Acórdão nº 02A1442 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 04 de Junho de 2002 (caso NULL)
Magistrado Responsável | GARCIA MARQUES |
Data da Resolução | 04 de Junho de 2002 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:IA, e mulher B intentaram, no Tribunal Judicial de Ponta Delgada, acção de reivindicação, sob a forma ordinária, contra "C - Ldª", D e marido E e F e marido G, todos com os sinais dos autos, pedindo a condenação dos réus a reconhecer o direito de propriedade dos Autores sobre o imóvel que identificam e a fazer dele entrega. Para o efeito, alegam em síntese, o seguinte: (a) são donos e legítimos proprietários do prédio urbano sito à Rua ......; (b) os réus ocupam, sem qualquer título, o rés-do-chão do prédio dos autores e recusam-se a entregar-lhes a parte que ocupam. Contestando, alegam os réus, em resumo, o seguinte: (a) ocupam o citado rés-do-chão na sequência de um contrato promessa de arrendamento celebrado com H, mãe do autor marido, como cabeça de casal da herança indivisa aberta por óbito do seu marido, a qual declarou no mesmo estar autorizada pelos seus filhos a celebrar o referido contrato; (b) pela ocupação do locado sempre a 1ª Ré pagou e paga mensalmente as rendas; (c) foram-lhe passados recibos do pagamento das rendas, três dos quais foram preenchidos e entregues pelo 1º Autor. Os RR. pediram ainda a condenação dos AA. como litigantes de má fé, tendo deduzido também pedido reconvencional no qual pediram a condenação dos autores a reconhecê-los como arrendatários da parcela do prédio identificado na p.i. Fundamentam a pretensão no facto de o contrato promessa de arrendamento consubstanciar um verdadeiro contrato de arrendamento, apenas faltando a sua formalização nos termos da lei, ou seja, a celebração de escritura, e ainda na circunstância de os autores terem reconhecido o arrendamento através da assinatura dos recibos de renda. Os réus requereram ainda a intervenção acessória provocada de H, para intervir como auxiliar na defesa. Replicando, os AA. alegaram que não podem ser compelidos a celebrar com os réus qualquer contrato de arrendamento, uma vez que, a isso, jamais se comprometeram. Mais alegam que os RR. nada pagam aos AA. a título de renda, já que inexiste qualquer contrato de arrendamento comercial, ou promessa dele, validamente celebrado entre estes e aqueles. Depois de admitida a intervenção acessória provocada de H (fls. 77), veio esta, depois de citada, contestar, alegando, em síntese, que celebrou o contrato promessa de arrendamento comercial na qualidade de cabeça de casal, tendo-o feito, porém, contra a vontade dos seus filhos que não pretendiam ver o local arrendado (fls. 81). Por despacho de fls. 95, foi decidido que a chamada não podia assumir uma atitude que estivesse em oposição com os assistidos, no caso os réus, não podendo, por isso, tomar-se em consideração o alegado pela chamada. Realizada a audiência preliminar, foi, em 24-01-2001, proferido saneador sentença no qual se conheceu das excepções deduzidas, do pedido reconvencional e do mérito da causa, tendo, a final, sido proferida decisão que: a) reconheceu o direito de propriedade dos AA. sobre o prédio em apreço; b) condenou os RR. na restituição aos AA. do rés-do-chão do referido prédio; c) absolveu os AA. do pedido de condenação como litigantes de má fé; d) absolveu os AA. do pedido reconvencional. Inconformados, apelaram os RR., tendo, porém, o Tribunal da Relação de Lisboa, por acórdão de 22-11-2001, embora com fundamentos diversos dos da decisão recorrida, julgado improcedente a apelação. Continuando inconformados, trazem os RR. a presente revista, oferecendo, ao alegar, as seguintes conclusões: 1. O acórdão recorrido aplicou erradamente o artigo 236º do Código Civil, ao interpretar o contrato de fls. 38 e 39 de acordo com esses critérios. 2. Não existem elementos suficientes para interpretar o contrato da forma como o Tribunal recorrido interpretou, existindo largas dúvidas sobre as intenções das outorgantes e seus objectivos. 3. Ao entender que é habitual as partes denominarem renda a uma contrapartida pecuniária, não ponderou que é habitual as partes denominarem trespasse ao pagamento da saída do anterior arrendatário. 4. Se houvesse trespasse não havia necessidade de celebrar contrato de arrendamento pois o mesmo é um direito que acompanha os elementos que integram o estabelecimento e, havendo alteração do ramo do comércio, como existiu no caso concreto, não há trespasse. 5. Existindo dúvidas, como existem, deveria o Tribunal recorrido ter aplicado o artigo 237º do Código Civil que consagra um princípio geral de direito, estabelecendo a lei um critério para a interpretação dos contratos jurídicos em casos de dúvida. 6. Deveria o Tribunal recorrido ter considerado que, atento o decurso de tempo decorrido e o comportamento do A. marido perante as RR., ao emitir recibos de renda e recebido a mesma, esta (sic) criou nas RR. a expectativa de não vir a ser exercido qualquer direito contra estas, pelo que o direito à acção de reivindicação constitui abuso de direito e é ilegítima a sua invocação por parte dos AA. contra as RR. 7. A pretensão dos AA. na reivindicação do locado, alegando ocupação não titulada, viola os princípios basilares da boa-fé contratual, visto terem reconhecido tacitamente o arrendamento, constituindo essa reivindicação abuso de direito, devendo intervir a proibição de "venire contra factum proprium". Termos em que os Recorrentes pretendem a procedência do recurso, com a aplicação do artigo 237º do C.C. na interpretação do contrato de fls. 38 e 39. Mais vêm pedir a atribuição de efeito suspensivo ao recurso. Contra-alegando, os AA. pugnam pela manutenção do julgado. Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.IISão os seguintes os factos dados como provados pelas instâncias: 1 - Os AA. são donos do prédio sito à Rua ...., inscrito na matriz predial da freguesia da Matriz, sob o artigo 211, por o terem adquirido em partilha de 30-04-99, por óbito de I, casado com H, registada na C.R.P. de Ponta Delgada a 11-05-99 - cfr. doc. de fls. 3 a 13; 2 - A 1ª Ré "C - Corta e Penteia, Ldª" é uma sociedade comercial que se dedica à actividade de corte e penteado de cabelos, bem como à execução de todo e qualquer serviço ou a comercialização de produtos ou bens relacionados com tal actividade e de bijuteria, produtos em pele e afins e ainda a representações; 3 - As 2ª e 3ª rés mulheres são as únicas sócias e gerentes da 1ª ré; 4 - Na qualidade de gerentes e em representação da 1ª ré, as 2ª e 3ª rés mulheres, em 17 de Junho de 1997, celebraram um contrato denominado de contrato promessa de arrendamento comercial, como promitentes locatárias - tudo conforme documento de fls. 38 e 39, que no mais se dá por integralmente reproduzido; 5 - Como promitente locadora e na qualidade de cabeça de casal numa herança indivisa H celebrou o contrato promessa de arrendamento com a 1ª ré; 6 - A promitente locadora declarou estar autorizada pelos seus filhos a celebrar o referido contrato; 7 - A primeira ré ocupa o locado, na sequência da celebração do contrato promessa de arrendamento, conforme estipulado na cláusula 11ª do contrato mencionado em 4.; 8 - Pela ocupação do rés-do-chão mencionado em 1), a 1ª ré pagou mensalmente as quantias mencionadas nos documentos de fls. 40 a 66 dos autos; 9 - A 1ª ré pagou as quantias mencionadas nos documentos de fls. 64 a 66 dos autos, os quais foram assinados e entregues às rés pelo 1º autor.IIIQuestão prévia: Considerando que o recurso de revista só tem efeito suspensivo em questões sobre o estado de pessoas (artigo 723º do C.P.C.), o que não é o caso, foi fixado ao recurso efeito meramente devolutivo. Como se sabe, o âmbito objectivo do recurso é definido pelas conclusões do recorrente (artigos 684º, nº 3, e 690º, nº 1, do C.P.C.), importando, assim, decidir as questões nelas colocadas - e, bem assim, as que forem de conhecimento oficioso -, exceptuadas aquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras - artigo...
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