Acórdão nº 03B3341 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 27 de Novembro de 2003 (caso NULL)
Magistrado Responsável | OLIVEIRA BARROS |
Data da Resolução | 27 de Novembro de 2003 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça Litigando com benefício de apoio judiciário em ambas as suas modalidades, A, invocando o disposto nos arts. 22º e 27º, n. 5, da Constituição 5º, n. 5, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem (CEDH), aprovada pela Lei n. 65/78, de 13/10, 202º, 204º, 212º, 225º, n.s 1 e 2, e 226º, n.1, CPP, moveu, em 24/3/2000, ao Estado Português acção declarativa com processo comum na forma ordinária de indemnização, fundada em responsabilidade civil do Estado por prisão ilegal e injustificada. Pediu a condenação do demandado a pagar-lhe, com juros legais desde a citação, a quantia de 3.754.700$00 pelos prejuízos resultantes da sua prisão preventiva desde 5/3/98 até 15/3/99 à ordem do que veio a ser o Proc. n.º 127/98 do 2º Juízo Criminal de Santa Maria de Feira, em que foi absolvido por acórdão de 7/4/99. São as seguintes as parcelas que compõem a importância referida: 750.000$00 de prejuízo na saúde (danos físicos e dano moral), 1.850.000$00 (5.000$00 diários) pela privação da liberdade durante 1 ano e 5 dias; 154.700$00 do não recebimento de Rendimento Mínimo Garantido no montante mensal de 22.100$00 nos meses de Outubro de 1998 a Abril de 1999; prejuízo para a honra pessoal estimado em 750.000$00; acrescida dificuldade de arranjar trabalho, estimada em 250.000$00. Contestada a acção e saneado e condensado o processo, veio, após julgamento, a ser proferida sentença do Tribunal de Círculo de Santa Maria da Feira que julgou improcedente a acção e absolveu o Réu do pedido. A Relação do Porto negou provimento à apelação do assim vencido, que pede, agora, revista dessa decisão. Em fecho da alegação respectiva, formulam-se, em termos úteis, as conclusões seguintes: 1ª - O decretamento e a manutenção da prisão preventiva em questão foram condicionados pela verificação de um erro grosseiro na apreciação dos pressupostos de facto de que a mesma dependia, indicando a existência de uma prisão preventiva injustificada, a partir da qual nasceria a pretensão de indemnização do ora recorrente, nos termos dos arts. 22º CRP e 225º, n. 2, CPP. 2ª - Para efeito do n. 2 do art. 225º CPP, a culpa não deve ser apreciada de acordo com o conceito genérico dum bónus pater familias civilmente estilizado, mas segundo a diligência especial exigida em situações muito especiais - até, sensíveis, do ponto de vista do sacrifício ponderado ou compatibilizado de direitos, liberdades e garantias - e a órgãos e pessoas com atributos que a própria lei considera específicos. 3ª - O art. 225º, n. 2, CPP não se refere à culpa de uma pessoa física ou jurídica minimamente cuidadosa, mas antes à culpa de alguém necessariamente muito cuidadoso, desde logo quando no desempenho da tarefa de procurar o maior conhecimento possível e de o transmitir a quem decida sobre uma eventual privação da liberdade de outrem. 4ª - Transmitir ao processo a ideia de que o arguido seria procurado por dezenas de consumidores de substâncias estupefacientes ou, pelo menos, não impedir a formação de tal errónea ideia, quando, afinal, nem a NIG-GNR, nem o Mº Pº, dispunham de qualquer fotografia, um só relato de vigilância externa que fosse, dos muitos que terão preparado a detenção em suposto flagrante delito, ou uma qualquer prova testemunhal a suportar tal gravosa afirmação, constitui um erro grosseiro, à luz do art. 225º, n. 2, CPP. 5ª - Nessa medida, o erro grosseiro em causa terá favorecido decisivamente a aplicação ao ora recorrente de uma medida de coacção da ordem da prisão preventiva, que se manteria durante 1 ano e 5 dias, sendo revogada em plena audiência de julgamento, ou seja, antes mesmo de se proferir o acórdão absolutório que ilibaria definitivamente o recorrente da prática dos factos de que vinha acusado. 6ª - Constitui igualmente um erro grosseiro na apreciação dos pressupostos de facto que conduziram ao decretamento e manutenção de uma prisão preventiva para efeitos de aplicação do art. 225º, n. 2, CPP o facto de, apesar de dois co-arguidos terem sido, ambos, detidos no mesmo momento e local, sendo alegadamente conectados com a mesma actividade ilícita, não terem sido presentes ao, e ouvidos pelo, mesmo juiz de instrução, para que se pudesse conhecer da sua possível interacção e qual deles poderia estar, ou não, de facto ligado a esta última, justamente num momento e num processo em que: se exigia um especial cuidado na recolha e processamento de conhecimentos - disponíveis - que pudessem reclamar a aplicação de uma medida de coação; - o co-arguido B afastava a associação do ora recorrente à actividade delituosa em causa; - e se viria, a final, a absolver o ora recorrente, precisamente por inexistência de qualquer prova incriminatória. 7ª - Em analogia com as normas similares previstas no DL 48.051, de 21/11/67, nomeadamente o seu art. 9º, o art. 22º CRP já acolhe, a título directo, a pretensão indemnizatória do recorrente face ao Estado Português, e não exige necessariamente a verificação de um erro grosseiro na actuação deste último. 8ª - O art. 225º, n.2, CPP é inconstitucional na parte em que exige a verificação de um erro grosseiro no decretamento ou na manutenção de uma prisão preventiva injustificada por referência ao disposto no art. 277º, n. 1, CPP e à luz dos grandes limites impostos pelo art. 22º CRP à actividade do Estado Português e da respectiva aparelhagem, pelos quais se fixam os princípios da máxima protecção da vítima e da mais ampla responsabilidade do Estado. 9ª - O art. 22º CRP não se encontra contrariado pelo disposto no art. 27º, n. 5, CRP, pelo que a autorização conferida ao legislador ordinário neste último normativo não se...
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