabalhador ausente ou que se encontra impedido de prestar serviço (...) motivado pela substituição da trabalhadora BB em licença de maternidade; 3. O contrato de trabalho da recorrente nada referia quanto a um possível acréscimo de actividade da empresa; 4. A 2.ª R. veio alegar, não obstante o motivo indicado no contrato da recorrente, que a trabalhadora BB foi, também ela, contratada temporariamente para fazer face a um acréscimo da sua actividade; 5. Nos termos da Lei, "[a] cessação ou suspensão do contrato de trabalho temporário, (…), não envolve a cessação do contrato de utilização, devendo a empresa de trabalho temporário colocar à disposição do utilizador outro trabalhador para substituir aquele cujo contrato cessou ou se encontra suspenso"; 6. Deveria ser a empresa de trabalho temporário "Empresa-C" a proceder à substituição da trabalhadora BB e não a 2.ª R. através de outra empresa de trabalho temporário, a 1.ª R.; 7. O motivo indicado para a celebração do contrato da trabalhadora BB foi, apenas e só: "a empresa utilizadora declara que o presente contrato é celebrado ao abrigo da alínea c) do art. 9.° do DL 358/89, de 17/10, e que o recurso ao trabalho temporário se justifica por excesso pontual de actividade no departamento de peças e logística, contactos com fornecedores, elaboração de guias de transporte, informatização de processos"; 8. A recorrente desconhecia que a trabalhadora BB era uma trabalhadora temporária, desconhecendo igualmente qual o motivo que levou à sua contratação; 9. Este motivo não pode ser oponível à recorrente; 10. Nos termos do art. 19.º, n.º l, alínea b), do DL 358/89, o contrato de trabalho temporário deve conter "a indicação dos motivos que justificam a celebração do contrato, com menção concreta dos factos e circunstâncias que integram esses motivos"; 11. E o n.º 2 do mesmo preceito acrescenta que: "A falta da menção exigida na alínea b) do número anterior (...) tem a consequência prevista no n.º 3 do art. 42.º (...) do DL n.º 64-A/89, de 27--02; 12. O contrato de trabalho temporário da trabalhadora BB não faz uma menção concreta aos factos e circunstâncias que integram o motivo indicado; 13. A trabalhadora BB era uma trabalhadora contratada sem prazo; 14. A 2.ª R. não alegou nem provou quaisquer factos que integrassem o conceito de acréscimo de actividade, nem tão pouco quaisquer factos que permitam concluir sem margem para dúvidas que tal acréscimo deixou de ser verificar; 15. A 2.ª R. afirma expressamente que o motivo que levou à cessação do contrato da recorrente foi a diminuição da sua actividade; 16. O contrato da recorrente só poderia cessar validamente mediante a verificação do fundamento que lhe deu origem, ou seja, o regresso da trabalhadora BB; 17. A trabalhadora BB não regressou ao trabalho após cessar a sua licença de maternidade, nem posteriormente; 18. Sendo a trabalhadora BB contratada sem prazo, o contrato da recorrente não poderia cessar por se verificar uma eventual diminuição da actividade da empresa; 19. Se [o] motivo justificativo que levou à contratação da A. foi o acréscimo de actividade, então o motivo justificativo indicado no contrat[o] da recorrente foi falseado; 20. A 2.ª R. ao pretender opor à recorrente o contrato celebrado com a...

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