Acórdão nº 06P3843 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 11 de Janeiro de 2007
Magistrado Responsável | RODRIGUES DA COSTA |
Data da Resolução | 11 de Janeiro de 2007 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I. RELATÓRIO 1.
Na 2.ª Vara de Competência Mista do Tribunal de Loures, foram julgados os arguidos AA, nascido a 2/8/97, BB, nascido a 30/6/79 e CC, nascido a 26/11/1978, todos com os demais sinais nos autos, e foram condenados pela prática, em co-autoria material, do crime de rapto agravado, previsto e punido pelo art. 160.º, n.º 1, alíneas a) e c) e n.º 2, alínea a), em conjugação com o art. 158.º, n.º 2, alíneas a) e b), todos do Código Penal (CP), na pena de 7 (sete) anos de prisão (cada um deles).
Os dois últimos arguidos foram ainda condenados a pagar ao Hospital de Santa Maria a quantia de € 193,10, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, à taxa legal, desde a notificação do pedido cível e até integral pagamento.
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Inconformados com a decisão, os arguidos recorreram para o Tribunal da Relação de Lisboa, que negou provimento aos recursos.
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Ainda insatisfeitos, os arguidos BB e CC recorreram para este Supremo Tribunal de Justiça, colocando as seguintes questões: A) - O arguido BB: - omissão de pronúncia por parte do tribunal recorrido relativamente à matéria de facto; - A medida da pena aplicada, considerando-a excessiva e não visando a reinserção social e reintegração do agente. O recorrente preconiza, neste campo, a pena de 4 anos de prisão ou de 3 anos, suspensa na sua execução pelo tempo máximo (cinco anos).
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- O arguido CC: - omissão de pronúncia por parte do tribunal recorrido da matéria de facto, tendo invocado para o Tribunal da Relação insuficiência da matéria de facto; - a medida da pena, que deve ser revista (caso não seja absolvido) e fixada em 3 anos de prisão, suspensa na sua execução pelo período de cinco anos.
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Respondeu o Ministério Público junto do tribunal «a quo», sustentando que a decisão recorrida não padece de qualquer vício ou nulidade, não cabendo ao STJ apreciar os vícios da matéria de facto apontados à decisão de 1.ª instância e que já foram objecto de conhecimento por parte do Tribunal da Relação. Quanto às penas, considerou-as adequadas e justas. Daí concluir pelo não provimento dos recursos.
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Neste Supremo Tribunal, constatando-se que os arguidos requereram ambos alegações escritas, foi fixado prazo para as ditas alegações, tendo-se demarcado as questões a tratar.
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Os recorrentes produziram alegações escritas que se não distanciam das respectivas motivações de recurso e o Ministério Público junto deste Supremo Tribunal remeteu no fundamental para a resposta do Ministério Público junto do tribunal «a quo», frisando a correcção das penas aplicadas, por força da elevada ilicitude que caracterizou as condutas dos recorrentes.
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Colhidos os vistos, o processo foi presente à conferência para decisão.
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FUNDAMENTAÇÃO 8. Matéria de facto apurada 8.1. Factos dados como provados: 1 - Todos os arguidos são cidadãos estrangeiros, tendo autorização de permanência válida para residirem em Portugal, à excepção do arguido BB.
2 - Os arguidos haviam encomendado a DD documentos de identidade, entregando-lhe em troca as quantias pedidas, não tendo DD chegado a entregar os documentos encomendados pelos arguidos.
3 - Em comunhão de esforços e intentos, em princípios de Fevereiro do ano de 2005, urdiram entre todos um plano que fosse apto a atrair DD ao seu encontro, de modo credível e insuspeito, pretendendo privarem-no logo de seguida da sua liberdade, transferindo-o da sua residência habitual para lugar por ele ignorado, para obterem para todos uma importância económica, para a fazerem sua e dela usufruírem em proveito pessoal, em troca da sua restituição à liberdade, que desde logo combinaram ser de valor não inferior a € 5.000,00, uma vez que entendiam que DD lhes devia dinheiro, atenta a não entrega dos documentos acima mencionados.
4 - Por isso, todos os arguidos pretendiam privá-lo da liberdade e mantê-lo consigo nessas condições, até obterem dele e/ou da família, a importância referida, que sabiam que não lhes era devida.
5 - Para tanto, os arguidos arranjaram correntes e cadeados, aquecimento a óleo e cobertores, uma pistola de alarme, bem como objectos cujo uso e exibição fosse susceptível de intimidar DD, o que conseguiram, nomeadamente os objectos fotografados a fls. 41 a 43, de entre os quais, um taco de basebol em madeira, um bastão com mola extensível e um machado com lâmina cortante.
6 - Escolheram ainda dois ou três locais que arrendaram, preferencialmente isolados, nas zonas da Lourinhã, Alverca e Bucelas, para aí manterem contra a vontade DD e poderem mudar de morada sempre que entendessem, para evitar serem detectados, bem como para obviar à localização daquele.
7 - Os arguidos dividiram tarefas entre si, designadamente, de vigilância aos diversos locais, em que se revezavam, tendo ainda usado diversos telemóveis e uma viatura automóvel, para contacto entre eles e deslocação, que foram utilizados para a prática dos feitos dos autos.
8 - Assim mancomunados, no dia 05/02/2005, o arguido AA combinou um encontro com DD, a suceder num café sito no ..., em Stº António dos Cavaleiros, Loures, local onde DD já se encontrava, na companhia de amigos, tendo este acedido.
9 - Este encontro entre o arguido AA e DD decorreu nesse dia 05/02/2005, no dito café de .., pelas 21 horas.
10 - A dada altura, a pedido do arguido AA, deslocaram-se ambos - o arguido AA e DD - para o interior da viatura de marca Fiat, modelo Brava, cor branca, matricula GI, para aí continuarem a conversar.
11 - O arguido AA entrou para o lugar do condutor e DD entrou e sentou-se no banco dianteiro a seu lado, vulgo "banco do pendura".
12 - Logo após se terem sentado entraram, de seguida, para o banco de trás deste automóvel, os arguidos BB e CC, que agarraram em DD, manietando-o e obrigando-o a sentar-se no banco de trás, entre estes dois arguidos, enquanto o arguido AA punha o carro em andamento, saindo daquele local.
13 - Face à situação em que se encontrava, DD não conseguiu sair da viatura.
14 - O arguido AA guiou o automóvel e conduziu-o até ...., Lourinhã, num local isolado, arrendado pelos arguidos AA e BB a EE, combinando na presença do DD - quando ali chegaram - sê-lo contra o pagamento do valor de 1.000 Euros, que foram pagos por cheque, sendo esta a casa fotografada a fls. 324. a 327.
15 - Nesta habitação, os arguidos colocaram a DD correntes em aço, que amarravam as pernas e pulsos entre si, e entre estes e uma cama, onde as fecharam com cadeados.
16 - Nesta altura, os arguidos disseram a DD que o que pretendiam era que este lhes entregasse uma importância não inferior a € 5.000,00, em troca da sua liberdade.
17 - Como DD lhes transmitisse não dispor desse montante, os arguidos disseram-lhe para o obter junto dos seus familiares e amigos, permitindo-lhe o acesso ao seu telemóvel, mas sempre sob vigilância dos arguidos.
18 - DD fez vários telefonemas, para familiares e amigos, quer em Portugal quer em Angola, durante o período de tempo em que esteve sob o poder dos arguidos - que sucedeu desde o dia 05/02/2005 até ao dia 15/02/2005 - tentando obter a quantia pedida, o que fez contra a sua vontade e por sentir receio dos arguidos.
19 - Durante todo o período em que esteve retido contra a sua vontade, pelos arguidos, DD permaneceu amarrado e controlado como descrito, nunca ficando sozinho, tendo sempre, pelo menos, um dos arguidos a vigiá-lo, revezando-se estes entre si.
20 - De...
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