Acórdão nº 06B514 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 02 de Março de 2006
Magistrado Responsável | SALVADOR DA COSTA |
Data da Resolução | 02 de Março de 2006 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I Empresa-A intentou, no dia 21 de Novembro de 2001, contra o Empresa-B, acção declarativa de condenação, com processo ordinário, pedindo a sua condenação a pagar-lhe 4 681 910$ e juros de mora desde a citação, com fundamento no mau estado de conservação, de limpeza e de operacionalidade, no termo de contrato de arrendamento, de andares, no dispêndio por causa disso de 1 421 910$ e no atraso na sua entrega de um mês e respectiva privação do recebimento da renda no montante de 800 000$.
A ré, em contestação, afirmou que os andares não lhe foram entregues em bom estado, tê-los entregado na data convencionada e que, na data da restituição, apenas apresentavam deteriorações inerentes a uma prudente utilização e, em reconvenção, pediu a condenação da autora no pagamento de 2 510 000$ correspondentes ao valor das obras de conservação ordinária que neles efectuou, e a autora replicou, negando a realização de quaisquer obras durante a vigência do contrato de arrendamento.
Realizado o julgamento, foi proferida sentença no dia 7 de Junho de 2004, por via da qual a autora foi absolvida do pedido reconvencional e a ré condenada a pagar-lhe € 15 845,92 e juros moratórios à taxa legal deste a data da citação e juros compulsórios à taxa anual de 5% desde a data do trânsito em julgado da sentença e, por litigância de má fé, no pagamento da multa de € 445 e indemnização, fixada no dia 30 de Setembro de 2004 no montante de € 2000.
Apelou a ré, englobando no recurso de apelação a condenação por litigância de má fé, e a Relação, por acórdão proferido no dia 27 de Setembro de 2005, negou provimento ao recurso.
Interpôs a apelante recurso de revista, formulando, em síntese, as seguintes conclusões de alegação: - não foi feita prova de questões relevantes para a decisão da causa, como saber o estado do locado no dia da entrega, se as suas deteriorações resultaram de utilização imprudente, se a recorrida já foi reembolsada das despesas incorridas pela sua seguradora ou se não procedeu às amortizações fiscais do locado e dos seus equipamentos; - há contradição entre os factos mencionados sob 37 e os referidos sob 41, 44 a 46 porque não existiam em finais de Agosto os mesmos defeitos no locado encontrados em Junho e porque realizou, em Julho e Agosto, obras de reparação avultadas e as reparações feitas pela recorrida em Setembro já não se referem à quase totalidade dos citados defeitos de Junho; - foi violado o artigo 1044º do Código Civil por ter sido dado como provado que o estado do locado em finais de Agosto, antes da conclusão das obras pela recorrente e da sua entrega, era igual ao existente na data da entrega; - não pode dar-se como provado que todas as deteriorações do locado eventualmente existentes na data da entrega eram ilícitas em resultado de utilização imprudente; - não incorreu em mora na entrega dos andares, pelo que a Relação violou o artigo 1045º do Código Civil; - foram violados o artigo 120º do Regime do Arrendamento Urbano e a cláusula 6ª do contrato de arrendamento por não ter sido reconhecido o seu direito à indemnização pelas obras realizadas, das quais não beneficiou, na medida do enriquecimento da recorrida, e aplicaram-se indevidamente o 1046º do Código Civil e a cláusula 5ª do contrato; - não litigou de má-fé, pelo que o tribunal violou o artigo 456º do Código de Processo Civil; - deve revogar-se o acórdão por violação da lei substantiva, absolver-se a recorrente do pedido, da condenação por litigância de má fé e condenar-se a recorrida no pedido reconvencional ou devolver-se o processo ao tribunal recorrido para ampliar a matéria de facto ou dirimir a sua contradição.
II É a seguinte a factualidade declarada provada no acórdão recorrido: 1. No dia 3 de Abril de 1997, representantes da autora e da ré declararam, por escrito, a primeira dar de arrendamento à segunda, por cinco anos, mediante o pagamento de 750 000$ mensais, o primeiro andar esquerdo e direito e o rés-do-chão esquerdo do prédio sito na Avenida Praia da Vitória, nºs. 5 e 5 A, em Lisboa, destinados à instalação dos escritórios da última, incluindo todo o mobiliário e equipamento neles existente, e ainda o que consta das seguintes cláusulas: - quinta: no local arrendado não poderão fazer-se quaisquer obras sem a autorização escrita da senhoria, nos mesmos termos da anterior cláusula terceira, e as que se fizerem com essa autorização serão por ela fiscalizadas e não poderão ser demolidas, pois ficarão desde logo pertença dos locais arrendados, sem que possa alegar-se direito de retenção ou exigir-se indemnização por benfeitorias; - sexta: a inquilina obriga-se, sob pena de indemnização, a proceder de sua conta a todas as limpezas e reparações interiores nos locais arrendados, incluindo a colocação de vidros nas janelas, reparações das canalizações de água, luz, esgotos e seus pertences, salvo as decorrentes do seu uso normal e prudente; - sétima: durante o período de vigência deste contrato, a inquilina é a única responsável pelas despesas de utilização de energia eléctrica, água, gás e telefone e do aluguer dos respectivos contadores ou assinatura mensal; - oitava: o arrendamento inclui o mobiliário e equipamento constantes do Anexo 1 deste contrato, do qual faz parte integrante; - nona: findo o arrendamento, a inquilina obriga-se a entregar os locais arrendados em bom estado de conservação e limpeza, com todo o mobiliário, equipamento e pertences em bom estado e a funcionar na sua plenitude, sob pena de ter de indemnizar a senhoria ou repor os mesmos na situação existente na presente data; - décima: a inquilina reconhece que os locais arrendados, no estado em que se encontram, realizam cabalmente o fim que se destinam e não carecem de qualidades necessárias a esse fim ou assegurados pela senhoria, e os locais arrendados, desde data anterior a 1980, são utilizados para fins não habitacionais.
-
Até então, os andares locados vinham sendo utilizados como escritórios de uma sociedade de advogados, tendo ficado ligados entre si, por forma a constituírem uma única unidade, um único escritório, estética e funcionalmente homogéneo, tendo todos os andares e respectivas divisões assoalhadas ficado equipados com sistema de alarme, iluminação especial, sistema sonoro, rede telefónica e aparelhos de ar condicionado.
-
O soalho tradicional dos corredores e halls dos três andares, em madeira, foi substituído por granito polido e equipados com o referido mobiliário de escritório, as instalações sanitárias do primeiro andar esquerdo e direito foram revestidas a mármore, equipadas com lavatórios, sanitas e autoclismos novos e, após a realização das obras, os andares tinham aspecto impecável, especificamente concebidos para escritórios vocacionadas para empresas que lidam com clientela numerosa e de grau sócio-económico elevado, a pintura das paredes, o chão de granito e as alcatifas dos diferentes compartimentos estavam em bom estado, não exigindo intervenção, não havia nenhum mobiliário danificado e o sistema de alarme e de som e o ar condicionado e a rede telefónica estavam a funcionar na sua plenitude, situação em que estavam na data da sua entrega à ré.
-
No dia 11 de Abril de 2000, a ré comunicou à autora, por escrito: "vimos, por este meio, nos termos e para os efeitos do disposto no Artigo 117º, nº 2, com remissão para o artigo 100º, nº 4, ambos do Regime do Arrendamento Urbano, revogar o citado contrato, o qual cessará no próximo dia 11 de Julho do corrente ano".
-
No dia 27 de Abril de 2000, a autora comunicou à ré, por escrito, além do mais: "considerando que a revogação do contrato de arrendamento em epígrafe produzirá os seus efeitos úteis a partir de 11 de Julho de 2000, considerando também que o arrendamento em apreço envolveu a cedência à vossa empresa de uma série de equipamento e outros materiais, inventariados, aliás, em documento anexo ao mesmo contrato de arrendamento, solicita-se a Vossas Excias. se dignem comunicar qual a data e hora que, entre os dias 1 e 11 de Julho, reputam mais conveniente para que a senhoria proceda à fiscalização do locado despejando".
-
Em Junho de 2000, as paredes estavam sujas e com buracos, no gabinete principal a alcatifa estava manchada, havia posters colados nas paredes, as instalações sanitárias estavam sujas, um espelho, um lavatório e um autoclismo estavam partidos, havia lixo diverso espalhado pelos andares, armários partidos, prateleiras amolgadas, as calhas das estantes não funcionavam bem, o sistema de alarme deixara de funcionar por completo, os aparelhos de ar condicionado estavam repletos de pó e a funcionar deficientemente, o sistema de som não funcionava por completo, havia fios de telefone arrancados e lâmpadas fundidas, faltavam dois comandos de ar condicionado e havia tomadas de electricidade e interruptores arrancados e desactivados.
-
No dia 28 de Junho de 2000, a autora enviou à ré uma carta, expressando: "venho pela presente solicitar a V. Exªs. que, até ao dia 11 de Julho de 2000, se dignem proceder a tudo o que entenderem por conveniente e adequado à reposição do espaço e mobiliário locados nas condições de limpeza, conservação e operacionalidade idênticas às existentes à data em que os mesmos vos foram entregues".
-
A ré comprometeu-se a restituir os andares nas condições iniciais em que os recebeu, não procedeu à sua entrega e do mobiliário e equipamento no dia 11 de Julho de 2000, e, posto isto, a autora colocou os três andares no mercado, sendo imediatamente contactada por uma sociedade de advogados, interessada em arrendá-los a partir do mês de Agosto de 2000.
-
No dia 29 de Agosto de 2000, a autora, através de mandatária, enviou à ré um fax, expressando: "Como é do Vosso conhecimento o locado em epígrafe ainda não se encontra nas condições em que o mesmo devia ter sido entregue à nossa constituinte no passado dia 11 de Julho. E a promessa assumida por Vossas Excias. de, até ao final do mês de Agosto, colocar o locado nas...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO-
Acórdão nº 1680/12.0TBGDM.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 19 de Março de 2019
...coelho), Proc. n.º 04B4043; de 17 de março de 2005 (salvador da costa), Proc. n.º 05B531; de 2 de março de 2006 (salvador da costa), Proc. n.º 06B514; de 14 de março de 2006 (bettencourt de faria), Proc. n.º 06B159; de 28 de março de 2006 (urbano dias), Proc. n.º 06A206; de 19 de setembro d......
-
Acórdão nº 1680/12.0TBGDM.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 19 de Março de 2019
...coelho), Proc. n.º 04B4043; de 17 de março de 2005 (salvador da costa), Proc. n.º 05B531; de 2 de março de 2006 (salvador da costa), Proc. n.º 06B514; de 14 de março de 2006 (bettencourt de faria), Proc. n.º 06B159; de 28 de março de 2006 (urbano dias), Proc. n.º 06A206; de 19 de setembro d......
-
Acórdão nº 1680/12.0TBGDM.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 19 de Março de 2019
...coelho), Proc. n.º 04B4043; de 17 de março de 2005 (salvador da costa), Proc. n.º 05B531; de 2 de março de 2006 (salvador da costa), Proc. n.º 06B514; de 14 de março de 2006 (bettencourt de faria), Proc. n.º 06B159; de 28 de março de 2006 (urbano dias), Proc. n.º 06A206; de 19 de setembro d......
-
Acórdão nº 1680/12.0TBGDM.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 19 de Março de 2019
...coelho), Proc. n.º 04B4043; de 17 de março de 2005 (salvador da costa), Proc. n.º 05B531; de 2 de março de 2006 (salvador da costa), Proc. n.º 06B514; de 14 de março de 2006 (bettencourt de faria), Proc. n.º 06B159; de 28 de março de 2006 (urbano dias), Proc. n.º 06A206; de 19 de setembro d......