Acórdão nº 07P655 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 21 de Março de 2007

Magistrado ResponsávelSANTOS CABRAL
Data da Resolução21 de Março de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: O Ministério Público veio interpor recurso da decisão que se pronunciou sobre a imputação a AA, em termos acusatórios, de factos que integram a autoria material e sob a forma tentada, de um crime de homicídio previsto e punido pelas disposições conjugadas dos artºs 22º, 23º, 131º e 132º, nº 2, al. d) e h) do Código Penal.

Tal decisão absolveu o arguido da prática do crime de homicídio sob a forma tentada e condenou-o, pela prática de um crime de um crime de ofensa á integridade física grave previsto e punido no artigo 144º do mesmo diploma na pena de dois anos e oito meses de prisão. A execução desta pena foi declarada suspensa pelo período de três anos.

As razões de discordância encontram-se expressas nas conclusões da respectiva motivação de recurso onde se refere que: I - O arguido foi condenado como autor material de um crime de ofensa à integridade física grave, p. e p. no artigo 144°, al. d) do C. Penal, na pena de dois anos e oito meses de prisão, suspensa na sua execução por três anos.

II - O bem jurídico protegido (a integridade física) e o perigo para a vida que acarretou para a vida humana exigem, por si só, fortes exigências de prevenção geral, sendo muito elevado o desvalor social da acção e o alarme social que causa.

III - No caso dos autos., o arguido agiu com grande intensidade de dolo - e não com dolo moderado - e com muito elevado grau de culpa, bem evidenciados pela forma como actuou: rápida, eficaz, com recurso a meios letais - bola de bilhar presa na extremidade de uma peça de tecido e faca com 8 cm de lâmina, atingindo zonas particularmente sensíveis e vitais do corpo - nariz, maxilar, abdómen, desvalor pelo bem protegido.

IV - No caso concreto, as exigências de prevenção geral assumem particular relevância e constituem "o limiar mínimo da pena, abaixo do qual já não poderá ser possível ir, sob pena de se pôr em risco a função tutelar do Direito e as expectativas comunitárias na validade da norma violada" (in Figueiredo Dias, in "Direito Penal", Parte Geral, tomo 2, 1988, pág. 279).

V - As circunstâncias que o Tribunal Colectivo considerou como favoráveis ao arguido: a confissão (não imprescindível para a descoberta da verdade), a juventude (apesar de tal facto denota uma personalidade forte. determinada e violenta, "para não dizer cruel "), e o "verbalizado" arrependimento (desacompanhado de actos que demonstrem) não são bastantes para se considerarem prementes as exigências de prevenção especial e, em consequência, serem sobrevalorizadas em relação às necessidades de prevenção geral.

VI - Não se conhecem as condições pessoais, familiares e sociais do arguido, nem o mesmo. em cerca de vinte meses após a ocorrência dos factos, teve oportunidade de demonstrar, ou demonstrou que está a conformar-se ou conformado com o Ordenamento Jurídico.

VII - Mostra-se necessária uma dissuasão individual sem a qual se não conseguirá uma verdadeira dissuasão comunitária e bem assim que a pena as reflicta, sob pena de se colocarem em causa as expectativas e confiança da comunidade no funcionamento do Ordenamento Jurídico.

VIII - Atendendo à ponderação dos factos dados como provados, aos critérios que devem assistir a determinação da medida da pena, ao acentuado grau da culpa e às prementes exigências de prevenção geral e especial, não poderia o Tribunal Colectivo ter condenado o arguido na pena em que o fez, excessivamente próxima do limite mínimo.

IX - É ajustada e proporcionada a aplicação ao arguido de uma medida da pena que se situe perto do limite mínimo abstracto, é certo, mas não tão perto como o Tribunal Colectivo considerou, afigurando-se-nos idónea a aplicação ao arguido de uma pena de prisão não inferior a três anos e seis meses, a qual coincide com as exigências mínimas de prevenção geral, abaixo das quais a protecção do bem jurídico ofendido não é comunitariamente assegurado e como tal aceite.

x - Não é possível a suspensão da execução da pena única que vier a ser aplicada ao arguido, caso o presente recurso mereça provimento, por ser superior ao limite legal estabelecido no art. 50° do C. Penal.

XI - Caso esse Supremo Tribunal considere ajustada a pena aplicada pelo Tribunal Colectivo ou uma outra até três anos de prisão, consideramos igualmente não ser possível a suspensão da sua execução, pois não basta para suspender a execução da pena que se verifique uma prognose social favorável ao arguido, é também necessário que, com a suspensão, fiquem igualmente garantidas as necessidades de reprovação e prevenção do crime como exigência mínima e irrenunciável do Ordenamento Jurídico.

XII - No caso, e como se viu, não goza o arguido duma prognose social favorável, - não se provaram as suas condições pessoais, familiares e sociais; fica-se na dúvida quanto à bondade do "verbalizado" arrependimento e confissão; não teve ainda o arguido oportunidade de demonstrar que está a conformar-se ou conformado com o Ordenamento Jurídico; a violência da actuação do arguido e suas consequências, denotando desvalor pelo bem jurídico protegido, nem com a suspensão da execução da pena ficam acauteladas as exigências de prevenção geral atenta a natureza do bem jurídico protegido com o crime em causa, a violência com que foi praticado e de que se revestiu nas suas consequências e o alarme social e, consequente, insegurança que gerou e gera.

XIII - Caso esse Supremo Tribunal entenda ser de manter a pena de prisão aplicada ao arguido, ou uma outra até três anos de prisão, e entender ainda que a pena deve ser suspensa na sua execução, então deve sê-lo pelo tempo máximo permitido pelo art. 50°, nº 5 do C. Penal, ou seja por cinco anos, e não aquele de três anos fixado pelo Tribunal Colectivo, por só assim se realizarem equilibradamente as exigências de prevenção especial e geral, possuindo o arguido um tempo razoável para interiorizar a censurabilidade da sua conduta e demonstrar a sua conformação com o Ordenamento Jurídico, e este, por seu lado, fica com o tempo suficiente para se pacificar, o que um período de três anos não permite atentas as circunstâncias em causa.

XIV - Em face do exposto, ao decidir como decidiu quanto à determinação da medida concreta da pena e quanto à suspensão da sua execução, violou o Tribunal Colectivo, respectivamente, o disposto nos arts. 40°, 700 e 71 ° e 50° todos do Código Penal.

Respondeu o arguido referindo que: -1- O arguido foi condenado no âmbito do supra referida processo pela autoria material de um crime de ofensas à integridade física grave p. e p. no art. 144º al d) do C. Penal Numa pena de dois anos e oito meses de prisão, suspensa na execução por um período de três anos. Não conformada com esta decisão vem a Digníssima Magistrada do Ministério Público recorrer da mesma com o fundamento na discordância da medida da pena aplicada e de esta ter sido suspensa na sua execução por um período de 3 anos.

2. Face à matéria de facto dada como provada e não provada e já atrás enumerada sobre a epigrafe de "factos" para qual se remete, não se vislumbra em que medida é que a pena aplicada a este caso em concreto se afigura desproporcionada, atendendo aos critérios estabelecidos no artigo 70º e 71º do C. Penal. Como também não se conjectura em que medida é que, face ás circunstâncias apuradas que mais atrás identificada para as quais se remete, que as exigências de prevenção geral não estejam asseguradas pela pena que efectivamente foi aplicada ao arguido.

3. É certo que o douto Acórdão considerou deporem contra o arguido alguns factores. Mas também considerou que devia depor a favor do arguido, após análise de todos os factos apurado no seu conjunto e tendo em conta os depoimentos prestados, aos quais o Tribunal ‘a quo" deu toda a credibilidade, que o ofendido agrediu por vários vezes o arguido. E que por várias vezes o ofendido avançada para o arguido com o intuito de o molestar, e que por isso nada mais fez o arguido, senão defender-se, utilizando meios excessivos, é certo, como aliás o próprio reconheceu no julgamento e reconhece, mas que dadas as circunstâncias, isto é face as agressões actuais e iminentes a que estava a ser alvo por parte do "ofendido": não teve discernimento para apurar.

4. Ficou também demonstrado que já haviam problemas entre o arguido e namorada destes, que se sentia perseguida pelo ofendido, com o ofendido e que o arguido não tinha os objectos que foram utilizados em sua posse, mas sim, que os mesmo por circunstâncias várias, se encontravam dentro da mala de sua namorada, Andreia Séneca, que aí os tinha para se defender de quem neste processo assume a posição de ofendido.

5. Também ficou apurado, relativamente ao perigo que estas agressões representaram para a vida do arguido, mais concretamente no que concerne à utilização de uma faca como meio de defesa, que a lâmina da referida faca, apesar de ter cerca de 8 cm de cumprimento, terá entrado na massa corporal do ofendido apenas 5 cm a 2 cm, 6. Ficou também demonstrado, que o dolo da actuação do arguido, foi de forma moderada, e assim foi considerado pelo douto Tribunal "a quo" porque se logrou provar que face aos circunstancialismos em que se deram os factos e já atrás referidos agiu o arguido repentinamente, em parte reagindo à provocação e à agressão física que lhe foi infligida pelo ofendido.

7. E quanto à eventual forte censurabilidade ético-jurídica da sua conduta o douto Tribunal "a quo" acaba por reconhecer e atribui-lhe carácter favorável, o facto do arguido ter verbalizado estar arrependido, pois considera, e bem, que o arguido denuncia alguma capacidade para se auto censurar.

8. Por fim ficou também demonstrado, que face aos elementos carreados para o processo no que concerne à conduta do arguido anterior e posteriormente à pratica deste crime, e por referência ao certificado do registo criminal do arguido, que este não demonstra ter um carácter agressivo e nem propensão para a pratica deste de tipo de crimes, uma vez que até à presente data só foi...

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