Acórdão nº 5202/04.8TBLRA.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 02 de Dezembro de 2010

Magistrado ResponsávelTEIXEIRA RIBEIRO
Data da Resolução02 de Dezembro de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: NEGADA A REVISTA Sumário : 1 – É requisito constitutivo do direito potestativo à constituição de uma servidão de passagem a favor de prédio rústico encravado a alegação de factos concretos em relação aos prédios vizinhos – nomeadamente os relacionados com as caraterísticas, utilização, produtividade, extensão e proximidade com a via pública – que permitam concluir que o prédio por onde se pretende efectivar a passagem é o que, de entre aqueles, o que menos prejuízo sofre com a constituição da servidão; 2 – Para esse efeito – o da constituição de uma servidão de passagem em benefício de prédio rústico encravado – há-de atender-se somente às necessidades (presentes e futuras) do prédio dominante, considerando sempre a afectação a que se encontra adstrito (no caso, a rústica), e não já a uma afectação inovadora, como, por exemplo, a da construção urbana.

Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I – AA e mulher, BB, residentes no Bairro do ....., Lote.... – ...., ...., em Leiria, intentaram, em 15/10/2004, na Comarca de Leiria, acção declarativa sumária (mais tarde convertida em acção ordinária, por efeito de reconvenção), contra CC e mulher DD, residentes no Rua da......, nº....., Casal dos Claros, freguesia de Amor, em Leiria, alegando, em síntese, que são donos de um prédio rústico (terra de cultura) totalmente encravado, por não dispor de qualquer comunicação com a via pública, e que pretendendo destina-lo à construção da sua habitação, o respectivo projecto só será aprovado se a parcela dispuser de uma passagem para a via pública, com pelo menos 4 metros de largura, para o trânsito de pessoas e veículos, bem como de tubos de água, gás, electricidade e esgotos, e o mais necessário; que esta via se situa a poente, a uma distância de 31 metros, interpondo-se entre ela e a referida parcela certo prédio rústico dos RR.; que este, de todos os prédios confinantes, é o que menor prejuízo e incómodo sofrerá com a servidão pretendida; que a indemnização a que os RR. têm direito pelo terreno a ocupar é de € 310,00.

Concluiram, pedindo que se declare a constituição de uma servidão de passagem sobre o prédio dos RR. a favor do prédio dos AA., com o traçado e largura referidos em 13º e 14º da p.i., destinada ao trânsito de pessoas e veículos ligeiros e pesados, tubos de água, esgotos, gás, electricidade e quaisquer outros que se mostrarem necessários aos fins habitacionais do prédio dominante, arbitrando-se aos RR. a indemnização de € 310,00.

Contestando, os RR. defenderam-se por impugnação e excepção, além de terem deduzido reconvenção. Alegaram, no essencial, que a doação mediante a qual os AA. adquiriram o imóvel de que se arrogam donos é nula, por dissimular uma compra-e-venda, negócio que daria lugar à preferência dos proprietários confinantes; que, de todo o modo, tal doação é sempre anulável, visto implicar o fraccionamento de um conjunto predial com área inferior à unidade de cultura respectiva; que, enquanto integrada na referida unidade predial, a parcela adquirida pelos AA. sempre teve acesso à via pública pelo lado nascente, através de outros prédios do doador; que há um outro prédio, confinante a norte-poente, com 3.000 m2 em que a implantação da passagem originará menor prejuízo para os seus proprietários; que, a ser declarada a servidão, o prédio dos RR. fica muito prejudicado, ficando sem dimensão para aí ser viabilizada a construção de uma habitação para o respectivo filho; que o valor do metro quadrado do prédio dos RR. é de € 180,00 e não de € 10,00, como dizem os AA.

Concluiram pela improcedência da acção. E, em reconvenção, pediram que se decida que o acesso ao terreno dos AA. se faça pelos terrenos do doador tal como sucedia antes da doação, ou, assim não se entendendo, pelos terrenos do prédio confinante pertencente aos herdeiros de EE, ou, em último caso, se se concluir que o sacrifício deve incidir no prédio dos RR., que a indemnização a atribuir-lhes não seja inferior a € 35.000,00.

Respondendo à matéria de excepção, os Autores negaram qualquer simulação na doação, refutando a aplicabilidade ao caso da proibição do emparcelamento, e concluiram como na petição inicial.

A acção prosseguiu a sua normal tramitação, agora como ordinária face ao valor da reconvenção, tendo-se proferido o despacho saneador, com elaboração dos elencos da matéria de facto assente e da base instrutória, vindo a realizar-se a audiência de julgamento, com resposta à matéria da base instrutória a fls.250-254, e a proferir-se sentença, que, julgando a reconvenção improcedente e procedente a acção, declarou a constituição de uma servidão de passagem sobre o prédio pertencente aos RR. a favor do identificado prédio dos AA.

nos precisos moldes por estes requeridos, arbitrando àqueles a indemnização de € 11,00 por metro quadrado da área ocupada com a servidão.

Mediante apelação dos Réus, o Tribunal da Relação de Coimbra, concedendo procedência ao recurso e revogando a sentença, julgou a acção improcedente e absolveu os Réus de todos os pedidos contra eles formulados.

Irresignados, são agora os Autores que pedem revista, formulando as conclusões alegatórias que se transcrevem: “1. A resposta dada ao quesito terceiro - de todos os prédios confinantes com o prédio dos autores o referido em c) é o que menor prejuízo, dispêndio e incómodo sofrerá - não tem um conteúdo meramente va1orativo, e deverá manter-se tal quesito.

  1. Os RR não questionaram o conteúdo de tal quesito, nem na sua contestação nem na sua alegação de recurso, aceitaram-no e até utilizaram o mesmo conteúdo e termino1ogia ao referirem que o prédio que menor prejuízo sofreria com a servidão seria o da viúva de EE, pelo que sendo as alegações que delimitam o objecto do recurso (artº 684º nº3 e 690º n° I do CPC) entendem os AA que o d. acórdão não deveria apreciar esta questão (artº 661 ° e 264° n° 2 do CPC).

  2. Contudo, na d. sentença constam descriminadas, a natureza e as características de cada um dos prédios confinantes que habilitaram o Tribunal a concluir que é o prédio dos RR que se encontra na situação particular de dever ser onerado com a servidão de passagem pretendida pelos AA.

  3. Tendo ficado provado que os prédios dos doadores FF e mulher que confinam com os dos AA são o local onde aqueles têm a sua casa de habitação e respectivo logradouro, e que era através do pátio da casa do FF que se acedia ao prédio dos AA, e destinando-se a servidão pretendida a aceder à casa de habitação dos AA é manifesta a maior devassa e o maior prejuízo para tais prédios se tivessem que ficar onerados com a servidão de passagem.

  4. Por outro lado, tendo o prédio dos RR uma textura arenosa com seixos e areia, de reduzida potencialidade agrícola, encontrando-se a mato, e sendo também a distância mais curta entre os prédios dos AA e a via pública através do prédio dos RR, é manifesto que é este prédio dos RR o que menor prejuízo sofre com a servidão.

  5. Conforme consta dos autos, houve uma perícia que constatou e concluiu que o prédio dos RR é...

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