Acórdão nº 06A2770 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 21 de Novembro de 2006

Magistrado ResponsávelMOREIRA ALVES
Data da Resolução21 de Novembro de 2006
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: Relatório.

No Tribunal Judicial da Comarca da Póvoa de Lanhoso.

AA, Intentar a presente acção declarativa sob a forma ordinária (acção pauliana), contra - BB e - Empresa-A alegando em resumo: - Cedeu ao 1º R. BB, uma quota de que era titular na Empresa-B" pelo preço de 21.198.91 €, tendo recebido 2 cheques para pagamento desse preço, o segundo dos quais, no valor de 10.599.46, apresentado a pagamento não teve provisão.

- Por outro lado foi accionado um aval que o A. havia dado a uma livrança emitida pela dita sociedade Empresa-B, cuja quota cedeu, tendo o A. pago a quantia de 8.559.59€.

- Portanto, o 1º R. é devedor do A. pela importância global de 19.158.92 €.

- Para conseguir o pagamento de tal dívida o A. intentou acção executiva contra o 1º R., mas não foram localizados quaisquer bens em nome do executado ou no seu património.

- Ora, o 1º R, BB, vendeu à 2ª Ré, Empresa-A, um imóvel, que era o único bem conhecido do 1º R. pelo qual podia satisfazer a dívida para com o A., tendo por objectivo colocar-se numa situação de insolvente, prejudicando o A. e agindo em conjugação de esforços com a 2ª Ré, conhecedora de toda a situação.

Pede, por conseguinte que se declare ineficaz relativamente ao A. a alienação do referido imóvel, ordenando-se à 2ª Ré a sua restituição ao património do 1º R., de modo a que o A. se possa pagar à custa desse prédio e na medida do seu crédito.

Contestou a 2ª Ré, alegando resumidamente que, apesar da compra que o 1º R. havia feito do prédio em causa a um seu primo, o certo é que nunca chegou a estar na posse efectiva do prédio e, não tendo possibilidade de liquidar o preço, passou procuração a favor do próprio vendedor, e do advogado, que já tinha intervindo como seu gestor de negócios (procuração irrevogável). Foi assim o vendedor que usando essa procuração vendeu o prédio à 2ª Ré.

A 2ª Ré desconhecia a situação descrita pelo A.

Contestou igualmente o 1º R. impugnando em geral a matéria de facto alegada pelo A.

Quanto ao aval, defende que, tratando-se de uma garantia pessoal, não se transmite ao adquirente da quota.

Admite, porém, a dívida emergente do não pagamento do 2º cheque.

Alega que o A. conhece os contornos da venda do imóvel, bem sabendo que o 1º R. nunca tomou posse efectiva do prédio.

Houve réplica.

Elaborou-se despacho saneador, fixaram-se os factos assentes e organizou-se a base instrutória.

Discutida a causa e lida a decisão sobre a matéria de facto, foi proferida sentença final que julgou a acção improcedente e, consequentemente, absolveu os RR. do pedido.

Inconformados, recorreram, quer o 1º R. (?) quer o A. tendo, porém, o 1º recurso sido julgado deserto.

Apreciada a apelação do A. a Relação de Guimarães negou-lhe o provimento, confirmando a decisão recorrida.

Novamente inconformada, volta a recorrer o A., agora de revista e para este S.T.J..

Conclusão Apresentadas tempestivas conclusões, formulou o recorrente as seguintes conclusões: EM CONCLUSÃO: 1 ° - Conforme resultou provado, por escritura pública outorgada no Cartório Notarial de Póvoa de Lanhoso em 17.06.1996, CC declarou vender ao 1 ° Réu que, representado por procurador, declarou comprar-lhe o prédio sub judice; 2° - Reveste a natureza jurídica de documento autêntico a escritura pública celebrada por Notário, o que lhe confere força probatória plena dos factos praticados pelo oficial público e do contrato de compra e venda efectuado pelas partes e do que nele é atestado (art°3 71 ° do Código Civil); 3° - A força probatória plena do documento autêntico somente poderá ser afastada perante a arguição e prova da falsidade desse mesmo documento (art°372° do Código Civil); 4° - Assim, a escritura pública que formaliza contrato de compra e venda de imóvel mantém a força probatória plena dos factos nela narrados, que é o contrato de compra e venda; 5° - E, em conformidade com as regras do registo predial, presume-se que o imóvel nele descrito e inscrito definitivamente no registo predial pertence àquele titular, sendo este o seu proprietário (art. 7° do C.R.P.); 6° - Nos autos ocorreu erro de julgamento, uma vez que se consideraram provados factos, invocados pelos simuladores, de onde resulta que a venda celebrada por escritura pública foi um negócio simulado, socorrendo-se o Tribunal para tanto de prova testemunhal, em clara violação do disposto no art. 394°, nº 2 do Código Civil, o que pode ser objecto de apreciação pelo S.T.J. (art. 722°, n.02 do Código de Processo Civil); 7° - O facto de se ter dado como provado que o l° Réu nunca chegou a tomar posse efectiva do prédio sub judice e que nunca o visitou, continuando a ser o seu primo CC quem continuou a manter a posse do mesmo, para além de ter assentado em prova testemunhal, não pode, contrariamente ao decidido, ser relevante para fazer funcionar o instituto da usucapião, uma vez que esta é uma forma de aquisição da propriedade e não da sua "manutenção" (art. 1287° do Código Civil); 8° - Ainda que assim não fosse, importa não esquecer que o negócio simulado é nulo e que a nulidade pode ser arguida pelos simuladores entre si, mas não pode ser arguida pelo simulador contra terceiro de boa fé (art°243°, nº 2, Código Civil), não podendo também, em consequência, o tribunal declará-la oficiosamente; 9° - Não tendo resultado provado que o Autor conhecesse os contornos do negócio celebrado em 17.06.1996, tem de considerar-se de boa fé, sendo-lhe por isso inopinável a nulidade do negócio simulado, tendo a possibilidade de continuar a beneficiar do mesmo, como se ele fosse verdadeiro e válido; 10° - Para além dos factos elencados como provados, tem também de considerar-se como assente que o negócio celebrado entre o 1°Réu e a 2ª Ré em 19.09.2001 foi um negócio gratuito, uma vez que tal resultou de confissão feita pelo l° Réu em audiência de julgamento e ficou a constar da respectiva acta; 11º - Com efeito, tal como se refere no 10 parágrafo de fls. 19 do Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães agora em crise, na fundamentação da sentença, imperativamente, o juiz tomará em consideração os factos admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito e os factos que o tribunal deu como provados; 12° - Não é havido por contrato (sinalagmático) oneroso de compra e venda o negócio jurídico ao qual falte a obrigação de cumprimento da contra-prestação de um dos contraentes, designadamente a obrigação de pagamento de um preço (art°s 874° e 879° do Código Civil); 13° - O negócio jurídico de transmissão de um imóvel ao qual falte a estipulação da contra-prestação e obrigação de pagamento do preço é havido com uma liberalidade ou acto gratuito (art° 940° do Código Civil); 14° - Quando a transmissão efectuada pelo devedor reveste a natureza de liberalidade ou acto gratuito procede a impugnação pauliana, não tendo o autor de provar a existência de má fé nessa alienação (art° 612°, n.º l, do Código Civil); 15° - Não obsta à procedência da impugnação pauliana a nulidade de acto simulado anterior impugnado, caso a mesma não lhe seja oponível; 16° - Tendo o Autor provado a anterioridade do seu crédito sobre o 1º Réu e a impossibilidade. de satisfação integral do mesmo em virtude da transmissão da propriedade sobre o imóvel e do lº Réu não ter outros bens penhoráveis, terá a impugnação pauliana de proceder, em face do carácter gratuito daquele negócio; 17° - Ainda que assim não se entenda, declarado nulo o negócio jurídico de compra e venda de imóvel...

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