Acórdão nº 04B1357 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 01 de Julho de 2004 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelFERREIRA GIRÃO
Data da Resolução01 de Julho de 2004
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: Nesta acção ordinária, o dr. A pede a condenação da ré "B, S.A.", a pagar-lhe a quantia de 5.992.609$70 (5.451.957$00 de capital e 540.652$40 de juros vencidos), com juros de mora vincendos, alegando, em síntese, ser accionista da ré e que a quantia ora por si peticionada consta de uma conta a seu favor na ré, sob a rubrica «suprimentos», como forma de compensação pela ausência da distribuição de dividendos, procedimento este que teve lugar quanto a todos os accionistas.

Na contestação, a ré confessa a existência do crédito, mas contesta a sua proveniência, bem como a sua exigibilidade, alegando, em suma, que, o crédito do autor corresponde a adiantamentos para reforço dos capitais próprios da sociedade, sendo certo, porém, que o seu reembolso é uma obrigação sem prazo, condicionada pelas disponibilidades de caixa da contestante, inexistentes nesta altura.

Na réplica, o autor respondeu a esta matéria exceptiva e pediu a condenação da ré, como litigante de má fé, em multa e indemnização.

A ré treplicou e, realizado o julgamento, foi proferida sentença que: - julgando procedente a acção, condenou a ré a pagar aos autor a quantia de 5.451.957$300, como juros de mora desde 9/7/1999, à taxa legal; - condenou ainda a ré na multa de 50 UCS e em indemnização favorável ao autor, a fixar posteriormente nos termos do artigo 457º, nº. 2 do C. P. Civil (CPC), por alteração dolosa da verdade dos factos, uma vez que se veio a provar, contrariamente ao defendido pela ré, que o autor jamais emprestou dinheiro à ré e que o seu crédito, ora pedido, resulta de uma liberalidade da administração daquela.

A ré apelou desta sentença, mas a Relação do Porto manteve-a, à excepção da condenação da ré por litigância de má fé, decisão que revogou, com o fundamento de que o «motivo avançado neste particular na dita sentença nem sequer foi mantido e aceite.».

Considerou ainda o acórdão como não escrita a palavra liberalidade constante da decisão sobre matéria de facto, por ser um «termo conceitual» e que o acto praticado pela ré - um «acto intra-societário» traduzido na «inscrição na contabilidade da empresa de verbas em favor dos sócios» -, embora anulável, consolidou-se na ordem jurídica, por prescrição do direito de invocar (a tempo e por parte legítima) essa anulabilidade.

Recorreram deste acórdão para o Supremo Tribunal de Justiça ambas as partes, sendo certo que o recurso interposto pelo autor, circunscrito à absolvição da ré como litigante de má fé, foi recebido como de revista, embora o recorrente o tenha qualificado como agravo no requerimento de interposição.

Houve contra-alegações a ambos os recursos no sentido da sua improcedência e a ré suscitou a questão da inadmissibilidade do recurso interposto pelo autor.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

Antes de entrarmos na apreciação do objecto de ambos recursos, há que decidir a questão prévia da indamissibilidade do recurso interposto pelo autor, suscitada pela ré com o fundamento de ser de agravo, com um valor de condenação (50UCS) aquém da alçada da Relação, sendo certo ainda que o vigente nº. 2 do artigo 754º do CPC - aplicável ao caso, por a acção ter sido proposta em 4/12/2000 - proíbe o agravo dos acórdãos da Relação «sobre decisões da 1ª Instância.

Na sua resposta, pugna o autor pela admissibilidade do recurso, com o fundamento de que é de revista, sendo ainda desconhecido o valor da indemnização a fixar a seu favor, pelo que se deve atender apenas ao valor da causa, nos termos do nº. 1 do artigo 678º do CPC.

Este recurso é limitado, como se disse, à parte do acórdão que decidiu revogar a sentença quanto à condenação da ré como litigante de má fé (não podia, aliás, o autor estender o objecto do seu recurso para além desta questão, uma vez que foi só quanto a ela que o recorrente ficou vencido - cfr. nº. 1 do artigo 680º do CPC).

O recurso em apreço foi admitido e processado como de revista.

Entende, no entanto, a ré que a espécie adequada aos recursos que têm por objecto as decisões por litigância má fé é a de agravo, pelo que, atento não só o valor da condenação (50 UCS de multa), como ainda o disposto na redacção vigente do nº. 2 do artigo 754º do CPC, o recurso não pode ser conhecido.

Não tem razão, porém.

Por um lado, estão subjacentes a uma condenação por litigância de má fé faltas aos deveres de probidade e de conduta ética das partes (interesses imateriais, portanto), consubstanciadoras de verdadeira responsabilidade civil.

Ora, como se decidiu no acórdão de 13/12/2000, proferido na revista nº. 3123/00, da 7ª secção deste Tribunal, o recurso de revista é o adequado para o STJ conhecer apenas da questão da litigância de má fé, considerando que está em causa um ilícito substantivo, um problema de responsabilidade civil (cfr. Sumários, ano 2000, página 371).

Por outro lado, estando ainda por liquidar a indemnização a favor do recorrente, o valor a atender para efeito da admissibilidade do recurso só pode ser, como determina o nº. 1 do artigo 678º do CPC, o valor processual da causa (in casu muito acima da alçada da Relação).

O recurso do autor está, assim, carregado na espécie devida, nada obstando ao conhecimento do seu objecto, pelo que improcede a questão prévia levantada pela ré.

A Primeira Instância considerou provados os seguintes factos: 1º- O autor é accionista da sociedade ré, cujo capital é de 100.000.000$00, titulando 3% do capital social, ou seja 3.000 acções com valor nominal de 1.000$00 cada...

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