Acórdão nº 06P2908 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 18 de Janeiro de 2006

Magistrado ResponsávelSOUSA FONTE
Data da Resolução18 de Janeiro de 2006
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça: 1.

1.1.

No Tribunal Colectivo da … Vara Criminal do Porto, Pº n.º…, responderam com outros, que foram absolvidos, os arguidos AA, BB e CC que vieram a ser condenados, como co-autores materiais de um crime de tráfico de estupefacientes agravado, p. e p. pelos arts. 21.º, n.º1 e 24.º als. b) e c), do DL 15/93 de 22 de Janeiro, nas penas de, respectivamente, 6 anos e 6 meses de prisão, 6 anos de prisão e 6 anos de prisão.

1.2.

Deste acórdão foi interposto recurso pelo arguido AA para o Tribunal da Relação do Porto que, pelo acórdão de fls. 1513 e segs., embora lhe tenha negado provimento, rectificou a decisão recorrida, afastando a qualificação do crime pela circunstância da alínea b) do artº 24º do DL 15/93 que entendeu não concorrer no caso (manteve, no entanto, a qualificação pela alínea c) do mesmo preceito legal).

1.3.

De novo inconformado, o arguido AA recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça, terminando a sua motivação com as seguintes conclusões: «1- O arguido foi condenado na pena de 6 (seis) anos e 6 (seis) meses de prisão pela comissão de um crime de tráfico de estupefaciente agravado.

2 - A matéria dada como provada e reproduzida na íntegra nesta Motivação, não corroborada por legal e adequado exame crítico (Fundamentação ou Motivação de facto) é insuficiente para a decisão que veio a ser proferida.

3 - O Colectivo de Juízes da 1ª Instância limitou-se, em regra e designadamente no que diz respeito ao arguido ora recorrente a proceder a uma enumeração dos meios de prova, não tendo o Tribunal da Relação do Porto sindicado correctamente esta violação.

4 - A Motivação de Facto (Fundamentação) não especifica (apenas enumera) de modo fundamentado em que meios de prova fundou a sua convicção.

5 - O Acórdão recorrido reiterou a violação do disposto no n° 2 do Artigo 374°do C.P.P..

6 - O Tribunal Colectivo não conseguiu atribuir e explicar qual a participação do arguido ora recorrente nos factos em apreço e em que medida, graduação neles participou.

7 - O Tribunal Colectivo refere como base da sua Motivação de Facto "análises das conversas telefónicas" quando não há conversas telefónicas nos autos, e o Tribunal da Relação do Porto não procede à crítica de tal inexactidão.

8 - O Tribunal Colectivo não explica qual o percurso lógico-dedutivo que lhe permite concluir pela atribuição de determinados números de telefone móvel ao arguido ora recorrente, e viu confirmada essa posição.

9 - Em geral, a Motivação de Facto é deficiente, não procede ao exame crítico das provas não sendo possível ao cidadão médio, lida que seja a Motivação de Facto confirmar a grande maioria dos factos dados como provadas.

10 - O arguido ora recorrente reclama-se inocente.

11 - Na verdade, foi dado como provado que todo o produto estupefaciente e o dinheiro apreendido (confissão do próprio) era pertença do arguido CC, 12 - O arguido foi condenado na pena mais severa fixada pelo Colectivo neste processo.

Subsidiariamente: 13 - Ainda que não se determine a absolvição do arguido ou o reenvio dos autos para novo Julgamento, deve ser operada a desqualificação relativa à agravação.

14 - E a pena substancialmente reduzida, designadamente por aplicação do disposto na alínea a) do Artigo 25° do DL. 15/93 sempre suspensa na sua execução.

15 - O presente recurso tem como fundamento a insuficiência para a decisão da Matéria de Facto Provada (Artigo 410° n° 1, al. a) do C.P.P.) e a contradição insanável entre a Fundamentação e a Decisão (Artigo 410° nº 1, al. b) do CP.P.).

NORMAS JURIDICAS VIOLADAS Artigos 21º'e 24°do DL. 15/93.

Artigo 374° do C.P.P..

Deve o presente Recurso merecer provimento e, assim: a)- decidir-se pela absolvição do arguido; b)- se assim se não entender pelo reenvio dos autos para novo Julgamento na parte necessária à melhor indagação e fixação de matéria de facto pertinente; c)- se ainda assim se não entender deve a conduta do arguido ser desqualificada, atenuada consideravelmente a pena e o arguido condenado nos termos previstos na al. a) do Artigo 25° do DL. 15/93».

1.4.

Respondeu o Senhor Procurador-Geral Adjunto do Tribunal recorrido que, depois de se debruçar sobre cada uma das conclusões da motivação, concluiu pelo não provimento do recurso.

1.5.

O seu Excelentíssimo Colega deste Tribunal promoveu se designasse data para a audiência.

1.6.

No exame preliminar, o Relator nada viu que obstasse ao julgamento do recurso, em audiência, razão por que, colhidos os vistos legais, foi designada data para a sua realização.

Tudo visto, cumpre decidir.

  1. Decidindo: 2.1.

    São os seguintes os factos julgados provados, depois de corrigidos (correcção de meros lapsos de escrita, sublinhe-se) pelo Tribunal da Relação: «Em data não apurada do ano de 2002, o arguido CC, juntamente com um outro indivíduo de nome DD, cujos restantes elementos de identificação se desconhecem, entraram em contacto com um outro indivíduo em Lisboa de nome EE e que frequenta o café …, …, a fim destes realizarem uma transacção de produtos estupefacientes, transacção esta que poderia e deveria envolver a quantidade de cem quilogramas de haxixe-canabis.

    O referido EE, por sua vez, entrou em contacto com o arguido FF para que este viesse ao Porto comprar o referido estupefaciente.

    Porque o arguido FF devia ao referido EE dinheiro proveniente da venda de estupefacientes para o seu consumo, acedeu vir ao Porto para concretizar o negócio.

    O referido EE entregou então ao FF as quantias necessárias para compra do haxixe, as quais lhe vieram mais tarde a ser apreendidas.

    Após aceder à realização do negócio o arguido FF convidou o arguido GG para o acompanhar ao Porto, apenas lhe tendo dado conhecimento do que vinham fazer quando se encontravam já nesta cidade.

    Como o referido EE de Lisboa tivesse acedido a tal proposta, o arguido CC e o tal DD entraram em contacto com o arguido AA, a fim de que este entrasse em contacto com fornecedores, de nacionalidade espanhola, para estes fornecerem tal quantidade de tal produto estupefaciente.

    Na sequência do plano previamente estabelecido, o arguido AA, no dia 5 de Fevereiro desse ano de 2002, deslocou-se a Vigo, fazendo-se transportar no veículo automóvel da marca Opel, modelo Corsa, de cor azul, de matrícula …, a fim de se encontrar com o arguido BB, de nacionalidade espanhola e seu conhecido, a fim deste conseguir o produto estupefaciente pretendido.

    Neste encontro, ficou estabelecido que o arguido BB logo que obtivesse o produto estupefaciente deveria comunicar ao arguido AA, para este informar o arguido CC, com a finalidade deste ultimar os últimos pormenores da transacção, nomeadamente informar os compradores, para estes se deslocarem a esta cidade a fim de consumarem o plano criminoso.

    Nesse mesmo dia, o arguido BB informou o arguido AA de que já tinha em seu poder o produto estupefaciente pretendido, tendo este arguido informado o arguido CC, o qual, por sua vez, informou o arguido FF, cujos contactos já lhe tinham sido fornecidos pelo BB e que a transacção se efectuaria nessa mesma noite, junto da sua residência.

    Após o BB ter acordado com o AA a venda do estupefaciente e terem acertado os pormenores da vinda ao Porto, convidou o arguido HH para o acompanhar.

    Na sequência de tal plano o arguido BB, acompanhado pelo arguido HH, que desconhecia o plano, fazendo-se transportar no veículo automóvel da marca Mercedes-Benz, modelo 230 CE, de cor castanha, matrícula …, conduzido pelo arguido BB e acompanhados do arguido AA, que se fazia transportar no veículo automóvel acima referido cerca das 21horas e 30 minutos, hora espanhola, iniciaram a viagem para esta cidade e comarca.

    Quase à mesma hora, 21horas e 30 minutos, hora portuguesa, os arguidos FF e GG, fazendo-se transportar no veículo automóvel da marca Citroën, modelo Saxo, de cor vermelha, de matrícula …, conduzido pelo arguido FF, iniciavam a viagem da Amadora para esta cidade e comarca, onde chegaram cerca das 00horas e 30 minutos do dia 6.

    Imediatamente se dirigiram para o Hotel …, sito na Praça …, onde se instalaram, passando a ocupar o quarto número 411, juntamente com mais dois indivíduos que os acompanhavam, a solicitação dos mesmos.

    Entretanto e cerca das 21horas portuguesas, os veículos automóveis onde se faziam transportar os arguidos AA e BB e HH, o Opel e o Mercedes Benz, respectivamente, dão entrada na Rua …, em …, Vila Nova de Gaia, onde estacionam junto do local onde se encontra devidamente estacionado e parado o veículo automóvel da marca Seat, modelo Leon, de cor cinzenta, de matrícula …, ao volante do qual se encontra o arguido CC.

    Após algumas vicissitudes, os arguidos CC e AA, fazendo-se transportar no veículo automóvel da marca Seat, acima identificado e conduzido pelo arguido CC, conseguem contactar com os arguidos FF e GG, cerca das 00horas e 34 minutos, na Pastelaria …, sita na Praça …, nesta cidade e comarca.

    Após este encontro, os quatro arguidos dirigem-se para a Rua 31 de Janeiro, nesta cidade, onde os arguidos CC e AA entram no veículo automóvel em que se faziam transportar e os arguidos FF e GG entram no veículo da marca Citroën, modelo Saxo, de matrícula…, que ali se encontrava estacionado.

    Ambos os veículos se põem em andamento, dirigindo-se para a Rua …, …, em Vila Nova de Gaia, onde chegam e estacionam devidamente os referidos veículos, dirigindo-se de imediato para o prédio com o número 1135, daquela artéria, onde entram cerca das 00horas e 51 minutos.

    Passados alguns minutos, cerca das 01horas e 25 minutos, os arguidos FF e GG abandonam o prédio referido, dirigindo-se para o veículo automóvel em que se fizeram transportar e, após entrarem no mesmo, abandonam o local, na direcção do Hotel em que se encontravam hospedados.

    Antes de saírem do Hotel e se encontrarem com os arguidos CC e AA os arguidos FF e GG já tinham formulado o propósito de não adquirir os 100kgs de haxixe, alegando que o mesmo não tinha qualidade, não tendo, por isso...

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