Acórdão nº 03P2612 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 17 de Março de 2004

Magistrado ResponsávelHENRIQUES GASPAR
Data da Resolução17 de Março de 2004
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça: 1.

Na 6ª Vara Criminal de Lisboa, e perante o Tribunal do Júri, respondeu a arguida A, devidamente identificada no processo, vindo a ser condenada pela prática, em autoria material, de um crime de tráfico de estupefacientes, p.e p. pelo artº 21º, nº1, do DL nº 15/93, de 22 de Janeiro, na pena de 6 anos de prisão.

Não se conformando com a decisão, recorrem o MºPº e a arguida, concluindo assim as respectivas motivações: A) - MºPº: - «Padece do vício de contradição insanável da fundamentação o acórdão em que se atribui à arguida ora a qualidade de mero "correio" que, como tal, se limita a transportar estupefacientes, ora a de interveniente no circuito do tráfico a concluir na transacção donde lhe adviria o lucro que a movera já que, segundo as regras da experiência comum, as duas qualidades são, no mesmo caso, inconciliáveis; - Enquanto tida no acórdão como mero "correio" de droga e sendo, nesta qualidade, alheia a todo o processo que antecede o transporte não pode a arguida ver a sua responsabilidade acrescida pela quantidade da droga que se encontrava na mala por não ter nisso qualquer interferência; - Dizendo a arguida, em audiência, que graças à sua colaboração prestada à PJ esta conseguiu identificar o dono da droga, sua residência e restaurante de que seria proprietário após a conclusão do inquérito, devia o Tribunal ouvir os depoimentos das testemunhas susceptíveis de permitirem, confirmando-o ou infirmando-o, contribuir para a descoberta da verdade e boa decisão da causa; - Não estando o requerimento para inquirição de testemunhas apresentado ao abrigo do disposto no nº 1 do art. 340º do C.P.P. nas circunstâncias previstas nas do nº 4 do mesmo nem tendo sido apresentado subordinado ao da defesa, como dele resulta, não podia o requerido ser indeferido com o confuso fundamento com que o foi; - Competindo na audiência de julgamento ao Tribunal do Júri, constituído por sete membros, apreciar e decidir da necessidade de, com base no princípio da investigação, realização de diligências alegadamente invocadas como necessárias ao apuramento da verdade e à boa decisão da causa, não pode o que a ele preside, sem consultar os demais, substituir-se-lhes e, como se fosse ele o próprio Tribunal, decidir segundo a sua própria convicção pois, mais não é do que o seu porta-voz; por isso, - Ao proceder como referido, decidiu sobre matéria que não é da sua competência; - Considerando que na determinação da medida concreta da pena aplicada à arguida pesaram em seu desfavor circunstâncias a que é de todo alheia como a quantidade de droga que estava na mala, não foi considerado o resultado de diligências susceptíveis de a beneficiarem como a inquirição de testemunhas a deporem sobre a sua alegada colaboração com a PJ por indeferimento da sua realização e às atenuantes dadas como provadas não foi dado o relevo que deviam ter sobretudo as que se relacionam com a sua integração sócio-económica; - A pena mostra-se desadequada, por excesso, relativamente ao seu grau de culpa pelo qual devia ter sido aferida».

Posteriormente ao recurso da decisão condenatória, o Ministério Público interpôs também dois recursos, de conteúdo semelhante, de despachos do juiz que indeferiram requerimentos para transcrição da gravação da audiência.

O magistrado recorrente, no essencial , conclui que «versando o recurso também matéria de facto», não se pode «privar a motivação do recurso, na parte que abrange tal matéria, do seu suporte documental essencial à apreciação pelo Tribunal Superior»,devendo «ordenar-se a aludida transcrição».

Invoca a violação dos arts. 97° n° l, alínea b), e 4, 101°, n° 2, e °n°4, do C.P.P.

  1. - ARGUIDA: - «Ao não enquadrar os factos merecedores da pena aplicada, ao não relatar o ocorrido ante detenção, em contraposição aceitando como base de fundamentação o depoimento da arguida, invocando a fls.6, segundo lembra, "alicerçado a circunstâncias de nula credibilidade" - quais? - tudo em plena contradição com o sentido do decidido, assim em clara queda nos fundamentos de recurso, previstos no art°- 410°, n° 2, b), do CPP, ao não explicar o iter do seu sentido decisório e de formação da sua convicção, vd a propósito, 2.1°. e 2.13°., também às lapidares referências de fls. 6, aos não provados 2.2.1º., e 2°., mergulhou o acórdão no imperativo contido no nº2, do art° 374°, comissão e omissão que a lei pune com a nulidade, vd art° 379°, ambos do CPP, consequência que se requer; - O acórdão, ao sustentar a sua convicção decisória nas declarações da arguida, hostis a tal sentido, gerou uma contradição em si mesmo, assim com a necessária violação do prescrito nas alíneas b) e c), do nº 2, do art°. 410º, do CPP, impondo-se a prol acção de nova decisão correctora do aqui aludido; - O acórdão sindicado, ao indeferir o requerimento do Exmo. Procurador, e a prova arrolada pela defesa, no que concerne à audição dos responsáveis da PJ, todos essenciais ao apuramento do ocorrido no aeroporto - eventualmente em contradição com as esquecidas versões das testemunhas de acusação - todos envolvidos nas operações de colaboração da arguida com a PJ, colaboração que se reputa de relevantíssima, vejo o tribunal criar as condições para a não suficiência da matéria de facto a considerar para a decisão tomada, assim em clara subsunção do previsto na alínea a), do n° 2, do art° 410º, do CPP, com esta negação do exercício dos direitos da defesa, essencial ao apuramento da verdade, com implicação substancial da decisão, seja ao nível da atenuação da pena, sua isenção, mesmo absolvição da arguida, violou o Tribunal o disposto no nº1, do art° 32°, da CRP, aqui se reclamando as pertinentes consequências constitucionais; - Em consequência se impondo proceder ao envio do processo para julgamento de tal matéria, com observância do disposto no art° 412°, do CPP, tendo por violadas as normas que consignam o direito à prova testemunhal, nomeadamente o direito ao seu arrolamento e audição, art° 315°, do CPP, as garantias da defesa que a prova em si consagra como direito fundamental, com necessária expressão e...

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