Acórdão nº 03P3188 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 04 de Dezembro de 2003 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelRODRIGUES DA COSTA
Data da Resolução04 de Dezembro de 2003
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam do Supremo Tribunal de Justiça: I. - RELATÓRIO 1. - No Tribunal da 2ª Vara Criminal de Lisboa foram julgados os arguidos A e B por crime de tráfico de estupefacientes do art. 21.º n.º 1 do DL 15/93, de 22/1, pelo qual foram ambos condenados na pena de 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de prisão, tendo o arguido B sido ainda condenado na coima 750 euros pela contra-ordenação prevista e punida pelo art. 81.º n.ºs 2 e 4 do Código da Estrada, na redacção do DL 2/98, de 3/1 (condução com taxa de alcoolemia superior a 0,5 grs./ l.). Recorreu o arguido B para o Tribunal da Relação de Lisboa na parte relativa ao crime de tráfico de estupefacientes, não tendo obtido provimento. Desta última decisão recorreu o mesmo arguido para este Supremo, extraindo extensas conclusões, que se resumem como segue: 1 - O Tribunal da Relação não se pronunciou sobre o recurso interposto da decisão que ordenou o desentranhamento do requerimento apresentado em 16/12/02, o que constituiria a nulidade prevista no art. 379.º n.º 1 c) do CPP, devendo o mesmo ter sido levado em consideração e, uma vez que ainda tinha oportunidade, ter-se produzido prova suplementar, em ordem a apurar-se a verdade material; 2 - O depoimento do agente C - única prova em que assentou a condenação do recorrente - foi sobrevalorizado, sendo que o mesmo estava afectado na sua credibilidade, pois a testemunha não quis, nem foi capaz de indicar o local exacto onde se encontrava, sendo que a sua indicação de que se encontraria a 80 metros do cruzamento da Rua da Cruz com a Rua Feliciano de Sousa é forçosamente errada, atentos os mapas topográficos que se juntaram aos autos. 3 - Houve erro notório na apreciação da prova, ou seja facto erroneamente julgado. 4 - A prova impõe até decisão diversa, analisados os depoimentos do arguido ao longo do processo, em que há uma linha de coerência, e atento o depoimento do co-arguido A na audiência, o qual foi prestado de forma livre e depois de uma desintoxicação no EPL, ao passo que os primeiros depoimentos foram prestados sob o efeito da ressaca provocada pela privação da droga. 5 - No julgamento ficou assente que a testemunha C não se encontrava no cruzamento da Rua Cruz, a Alcântara com a Rua Feliciano de Sousa, quando vigiou a 80 metros em linha recta os arguidos. Estaria na Rua Maria Pia, a alegadamente 80 metros de distância. 6 - Consultada uma carta topográfica do local e tiradas fotografias, verifica-se que a Rua Maria Pia fica a uma grande distância do local, não havendo ângulo de visão da referida rua para o local dos factos (facto notório e evidente que impõe decisão diversa, bem como renovação da prova). 7 - Ao aceitar-se que a testemunha se eximisse a revelar o local exacto onde se encontrava, sob o pretexto da protecção de actuais e futuras investigações, o tribunal recorrido aceitou uma situação de segredo não prevista nos artigos 135.º a 137.º do CPP. 8 - Violaram-se os artigos 32.º n.º 5 da Constituição, por se ter furtado esta testemunha ao contraditório, o da presunção de inocência do arguido, por se ter invertido o ónus da prova, já que se teve por verdadeiro tal depoimento, por não ter sido requerida a contradita pelo recorrente. 9 - Deve o recorrente ser absolvido, uma vez retirada valoração ao depoimento citado, ou, subsidiariamente, ser repetida a prova com exame ao local. 2. - Respondeu o Ministério Público, defendendo que não se verifica qualquer omissão de pronúncia e que a decisão deve ser mantida, não havendo lugar à repetição da prova. 3. - Neste Supremo, o Ministério Público teve vista dos autos, promovendo o julgamento. Colhidos os vistos, realizou-se a audiência de julgamento e nela o senhor Procurador-Geral Adjunto pronunciou-se de forma genérica sobre as questões prévias, entendendo que não eram procedentes. Disse que o recurso visava a matéria de facto e que, nessa medida, era inadequado, dado o STJ conhecer apenas de matéria de direito. Todavia, e embora não viesse questionada a questão da qualificação jurídica dos factos, nem a da medida da pena, entendia que, face à matéria provada, o crime dos autos seria de qualificar e punir como tráfico de menor gravidade, do art. 25.º do DL 15/93, de 22/1, revogando-se a decisão recorrida, o que estaria dentro dos poderes do STJ, dado tratar-se de questão de direito que não precisava de ser alegada, podendo e devendo ser conhecida ex officio. Cumpre, então, decidir. II. - FUNDAMENTAÇÃO 4. Factos provados No dia 11/5/2002, pelas 11h.45 m., no cruzamento da Rua Cruz de Alcântara e a Rua Feliciano de Sousa, em Lisboa, o arguido A foi surpreendido n aposse de 33 embalagens de heroína e o arguido B, na posse de 20 euros em dinheiro; O 1º arguido entregava heroína a consumidores que se lhe dirigiam e o 2º arguido recebia a contrapartida em dinheiro; A heroína tinha o peso total líquido de 7, 578 grs. e o dinheiro (20 euros) provinha de vendas anteriores de heroína; Os arguidos agiram livre e conscientemente, conhecendo as características estupefacientes da heroína e sabendo que o seu comportamento era punido por lei; No dia 16/2/02, pelas 06 h. 5 m., na Avenida Miguel Torga, frente à EPAL, em Lisboa, o arguido foi surpreendido ao volante do automóvel FX, acusando uma TAS de 1,19 grs./l.; Sabia que não podia conduzir na via pública sob influência do álcool; O 1º arguido confessou os factos de que vinha acusado; era, à data, toxicodependente, vivia na rua e não exercia qualquer profissão; actualmente, encontra-se detido preventivamente na ala A do EPAL; frequenta os 5.º e 6.º anos de escolaridade. Não tem antecedentes criminais; O 2º arguido vive com os pais e trabalha como servente de pedreiro; não sabe ler nem escrever, encontrando-se a estudar no EP, onde está preventivamente detido. Sofreu uma condenação anterior por condução sem carta. 5. Vistas as questões formuladas, comecemos pela alegada omissão de pronúncia. Diz ela respeito a um requerimento apresentado pelo recorrente na 1ª instância e no qual se pedia a junção de documento topográfico do local, a fim de se pôr em causa o depoimento da...

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