Acórdão nº 07B939 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 10 de Maio de 2007
Magistrado Responsável | JOÃO BERNARDO |
Data da Resolução | 10 de Maio de 2007 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I - A... - Pneus e Óleos, Lda. intentou a presente acção declarativa, em processo ordinário, contra: F..., SA.
Alegou, em síntese, que: Foi emitido a favor dela, autora, por terceiro, um cheque no montante de € 28.560,00 sacado sobre conta existente no réu.
Apresentado a pagamento no prazo de oito dias, o réu não lho pagou, alegando que o mesmo cheque fora revogado por coacção moral, coacção esta que ele sabia não corresponder à verdade.
Pediu, em conformidade, a condenação dele a pagar-lhe € 28.560,00 acrescidos de juros.
Contestou o R., afirmando que não pagou o cheque porque, à data da sua apresentação a pagamento, a conta do respectivo sacador não apresentava saldo suficiente que permitisse o seu pagamento, apenas tendo ficado a constar no verso do mesmo o motivo de revogação por justa causa - coacção moral - porque a entidade sacadora lhe solicitou o cancelamento do dito cheque com esse fundamento e, existindo mais que um motivo para a recusa do pagamento, está obrigado a respeitar as instruções do Banco de Portugal, que hierarquiza os motivos de devolução, não lhe cabendo averiguar o fundamento da comunicação da entidade sacadora.
Replicou a A. para dizer que nunca foi informada pelo Banco de que a recusa do pagamento do cheque se deveu à insuficiência de provisão da respectiva conta, estando em causa, apenas, nesta acção, a ilegalidade da conduta do R. e não o aprovisionamento da conta da sacadora. No mais manteve o já alegado na petição inicial.
A acção prosseguiu a sua tramitação, com um recurso interlocutório que agora não interessa e, na altura própria, foi proferida sentença que a julgou improcedente, absolvendo o réu do pedido.
II - Apelou a autora, mas sem êxito, porquanto o Tribunal da Relação do Porto confirmou a decisão.
III - Ainda inconformada, pede revista.
Conclui as respectivas alegações do seguinte modo: 1. Vem o presente recurso de revista interposto da decisão do Tribunal da Relação do Porto, que grosso modo, entendeu, o Banco/Recorrido em nenhuma responsabilidade incorreu quando, obedecendo a uma instrução dada pela Sociedade Sacada, recusou o pagamento do Cheque de € 28.560,00, com o fundamento em " ... cheque revogado por justa causa - coacção moral - por mandato do banco sacado.".
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Entendeu o Tribunal da Relação do Porto que "Decorre da factualidade provada que a sacadora do cheque enviou ao Banco sacado a comunicação junta a fls. 53, em que solicitou o cancelamento do cheque por motivo de devolução com justa causa/coacção moral, assumindo pessoalmente todas as implicações legais e comerciais decorrentes da instrução referente ao cancelamento" 3. E, deste modo, entendeu aquele tribunal que "Trata-se de um dos motivos acima indicados que, podendo ser causa de invalidade do saque, legitima a recusa de pagamento do cheque pelo Banco Sacado." 4. Terminando "Daí que, no caso, a recusa do pagamento do cheque não seja ilícita e geradora de responsabilidade civil para o Banco sacado." 5. Perante o exposto, concluiu o Tribunal recorrido que o Réu F... SA, não praticou qualquer acto ilícito eventualmente gerador de responsabilidade civil, improcedendo assim a presente acção.
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Antes de mais, tomemos como paradigma da nossa Alegação, o douto Assento 4/2000 de 19-01-20009 (DR I de 17-02-2000) que, na nossa modestíssima opinião foi, até à presente data, sem qualquer margem para dúvidas, o trabalho mais brilhante que a Jurisprudência e a Doutrina alguma vez proferiram acerca do assunto que nos vai ocupar de ora em diante.
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De forma absolutamente lapidar, veio aquele Assento 4/2000 pôr um "fim" a uma velha querela doutrinal, tendo então decidido de entre outros assuntos que, não houve qualquer revogação da 2.ª parte do corpo do art.° 14 do Decreto 13004, aquando a entrada em vigor da LUC.
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Refere aquele Assento que: "Em suma: tratando-se de uma norma, materialmente, do direito comum - responsabilidade civil extracontratual - sobre matéria que a Convenção se absteve de tratar, precisamente, para a deixar sob o império exclusivo do direito comum, a 2.ª parte do corpo do artigo 14.º do Decreto n.º 13004 não resultou revogada por efeito da entrada em vigor da LUC.".
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Aliás, ambas as instâncias aceitam de bom grado esta posição, não tendo tal facto sido posto em causa.
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Assim, outra nota importante a retirar é que, a responsabilidade do sacado perante o portador, funda-se não numa qualquer convenção do uso de cheque mas antes e tão só na responsabilidade civil extra contratual.
Da Validade da Revogação e da Justa Causa 11. Salvo melhor opinião, andou mal o Tribunal "a quo" quando decidiu que: "a recusa do pagamento do cheque não seja ilícita e geradora de responsabilidade civil para o Banco sacado", votando assim a presente acção à improcedência.
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Na verdade, como adiante se demonstrará, o cheque, uma vez emitido por quem com legitimidade para o efeito, é irrevogável durante o prazo legal para a sua apresentação a parlamento.
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E, esta irrevogabilidade abrange todos os fundamentos que lhe poderiam estar subjacentes, nomeadamente aqueles que o tribunal "a quo" entendeu preencherem o conceito de "justa causa de revogação".
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Como é sabido, ao proferir o Assento 4/2000, o plenário desta alta instância foi, em suma, chamado a decidir se " ... depois de ter preenchido, assinado e entregue o cheque ao tomador, o sacador solicita, por escrito, ao banco sacado que não o pague porque se extraviou (o que sabe não corresponder à realidade) e se, por isso, quando o tomador/portador lhe apresenta o cheque, dentro do prazo legal de apresentação, o sacado recusa o pagamento e, no verso do título, lança a declaração de que o cheque não foi pago por aquele motivo, o sacador comete ou não comete o crime previsto e punido pelo artigo 228. n.ºs 1, alínea b), e 2, ou o...
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