Acórdão nº 04B3374 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 18 de Novembro de 2004

Magistrado ResponsávelARAÚJO BARROS
Data da Resolução18 de Novembro de 2004
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: "A" intentou, no Tribunal Judicial de Vila Nova de Famalicão, acção destinada a exigir responsabilidade civil emergente de acidente de viação, contra "B - Companhia de Seguros, SA" (actualmente, "Companhia de Seguros .... Portugal, SA") "C" e D, pedindo: a) no caso de existir à data do acidente de viação descrito na petição inicial, seguro válido e eficaz entre o D e a "B" a condenação da 1ª ré a pagar à autora pelos danos patrimoniais e não patrimoniais por ela sofridos em resultado do acidente a importância de 14.066,60 Euros, acrescida dos juros vincendos a contar da data da citação à taxa legal até efectivo e integral pagamento, para além de eventuais custos de assistência hospitalar que a autora tenha de suportar; b) subsidiariamente, e no caso de não existir, à altura do acidente, seguro válido e eficaz entre os réus D e B a condenação solidária dos 2º e 3º réus no pagamento à autora, pelos danos patrimoniais e não patrimoniais por ela sofridos em resultado do acidente, da importância de 14.066,60 Euros, acrescida dos juros vincendos a contar da data da citação à taxa legal até efectivo e integral pagamento, para além de eventuais custos de assistência hospitalar que a autora tenha de suportar.

Alegou factos que implicam, por um lado, a responsabilidade civil, transferida contratualmente para a 1ª ré, do condutor do veículo de matrícula VNF interveniente no supra aludido acidente.

E alegou ainda que: - seguia a pé, na berma da EN 206, no sentido Esmeriz-Vila Nova de Famalicão, e a certa altura pretendeu atravessar a dita via; - antes de iniciar a travessia tomou todos os cuidados, sendo que quando estava a finalizar a mesma, foi embatida pelo referido veículo, o qual seguia a velocidade exagerada para o local, sendo a desatenção e imperícia do condutor que acarretaram o acidente relatado nos autos.

- com o acidente sofreu danos patrimoniais e não patrimoniais.

Contestou o C, alegando a existência de seguro válido e eficaz à data do acidente, sustentando que a acção terá, quanto a ele, de improceder.

O réu D contestou, alegando também a existência de seguro válido e eficaz à data do acidente, razão por que a demanda terá também de improceder quanto a si.

No mais, defendeu-se por impugnação motivada, acabando por imputar a causa do acidente à conduta da autora.

Finalmente, a ré B contestou, pugnando pela nulidade do contrato de seguro, por falsidade quanto à identificação do proprietário aquando da celebração do dito contrato e defendendo-se, no demais, por impugnação motivada, acabando por imputar a causa do acidente à conduta da autora.

A autora veio entretanto deduzir ampliação do pedido, agora no montante total de 31.524,53 Euros, que foi admitida.

Exarado despacho saneador, condensados e instruídos os autos, procedeu-se a julgamento, com decisão acerca da matéria de facto controvertida, após o que foi proferida sentença que, julgando a acção parcialmente procedente, decidiu: a) absolver a ré B do pedido formulado contra si; b) condenar os réus C e D a pagarem à autora A a quantia de 7.481,97 Euros, sendo que quanto ao C é deduzida quantia correspondente à franquia legal de 299,28 Euros; c) condenar os mesmos réus a pagarem à autora juros de mora, sobre os danos não patrimoniais, a contar da presente data até integral pagamento, à taxa de juro legal.

Inconformados com o assim decidido apelaram a autora (fls. 316) e os réus C (fls. 323) e D (fls. 327).

No conhecimento dos recursos, o Tribunal da Relação do Porto, em acórdão de 25 de Março de 2004, decidiu: 1. Julgar totalmente procedentes as apelações dos réus C e D e 2. Julgar parcialmente procedente a apelação da autora A, em função do que se revoga a sentença recorrida e, consequentemente: a) absolver os réus C e D do pedido contra eles formulado; b) condenar a ré "B - Companhia de Seguros, SA" a pagar à autora A a quantia de 10.000,00 Euros, acrescida de juros de mora, desde a data da prolacção da sentença, à taxa legal, até efectivo e integral pagamento; c) absolver a ré seguradora do mais peticionado.

Interpuseram, desta feita, a autora e a ré "B" recursos de revista.

Pugna a primeira pela fixação da indemnização relativa aos danos não patrimoniais que sofreu no montante de 14.963,94 Euros, com juros moratórios contados desde a citação.

Pretende a segunda ser absolvida e ver condenado o C no pagamento da indemnização devida à autora.

Foram apresentadas contra-alegações pelos réus D, B e C.

Verificados os pressupostos de validade e de regularidade da instância, corridos os vistos, cumpre decidir.

É, em princípio, pelo teor das conclusões das alegações do recurso que se delimitam as questões a apreciar no respectivo âmbito (arts. 690º, nº 1 e 684º, nº 3, do C.Proc.Civil).

Nas conclusões apresentadas pelas recorrentes (que, por economia de procedimento, nos dispensamos de transcrever) são essencialmente suscitadas as questões seguintes, de que importa conhecer: I. Perante a gravidade das lesões, dores e angústias que sofreu. bem como das sequelas que dessas lesões resultaram para a autora o montante indemnizatório atribuído à autora/recorrente a título de danos não patrimoniais deve ser equitativamente fixado em quantia nunca inferior a 14.963,94 Euros (recurso da autora).

  1. Os juros moratórios relativos a essa indemnização por danos não patrimoniais são devidos e contados desde a data da citação dos réus/recorridos (recurso da autora).

  2. Sendo a identificação do segurado uma das condições determinantes do contrato de seguro de responsabilidade civil automóvel, a declaração inexacta acerca dessa identidade, a que se refere o art. 429° do C. Comercial (reproduzido no art. 11º das Condições Gerais da Apólice Uniforme de Responsabilidade Civil Automóvel) implica a declaração de nulidade do contrato, já que este tem natureza pessoal, e não real, conforme art. 1º do Dec.lei nº 522/85, de 12 de Dezembro, pelo que é nulo o contrato de seguro outorgado por quem, sem o ser, se diz proprietário do veículo a que reporta tal seguro (recurso da ré).

Temos por assente em definitivo a seguinte matéria fáctica (indicada de forma mais resumida na parte que, salvo no essencial, não releva para a apreciação das questões suscitadas): i) - no dia 28 de Março de 1996, cerca das 18 horas, na EM n° 1470, no lugar de Aldeia Nova, freguesia de Esmeriz, concelho e comarca de Vila Nova de Famalicão, ocorreu um acidente de viação no qual intervieram um peão (a autora) e um ciclomotor, com a matrícula VNF, conduzido pelo 3° réu; ii) - no dia, hora e local acima mencionados encontrava-se a autora na berma esquerda da referida EM n° 1470, atento o sentido de marcha Vila Nova de Famalicão-Esmeriz, com a intenção de atravessar a citada estrada, da sua margem esquerda para a direita, atento aquele sentido; iii) - a autora olhou primeiro para a esquerda e de seguida para a sua direita, certificando-se se poderia efectuar aquela passagem em condições de segurança, e assim se manteve - aguardando oportunidade - dada a intensidade de tráfego automóvel que ali se costuma verificar; iv) - quando observou que podia efectuar a travessia da faixa de rodagem em segurança, iniciou a travessia perpendicularmente, em linha recta e sempre com a máxima atenção; v) - quando a autora se encontrava já na faixa de rodagem, a sensivelmente 3,60 m de distância da berma da margem direita, atento o seu sentido de marcha, surgiu imprevistamente o veículo VNF que transitava na mesma EN, no sentido Vila Nova de Famalicão-Esmeriz, desviado da berma direita, pelo menos 3,60 m, isto atento o seu sentido de marcha; vi) - e foi colher a aqui autora, que atentos os seus 84 anos de idade, nada pode fazer para evitar o acidente, tanto mais que o condutor daquele veículo ciclomotor, que circulava completamente desatento ao intenso tráfego tanto de peões como de veículos, nomeadamente de veículos que se encontravam estacionados na berma direita, atento o seu sentido de marcha, e mais concretamente a cerca de sensivelmente 20 m antes do local do atropelamento, nem sequer travou nem se desviou para a sua mão direita, quando é certo e sabido que disporia de um espaço de pelo menos 3,60 m para efectuar tal manobra e assim evitar o acidente; vii) - tratava-se de uma localidade, com grande movimento de peões e cuja estrada se encontra ladeada por habitações de ambos os lados da faixa de rodagem, estrada essa que no local é constituída por uma extensa recta que termina com uma curva para a esquerda, atento o sentido de marcha V. N. Famalicão-Esmeriz e por cima de uma ponte; viii) - como consequência directa e necessária do descrito acidente, a autora sofreu vários e gravíssimos ferimentos, para mais atenta a sua idade de 84 anos, tendo sido internada em ortopedia no Hospital de S. João em 29/03/96, por fractura do ramo isquiopiloros da bacia e fractura do prato tibial externo, sendo posteriormente retransferida do Hospital de S. João de Deus em 02/04/96, onde foi efectuada manipulação da fractura do joelho sob A.G. e gesso, tendo apenas alta do internamento em 09/04/96; ix) - viu-se assim obrigada a efectuar várias deslocações a hospitais, clínicas, companhia de seguro...

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