Acórdão nº 07S534 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 21 de Junho de 2007
Magistrado Responsável | BRAVO SERRA |
Data da Resolução | 21 de Junho de 2007 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1.
"AA" e BB intentaram, sob o patrocínio do Ministério Público e contra Companhia de Seguros Empresa-A, CC e mulher, DD, acção com processo especial emergente de acidente de trabalho, solicitando a condenação dos réus a pagarem: - - à primeira autora, como viúva do sinistrado EE, o capital de remição de uma pensão anual e vitalícia de € 2.041,80, a partir de 17 de Janeiro de 2003, € 2.852,80 pelas despesas de funeral e trasladação e € 60 a título de despesas de transporte e alimentação; - à segunda autora, como filha do mencionado sinistrado e que é portadora de incapacidade por deficiência física e mental, uma pensão anual e vitalícia de € 1.361,20, a partir da indicada data; - a ambas as autoras, em partes iguais, o subsídio por morte no montante de € 4.279,20, incidindo sobre todas as quantias juros à taxa legal.
Aduziram, em síntese, que o marido e pai das autoras, em 16 de Janeiro de 2003, quando trabalhava, desempenhando as funções de trolha, sob as ordens, direcção e fiscalização do réu CC, auferindo a retribuição anual base de € 6.806, foi vítima de um acidente que consistiu em ter caído de cerca de 3,80 metros de altura, o que lhe causou lesões que determinaram, directa e necessariamente, a sua morte.
Prosseguindo os autos seus termos, foi proferida sentença que: absolveu a ré DD do pedido; absolveu os réus CC e mulher do pedido do pedido de condenação como litigantes de má fé, pedido esse formulado pela ré seguradora; condenou o réu CC, enquanto responsável principal, a pagar à autora AA uma pensão anual e vitalícia de € 4.083,60, a partir de 17 de Janeiro de 2003, o subsídio por morte no quantitativo de € 2.139,60, € 2.852,80 por despesas de funeral e trasladação, € 60 a título de despesas em transportes e alimentação e juros; condenou a ré seguradora, enquanto responsável subsidiária, a pagar à autora AA a pensão anual e vitalícia de € 2.041,80, a partir de 17 de Janeiro de 2003 e até perfazer a idade da reforma, sendo, a partir desta, de 40% da retribuição do sinistrado, sem prejuízo da regra da actualização das pensões, € 2.139,60 a título de subsídio por morte, € 2.852,80 a título de despesas de funeral e trasladação, € 60 a título de despesas de transporte e alimentação; condenou o réu CC, enquanto responsável principal, a pagar à autora BB uma pensão anual e vitalícia de € 2.722,40, a partir de 17 de Janeiro de 2003, € 2.139,60 de subsídio por morte e juros de mora; condenou a ré seguradora, enquanto responsável subsidiária, a pagar autora BB uma pensão anual a vitalícia de € 1.361,20, a partir de 17 de Janeiro de 2003, o subsídio por morte de € 2.139,60 e juros de mora.
Do assim decidido apelou o réu CC para o Tribunal da Relação do Porto que, por acórdão de 25 de Setembro de 2006, julgando procedente a apelação, absolveu o apelante dos pedidos e condenou a ré seguradora "nas quantias referidas na sentença, mas a título principal", e isso porque, muito em súmula, entendeu que, ponderada a matéria de facto - sobre a qual, aliás, houve recurso e que levou a que um dos factos dados por apurados na 1ª instância viesse a ser alterado -, ficaram por apurar as causas determinativas do acidente, razão pela qual não logrou a ré seguradora provar o nexo de causalidade entre a violação das regras de segurança e o acidente.
-
Continuando irresignada, pediu a ré seguradora revista para este Supremo, tendo, na alegação adrede produzida, formulado as seguintes «conclusões»: - "1.
- A realidade dos autos evidencia, sem mais, o nexo causal entre o acidente e a inobservância das normas de segurança, por parte do-réu E.P., como causa geradora do acidente em apreço, pelo que carece de fundamento a conclusão ínsita na sentença sub judice, no sentido de que não ficaram demonstradas as exactas circunstâncias em que o sinistro ocorreu, em razão do que não foi possível aferir da responsabilização da E.P. pela sua ocorrência.
-
- No que concerne à questão do nexo de causalidade, importa salientar que, tanto na jurisdição administrativa como na civil, é pacificamente adoptada a doutrina da causalidade adequada na sua formulação negativa, segundo a qual ‘um facto que actuou como condição só deixa de ser considerado causa adequada se, dada a sua natureza geral, se mostrar de todo em todo indiferente para a verificação do dano, tendo-o provocado só por circunstâncias excepcionais, anormais, extraordinárias ou anómalas.
' cfr. Prof. Henrique Mesquita, RLJ, Ano 128°, n.º 3852, pág. 92, em anotação ao Acórdão do STA, de 20.20.1994, e Prof. Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Almedina, 1980, 3ª edição, págs.761 e 772.
-
- Deste modo, na apreciação desta circunstância, o julgador não pode deixar de apelar ao senso prático, às realidades do quotidiano, a juízos de probabilidade, para se concluir pela dita indiferença, ou não, para a produção do dano.
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- Por outro lado, não se pode esquecer que o Juiz tem por missão aplicar a lei aos factos apurados, conforme abundantemente resulta dos arts.264º, 659º e 664º do C.P.C., em razão do que é, pois, exclusivamente no quadro do factualismo adquirido no processo - e apenas com este -, que a sentença deve ser proferida.
-
- Por isso que, da matéria constante dos pontos 5º, 12º, 13º, 14º, 15º, 16º, 17º, 18º, 19º, 20º (ainda que com a nova redacção), 21º e 22º dos factos assentes, outra conclusão se não pode retirar que não seja a de que a E.P. do sinistrado violou culposamente as mais elementares regras de segurança no trabalho e que foram determinantes para a ocorrência do sinistro, o que é conducente a desresponsabilização da Recorrente, em via principal, pelas consequências do sinistro.
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- Salvo o devido respeito, a argumentação vertida na sentença em crise carece em absoluto de fundamento, uma vez que, no entender da Recorrente, não é de modo algum estranho à dinâmica e às consequências do acidente a demonstrada ausência dos equipamentos de segurança aludidos nos citados pontos da matéria de facto.
-
- Na verdade, da factualidade dada como assente e que serviu de base à fundamentação da sentença resulta inequivocamente que a E.P. do sinistrado não procedeu à implementação de qualquer equipamento de segurança - colectiva ou individual - para evitar o previsível risco de queda, facto de que o acidente, infelizmente, é sintomático e elucidativo.
-
- Pelo que terá de se concluir que houve efectivamente por parte da E.P. do sinistrado a violação de normas relativa à segurança no trabalho e que foram causa adequada do sinistro em análise, sejam elas a não instalação de sólidos guarda-corpos nos andaimes e redes de suspensão; o incumprimento da obrigação de fazer observar e fiscalizar a utilização dos necessários equipamentos individuais de segurança, designadamente cintos de segurança, tudo em ordem a prevenir e evitar as quedas em altura, o que inequivocamente não sucedeu, propiciando, assim, uma permanente situação de risco para os trabalhadores da obra, que o mesmo é dizer, criando condições adequadas à ocorrência do sinistro.
-
- Com efeito, se está assente que (i) o sinistrado deu uma queda de uma altura de, pelo menos, 3,80 m, quando se encontrava a descofrar janelas sobre o 3° e último nível do andaime; (ii) o andaime não possuía guarda costas ou guarda corpos (barras metálicas ou em madeira fixada a 90 cms de altura das tábuas de pé) no 3º e último nível, onde se encontrava o sinistrado; (iii) o sinistrado executava a tarefa de descofragem de pé sobre o último patamar do andaime; (iv) o sinistrado não usava cinto de segurança; (v) no local não havia rede de protecção (rede susceptível de suportar o corpo de uma pessoa em queda), 10.
Uma única conclusão se pode retirar deste condicionalismo, qual seja a de que a entidade patronal não implementou a utilização de qualquer equipamento de segurança - individual...
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