Acórdão nº 00A3282 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 13 de Dezembro de 2000 (caso NULL)
Magistrado Responsável | LEMOS TRIUNFANTE |
Data da Resolução | 13 de Dezembro de 2000 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: A, veio requerer procedimento cautelar comum, contra B, e o C, pedindo que seja ordenada: A) - A notificação dos requeridos para que se abstenham de realizar o concurso de tiro aos pombos previsto para os dias 13 e 14 de Fevereiro de 1999, bem como se abstenham de levar a cabo esta prova em qualquer outra data; B) - A notificação dos Requeridos para que se abstenham de matar ou ferir qualquer pombo que se encontre em seu poder; C) - A notificação dos Requeridos para que procedam à entrega dos aludidos animais a um fiel depositário e que os Requeridos sejam condenados no pagamento de uma quantia pecuniária compulsória em partes iguais, à requerente e ao Estado; Requer ainda que o procedimento cautelar seja decretado sem a audição dos Requeridos; A providência cautelar foi decretada pelo tribunal e, foi fixada, a título de sanção pecuniária compulsiva, a quantia de 1500000 escudos pela prática de actos que contrariem o decidido; O tribunal ordenou que fosse observado o disposto no artigo 385º, nº 5, do Código de Processo Civil; Os Requeridos vieram então, deduzir oposição, ao abrigo do disposto no artigo 388º, nº 1, alínea b), daquele diploma adjectivo, texto legal a que pertencerão todas as disposições citadas, sem indicação de outra providência; Após a apresentação da resposta pela Requerente, o tribunal proferiu decisão na qual manteve a providência cautelar anteriormente decretada; Não se conformando com a decisão, os Requeridos, interpuseram recurso, admitido na espécie de agravo; Conhecendo dessa via, no Tribunal da Relação de Lisboa veio, então, a ser proferido Acórdão, em que se concedeu provimento ao dito agravo, revogando-se a decisão recorrida que decretara a providência cautelar; Os agravantes, entretanto, fizeram juntar aos autos, a cópia, de folhas 616 e 637, do Acórdão proferido no processo nº 149/00 da 7ª Secção, do Tribunal da Relação de Lisboa, em 14 de Março de 2000, no qual, em processo rigorosamente idêntico ao destes presentes autos se decidira pela incompetência material da jurisdição cível; Tendo-se, então, lavrado, na Relação, o despacho de folhas 678, em que ordenando que ficasse no processo tal cópia, se referenciou, contudo, que o recurso já fora decidido, pelo que se esgotara o poder jurisdicional da 2ª instância, aqui; Recorreu, então, e depois, a requerente, via essa, admitida como de agravo, com subida imediata, nos próprios autos, e efeito suspensivo; E que constitui a sede da presente apreciação, para este S.T.J.; Alegando, para o efeito, a dita Requerente veio a formular as seguintes conclusões: 1 - As conclusões das alegações do recurso dos ora Recorridos para a Relação de Lisboa consubstanciam unicamente alegações de Direito; 2 - Nos termos do artigo 388º, nº 1, a utilização de oposição ou de recurso é alternativa; 3 - O recurso previsto no nº 2, do artigo 388º, visa a reapreciação da matéria de facto invocada na oposição deduzida pelo demandado no procedimento cautelar comum e não, directamente, a decisão de Direito que tenha sido proferida; Esta deve ser objecto do recurso previsto na alínea a) do nº 1 do preceito; 4 - Só será possível reapreciar a questão de Direito se, porventura, a factualidade alegada na oposição e provada, alterar a situação fáctica em que assentou a decisão proferida em 1º lugar, o que não se verifica nestes autos; 5 - Os Recorridos não usaram a faculdade prevista no nº 2 do artigo 388º citado, o que inviabiliza o conhecimento do objecto deste recurso; 6 - O Juiz não deve pronunciar-se sobre a procedência do pedido quando razões de ordem processual prejudicarem o seu conhecimento; 7 - Tendo o Tribunal da Relação de Lisboa apreciado o objecto do recurso conheceu uma questão de que não poderia tomar conhecimento, pelo que, nos termos do artigo 668º nº 1, alínea d), "ex vi", do artigo 755º, o Acórdão é nulo; 8 - Não tendo os Recorridos recorrido desta decisão, a matéria de facto sobre a qual as instâncias de recurso forçosamente se deverão pronunciar, é aquela que foi fixada quando da decisão da decisão cautelar; 9 - Na decisão cautelar a prova testemunhal foi gravada, só que os Recorridos, no recurso para a Relação, não usaram da faculdade prevista no artigo 690º-A, nº 1, alínea b), nomeadamente procedendo à transcrição mediante escrito dactilografado, das passagens da decisão em que se funda; 10 - Baseando-se a matéria de facto, quer em documentos particulares, quer em prova testemunhal não reduzida a escrito, não constando, assim, do processo todos os elementos de prova que lhe serviram de base, não pode a Relação alterá-la por a tanto se opôr o artigo 712º, nº 1, alíneas a) e b); 11 - Não houve qualquer documento superveniente que, por si só, fosse suficiente para destruir a prova em que assentou a decisão cautelar; 12 - Os elementos fornecidos pelo processo não impunham uma decisão diversa, insusceptível de ser destruída por quaisquer outras provas; 13 - Os Recorridos não recorreram de facto, apenas de Direito; 14 - A decisão da matéria de facto fez caso julgado (artigo 684º, nº 4); 15 - O Tribunal da Relação não utilizou "in casu" da faculdade conferida pelo artigo 712º, nºs 1 e 2, nem o poderia ter feito; 16 - A entender-se contrariamente ao estipulado na conclusão anterior infringir-se-ia a regra do artigo 684º, nº 4; 17 - A interpretação feita pelo Acórdão recorrido baseou-se em factos não constantes da matéria dada como provada e em contradição com a norma, pelo que viola o disposto no artigo 684º, nº 4, e consequentemente ofende o caso julgado quanto à matéria de facto, visto que assenta em factos que não foram dados como provados mas que sub-repticiamente no Acórdão não adiantados, os quais se encontram em total contradição com a matéria assente; 18 - Não é apenas na fixação dos factos que as instâncias são soberanas, mas também nas deduções lógicas e consequentes desses factos (artigos 722º, nº 2 e 729º nº 2); 19 - Tendo a Relação aceite a matéria dada como provada na 1ª instância e não tendo usado da faculdade prevista no artigo 712º, as conclusões a que chegou o Acórdão da Relação são absolutamente inadmissíveis porque totalmente incompatíveis; com o desenvolvimento lógico dessa matéria; 20 - O Acórdão recorrido é nulo por se ter baseado em factos diversos dos factos provados que fundamentaram a decisão cautelar e que constituem o objecto material do recurso, tendo sido conhecida uma questão de que não poderia ter tomado conhecimento (artigo 668º, nº 1, alínea d)); Se assim não se entender, à cautela ainda se diz que: 21 - Houve erro de julgamento; 22 - O Acórdão refere factos sobre os quais não foi produzida qualquer prova; 23 - O Despacho do Senhor Primeiro Ministro a atribuir o estatuto de utilidade pública à B, publicado no D.R. II Série, de 4 de Abril de 1994 é absolutamente omisso no que concerne à actividade de tiro aos pombos; 24 - A Relação serviu-se de determinados factos sobre os quais não foi produzida prova na 1ª instância, não tendo o Acórdão recorrido utilizado o artigo 712º, nº 2, assentado consequentemente em fundamentos ilegais; 25 - O conceito de necessidade implica uma comparação de valores tutelados; No caso, "sub-judice" os valores a atender com a prática de tiro com seres vivos não são de menor valor que a protecção dos animais; 26 - A existência de meios mecânicos alternativos ao tiro a alvos vivos torna absolutamente desnecessário que se continuam a utilizar seres vivos enquanto alvos; 27 - A prática de tiro aos pombos não tem subjacente qualquer tradição; A sua prática não implica qualquer valor cultural; Não há portanto razão para fundamentar a excepção (muito menos tácita) da permissão do tiro ao voo com base naquele valor; 28 - A eventual ilicitude de outras actividades não retira a ilicitude da prática de tiro ao voo, sendo certo que a pesca tem subjacente a alimentação do Homem; 29 - O Património cultural tem de traduzir uma "identidade cultural comum" com o próprio artigo 78º, nº 2, alínea c), (fim) da Constituição da República Portuguesa afirma, o que não é o caso do tiro a alvos vivos; 30 - A Lei nº 92/95, de 12 de Setembro, derrrogou parcialmente o despacho de 4 de Abril de 1994, que alegadamente concede poderes à B, no âmbito do tiro a alvos vivos, muito embora nada dele conste nesse sentido; 31 - A prática de tiro a alvos vivos é proibida pela Lei nº 92/95; 32 - Os trabalhos preparatórios não podem ser mais que meros indícios de uma determinada vontade legislativa e que de modo algum vinculam o intérprete da lei; Da letra da lei retira-se que a proibição de provas do tiro com utilização de alvos vivos está e sempre esteve prevista na actual lei, na regra geral do nº 1, para além do que nos termos do nº 3, alínea e) se proibir expressamente a realização de concursos, torneios, exibições ou provas similares que provoquem dor ou sofrimento consideráveis em animais; 33 - O legislador optou por uma proibição geral, atendendo à sensibilidade da matéria. 34 - A interpretação defendida pelos Recorrentes não tem na letra da lei um mínimo de correspondência verbal ainda que imperfeitamente expressa; 35 - A interpretação defendida pelo Acórdão recorrido viola frontalmente o texto da lei, bem como o seu espírito; 36 - A aceitar-se que o acréscimo de gozo ou divertimento de uns tantos, ou a tradição, é critério suficiente para afastar a proibição da morte ou sofrimento de animais sem necessidade consagrada na Lei nº 92/95, de 12 de Setembro, estar-se-á a negar a própria existência deste diploma legal, na medida em que, a ser assim, qualquer motivo por mais fútil que seja permitirá ilidir a proibição indiscutivelmente exarada no nº 1 e nº 3, alínea e) do normativo em apreço; 37 - O artigo 3, nº 1 do Código Civil estipula que os usos e costumes só são juridicamente atendíveis quando a lei o determine, o que não acontece com o tiro a alvos vivos; Termina, pelo provimento do presente recurso e consequente revogação do Acórdão recorrido, mantendo-se assim, a...
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