Acórdão nº 06P1561 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 08 de Junho de 2006

Magistrado ResponsávelRODRIGUES DA COSTA
Data da Resolução08 de Junho de 2006
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)
  1. RELATÓRIO 1.

    No 3.º Juízo do Tribunal Judicial de ..., no âmbito do processo comum colectivo n.º ..., foram julgados, entre outros, os arguidos AA e BB, e condenados como co-autores de um crime de tráfico de estupefacientes agravado, dos artigos 21.º, n.º 1 e 24.º, alínea b) do DL 15/93, de 22/1, nas penas, respectivamente de 9 (nove) e 8 (oito) anos de prisão.

    1. Inconformados, recorreram para o Tribunal da Relação de Coimbra, que negou provimento a todos os recursos.

    2. Ainda inconformados, interpuseram os arguidos recurso para o Supremo Tribunal de Justiça.

      Os arguidos apresentaram motivação comum, em que põem em causa as penas aplicadas, reputando-as excessivas, atendendo a que, desde os 15 anos de idade que são toxicodependentes, mantendo à data dos factos «uma luta diária para satisfazer o seu vício/patologia» e a que, posteriormente aos factos, vêm mantendo adequada conduta no Estabelecimento Prisional. Por outro lado, segundo a prova feita, os arguidos estão bem inseridos social e familiarmente, o que permite prever que, «quando forem devolvidos à liberdade, encontrarão um ambiente sócio-familiar bastante favorável à sua integral e bem sucedida ressocialização.

      Acresce, no caso do arguido AA, a confissão no essencial dos factos praticados.

      Por tudo isso, as penas deveria ser fixadas no mínimo da moldura penal abstracta.

    3. O Ministério Público junto do tribunal «a quo» respondeu aos recursos interpostos , defendendo a manutenção da decisão recorrida.

    4. Neste Supremo Tribunal, o Ministério Público teve vista dos autos, não tendo divisado obstáculos à prossecução dos recursos.

      Colhidos os vistos, realizou-se a audiência de julgamento.

      O Ministério Público defendeu que as penas deveriam baixar significativamente e serem fixadas em medida idêntica par ambos os arguidos, dado não haver diferenças sensíveis entre eles, sendo certo que ambos foram co-autores dos mesmos factos. Por outro lado, salientou que as instâncias não levaram em conta a alteração favorável introduzida pela Lei 11/04, de 27/4, que aliviou a agravação do crime de tráfico agravado.

      A defesa pugnou, tal como na motivação, pela redução das penas.

      II.

      FUNDAMENTAÇÃO 6. Matéria de facto 6. 1. Factos dados como provados: 1.º - Desde momento não concretamente apurado, mas seguramente desde Julho de 2002, os arguidos AA (doravante ...) e BB (doravante ...), conhecidos por "..." e pela alcunha de "..." passaram, de comum acordo, e actuando ambos em conjugação de esforços, a comprar e a vender heroína, com a intenção de, para além de satisfazerem o seu próprio consumo de heroína, auferirem lucros pecuniários, resultantes da diferença existente entre o preço de compra de tal produto, em Lisboa, e o preço de venda do mesmo, na zona de Tomar.

      1. - No desenvolvimento de tal actividade, que prosseguiam como modo de angariação de meios de subsistência e de fundos em dinheiro, os arguidos AA e BB passaram a contar com a ajuda do arguido CC, o que ocorreu desde data não concretamente apurada, mas seguramente desde finais de Maio de 2003.

      2. - Os arguidos AA e BB valiam-se ainda da ajuda de outras pessoas que os conduziam em veículos automóveis, seja aos locais de compra, em Lisboa, seja aos de venda, na zona de Tomar, de heroína.

      3. - Eram estes arguidos (AA e BB) quem, assim, determinava os montantes em dinheiro a usar na aquisição de mais produto estupefaciente, quais os números de telemóvel a fornecer aos compradores, quais os compradores em que confiavam para fornecer os respectivos números de telemóvel e vender produto estupefaciente, os locais das vendas, os horários dos contactos telefónicos e das vendas.

      4. - Por seu turno, o arguido CC prestava colaboração aos arguidos AA e BB, transportando-os até aos locais de compra e aos de venda de produto estupefaciente, bem como atendendo telefonemas dos compradores de estupefaciente e recebendo encomendas.

      5. - Na concretização de tal actividade, os arguidos AA e BB faziam-se transportar no veículo automóvel, de marca "Rover", de cor vermelha, com matrícula "...", o qual era conduzido pelo arguido CC, designadamente nos meses de Junho e Julho de 2003.

      6. - Para além disso, os arguidos BB e AA encarregavam por vezes o arguido CC de proceder à venda de produto estupefaciente, por conta daqueles.

      7. - Com efeito, algumas vezes, após contacto prévio com os respectivos compradores, os arguidos BB e AA mandavam o arguido CC entregar àqueles o produto estupefaciente e destes receber o dinheiro correspondente ao respectivo preço, o qual depois entregava aos arguidos BB e AA.

      8. - Para além disso, o arguido CC transportava os arguidos AA e BB em veículo automóvel, já que nenhum destes era, ao tempo, titular de carta de condução de tal tipo de veículos, designadamente no período temporal aludido supra em 6.º.

      9. - Em compensação, os arguidos AA e BB entregavam, após cada viagem, heroína ao arguido CC, que este destinava ao seu consumo pessoal, pois que era toxicodependente.

      10. - Assim, os arguidos AA e BB deslocavam-se com o arguido CC cerca de duas vezes por semana ao Bairro d..., em Lisboa, onde adquiriam quantidades de produto estupefaciente - heroína -, normalmente 08 (oito) gramas de heroína de cada vez, a qual adquiriam ao preço de 40,00 euros por grama; sendo que noutros dias da semana os arguidos AA e BB deslocavam-se com outros indivíduos, que os conduziam, ao dito Bairro d..., em Lisboa, onde adquiriam mais de tal produto estupefaciente.

      11. - Aquisições essas a indivíduos cuja identidade não se logrou apurar cabalmente, tratando-se de um indivíduo conhecido como "..." e outro como "...", com a intenção de, posteriormente, venderem tal produto, na área de Tomar, devidamente doseado e acondicionado, a troco de certa quantia monetária.

      12. - Na concretização da sua actividade, os arguidos AA e BB eram contactados, diariamente, em Tomar, por diversos indivíduos, por forma a combinarem um local, onde aqueles pudessem vender e estes pudessem adquirir produto estupefaciente.

      13. - Depois de acondicionarem a heroína, os arguidos AA e BB vendiam tal produto, já doseado, normalmente em pacotes, pelo preço de 20,00 euros (vinte euros) cada.

      14. - As vendas ocorriam em diversos locais da área desta comarca, normalmente isolados e afastados da cidade, designadamente, ..., ..., ..., ..., ..., ...,..., traseiras do hipermercado ...; 16.º - onde os arguidos AA e BB eram procurados pelos consumidores, que, previamente, os contactavam para tal efeito.

      15. - Na execução dessas vendas de produto estupefaciente, os arguidos AA e BB eram contactados via telemóvel, para os números ..., ... e ..., enquanto o arguido CC era contactado para o telemóvel número... , que para tal efeito haviam fornecido a diversos indivíduos consumidores de estupefacientes, os quais encomendavam as quantidades pretendidas; sendo que aqueles arguidos, mormente os arguidos AA e BB, indicavam, por sua vez, o local para a concretização da venda de tal produto, local esse onde posteriormente era feita a entrega do produto estupefaciente que aqueles consumidores haviam solicitado, recebendo, em troca, tais arguidos AA e BB a correspondente quantia monetária.

      16. - Assim, desde pelo menos o mês de Agosto de 2002 até Dezembro de 2003, antes de ficarem em prisão preventiva, os arguidos AA e BB venderam heroína a DD; 19.º - à média de cinco pacotes por semana, cada pacote ao preço de 20,00 euros (vinte euros).

      17. - Para tanto, o referido DD contactava tais arguidos para o telemóvel com o número ..., sendo atendido, ora pelo arguido BB, ora pelo arguido AA, os quais recebiam a encomenda da quantidade de heroína pretendida, indicando, por sua vez, o local de entrega do produto, que variava entre o ..., ...,... , ..., entre outros.

      18. - Também EE comprou, por diversas vezes, heroína ao arguido AA, designadamente no Verão de 2003; 22.º - sempre em pacotes individuais, pelo preço de 10,00 euros (dez Euros) cada um.

      19. - Para tanto, EE contactava telefonicamente com os arguidos AA ou BB, para os telemóveis com os números .... e..., por forma a combinar as quantidades de produto estupefaciente pretendidas e o local da respectiva entrega.

      20. - Em tais contactos, não era utilizada a palavra droga, mas sim, segundo instruções expressas do arguido AA, expressões como: "então, tudo bem?", querendo com tal expressão aferir se aquele arguido dispunha de produto estupefaciente para vender.

      21. - Durante pelo menos seis meses, no decurso do ano de 2003, e até Dezembro desse ano, os arguidos AA e BB venderam, em diversas ocasiões, heroína, em pacotes individuais de 20,00 euros (vinte Euros) cada um, heroína essa que foi paga e consumida por FF, embora este solicitasse, por vezes, a um seu amigo que fizesse o contacto com aqueles arguidos no sentido da aquisição do estupefaciente.

      22. - Para tanto, era estabelecido contacto telefónico com os arguidos AA ou BB, a fim de a estes ser indicada a quantidade de produto pretendida e ser acordado o local da entrega, que variava entre as traseiras do Supermercado ..., ..., ..., ..., .... e o ....

      23. - Nesses contactos, segundo instruções expressas daqueles arguidos, nunca era mencionada a palavra "droga".

      24. - Já no local acordado, ora o arguido BB, ora o arguido AA procediam à entrega da quantidade de heroína pretendida, que retiravam de uma caixa de plástico transparente, de pastilhas "...", recebendo o respectivo preço.

      25. - Designadamente, no dia 10 de Julho de 2003, pelas 18 horas e 24 minutos, FF contactou, através do telemóvel n.º ..., telefonicamente com o arguido AA, para o telemóvel n.º ..., tendo sido atendido por este arguido, procurando ser abastecido de heroína, dizendo "tou, é o FF, posso passar aí?", querendo com isso perguntar se podia dirigir-se à residência dos arguidos, a fim de lhes comprar heroína.

      26. - Tendo o arguido AA respondido "pá, eu tou em ..., a seguir a ..., na ..., num café", querendo com tal expressão dizer a FF para se dirigir à ..., a fim de concretizarem a venda de heroína.

      27. - De igual modo, durante mais de um ano e...

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