Acórdão nº 02P3735 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 03 de Julho de 2003 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelCARMONA DA MOTA
Data da Resolução03 de Julho de 2003
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: Contencioso do Conselho Superior da Magistratura Recorrente: Cons. A Redistribuição ao actual relator: 07Abr03 1. A PUNIÇÃO DISCIPLINAR No processo disciplinar nº. 23/2001 do CSM, o Conselheiro A foi disciplinarmente condenado, pelo Plenário do CSM, em 09Jul02, na pena de «advertência»: O Exmo. Juiz Conselheiro B, vogal do Conselho Superior da Magistratura, participou disciplinarmente do Exmo. Juiz Conselheiro A, nos termos da participação de fls. 2 dirigida ao Conselho Superior da Magistratura, a seguir reproduzida parcialmente: "No passado dia 5 (de Janeiro de 2001), na Casa de ..., em Vila Nova de Gaia, momentos antes de se iniciar o almoço de homenagem ao Senhor Presidente da Relação do Porto, Desembargador C - que amanhã vai completar 70 anos de idade - avistei o Senhor Conselheiro A que já não encontrava há muito tempo, e por isso a ele me dirigi, dizendo: «Olá, Dr. A, como está?»; estendi-lhe a mão que ele apertou, mas não me disse qualquer palavra, virou-me as costas e afastou-se. Fiquei surpreendido e chocado. Sabia que após a última graduação para o Supremo Tribunal de Justiça, e, provavelmente por discordar do seu posicionamento, o Senhor Conselheiro A tinha deixado de cumprimentar o Vogal deste Conselho Desembargador D. Mas eu sempre disse que não acreditava que também tivesse comigo comportamento semelhante. Na verdade, trabalhámos juntos vários anos (primeiramente num mesmo Juízo Cível, na 1ª Instância, e depois na mesma Secção do Tribunal da Relação do Porto) e sempre tivemos um muito bom relacionamento, com sincera amizade e simpatia pela minha parte, e que, pelo menos aparentemente, do mesmo modo eram retribuídas, relacionamento que se manteve depois de eu ter sido promovido ao Supremo. Assim, dirigi-me de novo ao Senhor Conselheiro A perguntando-lhe que mal eu lhe tinha feito para me tratar daquele modo. A resposta veio em forma de pergunta: «O Senhor Dr. faz parte do Conselho, não faz?» Respondi afirmativamente, e então ele disse-me textualmente: «Para mim todos os elementos do Conselho são uns filhos da puta», e acrescentou que lhe tinham esmagado uma vida inteira de trabalho. Tenho a certeza que foram rigorosamente aquelas as palavras da primeira frase que referi, mas só posso afirmar, relativamente à segunda, que a ideia era essa. Consegui conter-me, apenas lhe tendo dito que acabara de proferir gravíssimo insulto para mim e para todos os meus colegas do Conselho; que era malcriado; e que iria comunicar a ocorrência ao Conselho. De imediato pedi a dois Colegas que estavam perto para se aproximarem (os Desembargadores da Relação do Porto E e F) e na frente de cada um deles repeti tudo o que acontecera e o insulto proferido, pedindo ao senhor Conselheiro A para confirmar se era exactamente assim; mas nada disse, refugiando-se no silêncio". O Conselho instaurou processo disciplinar (...). Ouvidos preliminarmente o participante e o arguido, o primeiro confirmou o teor da sua participação, acrescentando que lhe parecera o Sr. Conselheiro A "perfeitamente calmo" na altura do incidente, e comunicando que não apresentara nem tencionava apresentar queixa crime, embora tivesse ficado, e continuasse, "muito profundamente ofendido com as palavras proferidas e extremamente chocado pessoal e profissionalmente - nomeadamente na qualidade de Vogal do Conselho Superior da Magistratura -, não podendo mesmo evitar sentir enorme vergonha e tristeza de ter um Colega Conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça capaz de uma atitude tão baixa e reprovável" (a fls. 60 dos autos). Por seu turno, o participado pronunciou-se também por escrito sobre a matéria da participação, confirmando que o participante se dirigira ao participado para lhe pedir explicações sobre o cumprimento por aquele feito como se fosse "por favor" e que houve em seguida uma "conversa privada, a dois". A reacção do participante teria sido completamente despropositada, inquirindo, "muito agitado" se o participado o estava a querer ofender. Ameaçou que ia fazer queixa do participado e pretendeu que este repetisse perante testemunhas o que lhe tinha dito. O participado negara-se a confirmar perante terceiros "o que era uma conversa particular". Face à afirmação de outros Colegas de que nada tinham ouvido, o participante sentiu-se desgostado e indignado, tendo optado pelo silêncio. E acrescentou: "selectiva a pretensa textualidade rigorosa de participação, o declarante nega ter proferido a expressão que nela lhe é imputada entre aspas" (a fls. 59 dos autos). O magistrado instrutor dirigiu ofícios aos restantes membros do Conselho Superior da Magistratura, solicitando-lhes que dissessem o que se lhes oferecesse sobre os factos descritos na participação, que esclarecessem se tinham apresentado queixa crime pelos ditos factos ou, caso não o tivessem feito, se admitiam vir a fazê-lo e que indicassem quaisquer meios de prova que julgassem pertinentes. As respostas a estes ofícios acham-se a fls. 50 a 58, 61 a 66, 73 a 74, 77 e 78. Importa destacar a resposta do Vogal do Conselho Desembargador D, o qual referiu na sua resposta que, sendo Colega de secção do Participado na Relação do Porto ao tempo em que foi publicada a graduação dos concorrentes ao concurso de acesso ao Supremo Tribunal de Justiça no ano de 2000, o mesmo Participado deixara de lhe falar, sendo certo que não tinha havido qualquer outra razão "para o Senhor Conselheiro A deixar de me falar que não fosse o facto de eu pertencer àquele órgão e ter participado na deliberação que graduou os candidatos para acesso ao STJ" (a fls. 53). Ainda na mesma resposta, o Desembargador D referiu ter estado presente no almoço de 5 de Janeiro de 2001, onde ocorrera o incidente objecto da participação, e ter-lhe sido relatado pelo próprio Participante o conteúdo da conversa havida entre este e o Participado. Ainda nesta fase liminar, foram ouvidos por escrito os Desembargadores C, E e F. O primeiro, a fls. 49, declarou não ter presenciado, nem de perto, nem de longe, os factos constantes de participação, por ocasião do almoço da sua despedida, por motivo de jubilação, tendo tido conhecimento por lhe terem sido contados pelo Participante. Sendo amigo do Participante e do Participado, considera a linguagem e o temperamento deste último "dentro da normalidade de qualquer magistrado". Os outros dois magistrados inquiridos foram os que o Participante abordou para que testemunhassem o que teria ocorrido na conversa entre este e o Conselheiro A. O Desembargador E refere que, na sua presença, o Participante referenciou ao Participado que este "havia acabado de dizer que «para mim os Elementos do Conselho são uns filhos da puta». Perguntou-lhe, directamente, se foi o que tinha dito, não tendo obtido qualquer resposta" (a fls. 68). Declarou ainda não ter notado qualquer perturbação no estado de espírito do Participado, quando lhe fora pedida a confirmação da frase perante testemunhas. Também declarou nunca se ter apercebido de que o Participado adoptasse um "comportamento de linguagem imprópria". Afirma ainda que é sua convicção "de que o episódio ocorrido se ficou a dever ao facto do Senhor Conselheiro A ter ficado agastado com a sua graduação para o Supremo Tribunal de Justiça". O Desembargador F relata, por seu turno, ter sido chamado pelo Participante para testemunhar o pedido de confirmação pelo Participante da frase que lhe imputou, sendo certo que este, confrontado com a mesma, nada disse. Repetida a mesma frase pelo Participante, o Participado "manteve-se em absoluto silêncio, colocando sempre o olhar no horizonte (distante)" (fls. 70). Esclareceu ainda não ter relações pessoais de proximidade com o Participado, sem prejuízo de as relações profissionais mantidas no Tribunal da Relação "sempre se terem revelado, do ponto de vista do depoente, merecedoras do maior respeito e consideração". Em 18 de Abril de 2001, o magistrado instrutor elaborou a acusação, descrevendo as circunstâncias de tempo e lugar em que ocorreram os factos disciplinarmente relevantes. Transcrevem-se os nºs. 15º a 17º dessa peça: "15º A conduta do arguido atrás descrita, tendo em atenção a natureza dos bens por ela directamente ofendidos, é subsumível, uma vez no artº. 181º, nº. 1, e dezasseis vezes, no artº. 180º, nº. 1, este e aquele do Cód. Penal. 16º Constituindo-o autor material de dezassete infracções disciplinares, previstas e punidas nos termos das disposições conjugadas dos artºs. 81º, 82º, 85º, al. d), 94º, nº. 1, e 131º do Estatuto dos magistrados Judiciais (EMJ) e 3º, nºs. 1, 4, al. f) e 10º do Estatuto Disciplinar dos Funcionários e Agentes da Administração Central, Regional e Local (EDFAACRL). 17º Contra o arguido milita a circunstância agravante da acumulação de infracções - artºs. 99º do EMJ e 31º nºs. 1, al. g), e 4 do EDFAACLR." (a fls. 83). O Arguido apresentou a sua defesa (a fls. 85 a 88 v.º), considerando terem os autos de processo disciplinar "por base uma participação que deturpa o que na realidade aconteceu e para que se tentou arranjar uma qualquer prova. Daí processo, acusação, e proposta pena que, a quem, com 32 anos de carreira, sem nunca (ter) um qualquer processo disciplinar, e que sempre viveu do e para o seu trabalho, deixa sem qualquer outro comentário que não seja o mais vivo repúdio" (a fls. 88 v.º). Na mesma peça, o Arguido afirma ser forçado a "advogar em causa própria", declarando que, ao contrário do participante, "não tem ligações políticas, corporativas ou familiares relevantes", considerando que "dificilmente será equitativo processo instruído por um amigo do irmão de quem subscreve a participação que lhe deu lugar: este, como se verá, está longe de ser o processo equitativo a que qualquer pessoa tem direito" (a fls. 85). Afirmando a relação de confiança por parte do Arguido face ao Participante, colega mais velho, o Arguido declara que tinha sido devido a essa relação de confiança que dera, "em conversa particular, a explicação que lhe era...

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