Acórdão nº 03B2841 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 18 de Dezembro de 2003 (caso NULL)
Magistrado Responsável | SANTOS BERNARDINO |
Data da Resolução | 18 de Dezembro de 2003 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1. O MºPº, ao abrigo das disposições conjugadas dos arts. 36º, n.os 1, 3 e 4 do Dec-lei 322/82, de 12 de Agosto, e 87º-a), 88º-a), 89º-b), 90º e 91º/1.a) do Cód. do Registo Civil, intentou pelo Tribunal da Relação de Lisboa, em requerimento instruído com os elementos de prova ao seu alcance e apresentado na Conservatória dos Registos Centrais, contra A, representada por seus pais B e C, acção de justificação judicial, para declaração de nulidade e cancelamento dos registos de atribuição da nacionalidade portuguesa e de nascimento da requerida. A instrução do processo teve lugar na Conservatória dos Registos Centrais, tendo a requerida apresentado contestação, em que impugna os factos alegados pelo MºPº e conclui pela improcedência da acção. Concluída a instrução, o Ex.mo Conservador lançou no processo a sua informação sobre a atendibilidade da pretensão - pronunciando-se no sentido de dever ser a acção julgada procedente - e ordenou a remessa dos autos a juízo para julgamento. Recebidos os autos na Relação, aí foi oportunamente proferido acórdão que julgou procedente a acção, "declarando-se a nulidade por falsidade e determinando-se o cancelamento do registo de nascimento com o n.º 5140 de 1991 de A". Deste acórdão foi, pela requerida, interposto recurso de apelação. Na sua alegação recursiva, a recorrente formula as seguintes conclusões: 1ª - A nacionalidade portuguesa da mãe da recorrente foi mantida pelo Estado Português, através das autoridades para tanto competentes, em data posterior à da entrada em vigor do Dec-lei 308-A/75; 2ª - Este diploma lembrava aliás expressamente que a Lei da Nacionalidade em vigor era a Lei 2098, ao abrigo da qual a mãe da recorrente declarou querer continuar a ser nacional portuguesa, o que lhe foi reconhecido; 3ª - Não pode pois agora o mesmo Estado - ademais volvidas quase três décadas - pretender vir retirar aquilo que concedeu; 4ª - Além de não considerar o que se acabou de consignar, o acórdão recorrido fez uma aplicação meramente literal do preceito do art. 4º desse Dec-lei 308-A/75, com ofensa de outras regras da Lei da Nacionalidade Portuguesa e dos princípios de direito internacional que confluem na matéria; 5ª - De facto, deveria ter convocado a regra do art. 31º da Lei 37/81 e reconhecido a relevância da declaração de vontade de quem, quando se propicia a aquisição de uma outra nacionalidade, opta por querer continuar nacional português; 6ª - Na segunda perspectiva apontada, a própria Declaração Universal dos Direitos do Homem consagra o direito de todo o indivíduo a ter uma nacionalidade; direito que os Estados só podem afastar, no que a cada um diz respeito, existindo motivos fundados e que não ponham em causa - de forma absoluta - a existência de tal direito; 7ª - E, mesmo que se não admitisse que tal princípio reveste a natureza de um princípio de direito internacional geral ou comum, sempre seria caso de sua consideração, nos termos do art. 16º/2 da Constituição, como parâmetro de integração dos preceitos constitucionais e legais relativos a direitos fundamentais; 8ª - O invocado art. 4º do Dec-lei 308-A/75 sempre teria pois de ser interpretado no sentido de que deve ser preservada a nacionalidade portuguesa quando as circunstâncias do caso concreto apontam para a inaceitabilidade de uma sua automática aplicação; 9ª - E dúvida não há sobre ser o presente caso um dos que rejeita tal automatismo, considerada a clara vontade expressa pela mãe da recorrente, o facto de nenhuma ligação ter com o país em que nasceu, a circunstância de nunca ter sido posta em causa, de 1975 até ao presente, a sua nacionalidade portuguesa, e o facto de, tendo recusado a nacionalidade do seu marido, ser consequência inevitável da decisão recorrida a de ser colocada numa situação de apatridia; 10ª - Por qualquer destas vias, não pode pois ser mantida a decisão proferida. Contra-alegou o MºPº, pugnando pela confirmação do julgado. Foram corridos os vistos legais, cumprindo agora decidir. 2.O acórdão recorrido houve por provados os factos seguintes: I - Na Conservatória dos Registos Centrais, sob o n.º 5140-91, encontra-se integrado o assento consular de nascimento lavrado por inscrição no Consulado de Portugal em Harare, em 07.10.87, referente a A, nascida a 5 de Novembro de 1986, em Blantyre, Malawi, filha de B, natural de Limbe, Malawi, e de C, natural de Inhaminga, Chuingoma, Moçambique, ambos residentes em Blantyre, Malawi; II - Do assento de nascimento - registado sob o n.º 329-H na Conservatória dos Registos Centrais - de C, nascimento ocorrido em 07.05.52, consta o averbamento n.º 1, de acordo com o qual casou civilmente com B em 20.06.70, bem como o averbamento n.º 2, segundo o qual a registada mantém a nacionalidade portuguesa nos termos da alínea c) da base XVIII da Lei n.º 2098, de 29.07.59; III - Do assento de nascimento em referência resulta, igualmente, o averbamento n.º 3 dizendo que a registada teve domicílio em...
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