Acórdão nº 03B4278 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 22 de Janeiro de 2004

Magistrado ResponsávelSALVADOR DA COSTA
Data da Resolução22 de Janeiro de 2004
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I "A" intentou, no dia 17 de Dezembro de 1999, contra B, acção declarativa constitutiva condenatória, pedindo a declaração de nulidade ou de anulabilidade do contrato-promessa de compra e venda do prédio urbano sito na Rua de Campolide, n.ºs ..., Lisboa, a condenação da ré a devolver-lhe 10 000 000$ entregues a título de sinal, e juros moratórios à taxa legal desde a citação até à restituição, com fundamento em não constar do respectivo documento o reconhecimento presencial da assinatura dos outorgantes nem a certificação pelo notário da existência de licença de construção ou utilização ou construção nem da sua inexigibilidade. A ré, em contestação, invocou a caducidade do direito da autora de anulação do contrato-promessa, ter sido a última a dar causa à nulidade, estar reconhecida notarialmente, desde 22 de Janeiro de 1993, a sua assinatura e certificada a inexigibilidade da licença de construção ou de utilização do prédio, só ter recebido a título de sinal 8 000 000$ e, na réplica, a autora afirmou não estar sanado o vício de nulidade. Na audiência preliminar, no âmbito do saneador, foi declarada a nulidade do contrato-promessa e a ré condenada a pagar à autora 10 000 000$ e juros moratórios à taxa de 7% desde 21 de Fevereiro de 2000 até ao reembolso. Apelou a ré, e a Relação, por acórdão proferido no dia 20 de Maio de 2003, negou provimento ao recurso. A apelante interpôs recurso de revista do acórdão da Relação, formulando, em síntese útil, as seguintes conclusões de alegação. - a recorrida considerou que a omissão dos referidos requisitos não era motivo impeditivo para a celebração da escritura, desde que a recorrente reduzisse o preço do prédio; - o motivo invocado pela recorrida para a redução do preço do prédio contraria o que por ela foi declarado no próprio texto do contrato-promessa sobre o conhecimento do seu estado; - a omissão do reconhecimento notarial e da certificação da não obrigatoriedade de licença de utilização resulta de conduta intencional e culposa da recorrida, ao considerar esses requisitos supérfluos e desnecessários; - como a recorrida foi a responsável pela omissão dos referidos requisitos formais, não pode arguir a nulidade respectiva, sob pena de violar de forma clamorosa os princípios da lisura, da transparência, da lealdade de procedimento e da boa fé, estruturantes do direito dos contratos, susceptível de se enquadrar no abuso do direito; - o acórdão recorrido fez errada aplicação do direito aos factos, violando o disposto no artigo 410º, n.º 3, do Código Civil e nas alíneas b), c) e d) do n.º 1 do artigo 668º do Código de Processo Civil. Respondeu a recorrida, em síntese útil de conclusão de alegação, com a adaptação decorrente da indevida repetição no recurso de revista das alegações produzidas no recurso de apelação: - só depois da celebração do contrato-promessa de compra e venda é que se confrontou com a alteração das condições, qualidades e circunstâncias existentes à data do mesmo; - por ser matéria controvertida, o tribunal da 1ª instância deu indevidamente por provado que "a exemplo de todos os negócios que efectuou com a C, mediadora na venda do prédio referido sob 3, a autora considerou supérfluos os requisitos referidos sob 4 e 5 desnecessários e supérfluos"; - apesar da reserva a considerar-se provado o facto acima referido, dele não resulta conduta culposa ou responsabilidade ou recusa da recorrida na omissão de cumprimento dos aludidos requisitos, mas uma mera opinião; - a omissão dos requisitos previstos no n.º 3 do artigo 410º do Código Civil deveu-se a exclusiva culpa da recorrente, por não ter em seu poder a caderneta predial do prédio, pelo que a recorrida não está inibida de arguir a nulidade do contrato-promessa de compra e venda; - a recorrida sempre agiu de boa fé, não tendo em momento algum recusado preencher os requisitos previstos no artigo 410º, n.º 3, do Código Civil nem obstou à sua observância, sendo a omissão da responsabilidade da recorrente; - deve manter-se o acórdão recorrido ou, no caso contrário, revogar-se o acórdão na parte em que considera provada a factualidade acima assinalada e ordenada a sua integração na base instrutória, ou remeter o processo à Relação para apreciação do seu pedido subsidiário. II É a seguinte a factualidade declarada provada no acórdão recorrido: 1. A dedica-se à compra, venda, revenda de prédios rústicos e urbanos e à construção civil, e B, entre outras, à actividade de compra e venda de imóveis. 2. A autora, identificada como primeira outorgante, e a ré, identificada como segunda outorgante, declararam, em documento escrito, datado de 19 de Outubro de 1992, o seguinte: 1ª - a primeira outorgante é dona e legítima possuidora do prédio urbano sito na Rua de Campolide, ...., freguesia de São Sebastião da Pedreira, Lisboa, descrito na 8ª Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o n.º 00382/021286, inscrito na matriz urbana da freguesia de Campolide, Lisboa, sob o artigo 083; 2ª - pelo presente contrato, a primeira contratante promete vender à segunda contratante, livre de quaisquer ónus ou encargos, e a última promete comprar o prédio acima identificado pelo preço se 35 000 000$, o qual será pago da seguinte forma: 2.1- entrega na presente data de 13 000 000$, que constitui sinal e princípio de pagamento, de que é conferida a correspondente quitação; 2.2 - liquidação total do preço ajustado no acto da escritura de compra e venda que terá lugar a 20 de Janeiro de 1993; 2.3 - a escritura de compra e venda será assinada em nome da segunda outorgante ou pessoa ou entidade por ela indicada: 3ª - a segunda contratante conhece o estado do prédio e, bem assim, os contratos de arrendamento existentes; 4ª - da conta da segunda contratante será o pagamento de todas as despesas inerentes à transmissão a...

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