Acórdão nº 06S2579 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 08 de Novembro de 2006

Magistrado ResponsávelSOUSA GRANDÃO
Data da Resolução08 de Novembro de 2006
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: 1 - RELATÓRIO 1.1 "AA" intentou, no Tribunal do Trabalho do Porto, acção declarativa de condenação, com processo comum, emergente de contrato individual de trabalho, contra "Empresa-A", alegando, em síntese, que trabalhou para a Ré desde 31/8/81 até 9/12/03, data em que foi despedido ilicitamente, e que, sem embargo dessa ilicitude, também se verificam a nulidade e a caducidade do procedimento disciplinar, bem como a prescrição das infracções reportadas aos anos de 2000, 2001 e até Maio de 2002.

Termina pedindo a condenação da Ré nos termos descritos no petitório da acção.

A Ré contraria a versão do Autor, sustentando a correcção procedimental operada, a tempestividade do processo disciplinar e das infracções coligidas, tal como a legalidade do despedimento.

Apesar disso, aceita a existência de créditos salariais vencidos e, nessa medida, conclui apenas pela improcedência parcial da acção.

1.2.

Instruída e discutida a causa, a 1ª instância proferiu sentença que, na procedência parcial da acção: A- condenou a Ré a pagar ao Autor: - € 381,58, a título de férias, e respectivo "subsídio de falhas"; - os juros moratórios devidos desde a citação até integral pagamento; B- absolveu a Ré dos restantes pedidos.

Sob apelação do Autor, parcialmente provida, o Tribunal da Relação do Porto condenou ainda a Ré a pagar: - € 5.260,51, a título de diuturnidades e de juros moratórios vencidos; - € 282,71, a título de juros de mora vencidos sobre os abonos para falhas; - manteve, no mais, a sentença apelada.

Em resumo, limitaram-se as instâncias a conferir ao Autor os assinalados créditos retributivos, convergindo na parte atinente à correcção do procedimento disciplinar e à plena legalidade do despedimento.

1.3.

Continuando irresignado, o Autor pede a presente revista, onde reclama a revogação do Acórdão impugnado "... na parte em que confirma a decisão da primeira instância relativamente à não declaração de qualquer das nulidades do processo disciplinar, substituindo-o por decisão que, declarado procedente qualquer uma das invocadas, conclua pela procedência dos pedidos, nessa sede, formulados pelo Autor" (sublinhados nossos).

Para o efeito, é licito extrair das respectivas alegações o seguinte núcleo conclusivo útil: 1- face aos princípios legalmente acolhidos, da defesa dos arguidos em processo sancionatório e do ónus da prova da acusação, entende o recorrente que a omissão por parte da entidade empregadora, da disponibilização ao arguido (por integral remessa ou facultação para consulta) dos documentos em que se baseia a nota de culpa, constitui intolerável violação dos seus direitos de defesa, que torna nulo o procedimento disciplinar, com a consequente ilicitude do despedimento que, a final, vinha a ser decidido - art.º 12º n.ºs 1 al. A) e 3 al. B), por remissão para o art.º 10º da L.C.C.T.; 2- tal omissão vem expressamente assumida pelo "instrutor" do processo disciplinar e também no único item da matéria de facto nesta parte relevante - Ponto 11º; 3- ora, se o ónus de disponibilizar os elementos que atestam que os factos concretos subsumíveis ao conceito de infracção ocorreram recai sobre a entidade acusadora, então nunca será incumbência do arguido a solicitação dos mesmos. Por conseguinte, não será a mera solicitação, por parte deste, de alguns elementos que entendeu necessários, que constituirá condição manifesta e suficiente para se concluir que não houve qualquer violação, por parte da entidade empregadora, do ónus que sobre ela impendia de fazer verificar os direitos de defesa do arguido, designadamente oferecendo, com a nota a mesma se baseou; 4- é que o princípio da "audiência do trabalhador arguido" envolve todas as circunstâncias que podem afectar essa audição e não, obviamente, tão-só a audição do próprio arguido, visando atribuir-lhe todos os elementos que lhe permitam efectuar a completa organização da sua defesa; 5- se não foram disponibilizados ao arguido, aquando da instauração e decurso do processo disciplinar, todos os elementos em que a acusação se baseou para a elaboração da nota de culpa e posterior despedimento do Autor, mal andou o tribunal "a quo" ao declarar a validade do procedimento disciplinar e a consequente não declaração da ilicitude do despedimento; 6- da matéria de facto provada resulta ainda o teor do "Ponto 7": o procedimento ali referido estaria conforme legalmente, não fosse a nota de culpa não vir subscrita pela entidade empregadora mas por pessoa alheia à instituição, que assina na qualidade de instrutor do respectivo processo disciplinar qualquer despacho de nomeação do instrutor; 7- essa circunstância fere insanavelmente de nulidade o procedimento disciplinar. É que não se diz no art.º 10º n.º 1 da L.C.C.T. - e, à semelhança, se não diz também no n.º 8 do mesmo artigo que, como expressamente refere o n.º 5 do preceito, a nota de culpa ou a decisão podem ser emanadas da "... entidade empregadora, directamente ou através de instrutor que tenha nomeado ..."; 8- partindo dos princípios interpretativos constantes do art.º 9º n.ºs 2 e 3 do C.C., temos que considerar inexistente uma nota de culpa não subscrita pela entidade empregadora (nem, como se viu, por pessoa por si expressamente nomeada), com a consequente nulidade do processado disciplinar. Também aqui andou mal o Tribunal "a quo" ao afirmar o contrário; 9- de acordo com o art.º 12º n.º 1 al. A) da L.C.C.T., o despedimento é ilícito se o mesmo por nulo, sendo que o processo só pode ser declarado nulo - n.º 3 al. c) - se, entre outras razões, a decisão do despedimento e os seus fundamentos não constarem de documento escrito - art.º 10º n.ºs 8 a 10; 10- nos termos desses preceitos, proferirá a entidade empregadora decisão, que deve ser fundamentada e constar de documento escrito e onde serão ponderadas as circunstâncias do caso, a adequação do despedimento à culpabilidade do trabalhador, não podendo ser invocados factos que não constem da nota de culpa nem da defesa do trabalhador, salvo se atenuarem ou dirimirem a responsabilidade; 11- o processo disciplinar dos autos evidencia que a "decisão" da Ré vem ferida de ausência total de fundamentação, não se encontrando ali ponderados os citados elementos. Dir-se-á mesmo que inexiste uma decisão punitiva, formalmente elaborada pela entidade empregadora, onde se apreciem e financiem, concreta e expressamente, os factos imputados ao arguido; 12- no que a esta matéria concerne, apenas resulta provado o facto constante do "Ponto 9", sendo que a carta aí referida, subscrita pela Direcção da Ré, se limita a informar o trabalhador que decide proceder ao despedimento com justa causa, pelo que lhe envia a conclusão do instrutor do processo; 13- e se, por um lado - e ainda que se admitisse, sem conceder, uma decisão feita por remissão para a conclusão do processo disciplinar efectuada pelo instrutor - inexiste qualquer despacho de nomeação que permita a terceiros proferir tal decisão, por outro, em lado algum dessa carta se vislumbra a expressa e inequívoca concordância da Ré com os factos, fundamentos e circunstâncias alegados em tal conclusão, nem sequer que tenha havido uma ponderação da Ré sobre a sanção a aplicar; 14- tal situação conduz inevitavelmente à nulidade de todo o processo, com a consequente declaração de ilicitude do despedimento; 15- de facto, verificando-se terminado o processo disciplinar com o relatório do instrutor e com a carta da Ré, comunicando ao Autor o seu despedimento, sem que entre um e outra conste no processo disciplinar a decisão escrita e fundamentada do despedimento, inexiste aquela decisão, para além de que não pode considerar-se essa carta como "decisão do processo disciplinar, pois que neste continua a...

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