Acórdão nº 104/04 0TBMBR.L1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 02 de Março de 2011
Magistrado Responsável | GRANJA DA FONSECA |
Data da Resolução | 02 de Março de 2011 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1.
AA e mulher BB, por si e em representação de seus filhos menores, CC e DD, todos residentes no L... de G..., Freguesia de S..., T..., intentaram, pelo Tribunal Judicial de M... da B..., a presente acção declarativa de condenação, emergente de acidente de viação, sob a forma ordinária, contra: a) - EE-“R... Seguros, S.A.”, com sede na A... de F..., n.º ..., P...; b) - FF-“L... – Companhia de Seguros, S.A.”, com sede na Rua de S. D... à L..., n.º 3, L...; e c) - GG-“M... – Seguros Gerais, S.A.”, com sede na Rua C..., n.º ..., ....º, L...; pedindo a condenação solidária das Rés a pagarem-lhes a quantia global de 209.500 euros ou o pagamento desta mesma quantia em função da percentagem de culpa que vier a ser apurada em relação a cada um dos seus respectivos segurados, a título de indemnização, por prejuízos patrimoniais e não patrimoniais, acrescida de juros de mora desde a citação até integral liquidação de tal quantitativo, tudo a título dos danos que lhes advieram dum acidente de viação ocorrido em 26 de Agosto de 2002.
Alegam, como fundamento da sua pretensão indemnizatória, e em resumo, que, no dia 26/08/2002, cerca das 18H20M, na Estrada Nacional n.º ..., concelho de M... da B..., ocorreu um acidente de viação, que consistiu no embate entre as viaturas “OC-...-...”, esta conduzida pelo Autor AA e segurado da Ré - GG-“M...”, e “95-74-...”, segura na 1.ª Ré - EE-“R...”, tendo-se o mesmo ficado a dever à actuação estradal do condutor do “HP”, bem assim ao dono do veículo “JJ-...-...”, segurado da 2.ª Ré – FF-“L...”, em face da manobra de ultrapassagem a que o condutor do “HP” procedeu em relação ao “JJ”, que se encontrava irregularmente estacionado na via onde ocorreu o dito choque.
A demanda da 3.ª Ré – GG-“M...” justifica-se para a hipótese de se considerar que o Autor AA, enquanto condutor do “OC”e segurado daquela, de alguma forma contribuiu para a dita ocorrência, atenta a velocidade a que seguia.
Todas as Rés contestaram, tendo a 1.ª Ré - EE-“R...”, seguradora do “”HP”, e a 2.ª Ré – FF-“L...”, seguradora do “JJ”, atribuído o aludido choque em exclusivo ao Autor, condutor do “OC”, por circular na via com excesso de velocidade, enquanto a 3.ª Ré – GG-“M...” imputou a responsabilidade do acidente aos condutores dos veículos “HP” e “JJ” com fundamentação semelhante à invocada pelos Autores no articulado inicial. De qualquer forma invoca o afastamento de qualquer responsabilidade da sua parte pelo ressarcimento dos danos descritos pelos autores, mesmo a admitir-se a imputação do acidente ao seu segurado (o autor/marido), por o contrato de seguro com o mesmo celebrado excluir a garantia desses danos, dado o Autor/marido ser o condutor do veículo por si seguro (o “OC”) e os demais Autores, seguindo como passageiros desse veículo, serem o seu cônjuge e filhos de ambos.
Replicaram ainda os Autores para rejeitar a matéria de excepção aduzida pela 3.ª Ré GG-“M...”, concluindo nos termos inicialmente peticionados.
No despacho saneador fixou-se a factualidade tida como assente entre as partes e organizou-se a base instrutória, peças estas que não sofreram reclamação.
Após se terem realizado perícias médicas na pessoa da Autora e seus filhos, foi proferida a sentença. Entendendo-se existir uma concorrência causal de comportamentos culposos do Autor, enquanto condutor do veículo “OC”, bem como do condutor do veículo “HP” e do responsável pelo veículo “JJ”, que originaram o acidente e julgando-se adequado fixar a proporção das culpas em 30% para o Autor, 25% para o responsável do veículo “JJ” e em 45% para o condutor do veículo “HP”, foi a acção julgada parcialmente procedende, por parcialmente provada e, em consequência, foram as Rés Seguradoras condenadas, em função da referida repartição de culpas, nos termos seguintes: a) - A 1.ª Ré - EE-“R...” (i) a pagar aos Autores BB, CC e DD a quantia global de 45.900 euros, com a individualização aí referida, acrescida de juros moratórios desde a citação sobre os montantes arbitrados a título de danos patrimoniais e de juros vincendos, a partir do sentenciado, contados sobre a totalidade do capital (ii) bem ainda a pagar ao Autor/marido 45% do montante que vier a apurar-se ulteriormente, quanto ao valor do veículo “OC” à data do acidente; b) – A 2.ª Ré - FF-“L...” (i) a pagar aos Autores BB, CC e DD a quantia global de 25.500 euros, com a individualização nela referida, acrescida de juros moratórios desde a citação sobre os montantes arbitrados a título de danos patrimoniais e de juros vincendos, a partir do sentenciado, contados sobre a totalidade do capital, (ii) bem como a pagar ao Autor/marido 25% do montante que vier a apurar-se ulteriormente, quanto ao valor do veículo “OC” à data do acidente; c) – A 3.ª Ré - GG-“M...” (i) a pagar aos Autores BB, CC e DD a quantia global de 30.600 euros, com a individualização nela referida, acrescida de juros moratórios desde a citação sobre os montantes arbitrados a título de danos patrimoniais e de juros vincendos, a partir do sentenciado, contados sobre a totalidade do capital.
Inconformadas com o assim decidido, apelaram para o Tribunal da Relação do Porto a 1.ª Ré EE-“R... S...” e a 3.ª Ré GG-“M...”, enquanto os Autores recorreram subordinadamente, tendo aí sido julgado procedente o recurso interposto pela 3.ª Ré GG-“M...”, mas já improcedente o recurso subordinado dos Autores, enquanto a apelação interposta pela 1.ª Ré EE-“R... S...” foi julgada apenas parcialmente procedende.
Nessa medida, alterando-se a decisão da 1ª instância, decidiu-se: 1) – Absolver a 3.ª Ré “GG-M... – Seguros Gerais, S.A.” do pedido que na acção contra si vinha deduzido; 2) - Condenar as Rés EE-“R... Seguros, S.A.” e EE-“L... - Companhia de Seguros, S.A” a pagar aos Autores, na proporção de 50% para cada uma delas, as seguintes quantias: a) - À Autora BB o montante global de 39.000 euros (sendo 18.000 euros por danos patrimoniais futuros; 20.000 euros por danos morais e 1.000 por danos emergentes); b) - À Autora CC o montante global de 55.000 euros (sendo 30.000 por danos morais e 25.000 euros pelo falado dano biológico); c) - Ao Autor DD o montante global de 1.000 euros, a título de danos morais; observando-se, contudo, quanto a juros moratórios o que foi decidido pelo tribunal “a quo”; 3 – Condenar ainda as mesmas Rés – EE-“R... S...” e FF-“L...” – a pagar ao Autor AA 70% do montante que vier a apurar-se em momento ulterior, referente ao valor do veículo “OC-...-...” à data do acidente, montante esse a distribuir por cada uma delas na já assinalada proporção.
De novo inconformadas, recorreram para este Supremo Tribunal de Justiça as Rés EE-“R... S...”, FF-“L...” e as Autoras BB e CC e, alegando, formularam as seguintes conclusões: FF-L...: 1ª – Impugna-se a repartição de culpas que, com base na matéria de facto apurada, o Acórdão recorrido alterou substancialmente, não imputando qualquer culpa a um dos condutores, o Autor nos autos.
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– Não pode merecer a nossa concordância o Acórdão em recurso, depois de subscrever a matéria de facto provada, não ter encontrado aí motivos, para exigir ao condutor do OC-...-..., o autor AA, um comportamento diferente na actuação de conduzir, naquele local, dia e hora.
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– Este condutor, como proprietário, conhecia o carro que conduzia; conhecia a estrada e circulava num trecho de curva e contra – curva. Ao sair desta última, deixa um rasto de 33 metros e, não obstante, ainda embate no obstáculo, a viatura pesada ...-...-HP, e destrói o carro que conduzia, e causa danos graves aos acompanhantes.
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– O condutor AA viu o obstáculo a 52 metros, (33 de travagem + 19/21 de reflexão), só que, como não conseguiu deter a viatura, chocou violentamente – perda total.
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- A velocidade a que circulava seria no mínimo, entre 120/130 km/h, à saída de uma curva e contra – curva.
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– Ora, atendendo aos traços da via que percorria, - curvas -, era exigível que o condutor AA assinalasse a sua marcha e não o fez.
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– Acresce que as outras duas viaturas, desde logo o “JJ-...-...”, seguro na recorrente, tiveram um comportamento normal na estrada, não lhe sendo exigível que prevenisse o comportamento irresponsável do condutor AA.
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– Assim, o “”JJ” estava estacionado, é certo, sem sinal avisador. Mas fazia-o a 27,90 metros do início da curva e o condutor AA viu-o estacionado a 52 metros.
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– Depois, a sinalização, note-se, não a pré – sinalização pois o “JJ” estava virado para onde circulava o veículo do AA e, por ser dia, seria inconsequente. Ter os piscas ligados, em nada alteraria as circunstâncias.
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– E o estacionamento era de curta duração. A viatura pesada, “...-...-HP”, efectuava a ultrapassagem, em circunstâncias normais e o AA avistou-o a 52 metros de distância.
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– Não atribuir ao condutor AA qualquer responsabilidade no acidente, atentas as circunstâncias descritas, é chocante. É olvidar a regra da prudência e os mais elementares deveres de boa condução, a que ele estava obrigado. É criar neste indivíduo um sentimento de impunidade; aliviar-lhe a consciência de ser o principal responsável pelo sofrimento dos entes próximos que transportava. É deixar à solta na estrada um condutor que não respeita as mais elementares regras de trânsito.
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– Assim, o grau de culpa do condutor AA não será inferior a 50/60%, no acidente em causa.
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– O Acórdão recorrido fez má aplicação da lei substantiva, errando na aplicação da mesma, concretamente e com base nos factos provados, n. º 2, alínea b), do artigo 22º, n.º 1 do artigo 25º e n.º 1 do artigo 27º, todos do Código da Estrada.
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– E, porque se conformou com a matéria de facto provada, violou ainda, a alínea c), n.º 1 do artigo 668º CPC.
EE-R... SEGUROS: 1ª – No domínio da responsabilidade pela eclosão do sinistro e tendo em conta o que resultou provado, não poderia o tribunal recorrido ter decidido como decidiu.
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– Tal deve-se ao facto de a matéria de facto provada permitir tirar conclusões que não as que figuram na decisão recorrida.
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