Acórdão nº 06P1914 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 21 de Junho de 2006

Magistrado ResponsávelSORETO DE BARROS
Data da Resolução21 de Junho de 2006
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam, no Supremo Tribunal de Justiça: 1. "AA", identificado nos autos, recorre do acórdão de 16.03.06, do Tribunal da Comarca de Aveiro (proc. n.º 3393/02), que, em síntese, decidiu : '

  1. Efectuar o cúmulo jurídico entre as penas aplicadas nos processos referidos em 2° e 3° supra, fixando-se a pena única em 3 (três) anos e 2 (meses) meses de prisão e 3 (três) meses de proibição de condução de veículos motorizados; b) Efectuar o cúmulo jurídico entre as penas aplicadas nos processos referidos em 1° e 4° supra, fixando-se a pena única em 2 (dois) anos e 7 (sete) meses de prisão e 8 (oito) meses de proibição de condução de veículos motorizados.

    Ambas essas penas únicas são cumpridas, sucessivamente (sendo a concessão da liberdade condicional regulada pelo art. 62º do C. Penal). (...) ' 1.1 O recorrente termina a motivação com as seguintes conclusões : "A) 0 Acórdão recorrido enferma de nulidade por violação das regras de competência funcional do tribunal, nos termos do artigo 32°, n°.1, do Código de Processo Penal, já que acabou por não englobar no cúmulo jurídico efectuado todas as penas parcelares em que o arguido foi condenado, tendo antes realizado dois cúmulos jurídicos, sendo que em nenhum deles a soma das penas cumuladas ultrapassa os 05 anos de prisão.

    1. Tal nulidade, submetida ao regime do disposto no artigo 119°, alínea e), do Código de Processo Penal, é insanável, devendo ser declarada oficiosamente em qualquer fase do procedimento.

    2. A não considerar-se que o Tribunal a quo violou as regras de competência funcional do Tribunal Colectivo, sempre deveria ter considerado que todos os crimes praticados pelo arguido se encontravam em concurso, e assim deveria ter efectuado o cúmulo jurídico de todas as penas aplicadas, condenando-o numa única pena.

    3. Não o tendo feito, violou o disposto nos artigos 77°, n°.1 e 78°, n°.1 do Código Penal, já que estamos in casu perante uma situação de cúmulo por arrastamento.

    4. Ainda assim, deveria ter suspenso na sua execução a pena única aplicada no cúmulo das penas dos processos referidos em 1° e 4° supra da nossa fundamentação, atentas as circunstâncias fixadas e atinentes à personalidade e modus vivendi do arguido, tal como dimana do artigo 50° do Código Penal. , F) Pelas mesmas razões deveria ter suspenso na sua execução a pena única aplicada no cúmulo das penas dos processos referidos em 2° e 3°, supra da nossa fundamentação.

    5. Sem esquecer que se trata em ambos os casos (processos 2° e 3° supra) de penas suspensas na sua execução.

    6. Não sem antes dever ter fixado previamente a pena única em medida não superior a 03 anos (mais concretamente em 02 anos e 07 meses), tal como impõe o critério mais utilizado pela jurisprudência de aditar à pena parcelar mais elevada 1/3 de todas as restantes.

    7. Não o tendo feito violou assim o disposto nos artigos 71° e 77° do Código Penal.

    8. Pelo que reputamos antes como adequada e proporcional uma pena (ou penas) não superior a três anos de prisão, e suspensa na sua execução, ainda que acompanhada de regime de prova, nos termos do artigo 50° do Código Penal (norma jurídica que reputamos também ter sido violada pelo Acórdão recorrido).

    Termos em que, deve o presente Recurso ser considerado provido, nos termos enunciados nas conclusões, como é de Direito e Justiça ! " 1.2 O recurso foi admitido com subida imediata, nos próprios autos, com efeito suspensivo . (fls. 400) 1.3 Respondeu o Ministério Público, concluindo que deve ser negado provimento ao recurso e confirmado, na íntegra, o acórdão de cúmulo jurídico recorrido . (fls. 404 a 411) 2. Realizada a audiência, cumpre decidir .

    2.1 Transitada em julgado (1) a sentença de 19.05.04, do Tribunal de Aveiro (proc. 3393/02), que condenou o arguido AA, na pena de dois anos e quatro meses de prisão, por crime de detenção de arma proibida, veio o arguido, 'para os devidos e legais efeitos, destacar que havia ainda sido condenado em outros três processos, que identificou .

    Nessa sequência - e uma vez que o somatório das penas parcelares excedia os cinco anos de prisão - foi designada data para audiência de realização de cúmulo jurídico, com intervenção do tribunal colectivo, 'convocando-se o arguido' (fls. 364), após o que foi decidido efectuar um cúmulo jurídico das penas impostas no proc. n.º 155/98, do Tribunal de Soure e no proc. n.º 1279/01, do Tribunal de Viseu, e outro (autónomo) cúmulo jurídico das penas impostas no proc. 3393/02, do Tribunal de Aveiro e no proc.179/02, do Tribunal de Albergaria .

    Como o somatório das penas de cada cúmulo acabou por não ser superior a cinco anos de prisão, vem o recorrente arguir a nulidade do acórdão (que é, aqui, a decisão recorrida), com o fundamento em 'violação das regras de competência funcional' do Colectivo que procedeu aos cúmulos referidos . [conclusões A) e B)] 2.1.1 'Compete ainda ao tribunal colectivo julgar os processos que, não devendo ser julgados pelo tribunal singular, respeitarem a crimes (...) cuja pena máxima, abstractamente aplicável, for superior a cinco anos de prisão, mesmo quando, no caso de concurso de infracções, for inferior o limite máximo correspondente a cada crime' . (al. b), do n.º 2., do art.º 14.º, do C.P.P.) .

    E tratando-se, no caso, de conhecimento superveniente do concurso (n.ºs 1. e 2., do art.º 78.º, do C. P.), não está em causa que o somatório das penas parcelares aplicadas, aparentemente englobáveis, excedia os cinco anos de prisão . Na verdade, segundo as regras da punição do concurso (n.º 2., do art.º 77.º, do C. P.), 'a pena aplicável tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes (...)', sendo certo que, 'para efeito do disposto nos artigos 13.º e 14.º, na determinação da pena abstractamente aplicável são levadas em conta todas as circunstâncias que possam elevar o máximo legal da pena a aplicar no processo' (art.º 15.º, do C.P.P.) . E há que 'notar que o termo circunstâncias não está aqui usado no sentido técnico em que o usava o Código Penal de 1886, sendo mais amplo e abrangendo todas as causas de elevação do máximo da pena' . (2) É certo que o recorrente parece não questionar a 'competência' do Colectivo, aferida ao momento da 'convocação' do Tribunal, deduzindo-se que apenas a não aceita por, ao fim e ao cabo, a respectiva decisão não ter englobado na pena única todas as penas parcelares (penas que, ainda agora, sob o seu ponto de vista, deveriam ter integrado tal pena única) .

    Ora, acontece que a competência do colectivo, quando determinada pela gravidade da pena aplicável (critério quantitativo), é fixada precisamente naquele momento processual, mantendo-se estabilizada até à decisão final (princípio da estabilidade da competência) (3).

    'Na delimitação da competência entre o tribunal singular, o tribunal colectivo e o tribunal do júri, a lei atende à gravidade da pena aplicável [arts. 13.º, n.º 2; 14.º, n.º 2, al. b); 16.º, n.º 2, al. b)] . (...) É, portanto, a pena máxima abstractamente aplicável que serve de critério para delimitar quantitativamente a competência material dos diferentes tribunais .

    O tribunal pode vir a julgar que a circunstância invocada não se verificou e então deveria ser julgado incompetente por excesso de competência . Há, porém, uma velha regra de direito que dispõe que, em princípio, quem pode o mais pode o menos e, por isso, v.g., se o tribunal colectivo podia aplicar pena de prisão superior a cinco anos pode também aplicar pena inferior. Presume-se que quanto mais solene é o tribunal maiores são as garantias de defesa, donde que não haveria dano para o arguido por ser julgado por tribunal mais solene'. (4) Improcede, pois, o arguido ' vício de violação de competência material e funcional' .

    2.2 O recorrente, embora 'também aceite que os crimes que tenham sido praticados após a data do trânsito em julgado da condenação por qualquer deles já...

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