Acórdão nº 06A2907 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 31 de Outubro de 2006

Magistrado ResponsávelALVES VELHO
Data da Resolução31 de Outubro de 2006
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1. - "Empresa-A" intentou acção declarativa contra AA, pedindo: a) que se declarasse a resolução do contrato-promessa de compra e venda celebrado entre a Autora e o Réu, por incumprimento culposo deste; e, b) que se condenasse o R. a pagar à A. a importância de esc. 44.713.534$00, acrescida dos juros, à taxa legal, sobre esc. 21.500.000$00" desde esta data e sobre esc. 21.500.000$00, desde a data da citação até efectivo pagamento.

Alegou, em síntese, que o R. prometeu vender-lhe uma parcela de terreno, mas recusou outorgar a escritura de compra e venda, tendo a A. o consequente direito ao sinal dobrado.

O R. contestou por excepção e deduziu reconvenção na qual pede que se "declare nulo o contrato de compra e venda dos autos, restituindo cada parte o que recebeu, em singelo".

Alegou, excepcionando, que as interpelações para cumprir o contrato eram ineficazes e, quanto à reconvenção, sofrer de doença mental desde o nascimento, que lhe diminui notavelmente a sua capacidade de se determinar, devendo ser assistido por familiares nos negócios em que se envolve, o que sucedeu no caso e levou a que o contrato-promessa não tivesse sido assinado devido à não inclusão de uma cláusula acordada. Mais tarde veio a assinar o contrato-promessa, que lhe foi apresentado para esse efeito, quando estava só, por sócio da A., dizendo-lhe que estava tudo conforme o contratado verbalmente, sem que o A. tivesse entendido e representado com clareza os limites do negócio e em divergência com a sua real vontade.

Após o julgamento, proferiu-se sentença em que se julgou improcedente a acção, mas procedente a reconvenção, declarando anulado o contrato-promessa, devendo o R. restituir à A. a quantia de € 107 241,55.

Apelou a A., que viu a Relação confirmar o decidido, mas determinando o pagamento de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até efectiva restituição daquela quantia.

Pedem agora revista a Autora e o Réu visando, respectivamente, a procedência da acção e a absolvição da condenação no pagamento de juros.

Para tanto, a Autora verteu nas conclusões da alegação: - O requisito fundamental da notoriedade ou cognoscibilidade da incapacidade constituía matéria integrante da causa de pedir e não foi alegado pelo R., pelo que não podia ser considerado; - Independentemente dessa falta de alegação, certo é que não resulta dos autos a prova de que tal notoriedade existia no momento da celebração do negócio (ou no decurso das respectivas negociações); - Não existe nos autos prova da anomalia psíquica do R.; - A decisão de considerar o R. incapaz para reger a sua pessoa e os seus bens e, em consequência, anular o contrato-promessa é incongruente com o facto de o R. ter estado, e continuar estar, por si, em juízo, e ser condenado a restituir o sinal, como se fosse uma pessoa normal; - O R. não logrou fazer prova da omissão de uma cláusula fundamental no contrato; - O incumprimento definitivo do contrato-promessa e o direito da A. ao recebimento da quantia pedida resultam dos factos assentes.

Foram violados os arts. 138º, 150º, 257º, 410º, 441º, 442º, 762º e 798º C. Civil.

O Réu, por sua vez, sustentou a pretensão na seguinte síntese conclusiva: - O pedido de juros formulado pela A. decorria do pressuposto necessário de que o contrato era válido e fora incumprido pelo R.; - Não se verificou esse pressuposto, mas a nulidade do contrato sem culpa do R.; - Assim, este deve restituir apenas aquilo que percebeu em singelo, não sendo exigíveis juros já que não houve culpa ou mora do R..

Não houve reciprocamente contra-alegações 2. - Factos.

Vem provado: 1.) A Autora tem por objecto social a construção e a compra e venda de imóveis; 2.) Na Conservatória do Registo Predial de Santa Maria da Feira encontra-se descrito o prédio rústico denominado "...", com a área de 6.100 m2, cujo direito de propriedade está aí inscrito em nome do réu; 3.) No início do ano de 1998, a A., através dos seus gerentes, contactou o Réu para negociar a compra de uma parcela do prédio referido em 2.); 4.) A parcela pretendida pela A. tinha a área de 3 200 m2, sendo que, na planta de fls. 17, encontra-se demarcada a preto e com a área preenchida com traços pretos; 5.) A A. pretendia construir na parcela um edifício de apartamentos, para venda; 6.) O R. mostrou-se interessado em vender à A. tal parcela, tendo o negócio ficado condicionado pela viabilidade de construção no terreno; 7.) A Autora e o Réu acordaram que, no caso dessa viabilidade, o preço da parcela dependeria da respectiva capacidade construtiva; 8.) Após ter sido informada pela Câmara Municipal da viabilidade de construção na parcela referida, a A. submeteu à mesma uma pretensão de construção de edifício de habitação colectiva de quatro andares (r/c + 3); 9.) Tal pretensão foi indeferida, tendo a Autora sido informada disso mesmo por aquela edilidade, através de ofício de 14.12.1998; 10.) No oficio referido, a Câmara observou que a sua posição poderia ser revista se a proposta apresentada fosse reformulada por forma a respeitar a cércea máxima admitida de "r/c+2" e o limite de 1 metro que a cota do piso rés-do-chão podia exceder a cota do armamento; 11.) A. e o R., sabendo da capacidade construtiva da parcela referida, acordaram no preço para a mesma de 43 000 000$00; 12.) Em 4 de Janeiro de 1999, por escrito, o R. declarou prometer vender à A., que declarou prometer comprar, pela quantia de 43 000 000$00, a parcela de terreno referida em 4.); 13.) No escrito referido em 12.), foi consignado que a A. entregou ao R., como sinal e principio de pagamento da quantia 43 000 000$00, a importância 20.000.000$00, que o Réu efectivamente recebeu; 14.) Em Julho de 1999, o R. pediu à autora que lhe entregasse 1 500 000$00, como reforço do sinal, alegando necessitar de dinheiro; 15.) A A. anuiu à solicitação do Réu e entregou-lhe, em 2.07.1999, o cheque n.º 42166281, sobre o Empresa-B, no montante de 1.500.000$00, como reforço do sinal; 16.) No documento escrito referido em 12.) foi estipulado entre a A. e o R. que a escritura pública de compra e venda seria efectuada no prazo de 15 dias depois de obtida a certidão de destaque da referida parcela; 17.) Simultaneamente com o negócio referido em 12.), o R. assinou uma declaração, autorizando a A. a submeter à aprovação da Câmara Municipal um projecto para a parcela referida em 4.); 18.) Esse projecto veio a ser aprovado pela Câmara Municipal; 19.) Em 24/09/1999, o R. apresentou no D. A. U. do Município um...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT