Acórdão nº 07S736 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 12 de Julho de 2007

Magistrado ResponsávelSOUSA PEIXOTO
Data da Resolução12 de Julho de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na secção social do Supremo Tribunal de Justiça: 1.

"AA" propôs a presente acção emergente de contrato individual de trabalho, no Tribunal do Trabalho de Setúbal, contra Empresa-A e Empresa-B, pedindo que as rés fossem condenadas a pagarem-lhe: a) 4.510,00 euros a título de comparticipações habitacionais já vencidas, acrescida das demais que se vencerem; b) 12.870,00 euros a título de férias e de subsídios de férias e de Natal referentes aos anos de 2001, 2002, 2003 e 2004; c) 2.654,08 euros a título de diferenças salariais.

Em resumo, o autor alegou o seguinte: - em 1 de Outubro de 1979, foi admitido ao serviço da Empresa-C, para, subordinada e remuneradamente, exercer as funções de serralheiro mecânico; - em 1989, a Empresa-C foi adquirida pela Empresa-D, a qual, em 1994, mudou de nome, passando a denominar-se de Empresa-B; - em Março de 2004, a Empresa-B, no âmbito de uma cessão de exploração de estabelecimento, correspondente à unidade de manutenção, transferiu os seus trabalhadores, entre os quais o autor, para a primeira ré; - o autor é dirigente sindical do Sindicato dos Trabalhadores da Química, Farmacêutica, Petróleo e Gás do Centro, Sul e Ilhas; - após ter exercido, durante alguns anos e a tempo inteiro, cargos de direcção no referido Sindicato, retomou as suas funções na empresa, em 1 de Junho de 2001; - até Setembro de 2004, trabalhou, na empresa, um dia por mês e a partir de Setembro de 2004 passou a trabalhar cinco dias por [mês]; - nos restantes dias exerceu e exerce funções sindicais, para as quais era requisitado; - as rés pagaram-lhe os quatro dias por mês a que tinha direito pelo exercício de funções sindicais, à razão de 34,55 euros por dia, quando a sua retribuição diária era de 49,63 euros; - após o seu regresso à empresa, passou a ter direito à retribuição de férias e aos subsídios de férias e de Natal, mas as rés não lhos pagaram, com o fundamento de que o seu contrato de trabalho estava suspenso, o que não era verdade, uma vez que a sua prestação laboral se manteve sem interrupções iguais ou superiores a 30 dias; - nos termos do seu contrato de trabalho, o autor tinha direito a uma compensação habitacional de 102,25 euros por mês, por ter sido deslocado para trabalhar em Sines; - as rés deixaram de lhe pagar a referida a compensação, a partir da suspensão do contrato de trabalho, mas com o seu regresso à empresa a suspensão cessou e passou a ter novamente direito àquela compensação; - todavia, as rés continuaram a não lha pagar.

As rés contestaram em conjunto, alegando, em síntese, o seguinte: - a partir de Março de 2004, a entidade empregadora do autor passou a ser a ré Empresa-A; - desde 1 de Outubro de 1987 até 1 de Junho de 2001, o autor exerceu funções de dirigente sindical a tempo inteiro e, durante esse, período o seu contrato de trabalho esteve suspenso; - o autor jamais reclamou o pagamento da comparticipação habitacional, sendo certo que a ela não tem direito, uma vez que não se encontra deslocado, por ter residência permanente em Sines; - os valores pedidos a título de férias e de subsídio de férias e de Natal não estão correctos, sendo certo que os mesmos também não lhe são devidos, uma vez que a situação em apreço constitui uma evidente fraude à lei; - nada é devido ao autor a título das diferenças salariais reclamadas, uma vez que o salário/dia tem sido correctamente calculado.

No despacho saneador, a acção foi julgada parcialmente procedente, tendo as rés sido condenadas a pagar ao autor: - a ré Empresa-B, a quantia de 3.476,50 euros, a título de compensação habitacional relativa ao período de Junho de 2001 até Março de 2004; - a ré Empresa-A, a quantia de 1.942,75 euros, a título de compensação habitacional referente ao período de Março de 2004 até à data da sentença, acrescida das importâncias que, a esse título, se vencerem até ao trânsito em julgado da sentença; - ambas as rés, solidariamente, a quantia de 8.557,67 euros, a título de retribuição de férias e de subsídios de férias e de Natal referentes aos anos de 2001, 2002 e 2003; - a ré Empresa-A, a quantia de 3.217,50 euros, a título de retribuição de férias e de subsídios de férias e de Natal relativos ao ano de 2004; - ambas as rés, solidariamente, a quantia de 1.532,16 euros, a título de diferenças salariais relativamente ao crédito de horas para o exercício da actividade sindical, no período compreendido entre 1 de Junho de 2001 e Março de 2004; - a ré Empresa-A, a quantia de 658,24 euros, a título de diferenças salariais relativamente ao crédito de horas para o exercício da actividade sindical no período de Março de 2004 a Abril de 2005.

As rés recorreram do saneador-sentença, arguindo a nulidade do mesmo por alegado excesso de pronúncia (segundo as recorrentes, ao ter dado como provado que a compensação habitacional recebida pelo autor decorria da alteração do seu local de trabalho para Sines - al. P) dos factos -, o juiz conheceu de matéria de que não podia conhecer, uma vez que tal facto não tinha sido alegado nem tão pouco provado) e sustentando que o autor não tem direito à retribuição de férias nem aos subsídios de férias que foram condenadas a pagar-lhe.

No que toca à nulidade da sentença, o Tribunal da Relação de Évora decidiu que a mesma não podia ser apreciada, por não ter sido arguida no requerimento de interposição do recurso, acrescentado, todavia, que a nulidade sempre teria de improceder, ainda que se entendesse que tinha sido correctamente arguida, dado que o vício invocado pelas rés não configurava um caso de nulidade da sentença, mas sim um caso de eventual erro de julgamento. E, no que diz respeito à retribuição das férias e subsídios de férias e de Natal, a Relação confirmou a decisão da 1.ª instância.

Mantendo o seu inconformismo, as rés interpuseram recurso de revista, formulando as seguintes conclusões: 1.ª - Ao contrário do que refere o acórdão recorrido, a nulidade da sentença foi correctamente arguida, tendo-se respeitado o disposto no art.º 81.º, n.º 1, do CPC.

  1. - E, portanto, a douta decisão da 1.ª instância é nula, por violação do disposto na al. d) do n.º 1 do art.º 668.º do Cód. Proc. Civil.

  2. - E mesmo que assim não se entenda, o acórdão da Relação de Évora, ao convolar tal nulidade numa errada ou deficiente fundamentação da decisão, deveria ter conhecido e decidido sobre esta questão, mandando baixar o processo à 1.ª instância para se indagar, em sede de matéria de facto, se a comparticipação habitacional continuava, ou não, a ser devida ao recorrido.

  3. - Pelo que o acórdão recorrido não se pronunciou, como deveria, sobre tal questão, pelo que será nulo por violação do disposto na al. d) do n.° 1 do art.º 668.° do C. P. Civil, aplicável por força do disposto no art.º 721.°, n.° 2, também do C. P. Civil.

  4. - O conceito de retribuição referenciado, quer no ano 22.°, n.º 1 do Dec.-Lei n.° 215-8/75, quer no art.º 455.º, n.º 1, do Cód. do Trabalho[ (1)], integra os subsídios de férias e de Natal, pelo que o Acórdão Recorrido ao decidir em sentido contrário, violou tais preceitos legais.

  5. - Um trabalhador que só excepcionalmente trabalha (um dia por semana ou um dia por mês, como no caso concreto), não pode reclamar o pagamento do subsídio de férias e de Natal à sua entidade empregadora, mas deve fazê-lo, sim, à sua associação sindical, ao serviço da qual emprega a esmagadora maioria do tempo da sua actividade laboral.

  6. - De outra forma estaríamos perante uma nítida situação de abuso direito, tal como esta se configura no art.º 334.º do Cód. Civil.

  7. - Na verdade, o direito à retribuição, no âmbito do exercício de funções sindicais, apenas se mantém intocável até ao limite do crédito de horas, crédito de horas que pressupõe o exercício excepcional da actividade sindical em simultâneo com a entidade profissional.

  8. - Portanto, ao ter optado por exercer excepcionalmente a actividade profissional e maioritariamente a actividade sindical, o recorrido beneficiará do regime de faltas justificadas, mas perde o direito à retribuição, onde se inclui o subsídio de férias e Natal.

Terminaram, pedindo a revogação do acórdão recorrido, no que respeita à questão do subsídio de férias e de Natal que não são devidos ao trabalhador recorrido e baixa do processo à 1.ª instância, no que concerne à questão da comparticipação habitacional, para aí se indagar se a mesma continua ou não a ser devida ao recorrido.

O autor não contra-alegou e, neste Supremo Tribunal, o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto pronunciou-se pela confirmação do julgado, em "parecer" a que as partes não responderam.

Corridos os vistos dos juízes adjuntos, cumpre apreciar e decidir.

  1. Os factos Os factos que vêm dados como provados das instâncias são os seguintes: I - Admitidos por acordo nos articulados: A) O Autor foi contratado pela "Empresa-C", em 1 de Outubro de 1979, para, sob as suas ordens, direcção e fiscalização, exercer as funções inerentes à categoria profissional de serralheiro mecânico.

    1. Em 1989, a "Empresa-C" foi adquirida pela "Empresa-D", a qual, no ano de 1994, alterou a sua denominação para "Empresa-B", ora 2.ª Ré.

    2. Por força de um contrato de cessão de exploração do estabelecimento da Segunda Ré, o Autor foi transferido, a partir de Março de 2004, para a 1.ª Ré, mantendo integralmente o seu contrato de trabalho e demais direitos e regalias, sendo que a 1.ª Ré se comprometeu a observar permanentemente o designado AE/Empresa-B.

    3. Do documento de fls. 11, datado de 19 de Março de 2004, subscrito pela 1.ª Ré consta: "Para efeitos do estabelecido no número 2 do artigo 318º e n.º 3 do artigo 319º, do Código de Trabalho, de 2003, avisam-se os trabalhadores transferidos no âmbito da «Cessão do Direito de Exploração do Estabelecimento, correspondente à unidade de Manutenção», que devem reclamar os eventuais créditos laborais à sua actual entidade patronal (Empresa-B), no prazo de três meses, da data da transmissão, sob pena de não se lhe transmitirem".

    4. Do documento de fls. 12 e 13, datado de 8...

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