Acórdão nº 03S2734 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 14 de Janeiro de 2004 (caso NULL)
Magistrado Responsável | FERNANDES CADILHA |
Data da Resolução | 14 de Janeiro de 2004 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça 1. Relatório. Na presente acção com processo ordinário emergente de contrato individual de trabalho que A intenta contra o B, formulando um pedido indemnizatório fundado em despedimento ilícito, vem agora a Autora recorrer do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa que, confirmando a sentença de primeira instância, julgou improcedente a acção e absolveu a Ré do pedido. Após convite formulado pelo tribunal nos termos e para os efeitos previstos no artigo 690º, n.º 3, do Código de Processo Civil, a recorrente sintetizou as conclusões da sua alegação do seguinte modo: 1. A Autora intentou acção contra o R. alegando em suma que entre as partes havia um contrato de trabalho subordinado a que o R. pusera termo sem fundamento legalmente válido em 23 de Setembro de 1999, despedimento que a A. impugnava, pedindo na acção a declaração da ilicitude do despedimento, bem como quantias retributivas não pagas pela R. na pendência do contrato de trabalho e ainda subsídios de férias e de Natal não pagos; 2. Proferida decisão veio a acção a ser julgada improcedente por a decisão ter considerado que entre as partes vigorava um contrato de prestação de serviços, decisão que veio a ser confirmada pelo Acórdão recorrido e que aqui se impugna por se considerar que não foi feita correcta aplicação do direito; 3. No ponto 3. da matéria de facto dada por provada em lª instância está dado como provado que a A. celebrou os contratos de fls. 51 a 199 dos autos, contratos de R. onde se retira que, ao contrário do que foi dado como provado nos 14, 15, 16, 17 e 6 da matéria de facto dada por provada em 1ª instância: - A Autora era remunerada em função de um valor hora presumida que englobava as aulas dadas, as tarefas de preparação de aulas, correcção de trabalhos, frequência de cursos e actividades de formação e realização de exames - Cláusula 5ª daqueles contratos; - Quando a A. faltava por facto que não lhe era imputável (por exemplo por doença) não havia perda de retribuição e que, se as aulas calhassem no horário num dia feriado eram também remuneradas - Cláusula 7ª dos mesmos contratos; 4. O Acórdão recorrido ao apreciar esta questão considerou que as Cláusulas 5ª e 7ª dos contratos e atrás referidas, tinham que ser apreciadas em conjunto com a prova produzida uma vez que essas cláusulas não continham matéria contrária aos interesses da R. e, como tal, por força do art. 376 º, nos 1 e 2, do Código Civil, poderia essa matéria ser objecto de prova testemunhal a ser valorada no seu--conjunto pelo Tribunal, como sucedera, e ainda que, mesmo admitindo a aplicabilidade do art. 376° do Código Civil, tal não impediria a produção de prova--testemunhal sobre os documentos, à luz do art. 393º, n° 3, do Código Civil; 5. Ao contrário do decidido no Acórdão recorrido, as normas das Cláusulas 5ª e 7ª dos contratos revelam factos que a R. na sua contestação impugnou, porque em nada abonavam a sua tese de que entre as partes vigorava um contrato de prestação de serviços, e eram pois claramente factos contrários ao interesse da R. nos presentes autos, razão porque à luz do arte 376º do Código Civil, os factos que integravam aquelas cláusulas não podiam deixar de dar-se como provados, só sendo admissível a prova testemunhal quanto àqueles documentos para prova da existência de vícios na declaração - Pires de Lima e Antunes Varela, em anotação -- ao art. 393º do Código Civil - vícios não invocados pela R. ao longo dos 23 contratos celebrados com a A.; 6. O Acórdão recorrido ao decidir como decidiu nessa matéria violou os arts. 376º e 393º do Código Civil e, por essa razão, não fez uso, como lhe cabia, da faculdade conferida pela alínea b) do n° 1 do arte 712º do Código de Processo Civil, e, reconhecida que seja a violação pelo Acórdão recorrido dos arts. 376º e 393º do Código Civil, por, e no entender da recorrente deve, ser anulado o Acórdão recorrido dada existência daquela violação, determinando-se que seja proferido novo Acórdão que não viole aqueles normativos; 7. E de nenhum facto vertido na acção (quer nos articulados quer na matéria de facto dada por provada) se pode extrair que a A. era remunerada em função do resultado das aulas leccionadas, mas antes resulta à saciedade que a A. era remunerada em razão das unidades lectivas leccionadas através de um cálculo de hora presumida que incluía o pagamento das actividades de preparação pedagógica, da correcção de pontos, da frequência de cursos de formação e da realização de exames, ou seja em razão de um tempo presumido de trabalho e não de um hipotético resultado atingido, sendo portanto a remuneração paga pelo Réu à Autora a remuneração típica do contrato de trabalho subordinado, até pelo cálculo médio da referida hora presumida; 8. O Acórdão recorrido considerou por outro lado que o facto de a A. ter aceite ao longo de 7 anos e sem contestação que a R. não lhe pagasse a retribuição de férias e os subsídios de férias e de Natal, demonstrava que entre as partes essa situação -- tinha sido assumida como normal e indiciadora da existência de um contrato de prestação de serviços; 9. Salvo o devido respeito não resulta dos autos que a A. tivesse aceite aquela situação sem protestar, mas somente que a R. não procedeu ao pagamento daquelas prestações remuneratórias e, exactamente por isso, a A. as peticiona nos autos; 10.Dos autos resulta por outro lado que o local de trabalho da A. era o designado pela R., quer no caso dos cursos especiais de empresas, quer nos cursos normais que eram dados nas instalações do R. - n° 9 da matéria de facto dada por provada e cláusula lª dos contratos celebrados -, característica própria dos contratos de trabalho subordinado, que o Acórdão recorrido admitiu existir, mas que desvalorizou, considerando que este elemento, só por si, é pouco para caracterizar a existência de um contrato de trabalho; 11. E estando também provado nos autos que os materiais didácticos eram da escolha da A., como é usual no ensino em que são sempre da escolha do professor principalmente em cursos não curriculares, como era o caso da A., e tendo esta que adequar a sua utilização àquilo que era exigido pela R. em termos dos critérios orientadores dos cursos de línguas praticados no R., como resulta da cláusula 4ª dos contratos celebrados e é dado como provado no n° 26 da matéria de facto dada por provada, o Acórdão recorrido desvalorizou também aqui estes factos provados considerando que a definição de critérios genéricos pode também existir em contratos de prestação de serviços, sendo uma característica que tem mais em vista aspectos relacionados com a qualidade técnica pretendida e com a homogeneidade dos cursos, do que com o poder de direcção do empregador, interpretação que não se considera coincidente com os 23 contratos celebrados onde de forma constante o R. fez acautelar a sua orientação dos cursos dados pela A.; 12. O Acórdão recorrido considerou por outro lado que a obrigação de a A. comunicar à R. com antecedência que ia faltar não poderia ser entendida como uma obrigação de justificar as faltas, decorrente da existência de uma fixação do horário, quando dos autos resulta que: Até 17 de Fevereiro de 1995, os horários eram estabelecidos por acordo entre o R., a A. e a empresa contratante dos serviços do R., tendo em atenção a necessidade de coadunar a disponibilidade de salas e o número de alunos que se viessem a inscrever nos respectivos cursos - Cláusula 3ª dos contratos juntos como Docs. 1 a 11 com a contestação; -Desde 28 de Outubro de 1996, os horários passaram a fazer parte integrante dos contratos celebrados - cláusula 3ª dos contratos juntos como Docs. 16 a 23 oferecidos com a contestação; -o R. pedia aos Professores, que se encontravam em situação contratual idêntica à da A., que avisassem com antecedência quando iam faltar - n° 18 da matéria de facto dada por provada; 13. E da Cláusula 4ª dos contratos celebrados entre A. e R. consta a obrigatoriedade de a A. respeitar os critérios genéricos definidos pelo R. em relação aos cursos de modo a garantir uma homogeneidade dos cursos do R., de onde decorre que o R. tinha por força dos contratos celebrados o direito de controlar e fiscalizar os cursos dados pela A. para aferir se esta cumpria aquela mesma estipulação contratual; 14. Em suma, no caso dos autos verifica-se a existência das seguintes características do -- contrato de trabalho subordinado: - Retribuição em função do tempo de trabalho, e não de acordo com um determinado resultado atingido, de acordo com horas de trabalho presumidas em que se incluía a retribuição pela preparação das aulas, correcção dos trabalhos dos alunos, frequência de cursos de formação, e realização de exames, retribuição que era devida quando o tempo de trabalho não era prestado por ter coincidido com um feriado ou por ter havido falta justificada por facto não imputável à A. - Cláusulas 5ª e 7ª dos contratos celebrados entre A. e R.; - Local de trabalho designado pelo R. - Cláusula 1ª dos contratos celebrados entre A. e R. e n° 9 da matéria de facto dada por provada; - Horário de trabalho fixado contratualmente tendo a A. que avisar o R. com antecedência quando não o podia cumprir - cláusula 3ª dos contratos celebrados entre A. e R. e n° 18 da matéria de facto dada por provada; - Direcção do empregador ao estabelecer os critérios genéricos que orientavam os cursos de línguas praticados pelo R., sujeitando a aprovação dos programas das aulas ministradas pela A. à observância desses critérios genéricos e tendo a faculdade de os modificar e fiscalizar a sua observância de modo a - homogeneizar os cursos com outros que o R. também tinha; 15. A douta sentença de 1ª instância, ao retirar ilações da matéria de facto dada por provada em sentido contrário ao que da matéria de facto consta e ao dar por provados factos que constam em sentido contrário dos contratos celebrados entre o R. e a A., é nula nos termos das alíneas c) e d), in...
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