Acórdão nº 03P768 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 29 de Abril de 2003

Magistrado ResponsávelCARMONA DA MOTA
Data da Resolução29 de Abril de 2003
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: Arguidos/recorrentes: C (1), A (2), E (3) e D (4) 1. OS FACTOS Em Dez00, o arguido A, acompanhado de um tal B, encontrou-se com o arguido C, em Matosinhos, próximo da ..., a quem comprou cerca de ½ quilo de heroína. Entre Dez00 e 17Jan01, e pelo menos por mais uma vez, voltou a encontrar-se com o mesmo co-arguido, também em Matosinhos, próximo da Petrogal, que lhe entregou mais heroína. E, no dia 17Jan01, cerca das 18:30, o arguido A encontrou-se com o arguido C no parque de estacionamento em frente do concessionário da ..., na zona do aeroporto, tendo recebido deste último cerca de meio quilo de heroína, que guardou no interior do veículo ... QD-..., onde se fazia transportar. Depois, regressou a casa, vindo a ser interceptado junto à Alfândega do Porto, cerca das 19 horas, pela Polícia Judiciária, que, no interior do ..., lhe apreendeu 500,49 gramas de heroína. Na sua posse, foram ainda aprendidos um telemóvel ... e um outro ..., por ele utilizados nos seus contactos no âmbito dos estupefacientes. Nesse mesmo dia, cerca das 21:40,a PJ apreendeu-lhe, em casa, 250.000$ em dinheiro (por ele obtida no negócio de estupefacientes) e um telemóvel ... (comprado com os respectivos proventos). Entre o início do mês e o dia 17Jul01, pelo menos por uma vez, o arguido C entregou ao co-arguido D cerca de 10 ou 30 gramas de heroína, que este, depois, entregou ao co-arguido E. No dia 16-7-01, cerca das 14:55, o arguido D dirigiu-se, ao volante do ... 5, QF-..., até ao largo de Vilarinho, em Vilarinho - Vila do Conde, onde se encontrou com o arguido C, que para ali se deslocara no ... 1143 XN 83, tendo-lhe este último entregue 30 gramas de heroína em três embalagens. Seguidamente, o arguido D dirigiu-se, ao volante da referida viatura, para a Estrada de acesso à Carriça, depois de passar o cruzamento para o Santuário de Santa Eufémia e, ao chegar ao cruzamento seguinte, abrandou a viatura e estacionou-a na berma. Nessa altura o arguido E, que, conforme combinação prévia, já se encontrava naquele local, ao volante do ... ...-HA, estacionou atrás do ... 5 e saiu da viatura dirigindo-se ao arguido D para receber o estupefaciente. Nesse momento, foram interceptados pela Polícia Judiciária do Porto, que lhes apreendeu o ... 5 (e, no seu interior, 29,380 gramas de heroína em três embalagens, uma nota falsa de 500 francos franceses) e o ... (e, no seu interior, uma pulseira em ouro amarelo, com pedras pretas, no valor de 14,21 euros, uma pulseira em ouro amarelo, com bolas de ouro, no valor de de 16,46 euros, uma pulseira em ouro amarelo com bolas de ouro, no valor de 15,71 euros, uma volta em ouro amarelo, no valor de 15,71 euros, uma aliança em ouro amarelo, no valor de 2,99 euros, comprados com proventos do negócio de estupefacientes). Nesse mesmo dia 16-7-01, cerca das 17:00, foi também interceptado o arguido C no momento em que se preparava para entrar na sua residência em Moreira, Maia, tendo-lhe sido apreendido o ... 1143 XN 83 em que se fazia transportar e, em sua casa, um telemóvel ... e um telemóvel ..., por ele adquiridos com proventos da compra e venda de estupefacientes. Os arguidos A, C, D e E agiram livre, consciente e voluntariamente. Conheciam as qualidades estupefacientes dos produtos que compravam e vendiam. Procuravam obter, com tal actividade, lucros económicos. Sabiam serem tais condutas proibidas. O arguido A confessou os factos, tendo ainda prestado colaboração noutros processos por tráfico de estupefacientes. Nada consta do seu CRC. É pessoa com hábitos de trabalho e com bons níveis de relacionamento familiar. Possui o 11° ano de escolaridade, tendo dois filhos. O arguido C confessou parcialmente os factos. Já fora condenado por descaminho de objectos. Possui o 3° ano do curso industrial, tendo dois filhos. O arguido D confessou os factos. Já fora condenado por tráfico de estupefacientes. Encontra-se reformado, beneficiando do apoio de duas filhas. O arguido E também confessou os factos. 2. A CONDENAÇÃO Com base nestes factos, o tribunal colectivo do 1.º Juízo Criminal de Vila do Conde (5), em 05Jun02, condenou C e A, como autores de um crime de tráfico agravado de droga, e D e E, como autores de um crime de tráfico comum de droga, nas penas de nove anos de prisão, sete anos de prisão, seis anos de prisão e seis anos de prisão: Ficou provado que os arguidos traficaram quantidades de heroína que atingiram ½ quilo, quanto aos arguidos A e C, e 30 gramas quanto aos arguidos D e E. Nos termos do disposto no art.24.b) e c), do DL 15/93, as penas previstas no art.21° são aumentadas de um quarto nos seus limites mínimo e máximo se "as substâncias ou preparações foram distribuídas por grande número de pessoas" e se "o agente obteve ou procurava obter avultada compensação remuneratória, pelo que as condutas dos arguidos A e C integram o crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art.21º nº1, do D.L. nº15/93 de 22/1, com a agravação prevista no art.24º al. as b) e c), enquanto que os arguidos D e E cometeram o referido crime de tráfico, mas sem aquela agravação. Corresponde ao crime cometido pelos arguidos A e C a pena abstracta de prisão de 5 a 15 anos. Na determinação da respectiva pena concreta, importa ponderar, designadamente, o elevado grau de ilicitude, traduzido na quantidade e qualidade de matéria estupefaciente comercializada, actividade que apenas terminou com a intervenção da Polícia Judiciária, a intensidade do dolo e as prementes necessidades de prevenção deste tipo de crimes. Relevam, por outro lado, a ausência de antecedentes criminais, quanto ao arguido A, a confissão e a colaboração que tem prestado, quer no âmbito deste processo, quer de outros, no sentido de se pôr fim a este tipo de condutas, o que revela arrependimento e vontade de não repetir condutas semelhantes, e as respectivas condições sócio-económicas e familiares. Entendem-se, pelo exposto, ajustadas as penas de 7 anos de prisão para o arguido A e 9 anos de prisão para o arguido C. E corresponde ao crime cometido pelos arguidos D e E a pena abstracta de prisão de 4 a 12 anos. N a determinação das respectivas penas concretas, importa ponderar, designadamente, o grau de ilicitude também elevado, atenta a quantidade e qualidade de matéria estupefaciente transaccionada, a intensidade do dolo e as necessidades" de prevenção. Relevam, por outro lado, a confissão, com as reservas acima assinaladas, e as respectivas condições sócio-economicas e familiares. Entendem-se, assim, ajustadas as penas de 6 anos de prisão para cada um dos arguidos. 3. OS RECURSOS PARA A RELAÇÃO 3.1. Inconformado, o arguido C recorreu em 20Jun02 à Relação pedindo a requalificação da sua conduta como tráfico comum e, em conformidade, a redução da pena: Os factos dados como provados apenas permitem subsumir o comportamento do recorrente no ilícito p. e p. no art. 21°. do Dec. Lei 15/93. Já que não ocorrem as circunstâncias agravantes previstas nas als. b) e c) do art. 24° do mesmo diploma legal. Efectivamente, não vem provado que o produto estupefaciente lidado pelo recorrente fosse "distribuído por grande número de pessoas" ou que o mesmo "obteve ou procurava obter avultada compensação remuneratória". E, à mingua de elementos fácticos , que permitam concluir tal, o acórdão recorrido extravasou quer o espírito quer a vontade do legislador. Por outro lado, o acórdão recorrido é omisso quanto aos motivos ou razões que pudessem levar a concluir pela perda da viatura automóvel. Não vem provado que a mesma tenha sido adquirida com os proventos de qualquer actividade delituosa ou estivesse destinada a servir para a prática de qualquer infracção. O acórdão recorrido apenas decretou a perda da viatura sem referir porquê. E não havia razão para tal. A pena, além da sua necessidade terá que ter em conta as exigências individuais e concretas de socialização do agente, sendo certo que na sua determinação ter-se-á que entrar em linha de conta que se deve evitar a dessocialização do agente. Face aos critérios legais estipulados pelos art.s 70° e 71° do CP, o recorrente deveria ter sido punido, por tal crime, em medida não superior a 6 anos de prisão. Subsidiariamente, a pena concretamente aplicada ao recorrente é exageradamente severa e não conforme o disposto nos artigos. 70° e 71°. Adequada seria a pena de 7 anos de prisão se se entendesse que cometeu o ilícito que, no acórdão recorrido, se entendeu ter sido cometido e com as agravantes referidas. 3.2. Igualmente inconformados, também os arguidos A e E recorreram, em 25Jun02 (6) à Relação do Porto, pedindo a requalificação jurídico-criminal dos factos, a redução da pena e a revisão da decisão de perda dos bens apreendidos: O arguido A entende que devia ter sido condenado pela prática, em autoria material de um crime de tráfico de estupefacientes na sua forma simples, p. e p. no art. 21.º, n.º 1 do D.L. n.º 15/93 de 22/01, e não pela prática desse mesmo crime, na sua forma agravada, p. e p. no art. 24.º als. b)e c). Entende ter existido uma errada subsunção jurídica dos factos. Dos factos dados como provados não se pode depreender que o estupefaciente efectivamente tenha sido distribuído por um grande número de pessoas, nem tão pouco se pode concluir que com tal prática os arguidos obtivessem ou procurassem obter avultados lucros. Revelam os arguidos plena consciência da gravidade dos factos de que foram acusados e condenados, não se conformando no entanto com o desfecho do processo. Atendendo-se sempre ao facto de os arguidos serem primários, se encontrarem perfeitamente integrados no ambiente familiar, social e profissional, condená-los a estas penas será expô-los a algo prejudicial. Para mais, será de salientar a prestimosa colaboração por parte do arguido A, bem como a confissão e colaboração prestada pelo arguido E, não só no âmbito deste processo como em outras investigações. A melhor pena para os arguidos não é serem afastados da sociedade, funcionando aqui a pena...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT