Acórdão nº 06P4339 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 15 de Fevereiro de 2007

Magistrado ResponsávelCARMONA DA MOTA
Data da Resolução15 de Fevereiro de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: Arguido/recorrente: AA ( 1) 1. OS FACTOS Em ocasião aproximada e anterior a 13 de Fevereiro de 2003, os arguidos, que são irmãos, formularam o propósito de ceder haxixe a consumidores de droga que lha solicitassem, aceitando e exigindo em troca o pagamento das doses individuais por si entregues. Assim, em execução de tal desígnio, os dois arguidos, no dia 13 de Fevereiro de 2003, em frente ao estabelecimento comercial "..." efectuaram as seguintes entregas de haxixe a indivíduos de sexo masculino, recebendo em troca dinheiro: BB, às 14:10, às 14:20 e às 14:40; o arguido AA, às 14:28, às 14:35, às 14:41, às 15:30, às 16:25 e às 16:40. Prosseguindo tal actividade, os arguidos, no dia 27 de Fevereiro de 2003, no mesmo local, efectuaram as seguintes entregas de haxixe nas mesmas circunstâncias: o arguido BB pelas 20:47, 20:59 e 21:18; o arguido AA pelas 21:15 e 21:27. No dia 19 de Maio de 2003, sempre em frente ao "..." efectuaram as seguintes entregas de haxixe: o arguido AA, pelas 16:50, 17:22 e 17:31; o arguido BB, que na última entrega não recebeu dinheiro em troca, pelas 17:53, 18:00 e 18:09. No dia 20 de Maio de 2003, pelas 16:26, o arguido BB entregou pedaços de haxixe a indivíduo do sexo masculino, recebendo em troca dinheiro; às 17:34 desse dia, o arguido AA ausentou-se do local onde regressou cerca das 17:50; tendo trocado pedaços de haxixe e notas em dinheiro com o seu irmão. A 30 de Junho de 2003, o arguido BB em frente ao "..." entregou pedaços de haxixe, pelas 16:55, 17:17, 17:22, 17:28, 17:59 e 18:34, a indivíduos de sexo masculino e um de sexo feminino, tendo recebido dinheiro em troca. A 1 de Julho de 2003, no mesmo local e circunstâncias, efectuaram as seguintes entregas de haxixe: o arguido BB, pelas 16:57; o arguido AA, pelas 17:37. e pelas 18:00; os dois arguidos, entre as 18:00 e as 18:30. A 2 de Outubro de 2003, cerca das 7:00, o arguido AA tinha consigo, no quarto onde dormia situado no .., do lote ..., da R. Adães Bermudes, em Chelas, residência habitual da sua companheira CC, 3,720 kg de haxixe, divididos em 15 pedaços vulgarmente conhecidos como "sabonetes", que estavam guardados numa embalagem de cartão por debaixo da cama do quarto onde o AA dormia; 88,20 g de haxixe que estavam na gaveta de uma cómoda do mesmo quarto; uma balança de precisão digital de marca "Tanita"; mil euros em dinheiro. Tinha em casa dos pais, situada no .., lote ..., da R. Adães Bermudes: - uma pistola de salva de calibre 9 mm pack, marca BBM, modelo Bruni 96, com o nº de série apagado, de origem italiana, adaptada abusivamente para calibre 7, 65 mm através da forma artesanal com a desobstrução do cano original e posterior introdução no seu interior de um cano de estriamento irregular de calibre 7,65 mm com o comprimento aproximado de 128 mm sendo redimensionada a câmara ao calibre atrás referido, em mau estado de conservação, sem funcionamento, acompanhada do respectivo carregador, 35 munições de calibre 7,65 mm de origem nacional e uma munição de calibre 7,65 mm, de marca GFL de origem italiana em estado funcional; - uma pistola de salva de calibre 8 mm, marca FT, modelo GT 28, sem nº de série, de origem italiana, adaptada abusivamente para calibre 7,65 mm através de forma artesanal com a desobstrução do cano original e posterior introdução no seu interior de um cano de estriamento irregular, de calibre 8 mm com o comprimento aproximado de 63 mm sendo redimensionada a câmara ao calibre atrás referido, em bom estado de conservação e normal estado de funcionamento acompanhada do respectivo carregador, quatro munições de calibre 6,35 mm, marca Geco de origem alemã a duas munições de calibre 6,35 mm, de marca GFL de origem italiana em bom estado funcional; - uma espingarda caçadeira, de calibre 12 com uma coronha serrada e ambos os canos serrados, marca Canones, modelo Demibloc, nº de série 131595 de fabrico espanhol em razoável estado de conservação e normal estado de funcionamento acompanhada de dois cartuchos de calibre 12 de base metálica corpo em plástico de cor azul, marca GB, carregados com bagos de chumbo em estado funcional. Também a 2 de Outubro de 2003, cerca das 07:00, BB tinha consigo no quarto onde dormia situado no ... do lote ... da R. Adães Bermudes , sua residência habitual: 238,245 g de haxixe e uma navalha com resíduos de tal substância; € 150 em dinheiro. A 8 de Outubro de 2003, cerca das 10:50,BB, quando estava em frente ao "...", tinha consigo 35 euros provenientes da venda do produto estupefaciente (...).

O dinheiro encontrado a ambos os arguidos era proveniente da venda de produtos estupefacientes efectuadas pelos dois arguidos no período de tempo situado entre, pelo menos, 13 de Fevereiro e 1 de Julho de 2003. Durante este período, os arguidos não trabalharam nem tiveram qualquer outra fonte de rendimentos. Estavam cientes do perigo que decorria para as pessoas em geral da posse por sua parte das armas de fogo e da navalha "borboleta" que tinham consigo. Conheciam a natureza estupefaciente da cannabis por si entregue a terceiros consumidores com aceitação do dinheiro como pagamento do preço das doses fornecidas. Agiram consciente, livre e deliberadamente fazendo-o com plena liberdade de actuação. Sabiam que as suas condutas eram proibidas.

O arguido AA consome a partir dos 16 anos de idade; completou o 6º ano de escolaridade; era pintor de automóveis; o absentismo laboral, devido ao consumo de estupefacientes, obrigou-o a abandonar essa actividade, passando a fazer trabalhos pontuais na construção civil; tem uma namorada também consumidora; nunca viveram juntos; têm uma filha; vivem ambas em casa dos avós maternos; não tem antecedentes criminais.

Os arguidos confessaram parcialmente os factos e mostraram-se arrependidos; têm o apoio dos pais e irmãos, que os visitavam com regularidade no EPL.

  1. A alteração da qualificação jurídica 2.1. O Ministério Público, na acusação, imputou aos irmãos AA e BB, «ao primeiro a prática em autoria material de um crime de tráfico de estupefacientes p. p. art. 21, nº 1 do DL 15/93 (...) e ao segundo, também em autoria material, um crime de tráfico de estupefacientes, p. no art. 21/1 do DL 15/93 (...)».

    2.2. «Os arguidos requereram a abertura da instrução e foram pronunciados pelos factos e dispositivos legais descritos na acusação (...)» 2.3. «Alegaram, em síntese, na contestação, que não corresponde à verdade que os arguidos tivessem formulado o propósito de ceder produto estupefaciente (...); que tão só o fizeram nas datas e nas horas referidas nos autos de vigilância o que é comprovado através da reportagem de vídeo; que não é verdade que o dinheiro encontrado a ambos os arguidos fosse proveniente da venda de produtos estupefacientes entre 13 de Fevereiro e 8 de Outubro de 2003; (...) que o dinheiro apreendido (...) a AA tinha sido emprestado por um outro irmão que vive na Suíça; que a actividade levada a cabo pelo arguido BB se enquadra no art. 25.º do DL 15/93» 2.4. «Quanto ao crime de tráfico de estupefacientes, entendeu-se, no anterior acórdão deste tribunal colectivo resultar dos factos descritos na acusação que aos arguidos AA e BB, e apenas a estes dois arguidos, era imputada a prática deste crime em co-autoria e não em autoria material como, por lapso, constava da parte final do texto acusatório» 2.5. «Os arguidos interpuseram recurso para a Relação de Lisboa, o qual confirmou integralmente a decisão recorrida. Inconformados, interpuseram recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, invocando violação do disposto no art. 358, nº 1 e 3, do CPP, contradição insanável da fundamentação, nos termos do disposto no art. 410, nº 2, al. b) do C.P.P. e pugnando pela integração da factualidade apurada no crime de tráfico de menor gravidade p. no art. 25, nº 1, do DL 15/93. O STJ decidiu declarar nula a decisão recorrida, nos termos do art. 379, al. b) do CPP e determinou que tal nulidade fosse sanada nos termos legais. Reaberta a audiência, em obediência ao decidido pelo STJ, foi dado cumprimento ao disposto no art. 358, nº 1 e 3, do CPP, tendo os arguidos requerido a audição de uma testemunha. Na data designada para a sua inquirição veio esta testemunha, que não compareceu no tribunal por motivos de doença, a ser substituída pela testemunha DD. Inquirida a testemunha seguiram-se novas alegações finais» 3. A CONDENAÇÃO Com base nos factos provados em julgamento, a 9.ª Vara Criminal de Lisboa, em 24Fev06, condenou o arguido AA (-05/03/71), por um crime de detenção de arma proibida p. p. art. 275, n.ºs 1 e 3, do C. Penal, com referência às al.s a) e d) do nº 1 do art. 3 do DL 207-A/75, na pena de 5 meses de prisão; pela prática, em co-autoria, de um crime de tráfico de estupefacientes p. p. art. 21 do DL 15/93, na pena de 4 anos e 5 meses de prisão; e, em cúmulo, na pena única de 4 anos e 6 meses de prisão: Os arguidos AA e BB encontram-se ambos acusados e pronunciados de um crime de tráfico de estupefacientes p. no art. 21/1 do DL 15/93 e um crime de detenção de arma proibida p. e p. respectivamente pelo art. 275/1 do C. Penal com referência às al.s a) e d) do nº1 do art. 3 do DL 207-A/75, de 17 de Abril (AA) e 275/3 do mesmo Código com referência á al. f) do nº1 do art. 3 do DL 207-A/ 75, de 17/4 (BB). Quanto ao crime de tráfico de estupefacientes alegam os arguidos em sua defesa que não é verdade que tivessem ambos formulado o propósito de ceder produto estupefaciente e que a actividade levada a cabo pelo arguido BB se enquadra no tráfico de menor gravidade p. art. 25 do DL 15/93. De acordo com o disposto no art. 26 do C. Penal, é punido como autor quem executa o facto, por si mesmo ou por intermédio de outrem ou toma parte directa na sua execução, por acordo ou juntamente com outro ou outros e ainda quem dolosamente determina uma pessoa á prática do facto, desde que haja execução ou começo de execução. Assim, nos termos deste normativo, a co-autoria pressupõe que o agente tome parte directa na...

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