Acórdão nº 04B2716 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 23 de Setembro de 2004
Magistrado Responsável | SALVADOR DA COSTA |
Data da Resolução | 23 de Setembro de 2004 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I O Banco A, a que sucedeu o Banco ...... intentou, no dia 6 de Novembro de 1995, contra B, C, D e E, acção executiva para pagamento de quantia certa, com processo ordinário, a fim de lhes exigir o pagamento de 9 511 493$ e juros, com base em três livranças subscritas pelo último e avalizadas por ele em representação, além do mais, da executada D.
A executada D deduziu, no dia 11 de Janeiro de 2002, embargos, afirmando não haver concedido poderes a E para garantir dívidas de outrem e que ele usou a procuração em seu favor, em negócio consigo próprio.
O Banco AA expressou, em contestação, deverem os embargos ser julgados improcedentes, sob o fundamento de a embargante haver emitido procuração a favor do pai com poderes para avalizar letras e livranças, sem qualquer restrição.
Realizado o julgamento, foi proferida sentença no dia 14 de Agosto de 2003, pela qual os embargos foram julgados procedentes e extinta a acção executiva quanto à embargante.
Apelou o embargado, e a Relação, por acórdão proferido no dia 2 de Março de 2004, negou provimento ao recurso.
Interpôs o embargado recurso de revista, formulando, em síntese, as seguintes conclusões de alegação: - a recorrida conferiu mandato ao pai, E, para comprar, vender, avalizar letras e livranças, e movimentar como entendesse contas bancárias, contrair empréstimos e assinar cheques; - a procuração foi entregue ao recorrente, face ao qual E subscreveu livranças e avalizou-as em nome dela, com os poderes conferidos pela procuração, esta sem limitações à concessão do aval ou sua à livre intervenção; - a procuração conferiu a E mandato para fazer tudo o que entendesse, incluindo negócios consigo próprio, sem a limitação de o produto dos levantamentos ser utilizado em proveito da recorrida; - o recorrente desconhecia tudo o que ia para além do teor da procuração e, face ao seu teor, E tinha poderes para obrigar a recorrida nos termos em que o fez; - o acórdão recorrido interpretou erradamente os artigos 262º e 266º do Código Civil, pelo que deve ser revogado e ordenado o prosseguimento da execução.
Respondeu a recorrida, em síntese de conclusão de alegação: - a procuração só no âmbito da administração dos bens da recorrida confere a E poderes para avalizar letras e livranças, o que pressupõe apenas o poder fazer no interesse dela; - a recorrida não conhecia o aval, não o consentiu de forma clara e inequívoca nem ratificou, há conflito de interesses entre ambos pelos danos que o acto lhe poderia causar, pelo que é em relação a si ineficaz; - E, ao avalizar em nome da recorrida as livranças relativas a empréstimo contraído em proveito próprio, agiu sem poderes de representação para o acto, e o aval ineficaz em relação a si, nos termos dos artigos 268º, n.º 1, e 269º do Código Civil; - E realizou, pois, um negócio consigo mesmo, sem para o efeito haver autorização clara e específica, pelo que é anulável, nos termos do artigo 261º, n.º 1, do Código Civil, anulação requerida; - nos termos do artigo 77º da Lei Uniforme Sobre Letras e Livranças, as livranças subscritas em representação de outrem por quem não tenha poderes para o efeito apenas obrigam aquele que as subscreveu.
II É a seguinte a factualidade declarada provada no acórdão recorrido:.
-
No dia 12 de Outubro de 1983, D e C outorgaram no Cartório Notarial de Abrantes, num instrumento de procuração, na qual declararam que "constituem bastante procurador o seu pai E. no qual concedem os necessários poderes para em seus nomes cobrar e receber as quantias ..; para sacar, aceitar e endossar letras, livranças ...; para em qualquer banco ... depositar ou levantar dinheiro, movimentando como entender as suas contas bancárias ou outras, avalizar letras e livranças e praticar, requerer e assinar tudo o mais que se torne preciso a esses fins, e ainda que "mais conferem poderes ao dito mandatário para com livre e geral administração civil, reger e gerir todos os bens destas ... como melhor entender.
-
E, pai de D, negociou com o exequente, em nome dele, um empréstimo, no âmbito do qual foram preenchidas as livranças mencionadas sob 6, usando a procuração referida sob 1, sem avisar previamente a embargante.
-
No dia 19 de Julho de 1995, o advogado F, em representação do Banco A, dirigiu à executada C uma carta na qual lhe expressou: "Acaba de nos ser distribuído para accionamento o processo respeitante às responsabilidades de que é devedora ao Banco A - livrança avalizada por V.Exª no montante de 2 570 000$, com vencimento no dia 10 de Junho de 1995, acima referenciada. Sem prejuízo de estarmos a preparar a respectiva minuta para apresentação em tribunal, fazemos ainda esta tentativa para conseguir o empenhamento de V.Exª numa solução que permita a regularização dos seus débitos sem os inconvenientes conhecidos do recurso a tribunal e os custos que os mesmos sempre envolvem. Para esse efeito, queira, pois, entrar em contacto com o signatário ou com a agência em referência onde o assunto pode ser tratado. No caso de falta de resposta no prazo de oito dias, a contar da data da presente carta, ver-nos-emos forçados a proceder judicialmente".
-
No dia 22 de Setembro de 1995, representantes do Banco A dirigiram à executada D uma carta, na qual lhe expressaram o seguinte: "Atenta a falta de resposta à minha carta de 19/07/95, no qual se tentou o empenhamento de V.Exª. na solução extrajudicial do assunto, venho comunicar-lhe que irá ser instaurado, de imediato, e sem qualquer outro aviso, a competente acção judicial, com os inconvenientes que daí lhe advirão. Lembro-lhe, no entanto, que o assunto ainda poderá ser extrajudicialmente...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO-
Acórdão nº 2664/15.1T8CHV-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 31 de Outubro de 2018
...quando o representante excede os poderes dela constantes”, cf acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, de 09/23/2004, no processo 04B2716, disponível em www.dgsi.pt (assim como todos os demais cuja fonte se não E no mesmo sentido, Pires de Lima e Antunes Varela, ao Código Civil A......
-
Acórdão nº 637/1999.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 21 de Março de 2013
...representado ou de que se age contra indicações do representado, que não está provada nos autos – cf. Acórdão do STJ, de 02/03/2004 (proc. 04B2716). - De resto, ao contrário do que defende o Tribunal recorrido, não só não está provado que a Autora esteja impedida, na prática, de controlar a......
-
Acórdão nº 346/08.0TBLSA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 14 de Dezembro de 2010
...do STJ de 05/03/1996, in CJ(STJ), IV, I, 111; e de 09/10/2003 (Proc. 03B2201, relatado pelo Cons. Araújo Barros); de 23/09/2004 (Proc. 04B2716, relatado pelo Cons. Salvador da Costa); de 07/02/2006 (Proc. 05A4285, relatado pelo Cons. Fernandes Magalhães), 27/05/2010 (Proc. 251/2002.P1.S1, r......
-
Acórdão nº 2664/15.1T8CHV-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 31 de Outubro de 2018
...quando o representante excede os poderes dela constantes”, cf acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, de 09/23/2004, no processo 04B2716, disponível em www.dgsi.pt (assim como todos os demais cuja fonte se não E no mesmo sentido, Pires de Lima e Antunes Varela, ao Código Civil A......
-
Acórdão nº 637/1999.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 21 de Março de 2013
...representado ou de que se age contra indicações do representado, que não está provada nos autos – cf. Acórdão do STJ, de 02/03/2004 (proc. 04B2716). - De resto, ao contrário do que defende o Tribunal recorrido, não só não está provado que a Autora esteja impedida, na prática, de controlar a......
-
Acórdão nº 346/08.0TBLSA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 14 de Dezembro de 2010
...do STJ de 05/03/1996, in CJ(STJ), IV, I, 111; e de 09/10/2003 (Proc. 03B2201, relatado pelo Cons. Araújo Barros); de 23/09/2004 (Proc. 04B2716, relatado pelo Cons. Salvador da Costa); de 07/02/2006 (Proc. 05A4285, relatado pelo Cons. Fernandes Magalhães), 27/05/2010 (Proc. 251/2002.P1.S1, r......