Acórdão nº 06P3109 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 26 de Outubro de 2006

Magistrado ResponsávelSANTOS CARVALHO
Data da Resolução26 de Outubro de 2006
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1.

"AA" e BB foram julgados, juntamente com outros, pelo Tribunal de Círculo da comarca de Tomar e aí condenados: O AA: - como co-autor material e em concurso real de 17 crimes de roubo sendo um deles na forma tentada, nas penas de prisão de 4 anos para cada um dos roubos às farmácias Ideal e farmácia Santos e 3 anos e 6 meses de prisão para cada um dos roubos às farmácias ... no Entroncamento, ... de Vila Nova da Barquinha, ... de Tomar, ... de Ourém, .... de Almeirim, .. de Vila Nova da Caparica, .... de Entroncamento, ... de Alcanena, .... de Ponte de Sor, ... de Santarém e ... de Tomar, p.p. pelos art.ºs 210.º n.ºs 1 e 2, al. b) e 204.º n.º 2 al. f), ambos do CP; 21 meses de prisão para o roubo na forma tentada da farmácia ... em Constância, p.p. nos art.ºs 210.º, n.ºs 1 e 2, al. b), e 204.º n.º 2 al. f), 22.º, 23.º e 73.º todos do CP e 18 meses de prisão para cada um dos três roubos quais sejam à CC, ao DD e à EE, p.p. pelo art.º 210.º, n.º 1 e 2, al. f), e 204.º, n.º 2, al. f), e n.º 4 do CP; - como co-autor material e em concurso real de 6 crimes de furto de uso de veículo, p.p. pelo art.º 208.º, n.º 1, do CP na pena de 4 meses de prisão para o furto de uso do veículo AV e 3 meses de prisão para cada um dos restantes 5 crimes de furto de uso; - como co-autor de 4 crimes de furto simples, p.p. pelo art.º 203.º do CP na pena de prisão de 3 meses para cada um de dois furtos simples dos bens que se encontravam no interior do veículo XS e no interior do veículo AI e um mês de prisão para dada um dos restantes dois furtos quais sejam o das 3 cadernetas que se encontravam no interior do UC e do painel auto rádio do interior do veículo XZ; - como autor material de 6 crimes de condução sem habilitação legal, p.p. pelo art.º 3.º, n.ºs 1 e 2 do DL nº 2/98, de 3 de Janeiro, na pena de 45 dias de prisão para cada um;.

- em cúmulo jurídico, na pena única de 11 anos de prisão.

O BB: - como co-autor material e em concurso real de 6 crimes de roubo sendo um na forma tentada, p.p. pelos art.ºs 210.º, n.ºs 1 e 2, al. b) e 204.º n.º 2 al. f), e 22.º, 23.º e 73.º, todos do CP, na pena de prisão de 4 anos para o roubo da farmácia ... e 3 anos e 6 meses para cada um dos roubos às farmácias ..., .., .... e bombas da ... e 21 meses de prisão para o roubo na forma tentada da farmácia ...; - como co-autor de um crime de furto de uso de veículo (XZ), p.p. pelo art.º 208.º, n.º 1, do CP, na pena de 3 meses de prisão e 1 mês de prisão pelo furto do painel auto rádio (art.º 203.º, n.º 1, do CP); - em cúmulo jurídico, na pena única de 6 anos de prisão.

  1. Do acórdão condenatório recorreram aqueles dois arguidos, o primeiro para este Supremo Tribunal de Justiça, o segundo para a Relação de Coimbra.

    Da motivação de recurso do AA, extraem-se as seguintes conclusões: 1ª- Deveria ter sido feita a convolação para um crime continuado, punido pela conduta mais grave, pelo que o douto acórdão fez, a nosso ver, uma errada interpretação e aplicação dos artigos 30° e 79° do C. Penal.

    1. - Não foi valorado, positivamente, o facto do arguido desde 1993, ter tentado, refazer a sua vida, esforçando-se por se reintegrar socialmente, só não o conseguindo, por efeito da dependência da droga, dependência esta que, naturalmente, lhe cerceia, muito, a consciência da ilicitude na sua conduta vivencial.

    2. - Por outro lado, a confissão total e sem reservas, não foi, suficientemente, valorada, na medida em que dum ponto de vista de lógica processual adjectiva, o arguido teria evidente vantagem em manter-se silencioso.

    3. - Não lhe tendo sido reconhecida esta auto-punição, ele, previsivelmente, deixará de acreditar na justiça, pelo que poderá, mais facilmente, justificar-se, no futuro, na escolha de comportamentos sociais negativos, gorando-se, definitivamente, a protecção de bens jurídicos e sua reintegração social, pelo que foram violados os artigos 40.° e 71. do C. Penal.

    Deve, pois, ser dado provimento ao recurso, revogando-se o douto acórdão e condenando-se o arguido na pena máxima de sete anos.

    Da motivação de recurso do BB, extraem-se as seguintes conclusões: 1- A participação criminosa do recorrente limitou-se à condução do veículo em que se fez transportar o arguido AA para praticar alguns dos roubos dos autos.

    2- O recorrente, ele mesmo, não roubou nada nem ameaçou ou intimidou ninguém, nem usou nenhuma arma de fogo.

    3- O recorrente praticou os factos criminosos num curto período de tempo, determinado pelo propósito de obter droga para satisfazer a sua toxicodependência e seduzido pelos nulos ou reduzidos riscos de que o arguido AA o convenceu que correria.

    4- Assim, a sua conduta deve ser punida pelas regras do crime continuado.

    5- De qualquer modo, considerando que o recorrente tinha somente 18 anos à data dos factos, que o nosso regime penal tem como primeiro objectivo a recuperação e ressocialização dos delinquentes e que o direito para jovens assenta na maior capacidade de ressocialização dos jovens, deve aplicar-se-lhe o disposto no art.º 4.° do Dec.-Lei n.º 401/82.

    6- Consequentemente deve proceder-se à atenuação especial da pena aplicada ao recorrente - suspendendo-se de seguida a sua execução, 7 - Considerando que, contra o que se presume que se julgou no Acórdão recorrido, se deve entender que as prisões portuguesas não têm condições para se ressocializarem delinquentes, que, pelo contrário são verdadeiras escolas de crime, 8 - Com o que se fará justiça.

    9 - A douta decisão recorrida violou o disposto no art.º 4.° do Dec.-Lei n.º 401/82 e nos art.ºs 72.° e 50.º do CP.

    Termos em que, provendo-se este recurso, se deve proceder à atenuação especial da pena aplicada ao recorrente e à suspensão da execução da que lhe competir em função da dita atenuação.

  2. O Ministério Público junto do tribunal recorrido respondeu aos recursos e concluiu pela sua improcedência.

    O Juiz do processo mandou subir os autos para este STJ.

    Neste Supremo, a Excm.ª PGA pôs o seu visto.

    O relator mandou prosseguirem os autos neste Tribunal, já que os recorrentes interpuseram recurso de decisão final do tribunal colectivo e colocam exclusivamente questões de direito, pelo que, nos termos do art.º 432.º, al. d), do CPP, a competência para o julgamento dos mesmos é do Supremo Tribunal de Justiça.

  3. Colhidos os vistos e realizada a audiência com o formalismo legal, cumpre decidir.

    As principais questões a decidir são as seguintes: 1ª- A existência de crime continuado e não de concurso de infracções (nos dois recursos); 2ª- A aplicação do regime especial para jovens adultos quanto ao recorrente BB, com a consequente atenuação especial da pena e sua suspensão; 3ª- A medida da pena quanto ao recorrente AA, que este considera ser exagerada.

    Os factos provados são os seguintes: Em data não concretamente apurada do ano de 2005, mas antes do dia 7 de Maio, os arguidos AA e BB ou outrem que não foi possível determinar decidiram fazer seus, dinheiro e outros bens que encontrassem no interior de farmácias.

    Mais acordaram que, previamente, se apropriavam de veículos.

    Preferencialmente da marca Fiat, modelo Uno.

    Para junto dos quais se deslocavam ora no veículo marca Peugeot, modelo 206, de cor encarnado, matrícula NP, utilizado pelo arguido BB e sua pertença, ora em veículo que não foi possível determinar.

    Na sequência do que, o arguido AA abria a porta do condutor do Fiat seleccionado.

    Usando, para tal, uma gazua "Misha".

    Seguidamente, com um objecto não identificado, accionava a respectiva ignição.

    Após o que se faziam transportar naquela viatura.

    Normalmente, conduzidos pelo arguido AA.

    O qual não é titular de carta de condução ou de outro documento que o habilite a tal.

    Na posse da viatura, dirigiam-se, ainda no mesmo dia, ou nos dias seguintes, a uma farmácia.

    Farmácia que tivesse pouco movimento.

    Nas imediações da qual estacionavam o veículo.

    O arguido BB ou quem acompanhava o AA ficava ao volante.

    De vigia.

    Com o motor em funcionamento.

    Pronto para fugir logo que o arguido AA regressasse.

    O AA entrava na farmácia.

    Munido de uma pistola, que funciona a ar comprimido, réplica da "Whalter P99", com capacidade para oito (8) chumbos, de calibre 4,5 mm, funcionando em semi-automática.

    Aqueles chumbos, disparados a curtas distâncias, se atingirem zonas vitais do corpo humano, são adequados a causar lesões graves ou permanentes.

    Mais, o arguido AA apresentava-se encapuçado, com um gorro, ou uma collant, em malha branca, sem perna, que lhe cobra a face, mas com dois orifícios na zona dos olhos.

    Sobre o qual colocava um boné de pala.

    Com as mãos cobertas com luvas.

    No interior dos estabelecimentos, apontava a descrita pistola aos funcionários ou a quem mais ali encontrasse.

    Logrando, assim, recolher todo o dinheiro disponível nas caixas registadoras.

    Bem como, eventualmente, objectos pessoais de quem ali encontrasse.

    Tudo porque, atemorizados, receando pela sua vida, os funcionários e clientes não ofereciam qualquer resistência.

    Na posse daqueles objectos e quantias monetárias, o arguido AA saía da farmácia.

    Entrava no veículo onde, ao volante, e com o motor em funcionamento, o arguido BB ou quem o acompanhava o aguardava.

    Abandonavam o local.

    Dividiam, em partes iguais, o dinheiro e o produto da venda dos objectos.

    No dia 7 de Maio de 2005, em execução do plano previamente delineado, o arguido AA na companhia de alguém que não foi possível identificar, a hora não apurada, mas depois das 19.00, dirigiram-se à "Farmácia ...", sita na Rua ...., no Entroncamento, propriedade de FF.

    Fizeram-se transportar num veículo, cuja marca, modelo e matrícula não foi possível apurar.

    Ali chegados, e sempre conforme o combinado o referido indivíduo ficou ao volante da viatura.

    Com o respectivo motor em funcionamento.

    O arguido AA aproximou-se da porta da entrada da farmácia.

    Munido da pistola.

    Usando luvas.

    Junto daquela porta enfiou, na cabeça, um gorro, de lã preta, cobrindo a cara.

    Gorro que apresentava dois orifícios nos local dos olhos.

    Colocou...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO
3 temas prácticos
3 sentencias

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT