Acórdão nº 04B2753 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 06 de Outubro de 2005 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelPEREIRA DA SILVA
Data da Resolução06 de Outubro de 2005
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I.

  1. A 95-10-30 (cfr.carimbo aposto a fls.2 e art.267º nº1 do CPC), A, intentou acção de restituição de posse, com processo especial, contra B, C, D e E, nos termos e com os fundamentos seguintes, em síntese: Em 13-11-94, no estado de viúva e sem herdeiros legitimários, faleceu F à qual sobreviveram, como herdeiros legítimos, a autora (irmã), G e B (sobrinhos), filhos de H (irmão), pré-falecido, em 11-07-78, a herança de F ainda não partilhada estando, tal pessoa contitulando com os demandados di versos depósitos bancários, os réus se tendo apropriado de quantias desses depósitos.

    Concluiu impetrando a condenação, na restituição à sua pessoa, da posse das seguintes quantias, por parte dos demandados: O réu B: 2.114.238$00, a título de capital, e juros vincendos, à taxa anual de 10%, desde a citação até integral pagamento.

    O demandado C: l.965.690$07 (capital) e juros legais sobre tal montante, à taxa anual predita, desde a citação até integral pagamento.

    O réu D: 1.965.734$70 (capital) e juros legais sobre tal quantitativo, à taxa de 10% ao ano, desde a citação até integral pagamento.

    E: 4.248.029$10 e juros, desde a citação até integral pagamento, à taxa anual supra-citada.

  2. Contestaram os réus, concluindo no sentido da improcedência da acção.

  3. Após réplica da autora, elaborado foi despacho saneador tabelar e organizados especificação e questionário, contra os quais, sem êxito, reclamou a autora.

  4. Cumprido que foi o demais legal, veio a acção a ser julgada parcialmente procedente, com condenação: 1. Do réu B: a restituir à autora a posse da quantia de 2.114.238$00 (10.547,77 euros), acrescida de juros desde a citação (18.4.96), à taxa legal de 10%, "sendo de 7% desde 17.4.99 até integral pagamento"; 2. Do réu C:" a restituir à autora a posse da quantia de 1.965.664$00 (9.804,69 eures) acrescida de juros desde a citação (4.12.95) à taxa legal de 10%, sendo de 7% desde 17.4.99 até integral pagamento;" 3. Do réu D: " a restituir à autora a quantia de 1.965.734$00 (9.805,04 euros) acrescida de jures desde a citação (11.12.95) à taxa legal de 10%, sendo de 7% desde 17.4.99 até integral pagamento;" 4. Da ré E:" a restituir à autora a quantia de 3.127.267$00 (15.598,74 euros) acrescida de juros desde a citação (5.12.95) ; à taxa legal de 10% sendo de 7% desde 17.4.99 até integral pagamento.

  5. Com o sentenciado se não tendo conformado, apelaram os réus E, D, B e C.

    Na alegação oferecida, em que propugna a bondade da revogação da sentença recorrida, com consequente absolvição sua de devolver qualquer quantia à apelada, tirou a ré as seguintes conclusões: "I - O Meretíssimo Juiz do Tribunal "a quo" atribuiu ao presente recurso efeito meramente devolutivo, conforme art. 792º do Código de Processo Civil, contudo, porque o valor da acção é de 10.293.697$00, isto é , 51.344,74 euros, de harmonia com o disposto no art. 462º, a acção deve seguir a forma de processo ordinário, e, assim, quanto a recursos, salvo o devido respeito, não deverá ser atribuído ao mesmo o efeito meramente devolutivo, mas sim o efeito suspensivo, "ex vi" do artigo 463º Nº 3 alínea b) tendo em conta a reforma processual de 1995, operada pelo Decreto-Lei 329-A/95 de 12 de Dezembro.

    II - A recorrente foi condenada no pagamento recorrida de 3.127.267$00.

    III - Porém, a apelante nada deve à apelada.

    IV - Na verdade, a sentença dá por provado, que o depósito "sub-judice" existiu pelo menos até 10.11.94 e não retira do facto qualquer consequência.

    V - Contudo, à data do falecimento da F o depósito já não existia, pois a 11.11.94 foi dada ordem legitima e eficaz no sentido da liquidação dos depósitos e, assim, não existindo o depósito, o mesmo não integrava o acervo da herança da falecida.

    VI - Por que assim se não entenda, subsistem razões que permitem fundar a inexistência de qualquer de restituir por parte da apelante.

    VII - Pois, é verdade que o Tribunal "a quo" dá por provado que a parte da F era de 1.966.988$00 e não retira desse facto a única consequência possível, ou seja, que o restante seria "in totum" da E.

    VIII- Mas nem essa quantia deve ser objecto de restituição, pois, provou-se que a referida importância de 1.966.988$00 foi. doada à ora apelante.

    IX - Na sua fundamentação a sentença recorrida qualifica incorrectamente o "quid" doado, que se traduziu na outorga donatária de um direito de crédito e não na doação de coisa móvel.

    X - Aliás, e novamente com o devido respeito, não se poderá concluir que um depósito consubstancie uma doação de coisa móvel.

    XI - É que o depósito bancário teve um carácter instrumental face à inequívoca intenção da doadora doar à donatária o que doou, como forma de agradecimento pelo carinho e cuidado por esta prestados.

    XII - A sentença recorrida dá por provado que a quantia de 1.966.988$00 foi doada a E pelo facto de esta ter cuidado da falecida F com todo o carinho nos últimos anos de vida desta, tendo inclusivamente diligenciado no sentido de proceder ao seu funeral.

    XIII - O Meretíssimo Juiz do Tribunal "a quo" qualifica de inválida a aludida doação, mas, com o devido respeito, recorre a uma fundamentação meramente formal que desconsidera a relevância em relação ao caso concreto, indo contra a inequívoca intenção da doadora.

    XIV - Mesmo que outro entendimento se perfilhe sempre se terá que entender que na esteira da doutrina expandida no acórdão do Venerando Tribunal da Relação do Porto, de 21.05.92, in BMJ 417-821, isto é, que existindo - como existiu de facto-tradição da coisa, a doação é válida.

    XV - Desta forma, tendo a doação por objecto a outorga de um direito de crédito, a tal doação não se aplica o nº 2 do art. 947º, mas sim o princípio da liberdade de forma ínsito no art. 219º do Código Civil.

    XVI - Pelo que é lícito concluir que os depósitos de que a apelante era titular com a F não existiam à data da sua morte, mesmo que assim se não entenda, à F só pertencia, como se provou, a quantia de 1.966.988$00, pelo que se a doação não existisse a E só teria que devolver essa quantia herança, pois o restante era seu, mas existindo, como existe, a doação, a E nada tem a restituir.

    XVII - A "F", como já se disse sobejamente, faleceu em 13.11.94, e, nesta data os depósitos contitulados com a E já não existiam - assim ficou expresso na douta sentença onde se afirma peremptoriamente que os mesmos existiram pelo menos até 10.11.94 - não tendo o Meretíssimo Juiz do Tribunal "a quo" valorado o documento junto com a contestação "doc. 1", mas o certo é que o especificado na alínea H encontra-se em nítida contradição com a resposta ao quesito 2º, daí que os fundamentos sentença estão, salvo o devido respeito, que é muito, em contradição com a decisão".

    Eis as conclusões tiradas pelo réu D na sua alegação: "I. - À presente apelação deverá ser atribuído efeito suspensivo e não meramente devolutivo, porquanto com a reforma processual de 1995, esta acção especial de restituição de posse, devido ao seu valor ( 10.293.697$00 ou 51.344,74 euros), passou a reger-se pelas regras do processo ordinário o regime dos recursos do processo ordinário, o que tem aplicação no caso concreto, nos termos do art. 463º, nº 3 do CPC.

    II - As contas bancárias abertas em nome da autora da sucessão e do aqui apelante D foram constituídas em regime de solidariedade, pois só assim foi possível o aqui apelante proceder ao levantamento desses dinheiros após o óbito da autora da sucessão, mesmo sem a assinatura desta.

    III - A abertura das contas bancárias em nome da autora da sucessão e do aqui apelante D ficou a dever-se a uma doação dos montantes nessas contas depositados que a falecida F quis fazer ao aqui apelante como forma de pagamento pelos serviços que lhe prestou, no entanto a referida F fez esta doação de forma condicional, visto ter reservado para si o usufruto dessas verbas, já que ela também era uma das titulares das contas e como tal podia-as movimentar livremente.

    Todavia, A doação dos montantes depositados, feita pela falecida F em favor do aqui apelante, operou-se logo com a constituição dos depósitos bancários, porque a partir desse momento o ora apelante passou a ser proprietário das verbas depositadas e como tal a poder movimentá-las livremente, sem a assinatura da autora da sucessão, atento o regime de solidariedade das contas bancárias.

    Portanto, IV - Tratou-se de doação remuneratória (a forma da doadora autora da sucessão recompensar o donatário aqui apelante pelos serviços que este lhe prestou), condicional (porque com reserva de usufruto para a doadora), de coisa móvel (dinheiro) e acompanhada de tradição do dinheiro doado da doadora para o donatário, operada no momento em que a autora da sucessão doadora constituiu os depósitos bancários com o aqui apelante D donatário, logo uma doação válida e legal, nos termos das disposições conjugadas dos arts. 513º, 940º, 941º, 947º, nº2, 954º, 958º, 959º, todos do Cód. Civil.

    Tudo...

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