Acórdão nº 07B1815 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 21 de Junho de 2007

Magistrado ResponsávelSALVADOR DA COSTA
Data da Resolução21 de Junho de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça AA e BB instauraram, no dia 22 de Fevereiro de 2001, contra CC e DD, acção declarativa constitutiva condenatória, com processo ordinário, pedindo a anulação de identificado contrato de compra e venda, com fundamento em erro na formação da vontade, e a condenação solidária das rés a restituírem-lhes 7 500 000$ e a pagar-lhes 602 000$ de juros vencidos e os juros vincendos, e 753 872$ a título de danos patrimoniais, e 1 000 000$ a título de danos não patrimoniais e juros de mora à taxa legal desde a citação.

Fundaram a sua pretensão na omissão deliberada e consciente dos réus acerca da verdadeira área do terreno que lhes venderam por 7 500 000$, gerando-lhe a convicção de que o prédio tinha 296,75 metros quadrados e que lhes possibilitava a construção de uma moradia, e que mais tarde verificaram que a sua área era de 255 metros quadrados e que ela lhe inviabilizava essa construção, nas despesas realizadas com a compra, o levantamento topográfico, o projecto de arquitectura, e na quebra de expectativas de mudança de residência com melhoria de condições de habitabilidade.

As rés, em contestação, afirmaram, por um lado, que o terreno tem a área convencionada, apenas carecendo para o efeito do desaterro de um declive, e, por outro, a caducidade da invocação do erro pelos autores.

Na réplica, os autores negaram a verificação da referida caducidade e afirmaram que a área do declive do terreno está ocupada por um talude de segurança da estrada desde Agosto de 1996.

No despacho saneador, em audiência preliminar, relegou-se para final o conhecimento da excepção de caducidade, e, realizado o julgamento, foi proferida sentença no dia 6 de Março de 2003, por via da qual foi anulado o contrato de compra e venda e as rés condenadas a restituírem aos autores € 37 409,84, e a indemnizarem-nos no montante € 3.261,50 a título de danos patrimoniais e € 2 493,99 a título de danos não patrimoniais, com juros de mora à taxa legal desde a citação.

Apelaram as rés, e a Relação, por acórdão proferido no dia 16 de Dezembro de 2003, anulou a decisão da matéria de facto a fim de serem aditados identificados factos à base instrutória.

Realizado novo julgamento, foi proferida sentença no dia 17 de Maio de 2005, com conteúdo idêntico ao da sentença anterior, da qual as rés apelaram, e a Relação, por acórdão proferido no dia 13 de Fevereiro de 2006, limitou-se a revogar a sentença na parte em que as condenou a pagar aos apelados, a título de danos patrimoniais, de € 3 261,50.

Interpuseram as apelantes recurso de revista, e este Tribunal, por acórdão proferido no dia 12 de Outubro de 2006, anulou o acórdão da Relação com fundamento em omissão de pronúncia sobre a caducidade por elas invocada à luz do disposto no artigo 917º do Código Civil, e a Relação, por acórdão proferido no dia 8 de Janeiro de 2007, conhecendo da mencionada excepção, considerou a acção sujeita ao prazo geral da prescrição, por visar a realização da responsabilidade civil contratual, e manteve o conteúdo do seu anterior acórdão.

Interpuseram as apelantes recurso de revista, formulando, em síntese, as seguintes conclusões de alegação: - o nº 3 do artigo 916º do Código Civil não se refere a terrenos, pelo que não é aplicável no caso, sendo aplicável o nº 2; - os recorridos souberam, antes de 19 de Dezembro de 1999, que a área do terreno que compraram era inferior à que constava da escritura e comunicaram isso às recorrentes; - caducou o direito dos recorridos porque a acção foi intentada mais de um ano depois da denuncia do defeito; - na lógica do entendimento da Relação, deveria considerar-se o disposto no artigo 917º do Código Civil, complemento do artigo anterior; - não resulta da lei a caducidade da denúncia dos defeitos a par da prescrição do seu exercício; - uma acção de anulação de um contrato, sujeita a caducidade, não pode ser transmutada em acção de responsabilidade civil contratual, sujeita a prescrição de prazo geral; - a acção de responsabilidade civil pressupõe a culpa, a presente é baseada em erro, e transitou em julgado a parte do acórdão recorrido que declarou não ter havido culpa das recorrentes na venda de coisa defeituosa; - é inaplicável o nº 2 do artigo 287º do Código Civil, porque o contrato foi cumprido e os recorridos invocam o erro para o anular por via de acção e não de excepção; - é inaplicável, por impossibilidade física, o regime das normas de reparação de coisa defeituosa, e não pode ser considerada a denúncia de defeitos por via da mera propositura da acção; - os recorrentes também impugnaram no recurso de apelação a condenação por danos não patrimoniais, pelo que deve tal impugnação deve ser considerada no recurso de revista; - o acórdão recorrido violou os artigos 236º, nº 1, 247º. 251º, 287º, nº 2, 295º, 309º, 798º 916º, nºs 1 a 3 e 917º do Código Civil e 497º, 498º, 664º e 672º do Código de Processo Civil, pelo que deve ser revogado e as recorrentes absolvidas do pedido.

II É a seguinte a factualidade declarada provada no acórdão recorrido: 1. Os autores tomaram conhecimento, nos primeiros dias de Novembro de 1999, da oferta de venda do lote em questão pelas rés, dado que no mesmo se encontrava uma placa de uma imobiliária a anunciar tal venda, com o respectivo contacto telefónico.

  1. Perante tal anúncio, os autores contactaram a imobiliária para saber o preço da venda bem como a área do lote em questão, assim como o tipo de construção permitida para o local, e foram informados de que o lote n.º 147 tinha a área de 296,75 metros quadrados, do seu preço e que no mesmo poderia ser edificada uma construção com cave, rés-do-chão, primeiro andar e anexos.

  2. Já na sede da imobiliária foram-lhe exibidos os documentos referentes ao lote de terreno, designadamente a cópia da caderneta predial, a cópia de uma certidão da Conservatória do Registo Predial de Gondomar e a cópia de um documento da Câmara Municipal de Gondomar onde era mencionado o numero do alvará de loteamento, sendo que todos esses documentos, à excepção do da Câmara, referiam que o lote em questão tinha a área de 296,75 m2.

  3. O documento da Câmara Municipal de Gondomar mencionado sob 3 referia a área de 321,75 metros quadrados, por ainda não estar rectificada a área em virtude de uma cedência à Junta Autónoma das Estradas.

  4. Confrontados com a exibição dos documentos aludidos em 3, os autores mostraram-se interessados no negócio, pelo facto de naquele lote de terreno poderem edificar uma casa com uma área de construção e de logradouro superior àquela da qual já eram proprietários.

  5. No dia 10 de Novembro de 1999, os autores, por um lado, e as rés, por outro, declararam, por escrito, prometerem: - as últimas venderem aos primeiros um lote de terreno destinado à construção com a área de 296,75 metros quadrados, designado lote n.º ..., sito no Lugar de Vale de Ferreiros ou Alto da Serra, freguesia de Baguim do Monte, concelho de Gondomar, descrito na Conservatória do Registo Predial de Gondomar sob o n.º 322 daquela freguesia, inscrito na respectiva matriz predial sob o artigo 11 879.

    - ser o preço de 7 500 000$, com entrega no momento da assinatura do contrato promessa, a título de sinal, de 2 000 000$, e o remanescente no momento da celebração da escritura pública de compra, no prazo de 30 dias.

  6. No dia da assinatura do contrato aludido sob 6, as rés foram directamente interpeladas pelos autores no que concerne à área do terreno e ao tipo de construção permitida no mesmo, tendo estas confirmado que o terreno tinha 296,75 m2 e que permitia a construção de uma moradia com cave, rés-do-chão, primeiro andar e anexos.

  7. Os autores e as rés declararam acordar que antes da celebração da escritura de compra e venda iriam todos ao local do lote de terreno para proceder à sua delimitação, dado que o mesmo se encontrava cheio de mato e de outra vegetação.

  8. Os autores desconheciam onde se encontravam os marcos de delimitação, e, no dia marcado, as rés não apareceram, apenas tendo estado no local o mediador que, com as indicações e conhecimentos que tinha, procedeu à delimitação do lote com a ajuda dos primeiros.

  9. No dia 2 de Dezembro de 1999, em escritura pública outorgada perante a notária do Cartório de Ermesinde, o autor, por um lado, e as rés, por outro, declararam, o primeiro comprar, e as últimas vender, por 2 800 000$, um terreno para construção com a área de 296,75 metros quadrados, designado por lote 147, situado no lugar de Vale Ferreiros ou Alto da Serra, freguesia de Baguim do Monte, Gondomar, e os autores entregaram às rés 5 500 000$, embora o valor declarado na escritura, por acordo das partes, tenha sido de 2 800 000$.

  10. O terreno na sua parte posterior confronta, desde Agosto de 1996, com um talude de segurança da Auto-Estrada A 4, e as rés compraram-no no dia 24 de Outubro de 1996, identificado como tendo a área de 296,75 m2, e, assim, o venderam aos autores.

  11. Logo após a celebração da escritura aludida em 10, os autores contactaram um gabinete de arquitectura para proceder à elaboração do projecto de construção da moradia, e um técnico deslocou-se, no dia 10 de Dezembro de 1999, ao lote, para proceder ao levantamento topográfico por forma a poder elaborá-lo.

  12. Feito o levantamento topográfico, verificou-se que o lote apenas tinha a área de 255 m2 e que essa área não permitia a construção pretendida pelos autores.

  13. Os autores, de imediato, contactaram as Rés, a alertá-las para este facto, e forneceram-lhes cópia do referido levantamento topográfico, onde se refere que a área do lote n.º 147 era de 255 metros quadrados.

  14. Os autores tiveram conhecimento do referido sob 13 antes de 19 de Dezembro de 1999, e se tivessem conhecimento da real área do lote em questão, não teriam realizado o negócio.

  15. Os autores criaram expectativas na mudança da sua residência por forma a melhorarem as suas condições de habitabilidade e de espaço.

  16. Os autores despenderam 280 000$ com a sisa, 49 690$ com a escritura e 24 182$ com o registo e...

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