Acórdão nº 06S4278 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 18 de Abril de 2007

Magistrado ResponsávelMÁRIO PEREIRA
Data da Resolução18 de Abril de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I - A autora Empresa-A pede, com a presente acção com processo comum, que se reconheça a existência de motivo justificativo para o despedimento da ré AA.

Alegou, para tal, em síntese: A R. foi admitida ao seu serviço em 31/07/2005, exercendo actualmente funções de operadora de caixa registadora no seu estabelecimento de S. M. Feira.

No dia 4 de Maio de 2004, a R. dirigiu-se à caixa registadora destinada ao pagamento de compras efectuadas pelos funcionários do estabelecimento e procedeu à aquisição de duas embalagens de "maltesers" que retirara dos expositores da loja, com o preço de € 3,98, com recurso a 16 vales de desconto que, como a R. sabia, se destinavam, unicamente, a ser descontados na compra dos produtos de marca "diese" indicados nas monofolhas e não na compra de maltesers.

A A. tem fundadas suspeitas que R. pretendia repetir o seu comportamento, pois que nesse mesmo dia se apoderou de cerca de 35 folhetos promocionais contendo vales de desconto.

A este respeito, correu o respectivo processo disciplinar, com apuramento dos referidos factos, tendo a A. motivo justificativo para proceder ao despedimento da R..

A R. contestou, invocando, em síntese: É falso que tenha sido a R. quem procedeu ao pagamento de maltesers com vales de desconto, mas sim uma sua colega de trabalho, BB.

De todo o modo, sempre seria em última análise à funcionária da caixa registadora que competiria aferir da legitimidade do desconto pretendido.

Não existe, pois, fundamento para qualquer sancionamento disciplinar e muito menos o pretendido despedimento, sendo que, ainda que se apurassem os factos do processo disciplinar, sempre a sanção em causa seria desproporcionada.

Concluiu pela improcedência da acção, com a sua absolvição do pedido.

Saneada, instruída e julgada a causa, foi proferida sentença que julgou a acção procedente e reconheceu a existência de motivo justificativo para o despedimento da Ré, tendo ainda condenado a R. na multa de 12 (doze) UCs, como litigante de má fé.

Apelou a R., tendo a Relação de Coimbra confirmado a sentença.

II - Novamente inconformada, a R. interpôs a presente revista, com as seguintes conclusões: 1ª. Tendo em conta que o quadro factual relevante integra, para além dos factos dados como provados na primeira instância, a matéria considerada igualmente provada pelo douto Acórdão do Tribunal da Relação do Porto ora sob recurso que constitui o n.º 23 daquela relação de factos provados ("na sequência dos factos que estiveram na origem do processo disciplinar instaurado contra a Ré, a A. instaurou também processos disciplinares contra as trabalhadoras BB e CC, que findaram com a aplicação a cada uma da sanção de suspensão do trabalho com perda de retribuição e antiguidade por um período de 8 dias úteis), ter-se-á de concluir que a sanção de despedimento da R. ora recorrente é desajustada ao respectivo comportamento tendo em conta a prática disciplinar da A. em relação àquelas colegas, nomeadamente à colega CC.

  1. Aliás, perante o circunstancialismo decorrente da matéria vertida, entre outros, nos pontos 8°, 18° e 23° da relação de factos provados, o despedimento da R. poria em causa os princípios da proporcionalidade e da igualdade de tratamento plasmados no art.º 367° e 396° do Código do Trabalho bem como o disposto no art.º 396° n.º 2 do mesmo Código, dispositivos esses que desse modo se mostram violados pelas decisões judiciais quer do Tribunal da Primeira Instância quer do Tribunal da Relação do Porto de que ora se recorre.

  2. Por outro lado, a gravidade do comportamento da R. e os reflexos do mesmo para a Recorrida não foram de molde a justificar o respectivo despedimento atendendo até à postura por esta adoptada relativamente às outras duas colegas daquela, designadamente à colega CC, e ao facto de a R. nunca ter sido antes sujeita a qualquer sanção ou processo disciplinar, tendo cumprido as suas obrigações profissionais de uma forma regular e correcta durante o tempo em que trabalhou para a A. (cfr. ponto 19° dos factos provados).

  3. Por tudo isso, o comportamento da R., ora recorrente, não foi adequado a tornar imediata e praticamente impossível a subsistência da relação laboral, não se justificando em consequência o respectivo despedimento.

  4. Para além dos dispositivos legais já citados a douta sentença da 1ª instância e o douto Acórdão ora sob recurso não tiveram também em devida conta o disposto no art.º 415º nº 3 do Código do Trabalho.

  5. Deve por isso concluir-se, face a todos os factos dados como provados e ao circunstancialismo que rodeou o comportamento da Recorrente e o das colegas acima mencionadas, pela inexistência de fundamentos suficientes para o respectivo despedimento.

Pede que se revogue a sentença recorrida, concluindo-se pela inexistência de fundamentos suficientes para o despedimento da R., com todas as consequências legais.

A A. contra-alegou, defendendo a confirmação do julgado.

No seu douto Parecer, não objecto de resposta das partes, o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto neste Supremo pronunciou-se no sentido de ser negada a revista.

III - Colhidos os vistos, cumpre decidir.

O acórdão recorrido deu como provados os seguintes factos, que aqui se aceitam por não haver fundamento legal para os alterar: 1- A Ré foi admitida ao serviço da Autora, no dia 31 de Julho de 2001, por contrato de trabalho celebrado naquela mesma data - documento n.º 1, junto com a p.i. que aqui se dá por reproduzido; 2- Actualmente, a Ré exerce as funções de Operadora de Caixa Registadora no estabelecimento Empresa-A de Santa Maria da Feira; 3- Auferindo, como vencimento base, em contrapartida do trabalho prestado, a quantia de € 436,00 (quatrocentos e trinta e seis euros), conforme cópia de recibo de vencimento junto como documento n.º 2 com a p.i., que aqui se dá por reproduzido; 4- Em 17 de Maio de 2004, iniciou-se processo prévio de inquérito para, com base nos factos constantes da participação disciplinar de 6 de Maio, averiguar se existia fundamento para a arguição de procedimento disciplinar contra a Ré, tendo posteriormente sido convertido em procedimento disciplinar com intenção de despedimento, em 17 de Junho de 2004, conforme processo disciplinar junto como documento n.º 3 com a p.i. e aqui se dá por integralmente reproduzido; 5- Durante o período compreendido entre 23 de Abril e 5 de Maio de 2004, a Autora, no seu estabelecimento de Santa Maria da Feira, realizou uma promoção de produtos da...

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