Acórdão nº 06P782 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 15 de Março de 2006

Magistrado ResponsávelSILVA FLOR
Data da Resolução15 de Março de 2006
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça: I. 1. O Ministério Público junto do Tribunal da Relação de Guimarães requereu a execução do mandado de detenção europeu emitido pela Audiência Provincial de Toledo - …, Espanha, contra AA, de nacionalidade portuguesa, casado, empresário, residente na Rua …, n.° .., .., …, com os fundamentos seguintes: - Pela referida autoridade judiciária espanhola Audiência Provincial foi emitido, em 8 de Novembro de 2005, mandado de detenção europeu contra AA, como autor, conjuntamente com outras pessoas, de quatro crimes de detenção ilegal e quatro crimes de favorecimento da prostituição dos artigos 163 e 188, respectivamente, do Código Penal Espanhol de 1995.

- Concretamente, o requerido é acusado de, conjuntamente com outro acusado, no dia 8 de Setembro de 1998, ter transportado de Portugal para Espanha quatro mulheres portuguesas, ao engano, prometendo-lhes trabalho num restaurante. Porém, uma vez em Espanha, obrigaram-nas a trabalhar como camareiras no clube de alterne "..", na localidade de … (Toledo), alternando com os clientes e forçando-as a exercer a prostituição com os clientes que o solicitassem, sem que lhes fosse entregue qualquer quantia do dinheiro que àqueles era cobrado. Ao fim do dia, as quatro mulheres eram fechadas à chave num piso daquela localidade de …, permanecendo vigiadas no clube e no piso. Esta situação prolongou-se até 6 de Outubro de 1998, data em que as mulheres puderam comunicar telefonicamente estes factos à Polícia Judicial (Guardia Civil).

- O requerido, durante a tramitação do processo judicial, ausentou-se do domicilio que havia indicado ao Tribunal, havendo conhecimento de que se encontrava a viver na … e que possui uma oficina de automóveis entre as localidades de … e …, no concelho de Esposende.

- Os factos indicados, de acordo com a legislação de Espanha, constituem tráfico de seres humanos, infracção esta punível nesse Estado com pena ou medida de segurança privativas de liberdade de duração máxima não inferior a 3 anos, mostrando-se, pois, respeitado o disposto no artigo 2°, n.os 1 e 2, alínea c), da Lei n.° 65/2003, de 23 de Agosto.

- Não se verifica nenhuma das situações que determinem a recusa da sua execução, nomeadamente as contempladas nas diversas alíneas dos artigos 11.° e 12.° da Lei n.º 65/2003.

- Contudo, uma vez que o requerido tem nacionalidade portuguesa e teria residência em Portugal, a decisão de entrega ao Estado espanhol poderá ficar sujeita à condição de o requerido, após ter sido ouvido, ser devolvido ao Estado português para neste cumprir a pena ou a medida de segurança privativas da liberdade a que for condenado no Estado espanhol, nos termos do artigo 13.°, alínea c), da Lei n° 65/2003.

Distribuído o processo na Relação de Guimarães, em 6-12-06, a relatora proferiu despacho liminar sobre a suficiência das informações que acompanhavam o mandado de detenção europeu, ordenando a passagem de mandados de detenção para os domicílios mencionados da área da Relação de Guimarães e determinando que se solicitasse ao Estado membro emissor a prestação da garantia a que se refere o artigo 13.°, alínea c), da Lei n.º 65/2003, garantia que foi prestada.

Detido o requerido, em 24-01-2006, e ouvido nos termos do artigo 18.º da referida lei, o mesmo opôs-se à detenção, dizendo em síntese: - A razão da detenção do requerido tem como fundamento a aplicação da medida coactiva de prisão preventiva; - Não consta do mandado que tal decisão não tenha sido objecto de recurso ou que tenha transitado em julgado, mostrando-se violado o artigo 3.º, n.º 1, alínea d), da Lei n.º 65/2003; - Não se encontra devidamente cumprido o disposto no artigo 3.º, n.º 1, alínea d), que exige a descrição das circunstâncias em que a infracção foi cometida; - Não foi cumprido o disposto no artigo 6.º, n.º 1, alíneas a) e b); - A infracção foi iniciada e cometida em Portugal, pelo menos em parte, o que constitui, nos termos do artigo 12.º, n.º 1, alínea h)-i), causa de recusa facultativa de execução do mandado de detenção europeu; - No inquérito em curso no Tribunal Judicial de Bragança, no qual o requerido foi constituído arguido, foi indicada uma testemunha, BB, também indicada na acusação do Ministério Público espanhol, o que integra a circunstância prevista no artigo 12.º, n.º 1, alínea c), constituindo também causa de recusa facultativa de execução do mandado de detenção europeu; - O mesmo ocorre em relação ao processo que corre termos no Tribunal Judicial de Póvoa de Varzim, relativamente a outra testemunha; - Não se mostra prestado o compromisso referido no artigo 12.º, n.º 1, alínea g), o que também constitui causa de recusa facultativa de execução do mandado de detenção europeu; - Deve assim ser indeferida a execução do mandado europeu emitido contra o requerido.

I.2. A Relação de Guimarães proferiu decisão sobre a execução do mandado europeu de detenção, determinando a execução do mesmo, entregando-se o detido AA às autoridades judiciais do Estado Espanhol (Audiência Provincial de Toledo), para efeitos de ser sujeito ao processo penal a que se refere o presente mandado e pelos factos nele mencionados.

Inconformado, o requerido recorreu para este Supremo Tribunal, formulando na motivação do recurso as seguintes conclusões: 1.ª Invoca-se no artigo 7° da Oposição que o mandado de detenção europeu solicitado pelo Estado Espanhol, tem como fundamento a aplicação ao detido da medida de coactiva de prisão preventiva e no artigo 8° diz-se que não se mostra suficientemente provado no mandado, e tão pouco indicado, que tal decisão não tenha sido objecto de recurso ou que tal decisão tenha transitado em julgado, e por isso mostrar-se violado o disposto na parte final a alínea c) do n° l do artigo 3° da Lei 65/2003 de 23/08.

  1. O acórdão não toma posição sobre a questão suscitada, não se pronunciando sobre o trânsito em julgado do despacho que decretou a prisão preventiva do recorrente e consequentemente da força executiva do mesmo.

  2. Existe omissão de pronúncia e falta de fundamentação quanto à questão suscitada, o que viola o disposto no n° l do artigo 205° da Constituição da República Portuguesa.

  3. No artigo 9° da Oposição o recorrente alegou que o mandado não cumpria o preceituado na alínea e) do n° l do artigo 3° da referida lei, que exige a descrição das circunstâncias em que a infracção foi cometida, incluindo o momento, o lugar e o grau de participação na infracção da pessoa procurada.

  4. O tribunal recorrido, toma posição, a folhas 5 do mesmo acórdão, dizendo o seguinte: «E...

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