Acórdão nº 06S2844 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 14 de Março de 2007

Magistrado ResponsávelMÁRIO PEREIRA
Data da Resolução14 de Março de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I - O autor AA pediu, com a presente acção com processo comum, que a ré Empresa-A fosse condenada a reintegrá-lo ao seu serviço, se até final não optar pela indemnização de antiguidade, e a pagar-lhe a quantia de 4.756,38 €, acrescida de juros legais, referentes a remunerações e a indemnização por danos morais, bem como no pagamento das retribuições que deixou de auferir em virtude do despedimento de que foi alvo e que considera ilícito em virtude da R ter prescindido dos seus serviços sem que previamente lhe tenha instaurado o competente e necessário processo disciplinar.

A R. contestou, alegando que não despediu o A. e que foi este quem rescindiu o contrato de trabalho.

Concluiu pela improcedência parcial da acção e consequente absolvição parcial do pedido.

Em sede de reconvenção, com fundamento em alegados danos resultantes da rescisão do contrato por parte do autor, sem aviso prévio, pediu a condenação deste a pagar-lhe o montante de 6.884,48 €.

O A respondeu à reconvenção, concluindo pela sua improcedência.

Após julgamento, foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente, condenando a R a pagar ao A. a quantia de 11.963,29 €, e julgou totalmente improcedente a reconvenção, absolvendo o A dos respectivos pedidos.

Dela apelaram a R. e o A..

A R. pediu a revogação da sentença, com a sua absolvição do pedido e a condenação do A no pedido reconvencional.

Por seu turno, o A. pediu que a R. fosse condenada a pagar-lhe a quantia total de 18 423,67 €.

II - Por seu douto acórdão, a Relação de Évora:

  1. Negou provimento à apelação da R; b) Concedeu parcial provimento à apelação do A, tendo condenado a R., para além das quantias já arbitradas na sentença, nas quantias seguintes: 1)- 500 € de compensação pelos danos não patrimoniais resultantes do despedimento; 2) 1.077,69 € de proporcionais de férias, subsídio de férias e natal.

    Dele interpôs a R. a presente revista, com as seguintes conclusões: a) - A relação de trabalho subordinado do A. perante a Ré iniciou-se em 26 de Abril de 1993, data em que foi admitido com a categoria profissional de instrutor.

  2. - Durante o ano de 1997 o Autor frequentou um curso de Director Técnico de Escola de Condução, a expensas da Ré e que concluiu em Março de 1998.

  3. - A partir de 2001, o A. passou a desempenhar as funções de Director da Escola de Condução da Ré, em substituição do anterior director, entretanto reformado.

  4. - No âmbito da actividade de Director Técnico o autor fazia a avaliação dos candidatos e a assinatura das proposituras para exames de condução e, de quando em vez, conferia as folhas de caixa.

  5. - O A. iniciou assim o seu contrato de trabalho com a categoria profissional de "instrutor" passando a partir de 2001 a ter a categoria de Director Técnico ou Director de Escola.

  6. - A autonomia destas duas categorias profissionais é expressamente reconhecida no Anexo 1 do Contrato Colectivo celebrado pela ANIECA (Associação Nacional dos Industriais de Ensino de Condução Automóvel) e o SITRA - Sindicato dos Trabalhadores dos Transportes Rodoviários e Afins) de 2002, no C.C.T. celebrado entre a APEC e a FESTRU, publicado no Boletim de Trabalho e Emprego 1 a Séria, n° 18 de 15-5-2001 a págs. 1061 e 1062 e ainda no já Dec-Lei 86/98 de 3 de Abril e no Dec. Regulamentar 5/98 de 9 de Abril.

  7. - A essa autonomia correspondia diferenciação retributiva - € 694,74 para a categoria de Director e € 638,60 para a de instrutor em 2003.

  8. - À data em que cessou o contrato de trabalho o A. tinha a categoria profissional de Director e era remunerado em função dessa categoria.

  9. - Depois de em Março de 2004 a gerência da Ré ter imputado ao A. a responsabilidade pelo pagamento de uma multa de € 249,00, este reagiu e comunicou por carta de 4 de Março "que a partir do próximo dia 8 de Março de 2004 deixarei de desempenhar o cargo de Director Técnico na v/ Escola passando a exercer somente as funções de Instrutor de condução. Tal facto foi informado à Direcção Geral de Viação".

  10. - Importa referir que essa carta era enriquecida no seu início com a seguinte e convicta expressão "Esta minha irreversível decisão".

  11. - A questão essencial a apreciar no presente recurso prende-se com a interpretação que deve ser dada à referida carta do A. de 4 de Março de 2004: a que lhe foi dada pelas instâncias e pelo A. ou a que é defendida pela Ré ? m) - Importa por isso, interpretar a declaração de vontade constante da carta do A.

  12. - Dizia o saudoso Prof. Manuel de Andrade in Teoria Geral da Relação Jurídica a págs. 305 que "Interpretar um negócio jurídico isto é, a declaração ou declarações de vontade que o integram - equivale a determinar o sentido com que ele há-de valer se valer puder". E a fls. 306 refere que interpretar "Consiste afinal em determinar o conteúdo voluntário ou talvez melhor, o conteúdo declaracional de cada negócio jurídico que a realidade nos depare, ou mesmo só posto como hipótese, figurando em dados termos e condições". A fls. 311 da mesma obra, ao defender a posição interpretativa, que segundo o Autor deve ser seguida, em relação à interpretação dos negócios jurídicos, consagra a "Teoria da impressão do destinatário".

  13. - Ora "in casu" o destinatário (a Ré) atendendo à natureza bilateral do vínculo, à irreversibilidade da manifestação do A.

    , e à sua prévia desvinculação perante a DGV da categoria de Director - documento 6 junto com a p.i. - a destinatária (Ré) só a poderia interpretar como manifestação de "desvinculação contratual", como o fez.

  14. - Na realidade a declaração do A. tinha, considerado no sentido por ele defendido, um objectivo impossível de concretizar sem a aceitação prévia da Ré.

  15. - O A. ao caracterizar a sua declaração como irreversível e ao auto-desvincular-se da categoria de Director pôs em causa a manutenção da relação laboral.

  16. - Pelo que deve interpretar-se a declaração como consagrando o despedimento por iniciativa do A.

  17. - Aliás mesmo admitindo, o que só por mera hipótese e sem conceder se faz e contra tudo o que se vem sustentando que os efeitos da declaração do A. seriam os que foram consagrados pela instância, como poderia manter-se a indemnização calculada com base no vencimento de Director, a condenação da Ré por danos não patrimoniais e os vencimentos vincendos calculados como se nada se tivesse operado na relação jurídica.

  18. - Isto depois de o...

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