Acórdão nº 01S1659 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 22 de Maio de 2002 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelMÁRIO TORRES
Data da Resolução22 de Maio de 2002
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: 1. Relatório: A, intentou, em 21 de Julho de 1998, no Tribunal do Trabalho de Lisboa, acção emergente de contrato individual de trabalho, contra Radiotelevisão Portuguesa SA, pedindo que seja: (i) declarada a ilicitude do seu despedimento; (ii) a ré condenada a reintegrá-lo no seu posto de trabalho ou a pagar-lhe a indemnização substitutiva, se por esta o autor vier a optar; e (iii) a ré condenada a pagar-lhe as retribuições vencidas desde a data do despedimento até à decisão, e uma indemnização não inferior a 10000000 escudos, para reparação de danos morais sofridos. Pediu ainda que a contrapartida que lhe era paga pelo trabalho de leccionação seja considerada parte integrante da sua retribuição, e que a ré seja condenada a pagar-lhe as correspondentes diferenças na remuneração das férias e nos subsídios de férias e de Natal. Mais reclamou que sobre todas as quantias peticionadas recaíssem juros de mora, contados das datas de vencimento de cada parcela, à taxa de 10% ao ano

Aduziu, para tanto, em suma, que: (i) foi admitido ao serviço da ré em 2 de Novembro de 1977, exercendo, ultimamente, as funções de assistente de programas/realização e auferindo, como contrapartida, o salário base de 233300 escudos mensais, acrescido de 6060 escudos de subsídio de transporte, 23650 escudos de subsídio de alimentação e 42554 escudos de média mensal de remuneração de leccionação; (ii) em 27 de Abril de 1998, foi despedido na sequência de processo disciplinar que a ré lhe instaurara, mas tal despedimento deve ser declarado nulo e de nenhum efeito, pois o referido processo enferma de diversas nulidades e, além disso, os factos de que foi acusado não correspondem à verdade; (iii) ministrava cursos no Centro de Formação Profissional da empresa, fazendo regularmente uma média anual de 302 horas, que lhe eram remuneradas pela ré a 1550 escudos a hora, mas tal prestação, que rondava em média 42554 escudos por mês, nunca foi levada em consideração na remuneração de férias, nos subsídios de férias e de Natal; (iv) o despedimento causou-lhe agravamento nos padecimentos psíquicos que o afectavam, passando a ter necessidade de acompanhamento psiquiátrico e intensa medicação com ansiolíticos, antidepressivos e soníferos

A ré contestou (fls. 64 a 96), alegando em resumo o seguinte: (i) o autor não esteve afectado com doença que o impedisse de trabalhar para a RTP entre 17 e 24 de Dezembro de 1997, não tendo ido trabalhar porque não quis; (ii) por outro lado, a "baixa" apenas poderia ser concedida por um prazo de 6 dias e findo esse prazo o autor teria de consultar de novo o médico para renovação da baixa, se fosse caso disso; (iii) como, porém, o referido médico estaria de férias nessa altura, ocorreu um conluio entre o autor e o médico para atribuição ilegal de 8 dias de baixa; (iv) o despedimento do autor foi válido e legal, pois existiu justa causa de despedimento e o processo disciplinar não enferma de qualquer nulidade que o invalide; (v) em 1998, o autor já não participou em qualquer curso de formação, nem o faria mais tarde se tivesse continuado ao serviço, já que as equipas intervenientes foram mudadas e reestruturadas, cabendo à ré escolher livremente os elementos que participavam em cursos de formação; (vi) a prestação que recebeu, enquanto colaborou em acções de formação, não pode portanto ser considerada parte integrante da sua retribuição. Concluiu pela improcedência da lide e pela sua absolvição dos pedidos

Frustrada tentativa de conciliação (fls. 107), foi proferido despacho saneador (fls. 108 a 110) - que julgou improcedente a "excepção" da nulidade do processo disciplinar por terem sido usados meios de prova de que o autor não teve conhecimento, com violação do princípio do contraditório, e por a decisão punitiva assentar em factos não constantes da nota de culpa - e elaborados especificação e questionário (fls. 110 verso a 114), contra os quais reclamaram a ré (fls. 117 e 118) e o autor (fls. 120 a 123), com parcial atendimento (despacho de fls. 127 e 128). O autor interpôs recurso (fls. 129 a 135) contra o despacho saneador, na parte em que este julgou desde logo inexistentes as nulidades do processo disciplinar por ele invocadas, que foi admitido com subida diferida (despacho de fls. 172), mas, na sequência de troca das alegações destinadas a este processo com as relativas a outra acção, o autor veio desistir desse recurso (requerimento de fls. 173)

Realizada audiência de julgamento, com gravação da prova, foram dados aos quesitos as respostas constantes de fls. 222 e 223, que não suscitaram reclamações, após o que, em 14 de Janeiro de 2000, foi proferida a sentença de fls. 225 a 235, que, julgando a acção parcialmente procedente, declarou ilícito o despedimento do autor e condenou a ré a reintegrá-lo e a pagar-lhe a quantia global de 8249166 escudos, sendo 6249166 escudos de retribuições vencidas até à data da sentença e 2000000 escudos a título de indemnização por danos morais sofridos, incidindo juros de mora, à taxa legal, desde a data do vencimento de cada uma das retribuições e desde a data da sentença quanto à indemnização fixada. Já quanto aos pedidos de reconhecimento de carácter salarial da contrapartida pela leccionação em acções de formação e de pagamento das correspondentes diferenças, a sentença julgou-os improcedentes, por se tratar de tarefa estranha à relação laboral

A ré interpôs recurso de apelação desta sentença para o Tribunal da Relação de Lisboa, defendendo: (i) a alteração da decisão da matéria de facto; (ii) a existência de justa causa para o despedimento; (iii) à cautela, para a hipótese de o despedimento vir a ser julgado ilícito: (1) a irressarcibilidade autónoma dos danos não patrimoniais; (2) a fixação no 30.º dia anterior à proposição da acção (isto é, em 21 de Junho de 1998) e não na data do despedimento (2 de Abril de 1998) do termo inicial da dívida de salários intercalares; e (3) a dedução do período em que o autor esteve de baixa, durante o qual não deixou de auferir retribuições, pois a elas não tinha direito (cfr. alegações de fls. 237 a 269)

Por acórdão de 22 de Novembro de 2000 (fls. 287 a 308), o Tribunal da Relação de Lisboa concedeu parcial provimento ao recurso: (i) reduzindo para 1000000 escudos o montante da indemnização por danos não patrimoniais; (ii) relegando para execução de sentença a liquidação do valor das retribuições que o autor deixou de auferir desde o 30.º dia anterior à proposição da acção (21 de Junho de 1998) até à data da sentença (14 de Janeiro de 2000); (iii) determinando que os juros de mora só serão devidos desde a data da notificação da sentença de liquidação até integral pagamento; e (iv) confirmando, na parte restante, a sentença apelada. Relativamente ao período de baixa, o acórdão deixou consignado que a sua repercussão na determinação do montante das retribuições que o autor deixou de auferir dependia do apuramento, em execução de sentença, quer do exacto período da sua duração quer da sua motivação, pois "se se demonstrar, como parece ter sucedido, que a mesma se ficou a dever ao agravamento da depressão psíquica causada pelo procedimento da apelante, esta será responsável pelo pagamento de todos os salários que o apelado teria auferido nesse período, caso não fosse despedido e não estivesse de baixa, devendo ser devolvido à segurança social o subsídio de doença que eventualmente tenha recebido relativo a esse período"

Contra este acórdão interpuseram recursos de revista a ré, "na parte em que decaiu" (requerimento de fls. 311) e, subordinadamente, o autor, tendo este, no requerimento de interposição de recurso (fls. 315 e 316), arguido a nulidade do acórdão por excesso de pronúncia, dado ter conhecido de questão (o eventual "desconto" dos subsídios de doença nas remunerações devidas ao autor) de que não podia conhecer (por se tratar de excepção peremptória, que não é de conhecimento oficioso e que a ré não invocou na contestação), e restringido o objecto do recurso às seguintes três questões: (i) redução da reparação dos danos morais; (ii) desconto dos valores dos subsídios de doença nas remunerações vencidas posteriormente ao despedimento; e (iii) dies a quo para contagem dos juros de mora

Relativamente ao recurso independente, a ré apresentou as alegações de fls. 318 a 333, concluindo: "1.ª - Exarou-se na alínea M) da especificação que «o autor referiu ao funcionário encarregado das escalas que, por se sentir doente ..»; 2.ª - Em parte alguma a ré articulou ou assentiu neste por se sentir doente, antes sustentou que o autor não alegou (nem aparentava) estar doente, circunstância que, aliás, foi o primeiro indício em relação à pretendida falsidade do Boletim de Baixa dos autos; 3.ª - Assim, tem que se suprimir a frase por se sentir doente da matéria de facto dada como provada com base na alínea M) da especificação; 4.ª - Supressão consentida a este Supremo Tribunal pelos artigos 722.°, n.º 2, 729.°, n.ºs 2 e 3, e 730.° do Código de Processo Civil; 5.ª - A especificação não transita em julgado, ainda que não tenha sido objecto de reclamações; 6.ª - O Boletim de Baixa dos autos é manifestamente falso quando refere uma consulta ocorrida em 22 de Dezembro que nunca teve lugar; 7.ª - A realização dessa consulta que não ocorreu era imposta por normas expressas e reiteradas quanto à outorga de baixas (despacho do Secretário de Estado da Segurança Social de 27 de Setembro de 1976, publicado no Diário da República, II Série, de 6 de Outubro de 1976, e ofício circular de 29 de Abril de 1993); 8.ª - O autor procurou justificar faltas com um atestado falso, pelo que a sua conduta integra a previsão da alínea n) do n.° 2 do artigo 9.° do Decreto-Lei n.° 64-A/89, de 27 de Fevereiro; 9.ª - Na utilização do atestado falso, o autor, que dele tirava proveito e não podia ignorar a falsidade - era, desde logo, constatável pela mera leitura do documento -, agiu culposamente; 10.ª - Com a sua...

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