Acórdão nº 02B2170 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 19 de Setembro de 2002 (caso NULL)
Magistrado Responsável | OLIVEIRA BARROS |
Data da Resolução | 19 de Setembro de 2002 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1. Litigando com benefício de apoio judiciário na modalidade da dispensa de preparos e do pagamento de custas, A, B, e C, o primeiro por si e na qualidade de curador provisório, como tal depois nomeado e ajuramentado, de sua mãe D, intentaram, em 9/2/98, acção declarativa com processo comum na forma sumária contra a Companhia de Seguros E, S.A., destinada a exigir a responsabilidade civil emergente de acidente de viação ocorrido em 20/1/97, pelas 20,15 horas, em Reparede, Gondifelos, Vila Nova de Famalicão, de que resultou a morte de F, marido da A. e pai dos demais AA, colhido pelo veículo ligeiro de mercadorias de matrícula QG. Pediram a condenação da seguradora demandada a pagar-lhes indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais causados por esse acidente no montante global de 35723000 escudos, acrescido dos juros legais a partir da citação. Distribuída esta acção ao 2º Juízo Cível da comarca de V.N. Famalicão, foi contestada. Lavrado despacho unitário de saneamento e condensação, a causa foi instruída mediante, no meadamente, deprecada expedida à comarca de Guimarães. Entretanto falecida a A., foi substituída pelos demais AA, seus filhos e únicos herdeiros, como tal habilitados através do competente incidente. Por fim iniciada a audiência de discussão e julgamento, a instância foi suspensa, ao abrigo do art.279º, nº4º, CPC, com vista a acordo que não se concretizou. Após julgamento, foi, em 28/5/2001, proferida sentença que, considerando, a um tempo, não poder concluir-se, em vista dos factos provados, pela atribuição de culpa a qualquer dos intervenientes no acidente em questão, a outro, o disposto no art.503º, nº1º, C.Civ., e, por fim, ocorrerem danos, nela discriminadamente avaliados, a que corresponderia indemnização de montante - 33100000 escudos - muito superior ao dobro da alçada da Relação ao tempo do acidente (que, consoante art. 20º, nº 1º, da Lei nº 38/87, de 23/12, era de 2000000 escudos), condenou a Ré, em vista do art.508º, nº1º, 1ª parte, C.Civ., a pagar aos AA a quantia, a dividir em igualdade pelos mesmos, de 4000000 escudos, com juros, à taxa legal sucessivamente vigente, desde 6/3/98, data da citação, até integral pagamento, absolvendo-a do mais pedido. A Relação negou provimento à apelação dos AA. 2. Pedem os mesmos, agora, revista dessa decisão, formulando, a finalizar a alegação respectiva, as seguintes conclusões : 1ª - O acidente dos autos decorre de conduta negligente, embora negligência inconsciente, do condutor do veículo atropelante e segurado na recorrida, tal como acaba de ser reconhecido pela sentença de 13/3/2002 que o condenou no processo crime. 2ª - O art.508º, nº1º, C.Civ. está tacitamente revogado, vigorando na nossa ordem jurídica, por virtude dos tratados firmados pela República Portuguesa, a Segunda Directiva 84/5/CEE do Conselho, relativa à aproximação das legislações dos Estados membros respeitantes aos seguros da responsabilidade civil que resulte da circulação de veículos automóveis. 3ª - Deverá ser arbitrada aos recorrentes a indemnização correspondente aos danos que estes efectivamente sofreram, no montante de 33100000 escudos. Houve contra-alegação, e, corridos os vistos legais, cumpre decidir. 3. Convenientemente ordenada, e com, entre parênteses, indicação das correspondentes alíneas e quesitos, a matéria de facto fixada pelas instâncias é, apenas, a seguinte: ( a ) - Em 20/1/97, pelas 20,15 horas, ao Km 15,900 da EN 206, no lugar de Reparade, freguesia de Gondifelos, Vila Nova de Famalicão, em local em que a faixa de rodagem é ladeada por bermas, o veículo automóvel ligeiro de mercadorias de matrícula QG, conduzido por G no sentido Póvoa do Varzim-Vila Nova de Famalicão, embateu em (colheu) F, que seguia a pé (caminhava ) em sentido contrário, pelo lado esquerdo (dessa via), atento o sentido de marcha Vila Nova de Famalicão - Póvoa de Varzim ( D, 1º, 2º, 3º, 10º, e 12º ). ( b ) - Era de noite ( 13º ). ( c ) - O condutor do veículo referido apercebeu-se de que à sua frente, a uma distância concretamente não determinada, caminhava, em sentido contrário ao seu, um vulto ( 8º). (d) - Após ter sido colhido, o peão caiu sobre o "capot" do veículo, sendo levado em cima deste por alguns metros, após o que ficou caído (prostrado) na berma ( 4º e 14º). ( e ) - Como consequência directa e necessária deste acidente, F sofreu ferimentos, que lhe causaram a morte ( E ). ( f ) - À data do seu falecimento, F contava 58 anos de idade (doc. a fls. 6.; F ) ( g ) - Era um homem saudável e trabalhador ( 22º). ( h ) - Era agricultor, explorando terras próprias e fazendo outras de renda (16º). ( i ) - Tinha uma vacaria, onde normalmente tinha mais de 30 cabeças de gado, explorando o leite das vacas e também carne (17º). ( j ) - Explorava bem assim a vinha, colhendo normalmente dezenas de pipas de vinho de qualidade ( 18º). ( l ) - Semeava e colhia milho, batatas e outros produtos hortícolas (19º). ( m ) - No exercício da sua actividade profissional, auferia, em média, uma quantia não inferior a 400000 escudos mensais ( 21º ). ( n ) - Era um homem respeitado e estimado, não só na freguesia - era o Presidente da Assembleia de Freguesia -, como no meio agrícola, desempenhando funções na Cooperativa Agrícola e na Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de Vila Nova de Famalicão ( 20º). ( o ) - A morte de F provocou nos AA, sua mulher e filhos, sofrimento moral e tristeza ( 23º). ( p ) - Deixou de haver alegria na casa ( 24º). ( q ) - A A. D era a viúva de F, e foi casada com ele em únicas núpcias de ambos e sob o regime da comunhão geral de bens ( doc.a fls. 8 a 10 ; B ). ( r ) - Os AA A, B e C são os únicos filhos de F, falecido a 20/1/97 (docs. a fls. 8 a 10 ; A ). ( s ) - Os AA são os únicos e universais herdeiros de F, que faleceu sem ter deixado testamento ou qualquer outra disposição de última vontade (doc. a fls. 8 a 10 ; C ). ( t ) - Por contrato de seguro titulado pela apólice nº 01171196, encontrava-se transferida para a R. a responsabilidade civil por todos os danos patrimoniais e não patrimoniais causados a terceiros com o veículo de matrícula QG ( doc. a fls. 28 ) ( G ). 4. A questão da culpa : 4.1. A culpa do segurado da recorrida é, nomeadamente, feita assentar na versão do acidente adiantada na contestação, no que respeita à distância - 10 metros - a que o condutor do veículo terá avistado o sinistrado. Avulta, assim, de imediato, a consideração também da afirmação nesse articulado de que o sinistrado se encontrava na faixa de rodagem, em contravenção do preceituado no art.102º CE 94 (1), e o princípio da indivisibilidade da confissão estabelecido no art.360º C.Civ. Admitida agora ( como, aliás, a sobredita distância inculca ), a inexistência de excesso de velocidade absoluto ( pois, ainda quando considerado situar-se o local do acidente dentro de localidade, não se mostra que aquela fosse superior a 50 km/hora - v. nº1º do art.27º CE 94 ), sobra, no que a eventual excesso relativo se refere ( idem, arts.24º, nº1º, e 25º, nº1º, als.c) e, porventura, f) ), a comum consideração de que não é exigível a quem circula em via pública que conte com a imprudência alheia (2),: dando qualquer embate, normalmente, lugar a natural perturbação e consequente perda do controlo da...
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