Acórdão nº 3440/07.0TBGDM.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 24 de Maio de 2011

Magistrado ResponsávelANTÓNIO DA SILVA GONÇALVES
Data da Resolução24 de Maio de 2011
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

“AA”e mulher “BB”, intentaram acção de condenação, sob a forma de processo ordinário, contra “CC” e contra “DD” Ltd., representada pela sua sucursal em Espanha, D... I..., S. A., pedindo a condenação dos réus, solidariamente, a pagarem-lhes a quantia global de € 95.900,00, a título de indemnização pelos danos patrimoniais e compensação pelos danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora vincendos à taxa legal, computados desde a citação e até integral e efectivo pagamento.

Em síntese, para fundamentaram o pedido, alegaram que emitiram procuração ao 1.º réu para este os representar numa escritura de compra e venda de uma fracção de um imóvel que pretendiam adquirir livre de quaisquer ónus, hipotecas ou encargos, conforme constava do contrato-promessa anteriormente celebrado, que subscreveram após terem solicitado aconselhamento jurídico ao 1.º réu.

Porém, o 1.º réu, violando a diligência que lhe era devida e de que era capaz enquanto Advogado, antes de outorgar a escritura em representação dos autores, não se certificou que tinha sido cancelada a hipoteca que onerava a fracção.

Por essa razão, posteriormente à realização da escritura, tiveram de proceder, a expensas suas, ao cancelamento da hipoteca, o que lhe causou prejuízo no montante de € 85.000,00, para além de angústias e sofrimentos, para cuja compensação peticionam o montante de € 5.000,00 para cada um.

Mais invocam que a 2.ª ré aceitou por contrato de seguro a transferência da responsabilidade civil profissional derivada de erro, omissão, negligência ou falta profissional cometida por qualquer Advogado no desempenho da sua actividade profissional e com inscrição em vigor na Ordem dos Advogados, abrangendo, assim, à data dos factos, a actuação profissional do 1.º réu, respondendo assim ambos os réus solidariamente pelos prejuízos causados.

Contestou a 2.ª ré, defendendo-se por excepção, invocando que a responsabilidade civil coberta pelo contrato de seguro está limitada a € 125.000,00 por sinistro, sujeito a uma franquia de €1.500,00, a cargo de segurado, e por impugnação, concluindo pela improcedência da acção.

Contestou o 1.º réu, defendendo-se por excepção, invocando a prescrição do direito reclamado, e por impugnação, defendendo a sua absolvição do pedido, e a litigância de má fé dos autores.

Replicaram os autores, concluindo pela improcedência das excepções, pugnando, ainda, pela condenação do 1.º réu como litigante má fé.

No despacho saneador foi julgada improcedente a excepção peremptória de prescrição, fixada a matéria de facto e elaborada a base instrutória.

Foi proferida sentença que julgou “…totalmente procedente, por provada, a apresente acção e, em consequência, condenou a Ré C.ª de Seguros a pagar aos AA a quantia de 85.900 euros (oitenta e cinco mil e novecentos euros) a título de danos patrimoniais e de 5.000 mil euros (cinco mil) por danos não patrimoniais, valor este que se considera actualizado à data da sentença.

O montante dos danos patrimoniais vence juros à taxa legal desde a citação e valor dos danos não patrimoniais vence juros a partir do trânsito em julgado desta decisão.” Inconformados, apelaram tanto a ré seguradora como os autores.

A Relação do Porto, por Acórdão datado de 29.11.2010 (cfr. fls. 504 a 535), revogou a sentença recorrida e, em consequência, decidiu: - Condenar os réus Dr. “CC” e “DD” Ltd., solidariamente, a pagarem aos autores “AA”e “BB”, a indemnização de € 95,900,00 (noventa e cinco mil e novecentos euros), sendo, porém, da exclusiva responsabilidade do 1.º réu, Dr. “CC”, o pagamento de € 1,500,00 (mil e quinhentos euros), correspondente à franquia prevista no contrato de seguro; - Condenar os réus no pagamento de juros de mora, à taxa legal, sobre as quantias devidas, desde a citação até efectivo e integral pagamento; - Julgar prejudicado o conhecimento do recurso de agravo interposto pelos autores; - Condenar a 2.ª ré/apelante o 1.º réu/apelado nas custas devidas, nos termos sobreditos.

Inconformada, recorreu para este Supremo Tribunal a interveniente “DD” Ltd, apresentando as seguintes conclusões:

  1. Não pode a Recorrente conformar-se com toda a restante decisão que confirma a Sentença proferida em primeira instância, descurando a aplicação e interpretação correcta das normas constantes dos artigos 905°, 907°, 908° e 909° do Código Civil; b) E aqui reside a questão de Direito que foi incorrectamente interpretada; c) Vejamos, o alegado dano patrimonial provocado na esfera dos recorridos, não se deveu a acções praticadas pelo Réu mas sim pelos próprios, correndo estes o risco que assumiram ao não exigir a expurgação da hipoteca pelos vendedores; d) Resultou provado que os demandantes prometeram comprar a fracção livre de quaisquer ónus ou encargos, que nessa situação jurídica lhes foi prometida vender, e) Os recorridos deveriam ter feito uso do disposto nos artigos 905° e seguintes do Código Civil; f) Diz-nos o artigo 907° do Código Civil que o vendedor é obrigado a sanar a anulabilidade do contrato, mediante expurgação dos ónus ou limitações existentes (...) deve ainda promover, á sua custa, o cancelamento de qualquer ónus ou limitação que conste do registo, (sublinhado nosso); g) No mesmo sentido nos ensina o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 25,05.2004: necessário que o comprador peça num primeiro momento, que se fixe ao vendedor um prazo para realizar a libertação desse ónus; h) Do mesmo Douto Tribunal, resulta de Acórdão proferido a 29.03.1993, tendo o vendedor de uma fracção autónoma omitido que incidiam sobre todo o prédio duas hipotecas, constitui-se nas obrigações de expurgar essas hipotecas e de indemnizar o comprador pelos lucros que a venda da fracção a terceiro lhe permita auferir; i) A expurgação é imposta como uma obrigação ao vendedor (In Batista Lopes, Compra e Venda, 164 e AA); j) Nada impede que persistindo o vício para além da realização do negócio, a lei considere o vendedor obrigado, por força do acordo negocial (subentendendo que o vendedor quis alienar e o comprador quis adquirir o direito, isento dos ónus ou limitações anormais que sobre ele recaíam) a expurgar os ónus ou limitações existentes. In Antunes Varela, RLJ, 119.º-341, nota 2) (sublinhado nosso); k) Pelo exposto, torna-se claro a quem é que os recorridos deveriam ter ido assacar responsabilidades: ao vendedor "“EE”, Construções, L.da" e nunca ao Réu, e, por conseguinte, à Recorrente; l) É unânime, e resulta directamente da lei, que não deveriam ter sido os recorridos a proceder ao cancelamento da hipoteca e ao seu pagamento, mas sim o vendedor. Mas, na falta de estipulação da transmissão das dívidas, o comprador, compelido a pagá-las por força dos ónus, tem depois direito de regresso contra o devedor, de quem pode exigir o reembolso dos créditos pagos, em que ficou sub-rogado nos termos gerias do direito (Galvão Telles, BMJ, 83°. 130, Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado 2°-149).

m) E se o fizeram, fizeram-no por sua conta e risco arcando com os custos do cancelamento da hipoteca, têm direito de regresso contra os vendedores; n) Com o devido e máximo respeito, erra o Douto Tribunal em interpretação do disposto nos artigos 906°, n. °2, 908° e 909° do CC quando afirma e nada havendo na lei que imponha ao comprador a obrigação de desencadear o meio de tutela conferido pelo n.°2 do artigo 906° e o pedido de indemnização correspondente previsto nos artigos 908° e 909°, conforme os casos, não compete à 2a Ré censurar os autores pela opção que tomaram, nem daí retirar qualquer consequência jurídica quanto à exoneração da eventual responsabilidade do 1° Réu; o) O disposto nos artigos 908° e 909° do CC é claro. O vendedor é obrigado a indemnizar o comprador. No caso em apreço, apesar de os danos ocorridos terem sido perpetrados pelo vendedor os recorridos...

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