Acórdão nº 1702/09.1JAPRT.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 04 de Maio de 2011

Magistrado ResponsávelARMINDO MONTEIRO
Data da Resolução04 de Maio de 2011
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam em conferência na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça : Em processo comum com intervenção do tribunal colectivo , no 2º juízo do Tribunal Judicial do Marco de Canavezes e P.º n.º 1702/09.1JAPRT foi submetido a julgamento AA , devidamente identificado nos autos , vindo a final a ser condenado : a) pela prática, em autoria material, de um crime de homicídio simples, p. e p., pelo art. 131º, n.º1 do Cód. Penal na pena de 12 (doze) anos de prisão; b) pela prática, em autoria material, de um crime de detenção ilegal de arma, p. e p., pelo art. 86º, n.º1, al. c), por referência ao artigo 2º e 3º da Lei n.º 5/2006 de 23 de Fevereiro com a redacção dada pela Lei 17/2009, de 6 de Maio na pena de 16 (dezasseis) meses de prisão; c) em cúmulo jurídico na pena única de 12 (doze) anos e 6 (seis) meses de prisão Em procedência parcial do pedido de indemnização cível formulado pela demandante BB, foi condenado a pagar-lhe a quantia de 30.000,00€ (trinta mil euros), acrescida de juros de moratórios computados à taxa legal em vigor, desde a notificação do pedido deduzido e até efectivo e integral pagamento, para compensação dos danos não patrimoniais por si sofridos em consequência da conduta do demandado; e ainda a quantia 65.000,00€ (sessenta e cinco mil euros) para indemnização dos danos patrimoniais por si sofridos em virtude da mesma conduta acrescida de juros de moratórios computados à taxa legal em vigor, desde a notificação do pedido deduzido e até efectivo e integral pagamento.

I . O Digno Magistrado do M.º P.º e o arguido interpuseram recurso , apresentando aquele na motivação as seguintes conclusões : 1. Vem o presente recurso apenas interposto relativamente à matéria de direito e quanto ao crime de homicídio simples da previsão do artigo 131º do C. Penal, por cuja prática o arguido foi apenas condenado e lhe foi aplicada uma pena de doze anos de prisão; não já quanto ao outro ilícito penal, de arma proibida, cuja pena de dezasseis meses de prisão se acha perfeitamente correcta; 2.A nossa discordância prende-se, pois, com a incorrecta qualificação jurídica de homicídio simples, porquanto se nos afigura que como qualificado a conduta do arguido deveria ter sido classificada e integrada no artigo 132º do C. Penal, nas alíneas h) e i) do seu número 2, este ultimo por cuja prática se encontrava pronunciado, devendo ser-lhe aplicada uma pena de dezasseis anos de prisão de em cúmulo jurídico de dezasseis anos e seis meses de prisão; 3. Porem e mesmo que subsidiariamente se continue a entender que o mesmo deverá ser apenas punido pelo cometimento desse crime de homicídio simples, p. e p. pelo art.131º do C. Penal, ora aqui questionado, então a pena, porque demasiado branda, deverá sempre ser-lhe subida, para uma pena nunca inferior a catorze anos e em cúmulo jurídico de catorze anos e seis meses de prisão; 4. O Tribunal afastou a qualificativa da alínea i) do nº2 do citado preceito legal 132º do C. Penal, dizendo que a utilização de uma arma de fogo, não poderia ser considerada como meio insidioso, aí previsto; mas sem razão, porquanto a forma como a mesma veio a ser utilizada, numa altura em que a vitima se encontrava de costas para o arguido e a cerca de um metro de distancia, sem poder aperceber-se do arguido municiado de tal arma e sem qualquer aviso foi atingido, pelo que apenas de um acto traiçoeiro e manhoso a conduta do arguido poderá considerar-se e, como tal, em tudo idêntico e similar ao contido naquela alínea de uso de meio oculto ou dissimulado, previsto nessa mesma alínea; 5. Para alem desta qualificativa, a conduta do arguido sempre teria também de integrar-se na previsão da alínea h) desse numero 2 do art.132º do C. Penal, por virtude da utilização de uma arma de fogo e o modo como a mesma foi utilizada, pois tratando-se de um meio potencialmente letal, a pouca distância da vitima alvejada e a forma como ela foi atingida, ou seja, de baixo para cima, apenas se poderá concluir tratar-se de um meio particularmente perigoso; 6.Não ocorrendo e com tal alteração de qualificativa deste tipo legal de crime agravado, qualquer alteração fáctica ou outra, ou violação da vinculação temática, porquanto todos os factos já se encontravam contidos e descritos na acusação e pronuncia, não havendo uma nova incriminação legal, daí que também não haveria necessidade de recorrer ao disposto no art.358º nº1, do C.P.P.; 7. Por outro lado, esta agressão sempre deveria considerar-se como atípica, em virtude da especial censurabilidade ou perversidade, não só porque perpetrada por uma arma de fogo de grande dimensão e levada a efeito quando a vitima se encontrava de costas e sem aviso prévio, devendo considerar-se como meio particularmente perigoso e insidioso, mas também porque é em tudo idêntica à do padrão das aludidas alíneas qualificativas h) e i) desse nº2 do 132º, como sejam as seguintes circunstâncias; 8.A ocorrência deu-se numa altura em que ambos – vitima e agressor - estavam sozinhos, ideal para inventar uma boa desculpa; tiro dado à queima-roupa, menos de um metro de distância da vítima; quando esta se encontrava de costas para o arguido; desprevenida e totalmente indefesa; evitando que pudesse reagir; com a certeza de uma eficácia total; direccionando o tiro à região lombar, onde se alojam orgãos vitais; fugindo do local e refugiando-se em Espanha, apresentando-se após delinear estratégia de defesa; 9.Para além de ter usado uma arma de fogo indocumentada e para cuja utilização não tinha licença, não colaborando com a justiça, sem esclarecer a verdade dos factos; mantendo uma relação de proximidade com as testemunhas, não confessando ou assumindo os factos, arranjando um álibi ao dizer que a vitima estaria armada com picareta; sem demonstrar qualquer arrependimento; circunstancias estas bem reveladoras da especial censurabilidade ou perversidade, pelo que essa sua conduta deveria somente integrar a pratica de um crime de homicídio qualificado da previsão do art.132º nº1 e 2 do C. Penal; 10.Subsidiariamente se propugna que, mesmo que o Tribunal Superior continue a entender que apenas de um crime de homicídio simples se trata continua a nossa discordância pela pena em concreto escolhida de doze anos de prisão e por ser demasiado benévola, em face da extrema gravidade da conduta do arguido e da grande ilicitude dos factos praticados e em termos das exigências de prevenção geral e especial; 11. Assim e de acordo com o que se dispõe no art.77º do C. Penal, sendo premente a necessidade de travar o cometimento deste tipo de ilícito, cada vez mais frequente na sociedade, que está aliada à ideia de impunidade, acresce as circunstancias atinentes ao arguido como sejam a forma como levou a efeito a agressão - disparo de baixo para cima, com instrumento perigoso e letal, a zona atingida do tronco onde se alojam órgãos vitais, forma insidiosa como foi praticada, à falsa fé e quando a vitima estava de costas, a cerca de um metro de distancia, ou seja, à queima-roupa, o local onde a mesma ocorreu, a sua não assumpção do crime, a sua superioridade e autoritarismo que se depreende ter sido feito sobre as testemunhas, a sua razoável situação sócio - económica e financeira que vem camuflando, para alem de, então, possuir ma arma ilegal em casa sem ter licença de porte de arma, a sua total ausência de arrependimento e a forma como se ausentou do local, deixando a vitima entregue à sua sorte; 12.Já aos factores que poderiam militar a favor do arguido, apenas a ausência de antecedentes criminais poderia ser considerado, ainda que só por si não signifique bom comportamento, como melhor se pode aquilatar do depoimento de algumas testemunhas; 13. Pelo que e mesmo que por este tipo legal simples de homicídio se continue a considerar a sua conduta, a pena em concreto não deverá ser inferior a catorze anos de prisão, pelo que e em cumulo jurídico de penas, deverá ser-lhe atribuída a pena única nunca inferior a catorze anos e seis meses de prisão; 14. Ao proceder do citado modo violou, assim, o Ilustre Tribunal “a quo”, frontalmente e desde logo, o disposto nos arts. 131º, 132º nºs 1 e 2 e als.) e i), do C. Penal, 40º 71º e 77º, todos do mesmo diploma legal; 15. Nestes termos, deverá, pois, o douto acórdão recorrido ser revogado e o arguido condenado pela prática, de um crime, na forma consumada de homicídio qualificado, da previsão dos arts.131º e 132º nºs 1 e 2, designadamente das alíneas h) e i), do C. Penal, na pena de dezasseis anos de prisão e em cúmulo jurídico de crimes, com o de detenção de arma proibida, na pena única de dezasseis anos e seis meses de prisão; 16. Ou subsidiariamente e caso assim se não entenda e continue a considerar a sua conduta apenas como integrando a pratica de um crime de homicídio simples, da previsão do art.131º do C. Penal, deverá então a pena em concreto aplicada ser elevada para catorze anos de prisão e em cumulo jurídico de penas, uma pena nunca inferior a catorze anos e seis meses de prisão.

II Por seu turno o arguido apresentou as seguintes conclusões : 1.O presente recurso é do douto Acórdão proferido no passado dia 24 de Setembro do ano corrente, que absolveu o Recorrente da prática de um homicídio qualificado, p. e p. pelos art°s. 131° e 132°, n°s. 1 e 2, alínea i) do Cód. Penal e o condenou pela prática, em autoria material, de um crime de homicídio simples, p. e p. pelo art°. 131°, n°. 1 do Código Penal, na pena de 12 anos de prisão, bem como pela prática, em autoria material, de crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo art°. 86°, n°. 1, alínea c), por referência ao art°. 2o e 3o da lei n°. 5/2006, de 23/02, com a redacção da Lei 17/2009, de 06/05, na pena de 16 meses de prisão, tendo, em cúmulo jurídico, sido fixada uma pena única de 12 anos e 6 meses de prisão.

2 Foi ainda julgado parcialmente procedente por provado o pedido de indemnização civil deduzido pela Demandante BB e, em consequência, foi o Recorrente condenado a pagar àquela Demandante, a quantia...

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