Acórdão nº 2217/08.OTBVRL.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 17 de Junho de 2011
Magistrado Responsável | SEBASTIÃO PÓVOAS |
Data da Resolução | 17 de Junho de 2011 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam, no Supremo Tribunal de Justiça, os Juízes que constituem o Colectivo a que se refere o n.º 3 do artigo 721-A do Código de Processo Civil.
AA intentou na Comarca de Vila Real, em 18 de Dezembro de 2008, acção com processo ordinário, contra a “Companhia de Seguros BB, SA” pedindo a sua condenação a pagar-lhe a quantia de 46.221,20 euros (acrescida de 37.800,00 euros relativos à ampliação do pedido) mais juros de mora desde a citação, para o indemnizar dos danos sofridos em acidente de viação.
Disse, nuclearmente, ter sido embatido por um motociclo tripulado pelo segurado da Ré que seguia a uma velocidade superior a 70 km/h e que, ao chegar junto de si, imprimiu forte aceleração, “levantou a roda da frente, fez cavalinho, colhendo o Autor que seguia a pé na berma” e causando-lhe lesões.
A Ré contestou a pugnar pela improcedência sob a alegação que “tendo havido uma discussão anterior ao acidente, o condutor do motociclo LP usou este como arma para atingir o Autor, encontrando-se, assim, o acto fora do âmbito do seguro.” A primeira instância julgou a acção parcialmente procedente e condenou a demandada a pagar ao Autor a quantia global de 63.295,79 euros, acrescida de juros moratórios desde a citação, absolvendo-a do mais pedido.
A Ré apelou para a Relação do Porto que, por unanimidade, confirmou a sentença.
Vem, agora, pedir revista excepcional, invocando as alíneas a), b) e c) do artigo 721-A do Código de Processo Civil.
Diz,em síntese, e em sede de motivação dos requisitos, que tudo está em saber se os factos provados se integram no âmbito do seguro, sabendo que o veículo que causou os danos “foi usado como instrumento de um crime”, ou seja, há que determinar “se os danos causados a um terceiro pela utilização de um veículo automóvel como arma de um crime, premeditado pelo seu agente e condutor do veículo, que agiu com intenção de atingir na integridade física o lesado, estão ou não abrangidos pela cobertura do seguro de responsabilidade civil automóvel obrigatória.” Refere que esta questão tem especial importância e relevância jurídicas em termos de uma boa aplicação do direito.
Que, outrossim, tem particular e notória relevância social “pelos seus efeitos práticos e consequências na paz e estabilidade sociais, mas também nas politicas de prevenção geral da actividade criminosa.” Finalmente, o entendimento do recorrente foi acolhido pelo Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13 de Março de 2007, em “situação factual em tudo análoga à dos presentes autos.” No mais, alega sobre o mérito do recurso que não foi contra alegado.
Sem precedência de vistos, cumpre conhecer.
1 Revista excepcional.
2 Requisitos do n.º 1 do artigo 721-A do Código de Processo Civil.
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Conclusões.
1 Revista excepcional 1.1 A revista excepcional – a pressupor a montante a inadmissibilidade da revista normal (revista-regra) apenas por o Acórdão da Relação ter confirmado, unânime e irrestritamente, a decisão da 1.ª instância (dupla conformidade) – só é de admitir uma vez verificada a presença de qualquer dos requisitos do n.º 1 do artigo 721-A do Código de Processo Civil, tarefa deste Colectivo/Formação, por força do n.º 3 do mesmo preceito, requisitos que o recorrente terá de invocar, e motivar, sob pena de rejeição (n.º 2 do artigo 721-A).
Para que possa proceder-se à subsunção do alegado na dogmática de, pelo menos, um dos três requisitos base, é curial que se defina a questão “sub judicio”, nos precisos termos em que as instâncias a conheceram.
1.2 A Ré-seguradora (ora recorrente) perante o evento danoso imputado ao seu segurado veio, logo na 1.ª instância, dizer não ser responsável por o condutor do motociclo ter agido dolosamente.
O Tribunal de Vila Real afirmou na sentença: “Ora, no presente caso, o condutor do motociclo LP utilizou o motociclo para atingir o A., ou seja, a actuação nem sequer foi só negligente mas sim dolosa.” Para contrariar a tese da Ré tinha escrito: “ Como se diz no Ac. do STJ, Processo n°08P3852, de 18-12-2008, in www.dgsi.pt relatado pelo Sr. Conselheiro Henriques Gaspar, a referência à não exclusão do âmbito da garantia do seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel dos danos resultantes de «acidentes de viação dolosamente provocados» está inscrita desde o diploma que primeiramente instituiu o regime do seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel (DL 408/79, de 25-09) — e já também em diploma de 1975 (DL 165/75, de 28-03) que, por circunstâncias do seu tempo histórico, nunca chegou a entrar em vigor.
E mantém-se, sempre em formulação verbal constante, no regime actualmente vigente, aprovado pelo DL 291/2007, de 21-08, justificado pela transposição da Directiva 2005/14/CE, do Parlamento e do Conselho, de 11-05 — 5.ª Directiva sobre o Seguro Automóvel, que procedeu à «actualização e substituição codificadora do diploma relativo ao sistema de protecção dos lesados por acidentes e viação» baseado no seguro obrigatório, «seguro de responsabilidade civil resultante da circulação...
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