Acórdão nº 06S3205 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 07 de Fevereiro de 2007

Magistrado ResponsávelFERNANDES CADILHA
Data da Resolução07 de Fevereiro de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: 1. Relatório Empresa-A, com sede em Lisboa, intentou a presente acção emergente de contrato de trabalho contra AA, identificado nos autos, pedindo a condenação do réu a pagar-lhe a quantia de € 61 875,00, acrescida de juros de mora até efectivo e integral pagamento, bem como o valor correspondente aos danos de imagem e de perturbação interna a contabilizar em execução de sentença.

Alegou, em síntese, que é uma empresa que se dedica à prestação de serviços postais e de transportador público rodoviário de mercadorias e que celebrou com o réu, em 25 de Janeiro de 2002, um contrato de trabalho por tempo indeterminado para o exercício de funções de "Director de Empresa-C". Contrato esse que previa um pacto de não concorrência, nos termos do qual o réu assumia a obrigação de, durante três anos após a cessação do vínculo, não exercer, quer por conta própria quer ao serviço de terceiro, actividade profissional em empresa concorrente com a primeira contraente, sob a contrapartida do pagamento de uma compensação pecuniária na data da cessação do contrato. Em 22 de Junho de 2004, o réu comunicou à autora a rescisão do contrato de trabalho, informando o Administrador Delegado que iria trabalhar para os Empresa-B, o que levou a autora a pagar ao réu, a título da compensação respeitante ao pacto de não concorrência, a quantia ilíquida de € 42 000,00, sujeita aos descontos legais. Porém, o réu violou o aludido pacto, pois foi exercer as funções de Director de Distribuição numa empresa concorrente, os Empresa-B, causando-lhe prejuízos que desde logo se consubstanciam na compensação que foi desembolsada, no aludido montante de € 42 000,00, que incluem as verbas relativas às contribuições e quotizações para a segurança social e os descontos para o IRS.

O réu contestou e deduziu pedido reconvencional.

Por sentença de primeira instância, foi julgada parcialmente procedente a acção, e o réu condenado a pagar à autora a quantia de € 51 975,00, acrescida de juros moratórios, e julgado improcedente o pedido reconvencional.

Em apelação, o Tribunal da Relação de Lisboa confirmou o julgado, salvo quanto ao momento a partir do qual são os devidos os juros de mora, que considerou ser a da data da citação (30 de Outubro de 2004) e não a indicada na sentença (5 de Julho de 2004).

É contra esta decisão que o Autor vem interpor recurso de revista, em cuja alegação formula as seguintes conclusões: 1. A A. intentou acção contra o R. invocando em suma que é uma empresa que tem por objecto o exercício da actividade na área dos serviços postais não reservados e que, quando com o R. celebrou um contrato de trabalho, nele fez inserir uma cláusula configurando um pacto de não concorrência, e que o R., após ter cessado o contrato de trabalho com a A., recebera a compensação prevista naquele pacto de não concorrência, mas violara o mesmo pacto por ter ido trabalhar para os Empresa-B, razão porque devia indemnizar a A. não só pelos prejuízos causados mas também pelos montantes despendidos pela A. em execução do pacto de não concorrência; 2. O denominado "pacto de não concorrência" celebrado entre A. e R. consta da cláusula 8ª do contrato de trabalho celebrado entre as partes nos termos transcritos no nº 7 da matéria de facto dada por provada na douta sentença recorrida, nos seguintes termos: "1. Salvo no caso de revogação por mútuo acordo ou por não renovação do referido contrato de acordo com o disposto no art. 46º, nº 1, do Decreto-Lei n.º 64-A/89, de 27 de Fevereiro, o segundo contratante compromete - se a, durante três anos após a cessação do vínculo, não exercer (quer por conta própria, quer ao serviço de terceiro) em actividade profissional em empresa concorrente com a primeira contraente.

  1. Em contrapartida, a primeira contraente pagará ao segundo contraente uma compensação pecuniária na data da cessação do contrato."; 3. A questão da validade do pacto de não concorrência assim celebrado prende - se com o facto de não estar quantificado na sua redacção o valor da quantia compensatória a pagar ao R. no termo do contrato; 4. Trata - se no casos dos autos da aplicação do art. 36º do RJCIT, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 49.408, sendo unânime a doutrina e a Jurisprudência no sentido de que o pacto de não concorrência tem que ser entendido como uma forma de limitação do princípio constitucional da liberdade de trabalho, e por isso ter de ser interpretado como norma de excepção por forma a não violar de forma intolerável o princípio constitucional referido - Ver por todos o Acórdão nº 256/2004, do Tribunal Constitucional; 5. Quer isto dizer que não é susceptível uma interpretação que alargue o sentido restritivo constante da norma em causa; 6. Está em causa saber se foi dado cumprimento à alínea c) do nº 2 do art. 36º citado quando se deixa em aberto a fixação do valor compensatório a pagar pelo empregador; 7. Exige de facto o nº 2 do art. 36º em análise que se verifiquem cumulativamente as seguintes condições: a) Observância de forma escrita; b) Tratar - se de actividade cujo exercício posse efectivamente causar prejuízo à entidade patronal; c) Atribuir - se ao trabalhador uma retribuição durante o período de limitação da sua actividade; 7. O Acórdão do Tribunal Constitucional citado, analisando aquele normativo defende que se trata de uma formalidade ad substantiam, que visa assegurar a assunção consciente da restrição e delimita o seu campo de aplicação; 8. A determinação da prestação compensatória à luz do carácter vincadamente excepcional da norma limitadora do princípio constitucional da liberdade de trabalho impõe inegavelmente que a prestação compensatória esteja estipulada no acordo escrito, sob pena de se mostrar violado o nº 2 do art. 36º, não se tendo pois por cumprida no caso dos autos a formalidade ad substantiam que o legislador quis configurar em termos suficientemente claros - Ver Acórdão citado a págs. 10 do mesmo; 9. Deste modo, ao contrário do que veio a ser decidido no Acórdão recorrido, entende-se sem margem para dúvidas (que o Acórdão citado não consente) que na cláusula 8ª do contrato celebrado entre A. e R. não se deu cumprimento ao estatuído no art. 36º, nº 2, do RJCIT, razão porque não é válida a cláusula que estatui o pacto de não concorrência; 10. O entendimento em contrário do Acórdão recorrido é claramente violador dos princípios constitucionais da liberdade de escolha de profissão e do direito ao trabalho consignados nos arts. 47º e 58º da Constituição; 11. Está provado nos autos que: a) O R. ao cessar o contrato de trabalho com a A. foi trabalhar para os Empresa-B., onde desempenha as funções de Director de Distribuição, reportando ao Director Geral de Operações, o qual por sua vez reporta directamente ao Administrador do pelouro - facto provado sob o nº 32; b) Os Empresa-B. tem a concessão do serviço postal universal que lhe foi concessionado e prestam em regime de exclusividade o serviço postal reservado - facto dado por provado sob o nº 33; c) A A. exerce a sua actividade na área dos serviços postais não reservados - facto dado por provado nos nºs 37 e 45; d) Os Empresa-B., para explorarem a actividade dos serviços postais não reservados constituíram diversas sociedades que actualmente estão unificadas na empresa Empresa-C, cujo capital é exclusivamente detido pelos Empresa-B. - factos provados sob os nº s 40 a 42; e) Os Empresa-C têm um quadro de pessoal distinto dos Empresa-B., não lhes sendo aplicável o Acordo de Empresa em vigor nesta última empresa - facto provado sob o nº 44; f) A Empresa-C tem a sua própria rede de operações; g) A Empresa-C por acordo com os Empresa-B., recorre à rede de distribuição desta última em determinadas zonas do interior e de menor densidade populacional, representando os objectos postais da Empresa-C distribuídos nestas condições pelos Empresa-B, cerca de 20 a 30% do volume de objectos distribuídos pela Empresa-C - nºs 51 e 52 da matéria de facto; h) Os Empresa-B., prestam também serviços na área do serviço postal não reservado, designadamente num denominado "correio verde" - facto provado nos nºs 47 e 48; 12. O Acórdão recorrido desvaloriza esse argumento salientando que tanto a Doutrina como a Jurisprudência assinalam que não é necessária a efectividade dos danos ou a ameaça dos mesmos, falando - se a propósito da proibição da concorrência de uma espécie de ilícito de perigo; 13. Entende-se que este tipo de questões tem de ser visto caso a caso pois, como é do conhecimento do público em geral os Empresa-B têm nas suas lojas comercialização de diversos produtos que vão do comércio de selos, incluindo a filatelia, ao comércio de artigos de papelaria, de livros, de produtos financeiros e/ ou bancários e até de refrigerantes; 14. A aceitar-se de forma ampla o que o Acórdão recorrido defende, o R. estaria a violar as regras da concorrência ainda que tivesse saído de uma editor ou de um Banco ou quiçá de um estabelecimento de restauração; 15. Impõe-se pois uma orientação mais limitadora que contemple aquilo que é a actividade da empresa para a qual o R. foi admitido quando saiu da A. e a verdadeira expressão do correio postal reservado como actividade quase exclusiva da empresa para a qual o R. foi trabalhar, não relevando o peso da actividade que ela presta no serviço postal não reservado e que se traduz ao fim e ao cabo na distribuição de encomendas postais em zonas mais despovoadas do país, sem que essa distribuição tenha qualquer interesse económico e antes traduza o exercício de uma obrigação assumida no âmbito da concessão do serviço postal universal, não se podendo recusar a prestá - los ainda que isoladamente se traduzam num prejuízo; 16. Nestas condições, o douto acórdão recorrido ao decidir que o R. foi exercer a sua actividade para uma empresa...

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