Acórdão nº 04B2877 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 04 de Novembro de 2004

Magistrado ResponsávelCUSTÓDIO MONTES
Data da Resolução04 de Novembro de 2004
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I. Relatório "A - Indústria de Calçado, Ldª", intentaram contra B acção com processo comum sob a forma ordinária Pedindo a condenação desta A pagar-lhe a quantia de 118.450.000 Liras Italianas, acrescida de juros à taxa de 12% a contar da citação e até ao trânsito em julgado da sentença, e a partir de então com juros à taxa anual de 17% até integral pagamento, podendo esta quantia ser convertida em escudos ou euros ao câmbio da data do pagamento; E, a título de indemnização, a quantia de 6.350.000$00, acrescida de juros às mesmas taxas, a iniciar nas mesmas épocas, e que pode igualmente ser convertida em liras italianas ou euros, ao câmbio da data do pagamento.

Invoca como fundamento a falta de pagamento parcial do preço num contrato de fornecimento de calçado, bem como prejuízos daí advindos.

Contestou a R. por impugnação e deduziu pedido reconvencional, pedindo a condenação da A.

. a pagar-lhe a quantia de 294.391.224 liras italianas (30.481.267$00 nesta data), bem como a quantia de 10.000.000$00, a título de danos não patrimoniais, acrescidas, ambas as quantias, dos juros de mora contados desde a citação, calculados à taxa legal, até efectivo e integral pagamento; . a declaração de compensação do crédito de 194.391.224 liras italianas com os alegados créditos da A., que venham a ser reconhecidos nos autos, devendo, em qualquer dos casos, a A. ser condenada a pagar à R. o montante do crédito desta na parte que exceda a aludida compensação.

Como fundamento do pedido reconvencional invoca a incumprimento do contrato por parte da A. e respectivos prejuízos.

Houve réplica e tréplica e, depois, a apresentação de nova P.I. corrigida e nova contestação/reconvenção, com novo pedido reconvencional, não atendido.

Julgadas parcialmente procedentes a acção e a reconvenção, foi proferida sentença nos seguintes termos: Condenada a R. a pagar à A. a quantia de 47.452.74 Euros, sem prejuízo da compensação que posteriormente se realizará, absolvendo aquela do restante pedido que contra si foi formulado; Condenada a A. a pagar à R. a quantia de 41.940,92 Euros, acrescida de uma indemnização pelos danos não patrimoniais causados pela primeira à segunda, no valor de 3750 Euros, sem prejuízo da compensação a operar de seguida, absolvendo aquela do restante pedido que contra si foi formulado; Declarado compensado aquele valor de 47.452,74 Euros pelo montante de 45.690,82 Euros, subsistindo a condenação da R. a pagar à A. a quantia de 1.761,82 Euros, acrescido de juros à taxa de 12% desde 3 de Novembro de 1999 e até integral pagamento.

Interpuseram recurso de apelação A. e R., tendo sido julgado improcedente o recurso da R. e parcialmente procedente o da A., confirmando-se a decisão da 1.ª instância, com o seguinte acrescento: "Condena-se ainda a R. a pagar à A. uma indemnização a liquidar em execução de sentença relativa aos prejuízos consubstanciados na resposta ao quesito 19º - facto 30º da sentença recorrida, indemnização essa que subsistirá para além da compensação determinada na alínea c) da parte conclusiva da mesma sentença".

Novamente inconformadas, A. e R. interpuseram recurso de revista, terminando as suas alegações com as seguintes Conclusões Da A.

  1. Não se pode argumentar com entrega tardia ou fora de prazo dos pares de sapatos que pelas facturas de 08 e 15 de Outubro de 1998, foram debitados à Recorrida, no total de 932 pares; 2. A Recorrida ao receber esta mercadoria, não esboçou qualquer reacção, quer no sentido de a não receber, quer no sentido de a devolver, quer assacando-lhe qualquer defeito; 3. Aceitando, pelo menos, tacitamente, se não contratualmente, a existência da obrigação do seu pagamento integral, pois recebeu a mercadoria; 4. É que, no caso em apreço, se não houver um contrato típico, pelo menos não pode a Recorrida enriquecer à custa alheia; 5. O Douto Acórdão recorrido, fez incorrecta aplicação do disposto nos artigos 879.º, c), 1207.º e 473°, todos do Cód. Civil.

    Termina, pedindo se dê provimento ao recurso, aditando-se à sentença recorrida o valor de 16.273,51 Euros, referente aos fornecimentos constantes das facturas 52 e 53 de Outubro de 1998.

    Da R.

  2. Atendendo aos factos dados como provados, o montante da indemnização de 3.750€ arbitrado à Recorrente, em razão dos danos por esta sofridos em consequência do incumprimento da Recorrida, é manifestamente insuficiente para ressarcimento dos mesmos; 2. Da factualidade dada como provada apenas se podem extrair os inúmeros prejuízos sofridos pela Recorrente - quer no que respeita à sua imagem e reputação comercial perante os seus clientes e perante o mercado em que a mesma está inserida, quer, ainda, no que respeita à perda da sua capacidade negocial com os seus clientes e de angariação de nova clientela.

  3. A impossibilidade de entregar aos seus clientes os produtos por estes encomendados, nos prazos acordados, constitui um fenómeno anómalo no funcionamento da Recorrente, que se traduziu numa afectação negativa da sua reputação comercial, bem como, na perda de clientes e de capacidade de contratar e angariar nova clientela.

  4. A imagem e o bom nome comercial que a Recorrente gozava ficaram definitivamente afectados em consequência do incumprimento da Recorrida.

  5. Ainda por força do incumprimento da Recorrida, grande parte dos clientes da Recorrente, para além de terem cancelado as suas encomendas, cessaram as relações comerciais estabelecidas até então.

  6. O incumprimento da Recorrida determinou, ainda, uma perda da capacidade de angariação de novos clientes, na medida em que a sua reputação comercial, adquirida e mantida ao longo de vários anos, foi drasticamente atingida.

  7. A mais valia da Recorrente no mercado interno e internacional resultava precisamente do facto de ser conhecida como uma empresa cumpridora de todas as obrigações, designadamente, no rigoroso cumprimento dos prazos de entrega das mercadorias aos seus clientes.

  8. O incumprimento da Recorrida, no que respeita aos prazos de entrega acordados, determinou para a Recorrente a perda daquela mais valia liquidação em execução de sentença do prejuízo não quantificável da Recorrida Termina, pedindo se julgue o recurso procedente em conformidade com as precedente conclusões.

    Corridos os vistos legais, cumpre decidir.

    1. FUNDAMENTAÇÃO Matéria de facto dada como provada pelas instâncias: 1. A A. dedica-se ao fabrico e comercialização de calçado, com unidade fabril e sede social em Arrifana, sendo uma empresa de pequena dimensão, com 12 trabalhadores, o que era do conhecimento da R. e a quem a falta de pagamento atempado causa grandes e imediatos transtornos - alínea A); 2. A R. acordou com a A. em encomendar-lhe a produção de sapatos que os seus clientes lhe haviam previamente encomendado - resposta ao quesito 20º; 3. A R., através do seu representante em Portugal, informou a A. de que aquela era uma empresa de grande dimensão no sector do calçado, sendo imprescindível o respeito pontual e rigoroso dos prazos que viessem a ser acordados - resposta aos quesitos 22º e 23º; 4. Na sequência dessas informações a A. aceitou e comprometeu-se a respeitar os prazos de entrega nos fornecimentos que viessem a acordar - resposta ao quesito 24º; 5. A A. acordou com a R. em que seria esta a fornecer as matérias primas e acessórios e que depois haveria encontro de contas e compensação - alínea F); 6. A R. comprometeu-se a pagar à A., após boa recepção nas suas instalações em Itália do produto fabricado, a que normalmente sucedia cinco dias depois da sua entrega nos serviços de transportes em Portugal, sendo a taxa de câmbio na ocasião correspondente a ITL 1 a PTE 0,7078 - resposta ao quesito 12º.; 7. O pagamento devia ser feito em Portugal, através de transferência bancária, e em liras - resposta ao quesito 13º; 8. A A., no exercício da sua actividade acima referida, acordou com a R., em Junho de 1998, a fornecer-lhe cerca de 4.200 pares de sapatos da linha Bambi e Disney - resposta ao quesito 1º; 9. A A. em fins de Junho ou princípios de Julho de 1998 comprometeu-se a fornecer à R. mais cerca de 2.400 pares da linha Fiorucci - resposta ao quesito 2º.; 10. As encomendas referidas em 8º. e 9º. incluiriam amostras - resposta ao quesito 25º; 11. Foi ainda inicialmente acordado aquando do referido em 8º. e 9º. que a A. deveria entregar nos serviços de transporte, cerca de 3300 pares até 10 de Agosto e os restantes 3.300 pares até 11 de Setembro, sempre do ano de 1998 - resposta aos quesitos 26º e 27º; 12. A R. informou a A. que seria necessário observar estes prazos, em virtude da primeira ter que cumprir os calendários de entrega estipulados para com os seus clientes, sendo tais modelos de sapatos para a estação de outono/inverno do ano de 1998/99 - resposta ao quesito 28º.; 13. Na sequência do referido em 5º a R. forneceu à A. os materiais descriminados nas seguintes facturas: - factura n.º 879, de 19-6-98, no valor de ITL 1.673.000; - factura n.º. 881, de 19-6-98, no valor de ITL 489.439; - factura n.º. 902, de 24-6-98, no valor de ITL 8.331.708; - factura nº.905, de 24-6-98, no valor de ITL 3.286.600; - factura n.º. 906, de 31-7-98, no valor de ITL 42.000; - factura nº. 910, de 26-6-98, no valor de ITL 313.554; - factura n.º. 935, de 3-7-98, no valor de ITL 4.869.530; - factura n.º. 937, de 6-7-98, no valor de ITL 85.000; - factura n.º. 943, de 7-7-98, no valor de ITL 341.260; - factura n.º. 963, de 9-7-98, no valor de ITL 18.603.500; - factura n.º. 1016, de 21-7-98, no valor de ITL 2.436.611; - factura n.º. 1039, de 23-7-98, no valor de ITL 4.773.085; - factura n.º. 1058, de 28-7-98, no valor de ITL 1.919.613; - factura n.º. 1067, de 28-7-98, no valor de ITL...

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