Acórdão nº 02P2930 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 30 de Outubro de 2002

Magistrado ResponsávelLOURENÇO MARTINS
Data da Resolução30 de Outubro de 2002
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça: I 1. No P.º comum n.º 291/01, do 3º Juízo Criminal de Matosinhos, mediante acusação do Ministério Público foram submetidos a julgamento pelo Colectivo: A, B, C, e D, todos ids. nos autos, tendo sido condenados, por acórdão de 27.11.2001, pela prática em co-autoria de um crime de tráfico de estupefacientes, agravado, pp. pelos artigos 21º, nº1, e 24°, alínea c), do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, em oito anos de prisão o primeiro e onze anos de prisão cada um dos restantes, estes ainda na pena acessória de expulsão, pelo período de dez anos. Daquele acórdão condenatório recorreram para a Relação do Porto os arguidos B e D, tendo-lhes sido negado provimento aos recursos interpostos, e confirmada inteiramente a decisão recorrida, por douto acórdão de 24.02.02. 2. De novo inconformado, recorre D, concluindo assim a sua motivação (transcrição): "1- O recorrente D, atento à matéria dada como provada, designadamente o facto de o arguido ter chegado num momento posterior ao acordo entre os restantes co-arguidos para proceder à importação do produto estupefaciente, atento ao facto de nenhum dos restantes co-arguidos à excepção do C ter com eles mantido qualquer contacto, ser claro no douto acórdão que o produto estupefaciente era para ser entregue ao arguido C, que o arguido D não praticou qualquer acto de execução para que o produto estupefaciente chegasse a Portugal, limitando-se única e exclusivamente a no dia da detenção acompanhar o arguido B, pelo que , 2- O arguido D participou no crime do arguido C, prestando-lhe um auxilio material. Esse crime podia ter sido cometido sem a participação do arguido D e porque não se provou que este tivesse acordado previamente e concertado esforços para a entrega de estupefacientes com os demais co-arguidos, não é aquele autor daquele crime, relativamente ao qual não tem o domínio do facto, nem lhe deu "causa", no sentido de relação entre o evento e o comportamento ou seja no sentido de causalidade adequada adoptado no nosso ordenamento jurídico, no artigo 10º do C.P. 3- A sua conduta apenas se pode subsumir ao artigo 21º do D.L 15/93 de 22-01 conjugado com o artigo 10º do C.P. 4- A pena, além da sua necessidade terá que ter em conta as exigências individuais e concretas de socialização do agente, sendo certo que na sua determinação ter-se-á que entrar em linha de conta que se deve evitar a dessocialização do agente 5- Face aos critérios legais, arts. 70º, 71º do C.P.P, o recorrente deveria ser punido, por tal crime em medida não superior a 4 anos e 6 meses de prisão. 4-A decisão recorrida violou os arts., 10º, 40º, 70º, 71º do C.P, arts. 21º do DL 15/93 de 22-01, 6- Pelo que deve ser revogada, nos termos sobreditos" O recorrente repete junto deste Supremo Tribunal, ipsis verbis (1), o que disse no recurso para o Tribunal da Relação. Respondeu o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto na Relação do Porto, a defender a improcedência do recurso dada a boa fundamentação do acórdão recorrido, não abalada pela motivação do recorrente. 3. Já neste STJ, o Ex.mo Representante do Ministério Público, nada opôs ao prosseguimento do recurso, que se ordenou. Colheram-se os vistos legais. Procedeu-se à audiência a que se refere o artigo 423º do Código de Processo Penal, com observância do formalismo respectivo, tendo sido produzidas alegações orais. Cumpre ponderar e decidir. II Vejamos a matéria de facto considerada provada na 1.ª Instância e não modificada pela Relação. "Em data não apurada do ano de 1999 o arguido A que residia na Colômbia como emigrante, foi abordado por pessoa de identidade não apurada, que se lhe apresentou como sendo E, que lhe propôs procederem, em Portugal, à importação de produtos estupefacientes. Este dito E, cidadão de nacionalidade colombiana, mencionou ao arguido A que em momento posterior haveria de ser contactado em Portugal por um cidadão holandês, de diminutivo Ben (o C), que seria o responsável pela distribuição da droga, cabendo ao A apenas a sua importação. Na sequência desse acordo firmado com o tal E, o arguido A em data indeterminada do mês de Março ou de Abril de 1999, por via aérea, deu entrada em Portugal, na companhia de sua filha, com a finalidade de aqui permanecer para pôr em prática a importação da droga, fixando residência, inicialmente, na habitação da sua mãe, sita em Estarreja. E em data indeterminada, em finais de Junho de 1999, o arguido A contactou com R, solicitando-lhe um encontro, a efectuar nesta cidade e comarca do Porto, com a finalidade de dar início à documentação necessária para a constituição de uma sociedade, cujo objecto social fosse o import-export. Este encontro acabou por se realizar, não na cidade do Porto, mas na cidade de Espinho, tendo ficado combinado que em vez de ser constituída uma nova sociedade, o arguido A adquiriria, através da cessão de quotas, a sociedade designada por "..., Lda.", da qual o F era um dos sócios, despendendo a importância de 1.000.000$00 (um milhão de escudos), pelo pagamento das cotas da sociedade referida. De acordo com o acordado, em 30 de Julho de 1999, no Cartório Notarial de Ílhavo, foi celebrada a escritura de cessão de quotas e alteração da pacto, conforme consta da certidão junta a fls. 107 e seguintes dos autos, passando a sociedade a adoptar a designação de "... - IMPORTAÇÃO E EXPORTAÇÃO, LDA.", com sede no lugar do Campo, freguesia de Beduido, Estarreja. Na posse de duas fotocópias da escritura acima referida, requisitadas ao Cartório Notarial competente, pelas quais efectuou o preparo da quantia de 1.000$00 (mil escudos), conforme consta do documento junto a fls. 100 dos autos, o arguido A requereu, na Conservatória do Registo Comercial de Estarreja, o registo da nova firma, para Estudo e Organização do Processo Pré-Registral, entregando uma das fotocópias da escritura de alteração do pacto social, um certificado de admissibilidade de firma ou denominação e declaração de início de actividade, conforme consta dos documentos juntos a fls. 99, 101, 102 e 103 dos autos. Para melhor possibilitar os contactos telefónicos necessários para concretizar o plano, o arguido A adquire dois telefones celulares com os números 91-...... e 91-....., números estes de que dá conhecimento ao dito E. Continuando a dar seguimento ao acordo estabelecido, o arguido A em 1 de Setembro de 1999, celebra com X, devidamente identificada a fls. 2578 dos autos, o contrato de arrendamento para habitação, de duração limitada, por um período de um ano, junto a fls. 814 e seguintes dos autos, no qual toma de arrendamento o prédio urbano sito na Avenida Sacadura Cabral, 3180, na freguesia de Arcozelo, concelho de Vila Nova de Gaia, despendendo a importância de 140.000$00 (cento e quarenta mil escudos) mensal, a título de renda. Na posse da habitação acima referida, o arguido A entra em contacto com o arguido B, que se encontrava na Colômbia, solicitando-lhe que se deslocasse para Portugal, a fim de o poder ajudar no desenvolvimento da actividade criminosa a que se propunha. Estas informações são igualmente transmitidas ao já referido E, de molde a que este pudesse começar ou a acelerar o envio do produto ou substância estupefaciente, uma vez que se encontravam reunidas as condições necessárias e objectivas para que o plano criminoso fosse bem sucedido. Acedendo à solicitação do arguido A o co-arguido B viajou, via aérea, no dia 24 de Outubro de 1999, da Colômbia para Madrid, onde aterrou, no aeroporto de Barajas, no dia 25 de Outubro do mesmo ano, conforme consta dos carimbos apostos no seu passaporte e cuja fotocópia se encontra junta a fls. 215 dos autos. Em Madrid, o arguido B permaneceu dois dias, acabando por aterrar no aeroporto Francisco Sá Carneiro, na comarca da Maia, no dia 27 de Outubro desse mesmo ano. Neste aeroporto, o arguido B tinha à sua espera o arguido A que se encontrava acompanhado da sua filha, tendo viajado de táxi para uma das estações dos Caminhos de Ferro existentes nesta cidade, onde apanharam um comboio que os transportou até à residência, sita na Granja, que, como já acima referimos, se encontrava ocupada por este arguido. Após a sua chegada, o arguido B passou a acompanhar o arguido A, a fim de prestar toda a colaboração necessária para levar a bom termo o plano previamente estabelecido. Para dar uma maior credibilidade à firma constituída, os arguidos A e B, no dia 30 de Novembro de 1999, dirigiram-se à firma "... & ...., Lda.", titular de um Centro MBE, sito na Rua 25, 177, em Espinho, onde o arguido A em representação da firma "... Importação & Exportação, Lda.", celebrou um contrato de prestação de serviços de Caixas Postais Mails Boxes, Etc., por um prazo de um ano, sendo-lhe atribuído a Caixa Postal com o nº169, conforme consta da fotocópia do respectivo contrato junta a fls. 192 dos autos, pela qual despendeu a quantia de 18.000$00 (dezoito mil escudos), acrescida de uma caução no montante de 5.000$00 (cinco mil escudos) e, simultaneamente, solicitou a efectivação de um carimbo em tudo similar àquele que se encontra impresso a fls. 761 dos autos, e de cartões de visita da mesma firma, em tudo iguais aos que se encontram juntos a fls. 87 dos autos, nos quais constavam a denominação da firma, sede social, número de contribuinte e números de telefones celulares, para possíveis contactos. Em finais de Novembro de 1999, o dito E, a solicitação dos arguidos A e B e na sequência do plano estabelecido, remeteu um fax, para a Caixa Postal - Mail Boxe - alugada, no qual vinham descritas as características do produto alimentar - farinha exportada da Venezuela, cuja fotocópia se encontra junta a fls. 118 dos autos, documento este absolutamente necessário para proceder ao desalfandegamento de tal mercadoria. Simultaneamente e na sequência de um anúncio publicado no "Jornal de Notícias" do Porto, por G, devidamente identificado a fls. 873 dos autos, no qual pretendia alugar um armazém, sito na Rua Agostinho...

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