Acórdão nº 346-02.3TAVCD-B.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 09 de Dezembro de 2010

Magistrado ResponsávelRODRIGUES DA COSTA
Data da Resolução09 de Dezembro de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISÃO DE SENTENÇA Decisão: NEGADA A REVISÃO Sumário : 1. Partindo do princípio de que a decisão que revoga a suspensão da execução da pena é susceptível de recurso extraordinário de revisão, nomeadamente tendo por base o fundamento da alínea d), do n.º 2, do art. 449.º do CPP, não constitui “facto novo” o pagamento do quantitativo a que ficara subordinada a suspensão da execução da pena já depois de transitado em julgado o despacho que revogou aquela suspensão, com fundamento em incumprimento imputável, a título de culpa, ao próprio condenado.

  1. Tal facto não indicia a ocorrência de um erro judiciário, que sendo um erro sobre factos estranho ao decurso normal do processo, constitui fundamento do recurso extraordinário de revisão.

  2. Esse facto posterior, tendo sido praticado com o fim de evitar o cumprimento da pena de prisão, não tem qualquer incidência na prova dos factos que determinaram a revogação da suspensão da pena de prisão aplicada, estando já para além dos limites cognitivos do tribunal, definidos pelo caso julgado que se formou com o trânsito em julgado da decisão revogatória.

    Decisão Texto Integral: I. RELATÓRIO 1.

    AA, identificado nos autos, veio, com base no art. 449.º, n.º 2, alínea d) do CPP, interpor recurso extraordinário de revisão do despacho de 23-06-2009, que revogou a suspensão da execução da pena de 1 (um) ano de prisão que lhe havia sido aplicada, com a condição de pagar ao Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social (IGFSS) a quantia de € 15 394,03 e demais acréscimos legais até ao fim do período de suspensão, que era de 3 (três) anos.

    Concluiu a motivação do seguinte modo: 1. Por despacho de 23/6/2009, cf. fls. 634, o Tribunal declarou que a conduta do condenado não se encontra descriminalizada, ao abrigo do art. 50 n.° 1 e 5 do CP alterado pela lei 59/2007, reduziu o prazo de suspensão de execução da pena de prisão para doze meses, declarou tal prazo findo, reconheceu o incumprimento da obrigação que impendia sobre o arguido, indeferindo a prorrogação do prazo de suspensão para pagamento da dívida á Segurança Social e revogou a suspensão da execução da pena de prisão, declarando que o arguido podia até ao trânsito em julgado de tal despacho, proceder ao pagamento integral da divida.

  3. Sucede que, posteriormente ao trânsito em julgado do referido despacho, o arguido procedeu ao pagamento da quantia de € 15.394.03 e dos acréscimos legais no valor de € 8.804,88, referentes ao pedido de indemnização formulado pela Segurança Social, o que não fez antes, por absoluta impossibilidade financeira, mercê da crise económica e financeira que assola o pais e, que tem levado à insolvência de muitas empresas deste país, crise essa de contornos mundiais, dizendo-se até que pior que a Depressão de 1929.

  4. O pagamento daquelas quantias, condição da suspensão da execução da pena de prisão, apresenta-se como um facto novo, no sentido de desconhecido pelo Tribunal, que permite questionar, de forma séria e fundada, a justiça da decisão, voltada para a defesa social, mas também para o cumprimento da condição imposta para a suspensão da execução da pena de prisão, ou seja, no pagar a divida à Segurança Social, o que se mostra feito. 4.

    Resulta das declarações do arguido que o mesmo não cumpriu a condição de suspensão por falta de dinheiro, embora admitisse ser proprietário de duas pastelarias e de um restaurante, tendo a seu cargo, no total 9 trabalhadores, mas com uma divida de 22 mil contos, no estado de falência e sem dinheiro para poder cumprir com o pagamento.

  5. “São de considerar abrangidos pela previsão da al. d) do n.º 1 do art 449 do CPP, os casos em que a injustiça da condenação, se vem a revelar por factos ocorridos posteriormente a esta e que, se verificados e apreciados aquando da prolação da decisão, conduziriam à não condenação por imperativo constitucional’ (Ac.

    STJ de 5/5/2004 CJ ÁCS do STJ, Ano XlI, tomo 2, p. 183) 6. Encontra-se nesta situação o arguido, que na altura em que lhe foi revogada a suspensão da execução da pena de prisão, não tinha pago a Indemnização à Segurança social, condição da suspensão, e que, posteriormente em plena execução da pena, procede a tal pagamento.

  6. Sem prescindir, nos termos do n.° 1 do art. 14 n.°1 do RGIT: “A suspensão da execução da pena de prisão aplicada é sempre condicionada ao pagamento, em prazo a fixar até ao limite de cinco anos subsequentes à condenação da prestação tributária e acréscimos legais, do montante dos benefícios indevidamente obtidos, caso o Juiz o entenda, ao pagamento da quantia até ao limite máximo estabelecido para a pena da multa.” 8.

    Deverá, assim, estender-se o prazo inicial de 3 anos de suspensão, até ao limite de cinco, estabelecido no n.° 1 do art. 14 do RGIT, o que, equivale a dizer que, sendo o trânsito da condenação a 20/12/2005 o limite da suspensão ocorrerá a 20/12/2010, sendo que o pagamento efectuado pelo arguido do pedido de indemnização à Segurança Social ocorreu no período de suspensão da execução.

  7. Assim sendo, um facto novo que tomou injusta uma decisão condenatória de cumprimento de pena de prisão, porque a manteve por facto que deixou de merecer qualquer condenação e porque perante situações iguais potencializa tratamento radicalmente diferente, pode fundamentar um pedido de revisão, nos termos da ai. d) do n.° 1 do art. 449 do CPP.

  8. Respondeu o Ministério Público, concluindo, em suma que o despacho que revogou a suspensão da execução da pena não é susceptível de recurso extraordinário de revisão, por não ser um despacho que põe termo ao processo.

    (…) O esforço de recuperação e cumprimento das condições de suspensão só foi posto em marcha quando ⌠o condenado⌡ se viu privado da liberdade, quando já havia transitado o despacho de revogação.» Se o condenado entendia que lhe foi injustamente revogada a suspensão da execução da pena, deveria ter interposto o competente recurso ordinário e não lançar mão do recurso extraordinário de revisão, sendo que o pagamento tardio e apenas na iminência do cumprimento da pena de prisão não pode considerar-se facto novo, sob pena de se subverter por completo os fundamentos do recurso de revisão.

    Quanto à prorrogação do período de suspensão, esta não é enquadrável nos fundamentos de revisão.

    Deste modo, a revisão deveria ser negada.

  9. A Sra. Juíza do processo prestou a informação a que alude o art. 454.º do CPP.

    De relevante para o caso, expôs o seguinte: (…) O despacho ora posto em causa por via de recurso extraordinário de revisão, o qual revogou a suspensão da execução da pena, não põe fim ao processo. Aliás, esse despacho dá início a uma nova fase, própria da execução da pena de prisão, estando, assim, imposta a continuidade do processo.

    Deste modo, não é legalmente susceptível de recurso de revisão, porque não é subsumível à previsão do art. 449.º, nº 2 do CPP. Termos em que é nosso parecer que logo, atento este ponto, - a admissibilidade legal – será de negar a revisão.

    (…) Acrescenta-se ainda que o pagamento efectuado pelo arguido, posteriormente a esse despacho, não constitui de modo algum um facto novo para efeitos do art. 449.º, n.º 1, alínea d) do CPP.

    À data da prolação do despacho que revogou a suspensão da execução da pena de prisão, o arguido não tinha efectuado qualquer pagamento...

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