Acórdão nº 06S2572 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 06 de Dezembro de 2006

Magistrado ResponsávelSOUSA GRANDÃO
Data da Resolução06 de Dezembro de 2006
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: 1- RELATÓRIO 1.1.

AA intentou, no Tribunal de Trabalho de ...., acção declarativa de condenação, com processo comum, contra "BB - Construtora, Ld.ª", pedindo que a Ré seja condenada a pagar-lhe o montante, devidamente quantificado, das retribuições mensais vencidas durante o período em que vigorou o contrato de trabalho celebrado entre as partes, sendo que a demandada nunca lhe pagou qualquer quantia a esse título, bem como os respectivos juros moratórios.

A Ré impugna a celebração do invocado vínculo laboral e, porque entende nada dever à Autora, conclui pela necessária improcedência da acção.

1.2.

Instruída e discutida a causa, veio a 1ª instância a proferir sentença em que, subscrevendo por inteiro a tese da Ré, julgou a acção totalmente improcedente.

Mais condenou a Autora, como litigante de má fé, em multa (6 UC's) e em indemnização (€ 2.684,15) a favor da Ré.

O Tribunal da Relação do Porto, sob apelação da Autora, confirmou integral e remissivamente a sentença da 1ª instância.

1.3.

Continuando irresignada, a Autora pede a presente revista, cujas alegações remata com o seguinte núcleo conclusivo: 1- No Ponto 30 da decisão relativa à matéria de facto decidiu-se: "E, por isso, e todas as relações familiares existentes entre a A. e demais sócios da R. (marido e filhos), foi acordado entre o sócio-gerente e a A. que a R. a "enfolharia" como se fosse sua empregada e, como tal, a inscreveria na segurança social, passando a pagar a esta entidade os descontos correspondentes ao salário mínimo nacional, com a única intenção e finalidade do, desse modo, a A. poder beneficiar da correspondente assistência médica e social, o que se verificou até meados de 1999, data em que, devido aos desentendimentos entre A. e marido, a R. pôs termo aos descontos para a segurança social em nome daquela e à menção da mesma no mapa de pessoal enviado ao IDICT"; 2- a única testemunha que se referiu a esta matéria, como se refere na fundamentação do despacho, foi a testemunha CC, que declarou que o sócio-gerente da R. lhe disse que inscrevesse a A. como trabalhadora da R., a fim de beneficiar das prestações da Segurança Social; 3- nenhuma outra testemunha se pronunciou sobre a matéria, nem de tal dá conta a Sr.ª Juíza, e o sócio-gerente da R. também não foi ouvido sobre essa matéria, pois que só o foi sobre o alegado nos n.ºs 4º a 12º da P.I.; 4- deste modo, e com o âmbito e amplitude constantes do citado n.º 30, não podia ter sido dada como provada tal matéria, sendo patente a insuficiência e falta de motivação para uma resposta com tal amplitude; 5- a sentença retoma, e reproduz a fls. 9, exactamente o constante desse n.º 30; 6- assim, é distinta a matéria que a decisão recorrida considerou e deu como provada com base e por remissão para o depoimento da referida testemunha, dado que esta se limitou a referir conforme o já exposto em 2-; 7- tudo o mais que a Sr.ª Juíza consignou como tendo sido dito pela testemunha não tem qualquer suporte nem fundamento e constitui um exercício de convicção não sustentado em qualquer facto nem em qualquer depoimento; 8- consequentemente, quer a decisão sobre a referida matéria de facto, quer a sentença, são nulas - art.º 668º n.ºs 1 e als. B) e C) do C.P.C.; 9- por força do art.º 712º n.º 1 e segs. do C.P.C., deve a decisão sobre a matéria de facto ser alterada, pois que do processo constam elementos - síntese do depoimento do CC - que impõem uma decisão diferente; 10- assim, o referido Ponto n.º 30 deve integrar apenas a seguinte resposta: "o sócio-gerente da R. deu instruções do gabinete de contabilidade, encarregado da contabilidade da R., para inscrever a A. como trabalhadora da R., a fim de beneficiar das prestações da Segurança Social"; 11- na parte do despacho relativa à matéria de facto não provada, consignou-se como não se tendo provado "… que a A., em Janeiro de 1981, tivesse sido admitida ao serviço da R. para trabalhar sob as suas ordens direcção e fiscalização e mediante retribuição, constituída por vencimento igual ao salário mínimo nacional, férias anuais pagas, subsídio de férias e de Natal iguais, cada, ao vencimento mensal"; 12- saber se a A. foi admitida ao serviço da R. para trabalhar sob as suas ordens, direcção e fiscalização, constitui matéria de direito; 13- de onde decorre que a resposta ou conclusões a extrair sobre esta questão hão-de resultar da subsunção dos factos ao direito; 14- como tal, a referida resposta deve ser tida como não escrita - art.º 646º n.º 4 do C.P.C. - sendo que a sentença se suportou nessa resposta negativa, o que torna nulas ambas as decisões - art.º 668º n.º 1 al. D) do C.P.C.; 15- por outro lado, a matéria de facto dada como provada nos Pontos n.ºs 2 a 14 da decisão respectiva integra um conjunto de factos a partir dos quais tem necessariamente de concluir-se pela existência da relação subordinada de trabalho entre a A. e a R.; ao decidir em contrário, a sentença fez incorrecta aplicação dos factos ao direito, devendo ser revogada; 16- sendo o sócio-gerente da R. casado com a A. e vivendo ambos na casa de habitação, que era simultaneamente a sede social da R., compreende-se, por razões de subordinação económica e conjugal da A., que esta não tivesse reclamado os salários há mais tempo; 17- a coincidência entre a sede social da R. e habitação do casal não pode ser invocada para confundir e desvalorizar as funções desempenhadas pela A. à R.; 18- o entendimento contrário levaria a que não se considerasse existir relação laboral sempre que houvesse salários em atraso ou um dos cônjuges trabalhasse em empresa de que o outro cônjuge fosse sócio-gerente; 19- afirma-se na sentença (fls. 13) que "é legítimo presumir, até pela data em que a R. fez cessar os descontos em nome da A. para a segurança social, que se não fossem os desentendimentos do casal e a consequente acção de divórcio, a presente acção não seria intentada"; 20- esta presunção é abusiva, porque a matéria de facto dada como provada apenas ilustra a efectivação de tais descontos e nada diz acerca da sua cessação e, muito menos, da data da cessação; 21- a presunção é ainda despropositada, porque a matéria, dada como provada, sobre as relações do casal - Pontos n.ºs 15 a 35 - não está demonstrado ter relação com o objecto da acção; 22- no que respeita à litigância de má fé, a sentença tratou desigualmente as partes, pois condenou a A. - e não o deveria ter feito - e não condenou a R. - como se impunha; 23- a A. alegou matéria (art.s 2, 3, 4, 5, 12, 13 e 14) que integra factos pessoais da R., que esta impugnou logo no art.º 1º da contestação e que o despacho sobre a matéria de facto deu como provada - Pontos n.ºs 2 a 8, 10 a 13; 24- ao negar esses factos do seu conhecimento pessoal, a R. propôs-se alterar a verdade dos factos e omitiu matérias de interesse relevante para a decisão da causa, reputando de "falso e pura invenção" o articulado do A., incorrendo, por isso, na previsão do art.º 456º n.ºs 1 e 2 do C.P.C., impondo-se a sua...

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