Acórdão nº 949/06.7TTVNG.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 02 de Fevereiro de 2011
Magistrado Responsável | PINTO HESPANHOL |
Data da Resolução | 02 de Fevereiro de 2011 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1.
Em 12 de Setembro de 2006, no Tribunal do Trabalho de Vila Nova de Gaia, AA instaurou a presente acção declarativa, com processo comum, emergente de contrato individual de trabalho contra o INSTITUTO NACIONAL DE ESTATÍSTICA, pedindo a condenação do réu: (A) a atribuir-lhe «a categoria de técnico superior, do grupo de qualificação de pessoal técnico superior, com efeitos a partir de 1.5.1996, sendo o ingresso na classe A6, nível 13, ou, no mínimo, na classe mais baixa (A9, nível 10), com as consequências legais e estatutárias e as promoções por mérito que lhe foram concedidas; no caso de não proceder o pedido de atribuição da classe A6, nível 13, desde 1.5.1996, que proceda, pelo menos, a partir de 1.6.2003, com todas as consequências»; (B) a pagar-lhe «as diferenças salariais decorrentes da atribuição desse estatuto, classe e nível, na remuneração de base e na remuneração adicional ou complemento de chefia de 10% da remuneração de base e nos 25% da isenção de horário de trabalho sobre a remuneração de base»; (C) a pagar-lhe «o prémio semestral do 1.º semestre de 2003, dos anos de 2004, 2005, 2006 e os vincendos, pelo valor mínimo, unitário, de 750,00 euros»; (D) a pagar-lhe uma compensação por danos não patrimoniais sofridos, no valor de € 5.000; (E) «a pagar uma sanção pecuniária compulsória, por cada dia de atraso no cumprimento da decisão, no valor de € 1.000»; (F) «todas as quantias com juros legais, desde a data do respectivo vencimento».
Posteriormente, o autor aditou o pedido de restabelecimento do uso do lugar de garagem para o estacionamento da respectiva viatura e, enquanto o réu assim não procedesse, de pagamento do prejuízo sofrido, desde 15 de Novembro de 2006, à razão de € 60 por mês, sem prejuízo de maior valor que o autor tivesse que despender para esse efeito.
Realizada sem êxito a audiência de partes, o réu, notificado para contestar, veio alegar que as tarefas realizadas pelo autor não integravam a categoria de técnico superior, que «não deve quantia alguma ao autor», que o complemento de salário foi substituído por um prémio de acordo com o desempenho, o qual não é inferior ao que auferia anteriormente, que os danos não patrimoniais invocados «não passam de pura ficção e fantasia» e, relativamente aos pedidos aditados, defendeu que o autor pode estacionar na garagem livremente, desde que haja lugares disponíveis, já que não são suficientes para uso de todos os trabalhadores, daí que a acção devia improceder.
Teve lugar audiência preliminar, foi proferido despacho saneador e operada a selecção da matéria de facto assente e controvertida, fixando-se a base instrutória.
Realizado o julgamento, exarou-se sentença, objecto de recurso de apelação, sendo que o Tribunal da Relação anulou o julgamento e todos os actos subsequentes, atenta a falta de gravação de alguns dos depoimentos produzidos em audiência.
Após novo julgamento, a sentença proferida julgou a acção parcialmente procedente, tendo condenado o réu: «1.º – [a] atribuir ao A. a categoria de técnico superior, do grupo de qualificação de pessoal técnico superior, com efeitos a partir de 01.01.1996, sendo o ingresso na classe A9, nível 10, com as consequências legais e estatutárias e as promoções por mérito que lhe foram concedidas; 2.º – [a] pagar [ao autor] as diferenças salariais decorrentes da atribuição desse estatuto, classe e nível, na remuneração de base e na remuneração adicional ou complemento de chefia de 10% da remuneração base e nos 25% da isenção de horário de trabalho sobre a remuneração de base, a liquidar em fase de execução de sentença; 3.º – [a] pagar [ao autor] o prémio semestral do 1.º semestre de 2003, no valor de € 750 (setecentos e cinquenta euros); 4.º – [a] pagar [ao autor] uma compensação por danos não patrimoniais sofridos, no valor de € 5.000 (cinco mil euros); 5.º – [a] restituir [ao autor] o lugar de garagem para o estacionamento da sua viatura e, enquanto o não fizer, [a] pagar-lhe o prejuízo sofrido, desde 15.11.2006, à razão de € 60 por mês, sem prejuízo de maior valor que o A. tiver que despender para esse efeito, a liquidar em fase de execução de sentença; 6.º – [a] pagar [ao autor] os juros à taxa legal, em vigor à data de cada vencimento, sobre os créditos em dívida, desde a data do respectivo vencimento, à excepção dos danos não patrimoniais, que foram fixados actualisticamente; 7.º – [a] pagar [ao autor] uma sanção pecuniária compulsória, por cada dia de atraso no cumprimento da decisão, no valor de € 50 (cinquenta euros)».
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Inconformados, o autor e o réu interpuseram recurso de apelação para o Tribunal da Relação do Porto, tendo o autor sustentado: (i) os quesitos 33.º, 41.º e 44.º deviam ser dados como provados; (ii) ter direito à classe A6, nível remuneratório 13, a partir de 1.5.1996, ou, caso assim se não entenda, à classe A6, nível 13, desde, pelo menos, 1.6.2003; (iii) ter direito ao complemento salarial semestral desligado da avaliação do desempenho e do cumprimento de objectivos; (iv) o valor da sanção pecuniária devia ser persuasório e compulsório, o que não sucedia com o fixado na sentença recorrida. Por sua vez, o réu alegou: (i) a nulidade da sentença por omissão de pronúncia; (ii) os quesitos 1.º, 10.º, 30.º, 40.º, 59.º, 60.º e 79.º merecem resposta diversa; (iii) o tribunal recorrido não atentou nas normas imperativas constantes do Regulamento de Carreiras, pelo que, não sendo o autor licenciado, não tendo o réu feito qualquer declaração de necessidade funcional, não se mostram verificados os requisitos legais de que dependia a procedência da acção; (iv) não se provaram tarefas, funções e competências que possam convencer que o autor as realizava ao nível do estudo, concepção, inovação e projecto, (v) sendo que as promoções por mérito concedidas ao autor não podem ser transpostas sem mais para a carreira de técnico superior e que o ingresso na carreira de técnico superior também não poderá ter efeitos retroactivos a 1.05.1996, pois é manifesto que o mesmo, à data, não preenchia os requisitos legais do referido Regulamento de Carreiras; (vi) não existe qualquer tipo de pagamento a efectuar pelo réu a título de prémio de desempenho relativamente ao 1.º semestre 2003; (vii) não se apurou matéria de facto suficiente para imputar ao réu o pagamento de danos não patrimoniais (viii) e decorre da regulação aplicável que apenas as viaturas do réu, do Delegado Regional e dos trabalhadores deficientes possuem lugar privilegiado e reservado no parqueamento.
O Tribunal da Relação do Porto decidiu julgar parcialmente procedentes os recursos interpostos, tendo: a) considerado «Não provado» o quesito 30.º; b) julgado, para evitar contradição, relativamente aos quesitos 59.º e 60.º, «[p]rovado apenas o constante da resposta ao quesito 35.º e o teor das alíneas u) e v) dos factos assentes»; c) alterado as respostas dadas aos quesitos 57.º, 77.º e 79.º; d) absolvido o réu «de reclassificar o autor na categoria de técnico superior de estatística»; e) condenado o réu a pagar ao autor (i) «o prémio de 2003, no valor de euros 750,00, bem como o de 2006 e vincendos nos valores fixados pela ré», (ii) «desde 1 de Maio de 1996 até Dezembro de 2004, desde 1 de Janeiro de 2005 a Março de 2005 e daí em diante, enquanto o autor desempenhou funções na categoria de técnico superior de estatística, os correspondentes diferencias salariais, de acordo com as tabelas salariais aplicáveis, em montante a liquidar oportunamente» e (iii) «a título de danos não patrimoniais, a quantia de euros 300,00».
É contra esta decisão do Tribunal da Relação do Porto que o autor agora se insurge, mediante recurso de revista, em que formula as conclusões seguintes: «I – Categoria de técnico superior de estatística 1.ª A jurisprudência do acórdão do STJ de 4.6.2008, em que o acórdão recorrido se baseou, não é ajustada/aplicável in casu, sob pena de atentarmos contra os princípios elementares do direito do trabalho e as garantias constitucionais do trabalhador e violentarmos a dignidade do recorrente; 2.ª Não era exigível in casu a declaração funcional, nos termos decididos pelo acórdão recorrido, sob pena de abuso, proibido pela CRP (art. 18.º, n.º 2): Aplicar cegamente os art.s 3.º, n.º 1, a), e 4.º, n.º 2, a), e 5.º, n.º 1, do Regulamento de Carreiras e exigir o acto formal dos art.s 19.º, n.º 2, e 21.º dos Estatutos do INE (pgs. 1254 e 1256 do acórdão recorrido), desconsiderando que foi o INE que nomeou por Ordem de Serviço o recorrente para o exercício de funções de técnico superior e o exercício efectivo e ininterrupto dessas funções, cerca de 10 anos (pelo menos), por que foi avaliado e promovido por mérito, é um abuso não permitido pelo art. 18.º, n.º 2, da CRP; 3.ª A Administração Pública indirecta não pode comportar-se desta forma, em desrespeito pelo direito fundamental do trabalhador à categoria correspondente às suas funções (art. 8.º, n.º 1, da Portaria 441/95), que exerceu pelo menos durante 10 anos, e da dignidade humana e de trabalhador (art.s 58.º e 59.º da CRP), tanto mais que o recorrente chefiava pessoas de categoria superior (no exercício das suas funções o recorrente coordenou e avaliou o desempenho e a actividade de técnicos superiores de estatística que nele prestavam serviço [facto y) do acórdão], supervisionava, validava e aprovava os trabalhos desses técnicos (facto 7 do acórdão) e informava e formava os técnicos à sua responsabilidade, com vista à promoção e valorização das suas competências e ao pleno exercício das suas funções (facto 21 do acórdão); 4.ª Qualquer empregadora privada, numa situação equivalente, estaria obrigada à reclassificação do A. na categoria de técnico superior, por força do princípio fundamental de que a categoria deve corresponder às funções exercidas e do n.º 5 do art. 22.º da LCT e do art. 18.º, n.º 1, da CRP; 5.ª O acórdão recorrido, ao decidir que para que o recorrente tivesse direito à...
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